A Igreja, como qualquer instituição, precisa de um conjunto de normas jurídicas para se comportar. O primeiro Código de Direito Canónico foi promulgado em 1917 pelo Papa Bento XV e o actual foi promulgado por São João Paulo II em 1983. No passado dia 23 de Maio, o Papa Francisco promulgou a Constituição Apostólica Pascite gregem Dei que reforma o Livro VI do Código de Direito Canónico sobre sanções penais na Igreja, uma alteração que entrará em vigor a partir de 8 de Dezembro deste ano.
Na Constituição Apostólica acima referida, o Santo Padre sublinha que "desde os tempos apostólicos, a Igreja tem vindo a dar-se leis para a sua forma de agir que, ao longo dos séculos, têm vindo a formar um corpo coerente de normas sociais vinculativas, que dão unidade ao Povo de Deus e cuja observância é da responsabilidade dos Bispos". Normas que ligam "a misericórdia e correcção da Igreja" e que "precisam de estar em permanente correlação com as mudanças sociais e com as novas exigências que surgem entre o Povo de Deus, que por vezes tornam necessário rectificá-las e adaptá-las a situações de mudança". O Papa revela em Pascite gregem Dei que "a sanção canónica também tem uma função de reparação e medicina salutar e procura, acima de tudo, o bem dos fiéis".
Não é fácil redigir um texto legal aplicável à Igreja universal. Hoje em dia, um certo etnocentrismo cultural está a espalhar-se por grande parte do nosso mundo, levando-nos a pensar que a nossa própria cultura é superior a outras culturas que deveriam ser cobertas pelo mesmo guarda-chuva jurídico. De facto, o Papa recorda que Bento XVI lançou esta revisão em 2007 e que, desde então, tem vindo a amadurecer.
Como Monsenhor Juan Ignacio Arrieta, Secretário do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, sublinhou recentemente, entre as principais novidades destas revisões encontramos que elas determinam com maior precisão o comportamento a adoptar pelos responsáveis pela observância destas normas e os critérios a seguir para a aplicação de sanções. Outro aspecto relevante é o aspecto comunitário, ou seja, que o direito penal é também importante para preservar a comunidade dos fiéis, reparar o escândalo causado e reparar os danos. O texto também fornece à autoridade os instrumentos para reorientar o comportamento a tempo e, consequentemente, para evitar danos.
O Presidente do Conselho Pontifício dos Textos Legislativos, Monsenhor Filippo Iannone, salientou o aparecimento de novas sanções, tais como a reparação ou compensação por danos. As penalidades são enumeradas com mais detalhe. Algumas penalidades que anteriormente só estavam previstas para os sacerdotes são alargadas a todos os fiéis. O estatuto de limitações para infracções foi revisto e foram introduzidas algumas novas. Na área do abuso de crianças, a gravidade dos crimes e os cuidados com as vítimas são realçados. A ênfase na transparência e na boa gestão dos recursos é também realçada.
Esta reforma será certamente um instrumento importante "para responder adequadamente às necessidades da Igreja em todo o mundo", no "contexto das rápidas mudanças sociais que estamos a viver", como o Papa Francisco assinala em Pascite Gregem Dei.