A memória de gerações e gerações remete-nos para os primórdios da pregação apostólica. Em Saragoça, a Caesaraugusta romana, encontramos o Apóstolo São Tiago o Grande cansado e sobrecarregado, rezando com alguns convertidos, e a Virgem Maria que "vem" consolá-lo e recordar-lhe a missão que lhe foi confiada por Jesus Cristo e a promessa: "Sabei que estarei sempre convosco, até ao fim dos tempos". Não se trata de uma aparição, mas de uma vinda: uma vinda "em carne mortal", porque a Virgem ainda não tinha terminado os seus dias nesta terra, ainda não tinha sido levada para o céu, mas estava em Jerusalém, na Igreja mãe.
O pilar da Virgem
Os vários relatos deste acontecimento prodigioso falam de uma "vinda gloriosa", de uma "noite que se tornou luz", de "cortes de anjos"... e, sobretudo, de uma "coluna". Esta "coluna" é o "Pilar". A Virgem, no seu encontro com o apóstolo Tiago, apontou para um pilar de pedra de jaspe rosa com 170 centímetros de altura e 24 centímetros de diâmetro. Esta coluna, que não se moveu do mesmo lugar onde se realizou a Vinda, representa a firmeza e a segurança da fé cristã em Espanha e a comunidade dos povos hispânicos que têm em Maria um sinal de esperança.
Nossa Senhora recordou também ao Apóstolo que ele devia construir a Igreja: a Igreja e um templo no qual adorar a Deus e conservar a memória da sua presença materna. O Pilar colocado pela Virgem é o sinal em torno do qual se constrói o chamado primeiro templo mariano; e, sobretudo, a imagem da Igreja que, pela mão de Maria e de São Tiago, começa a difundir-se. Quando é que isso aconteceu? As tradições jacobeia e pilarista remetem-nos para uma época anterior ao martírio de Santiago e à Assunção de Maria. No século XVII, será uma freira franciscana, a venerável madre María Jesús de Ágreda (1602-1665), que no seu livro "A cidade mística de Deus" situa a vinda no dia 2 de janeiro do ano 40 da nossa era cristã.
Os "templos" do Pilar
Quem conhece a catedral basílica de El Pilar sabe que se trata de um templo barroco. O que terá acontecido entre 1940 e 1680, ano em que se iniciou a construção do atual edifício? A tradição diz que o próprio apóstolo Santiago construiu uma igreja. No entanto, a história documentada do templo remonta ao século IX, quando um monge de nome Aimoino testemunha a existência de uma igreja moçárabe na Saraqusta muçulmana.
Esta igreja dedicada a Santa Maria ocupava o mesmo lugar onde atualmente se encontra a basílica barroca e encontrava-se em mau estado de conservação, já que, embora os muçulmanos tolerassem o culto cristão, não permitiam reformas nem a construção de novos templos. Após a conquista de Saragoça pelo rei Afonso I de Aragão, em 1118, o templo foi reconstruído e foi edificada uma igreja românica, cujas obras só foram concluídas nos séculos XI-XII, cujo aspeto é visível num tímpano que ainda se encontra integrado na fachada atual. No entanto, um incêndio em 1434 levou à construção de um novo edifício de estilo gótico-mudéjar.
Este templo não durou muito tempo: o Milagre de Calanda provocou um novo surto de peregrinações e o edifício tornou-se demasiado pequeno. Muito em breve se iniciaria a construção do atual templo barroco, que só ficou concluído em 1961, com a última das suas quatro torres.
O milagre de Calanda
A história leva-nos a finais de julho de 1637. Miguel Juan Pellicer, natural de Calanda (Teruel), sofre um acidente durante o seu trabalho. Caiu no chão e uma das rodas da carroça do seu tio passou-lhe por cima da perna direita. Partiu-a mais ou menos ao nível do tornozelo. Foi levado para o hospital de Valência e, vendo que estava a piorar cada vez mais, foi transferido para Saragoça, onde chegou no início de outubro, com febre alta e uma perna completamente gangrenada. Antes de ser internado no hospital, foi à igreja de El Pilar, onde se confessou e comungou. Uma vez no hospital, os médicos viram que a perna não podia ser curada e decidiram cortá-la quatro dedos abaixo do joelho, sem qualquer anestesia para além de uma bebida cheia de álcool, enquanto rezava à Virgem do Pilar.
Depois da operação, dois médicos enterraram-lhe a perna no cemitério do hospital. Quando recuperou da operação, passou dois anos e meio a pedir esmola à porta do Pilar, a untar o coto com óleo da lâmpada da igreja do Pilar e a dormir numa estalagem ou nos bancos do hospital. Regressa a Calanda e, a 29 de março de 1640, cansado do trabalho, deita-se cedo e no mesmo quarto que os pais. Pouco tempo depois, ao entrarem no quarto, notam um cheiro estranho; a mãe aproxima-se do filho com a vela e vê que não uma, mas as duas pernas do filho saem de entre os lençóis. Era a sua própria perna amputada: com as velhas cicatrizes da sua infância e o ferimento perto do tornozelo que a carruagem lhe tinha causado quando o atropelou.
