Pode passar por desertos pessoais, maritais, vocacionais, espirituais, institucionais, etc. As condições lá são espartanas, é muito frio e muito quente, há pouca companhia, a comida é precária, o tempo passa lentamente, o silêncio prevalece, há pó e insectos, são lugares inóspitos, austeros e desagradáveis. É lógico queixar-se e procurar consolo, seja um bezerro de ouro, transformando pedras em pão ou chorando sobre os alhos-porós e cebolas que costumava comer.
E, ao mesmo tempo, lembre-se que está de passagem, que está a deixar para trás algo que era desnecessário, que sabe que é um deserto porque conheceu outros lugares e que pode comparar. O facto de lá estar agora não anula ou nega o que já experimentou antes, mas antes reforça, afirma e contrasta com isso. Que antes era diferente, também reafirma que agora se encontra neste lugar desolado. A secura emocional desta estação contrasta com a sábia consciência que aponta de forma conatural para a verdade. O deserto é um lugar solitário onde só Deus o encontra ao amanhecer, depois de o ter contemplado durante o sono.
Não tenha medo disso, é assustador, sim, e vá em frente porque é bom para nós, mesmo que não o compreendamos.
1.- Ameaça perturbar a sua vida. Parece que tudo acabou, que já nada faz sentido, que tudo antes era falso. Aparecerá um grande mal-estar e/ou abordagens enganosas subtis: desilusão, cansaço, questionamentos existenciais ou emendas ao todo.
2.- Interroga-se. Passar por ela é discernir novamente. Sim, mais uma vez. O que é trigo e o que é joio, o que é reto e o que é torto, o que é luz e o que é sombra, os demónios e os animais selvagens perguntam-lhe, se é por aqui ou por ali. É uma deliberação lúcida em que, ao mesmo tempo, se sabe e não se sabe, se vê e não se vê.
3.- Despertar o espírito para recomeçar, e para começar realmente. É o preâmbulo de um novo caminho espiritual, para regressar ao essencial e tornar as coisas novas. Não negue o passado, sabe de onde veio, mesmo por vezes fugindo do egípcio do dia. O sol queima a sua pele velha e aparece uma nova. Está sedento e ansioso pela luz; ao contrário das imagens depressivas, onde não se preocupa com nada, aqui quer encontrar a verdade.
4.- Mostrar o norte. Para ver bem as estrelas, quanto mais escuridão, melhor. Parece - assim dizem os místicos que nos iluminam com as suas noites escuras - que Ele não isenta da escuridão fecunda do homem cego que recupera a sua visão. A falta de luz na terra permite-lhe ver as estrelas no céu, onde o Polar permanece ao seu serviço. Se confiar a noite com o seu tempo e esperar, no final, surpreende-o sempre com o dom do amanhecer. Há esperança, face à desesperança da depressão.
5.- Limpa e atordoa ao mesmo tempo. Gera confusão no início: o que se passa? Pouco a pouco, centraliza-o e permite que não se distraia porque há pouco barulho, com muito vazio à sua volta. Liberta-o de pesos que não são necessários para seguir em frente. Em silêncio, a palavra é melhor ouvida. Sem tanto complemento a Palavra é mais autêntica e você sabe que está lá, mesmo que não sinta quase nada espiritualmente, e em outras áreas da sua vida ainda está vivo como sempre.
6.- Desespero. Quando se encontra tão esgotado, tem duas opções: ou acorda e continua a caminhar para viver, ou desiste e morre pelo nada deserto. Este cenário oferece-lhe uma vida plena de acordo com o espírito, porque os suportes materiais, estruturais, institucionais ou de tarefas são poucos, pouco apetitosos e pouco satisfatórios. O deserto não o acalma para dormir como alterações de humor.
7.- Desprender. Para poder avançar através das areias é necessário deixar passar o que não é essencial: ocupações, recados, actividades, distracções. É assustador porque parece que não restará nada, mas haverá você e Deus que, além disso, no meio do deserto, lhe dirá com um meio sorriso "alimente-os", quando tudo o que lhe resta são trapos, grande fome e grande sede.
8.- Vá para dentro. Como o exterior do deserto tem pouco interesse e é sempre o mesmo, é necessário parar de procurar no exterior o que se tem no interior. Assim, coloca-o num cenário propício ao encontro consigo mesmo, com a sua própria verdade, e para ver que lá dentro já estava à espera do casamento. No entanto, na depressão não é capaz de reflectir.
9.- Renomear. Com tantas pedras à volta, no final vê-se o seu nome escrito em todos os calhaus brancos. Um novo nome, depois da viagem do herói, que se revela ser o mesmo nome de antes.
Assim, você faz história, constrói a sua história, e emerge do deserto desperto, revitalizado e com esse olhar - compreensivo, espantado e apreciador - sobre si próprio, os outros e a vida, o que lhe permite desfrutar muito mais de cada gota de água.