É precisamente esta alegria, motivada pela proximidade do Senhor, que se reflecte também na correspondente oração coleta:
Ó Deus, que contemplais a fidelidade com que o vosso povo espera a festa do nascimento do Senhor, concedei-nos que nos alegremos com tão grande acontecimento de salvação e o celebremos sempre com solenidade e alegria transbordante.
Deus, qui cónspicis pópulum tuum nativitátis domínicae festivitátem fidéliter exspectáre, presta, quaésumus, ut valeámus ad tantae salútis gáudia perveníre, et ea votis sollémnibus semper laetítita celebráre.
Mais uma vez, os responsáveis pela reforma litúrgica acharam por bem transferir a antiga oração em uso para outro dia e encontrar uma que reflectisse melhor a essência deste domingo. Com pequenas modificações, utilizamos atualmente esta oração, que provém do Ritual de Ravena (século VIII).
Na sua estrutura, encontramos uma breve invocação (Deus), a anamnese que se refere à aproximação do Natal e uma oração subordinada que introduz uma epiclese com duas petições.
Esperar, chegar e festejar
O uso abundante de verbos nesta frase é interessante. Por um lado, os verbos com forma pessoal apresentam-nos dois sujeitos: Deus e o seu povo. Deus é aquele que contempla (conspícuo) sempre com amor paternal e benevolente pelo seu povo peregrino. Nós, como seu povo, dirigimo-nos a ele com confiança filial para lhe pedir (quaésumus) a vossa ajuda, para que possamos (valeámus) para alcançar os bens de salvação que Ele nos destinou. Este é o dinamismo de toda a vida cristã.
Por outro lado, os três verbos que aparecem no infinitivo dão-nos uma boa ideia das atitudes com que a Igreja se coloca neste tempo litúrgico.
Em primeiro lugar, há a espera (exspectáre): aguardar com esperança o nascimento do Salvador. Sem dúvida, isto desperta no cristão um forte desejo e este desejo origina nele, nela, o movimento de querer ir ao encontro (perveníre) esse horizonte maravilhoso que Deus abre aos olhos da fé. E, claro, a chegada tornar-se-á uma festa (celebrar), com a sua dupla nuance: de celebração, logicamente, mas também de ação litúrgica e, portanto, de participação real e efectiva no mistério da salvação.
Alegria e solenidade
A última ação mencionada, a celebração do nascimento do Senhor, é acompanhada por duas características que lhe dão um tom particular: a alegria (laetítia) e solenidade (votis sollémnibus).
A alegria é a caraterística específica deste terceiro domingo do mês. Advento. Uma alegria particularmente viva, animada e entusiástica (alacri). Desta forma "muito alegre", Deus encoraja-nos a não nos contentarmos com a alegria que já temos, mas a procurarmos uma alegria mais plena. Uma plenitude que só é possível aproximando-nos dele, confiando mais nele, deixando-nos amar mais por ele. Mesmo sabendo que, no fim de contas, só alcançaremos a alegria perfeita depois desta vida. E, precisamente por isso, compreendemos a necessidade de corresponder mais plenamente à graça de Deus aqui na terra, aproveitando ao máximo o tempo que Deus nos dá.
A outra caraterística a que nos referimos são os ritos solenes e esplêndidos que costumam acompanhar o Natal. Certamente que têm como objetivo ajudar-nos a saborear a bem-aventurança do Céu, juntando-nos já à felicidade perfeita dos coros dos anjos e dos santos.
Mas, paradoxalmente, tal celebração contrasta radicalmente com a humildade do nascimento do Menino Deus em Belém, numa manjedoura. E contrasta também com a nossa pequenez pessoal, com a nossa falta de mérito e, por vezes, com as nossas derrotas. Talvez assim possamos ver que Deus tem mesmo de providenciar tudo. É ele que faz a festa. Sem Deus, sem a Redenção, não haveria motivo para festejar. Sem dúvida, foi Deus que nos deu o direito de festejar. Mesmo que ainda festejemos sob o véu deste mundo que passa, é uma realidade que o motivo da nossa alegria e da nossa festa já está connosco, e isso é razão suficiente para querermos transformar a nossa vida.
Sacerdote do Peru. Liturgista.