A grande festa do dia do Pilar
Existem várias datas no calendário que assinalam a devoção à Virgen del Pilar. Obviamente, a mais conhecida e provavelmente a mais popular é o dia 12 de outubro: a festa de Nossa Senhora do Pilar, padroeira de Saragoça e Aragão. É de salientar que foi o Papa Inocêncio XIII que, no século XVIII, fixou a data de 12 de outubro como o dia da Virgen del Pilar, uma vez que foi a 12 de outubro que se celebrou a primeira missa após a recuperação da cidade de Saragoça. Como se celebra o dia 12 de outubro? A grande festa da Virgen del Pilar é precedida e acompanhada de numerosas tradições que tornam única esta celebração de fé mariana.
-Véspera do Pilar: Vibrante. Um dia de espera que se centra na procissão que, por volta das 20h30 do dia 11 de outubro, sai do altar-mor para a Santa Capela do Pilar para cantar a Salve. Esta procissão, conhecida como o "Claustro Magno", é tradicionalmente presidida pelos estudantes do último ano e pelo arcebispo da arquidiocese de Saragoça.
-Missa do bebé: Família. A celebração mais carinhosa deste dia dedicado à Santíssima Virgem. É o dia do Pilar, são 4h15 da manhã. É a meio da noite e as crianças são as primeiras a cantar a Virgem Bendita e Louvada no seu dia de festa. A Capela Santa está cheia e não se ouve nenhum murmúrio. Um silêncio orante espalha-se por toda a basílica, onde se reúnem centenas de devotos, alguns dos quais percorreram quilómetros a pé. Após esta celebração, é comum encontrar famílias e as próprias crianças a saborear chocolate nas imediações da basílica mariana.
-Rosário da Aurora: Sacrificados. Depois da esperada Missa das Crianças, por volta das 5h45 da manhã, o Gancho chega ao Pilar, vindo da paróquia de San Pablo. Este dispositivo único abre caminho, sem ferir, à aurora que vem prestar homenagem à sua Rainha da manhã. Manto de flores feito com as oferendas do dia 12 de outubro.
-Missa sazonal: solene. Dia 12 de outubro, às 12:00 horas. É a missa por excelência, celebrada pelo pároco diocesano acompanhado por todo o povo de Deus. Uma grande eucaristia que é celebrada com coro, rondalla, orquestra e órgão. É a missa aragonesa do maestro Berdejo-Marín. Milhares de pessoas reúnem-se na casa da Virgem, na sua praça e arredores para a honrar e venerar no seu principal dia de festa.
-Oferendas à Virgem: Extensas e intensas. A primeira destas oferendas é a das flores. Centenas de pessoas acorrem à imagem da Virgen del Pilar colocada na praça, a partir das 7h30 do dia 12 de outubro, levando ramos, centros de mesa e arranjos florais com os quais se tece um imenso e colorido manto. A segunda oferta é a dos frutos e realiza-se no dia treze, às 12h00. Também se oferecerá música para tecer um manto sonoro à Virgen del Pilar.
-Rosário de Cristal: Cada 13 de outubro, Saragoça acolhe o Rosário de Cristal. Este costume único e belo remonta a 1889, desde a fundação da Irmandade do Santo Rosário da Virgem do Pilar. No dia seguinte à festa da Virgem, às 18:30 horas, da Plaza de San Pedro Nolasco, parte uma procissão muito especial de 30 carros alegóricos de vidro, iluminados por dentro, aludindo aos Mistérios do Rosário (Doloroso, Gozoso e Glorioso).
Esta procissão luminosa pontua as ruas e as orações de milhares de pessoas como uma Via Láctea que desceu do céu à terra e uma sinfonia de luz e de cor, de arte e de magnificência incomparável. Com a incorporação dos Mistérios da Luz por São João Paulo no Rosário, foi acrescentado à procissão um novo carro alegórico moderno representando estes mistérios.
Infantics e "medidas
À volta da Virgen del Pilar encontramos também uma série de instituições, tradições e curiosidades. Entre elas, duas das mais conhecidas são os Infanticos del Pilar e as "medidas" da Virgen del Pilar que dezenas de milhares de pessoas levam nos seus carros, mochilas ou atados nas mãos.
-Os Infanticos: Os Infantes del Pilar, popularmente conhecidos como os "Infanticos del Pilar", são um dos grupos escolares que ainda hoje subsistem em Espanha. A instituição foi formalmente instituída no século XVII, embora existam provas da sua existência já no século XIII. Atualmente, são quinze crianças entre os seis e os doze anos que cantam diariamente a missa capitular, de manhã, e os Gozos e a Salve, à tarde.
-As "Medidas" da Virgem: Uma das lembranças mais típicas e mais solicitadas do Pilar são as "medidas". A "Medida" é uma fita com 36,5 centímetros de comprimento, que é o tamanho da escultura de Nossa Senhora do Pilar, como diz a legenda impressa no tecido. As fitas referem-se aos mantos que cobrem a Coluna Sagrada e, por isso, têm cores diferentes: verde, roxo, azul celeste ou com as bandeiras de Espanha ou de Aragão. Estas "Medidas" são transportadas pelo Pilar e são um sinal de devoção e proteção mariana. Quantos carros, malas, bonecas ou berços de bebé transportam uma destas famosas "Medidas" como sinal de devoção filial mariana!
Uma devoção universal
Um dos elementos mais chamativos que se conservam no interior da basílica-catedral de Nossa Senhora do Pilar de Saragoça, e na sala por cima do Museu Pilarista, é a coleção de bandeiras de diferentes países, comunidades ou destacamentos militares, oferecidas à Virgem em diferentes momentos da nossa história contemporânea. Como assinalam José Enrique Pasamar e Leonardo Blanco Lalinde, "as bandeiras mais antigas estão relacionadas com os acontecimentos dos cercos de Saragoça. As restantes bandeiras estão geralmente relacionadas com a Hispanidade, uma vez que a Virgen del Pilar foi proclamada Rainha e Padroeira da Hispanidade". As bandeiras mais antigas chegaram em 1908, quando 19 bandeiras americanas foram oferecidas à Virgem: República Dominicana, Cuba, Paraguai, Uruguai, Chile, Haiti, El Salvador, Costa Rica, Peru, México, Equador, Panamá, Venezuela, Colômbia, Argentina, Bolívia, Honduras, Guatemala, Nicarágua; e a bandeira das Filipinas.
As bandeiras tinham chegado a Espanha depois de terem sido benzidas em Roma por São Pio X. A bandeira de Espanha foi a próxima a chegar e fê-lo em 1909. Ainda faltava algum tempo para que uma nova bandeira se juntasse às oferecidas à Virgem: em 17 de maio de 1953, a bandeira de Porto Rico juntou-se à coleção de países latino-americanos presentes na basílica do padroeiro da Hispanidade. As bandeiras da Santa Sé, de Portugal e do Brasil também chegaram em 1953.
A deterioração de muitas destas bandeiras levou, em 1958, por ocasião do 50.º aniversário da oferta das bandeiras americanas, a uma renovação das bandeiras promovida pelo Instituto Cultural Hispânico de Aragão. 10 anos mais tarde, em 1968, a Florida ofereceu a sua bandeira. A última bandeira a ser oferecida é a dos Estados Unidos da América, que se juntou às bandeiras americanas em 14 de setembro de 2000.
No dia 22 de janeiro de 2005, por ocasião do Ano Jubilar, e no âmbito dos eventos do Centenário da coroação canónica da imagem da Virgem do Pilar, as Filipinas e o Haiti renovaram as suas bandeiras. Nas palavras de Pasamar e Lalinde, "hoje, ainda hoje, as bandeiras do Pilar querem continuar a ser mensageiras da unidade, da paz, do fervor e sobretudo da cooperação entre os países".
A devoção a Nossa Senhora do Pilar é também muito forte nos países da América Latina, onde existem bastantes igrejas dedicadas a esta invocação materna. São disso exemplo a catedral basílica de Nossa Senhora do Pilar em São João del Rei (Brasil), a basílica de Nossa Senhora do Pilar em Buenos Aires (Argentina) e as festas em honra da Virgem do Pilar no município de Maneiro, estado de Nueva Esparta, na Venezuela, onde a Virgem do Pilar é venerada como padroeira da localidade.
Padroado da Virgen del Pilar
Nossa Senhora do Pilar tem a caraterística de unir, como Padroeira do mundo hispânico, na sua devoção, todos os povos hispânicos.
A celebração do dia 12 de outubro como Dia de Colombo recorda o tesouro cultural que é a união dos países de língua espanhola, além de reivindicar o valor dos povos indígenas, da fraternidade e da irmandade. Além disso, a Virgen del Pilar tem o patrocínio, talvez menos conhecido, de outras instituições. O primeiro dos padroados da Virgen del Pilar é a Guarda Civil espanhola. Um patrocínio que deve a sua existência à devoção do capelão militar Miguel Moreno Moreno que, no Colégio da Guarda Civil de Valdemoro, onde esteve colocado em 1864, colocou a imagem da Virgen del Pilar e introduziu os jovens estudantes na devoção e no amor à Virgem.
A devoção ao Pilar tomou forma na Guarda Civil e, em 8 de fevereiro de 1913, por ordem real, a Virgen del Pilar foi proclamada padroeira da Guarda Civil. Além disso, a Virgen del Pilar é a padroeira do corpo de submarinos da Armada Espanhola desde 1946, já que, muito antes disso, uma imagem de Nossa Senhora do Pilar foi levada a bordo do submarino torpedeiro de Isaac Peral durante o primeiro mergulho. Outro mecenato, menos conhecido, é o dos Correios de Espanha. Em 1935, foi constituída a Hermandad del Pilar de Funcionarios de Correos e Nossa Senhora do Pilar foi nomeada padroeira do Corpo Postal, enquanto o apóstolo Santiago é o padroeiro do Corpo Telegráfico.
Delegado para a Comunicação Social do Arcebispado de Saragoça e cónego das catedrais de Saragoça.