Espanha

A nova edição Para dar luz reúne os relatórios da Cremades e do Provedor de Justiça espanhol

A Igreja lança a segunda edição do relatório Para dar luz, sobre o abuso sexual de menores na Igreja Católica em Espanha, no qual integra as últimas investigações realizadas por outras instituições.

Maria José Atienza-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 5 acta

A Igreja espanhola apresentou hoje o segundo volume Para dar luz. Este "estudo vivo" integra, neste segundo número, os resultados da auditoria efectuada pelo escritório de advogados Cremades-Calvo Sotelo bem como os contributos e recomendações do relatório do Provedor de Justiça espanhol apresentado em outubro de 2023. 

O volume hoje apresentado divide-se em cinco capítulos. O primeiro capítulo aborda o contexto geral dos abusos sexuais na sociedade sob três perspectivas: histórica, jurídica e atual. O segundo capítulo trata da questão dos abusos sexuais de menores no seio da Igreja Católica e retoma a posição da Igreja sobre os abusos sexuais de menores no seio da Igreja, começando por fazer uma resenha histórica desde as origens da Igreja até aos pontificados do século XXI, bem como as investigações efectuadas e as medidas tomadas em termos de proteção e prevenção destes casos. 

O terceiro capítulo reúne toda a legislação em vigor e os protocolos de intervenção que foram aprovados na Igreja Católica, tanto pela Santa Sé como pela Conferência Episcopal Espanhola.

O quarto capítulo contém o relatório consolidado da Conferência Episcopal sobre a realidade dos abusos sexuais na Igreja espanhola. Este relatório, que é a primeira parte de "Para dar luz", tem vindo a aumentar o seu conteúdo desde o seu lançamento em abril de 2023, incorporando o testemunho das vítimas oferecidas aos Gabinetes de Proteção de Menores, desde a sua criação até dezembro de 2022. Também é feita referência ao trabalho de prevenção e ao material desenvolvido por instituições religiosas para essa prevenção. Finalmente, o quinto capítulo faz uma seleção de observações e recomendações feitas à Igreja Católica por instituições que estudaram a situação dos abusos sexuais.

Finalmente, o documento contém três anexos com um resumo de cada um dos casos de abuso registados, bem como os protocolos de ação e prevenção deste tipo de abuso em vigor em Espanha. 

A vítima, sempre no centro

"O importante não é o número de vítimas, mas cada uma das vítimas". Esta frase, repetida em cada uma das aparições que, em relação aos abusos sexuais de menores cometidos no seio da Igreja Católica, é também a chave de leitura do novo volume de Para dar luz publicado na manhã de 21 de dezembro pela Conferência Episcopal Espanhola. De facto, a disparidade do número de vítimas acreditadas apresentadas pelas diferentes investigações realizadas a este respeito pela própria Igreja, pela Provedoria de Justiça espanhola, pelo escritório de advogados Cremades-Calvo Sotelo e pelo jornal El País é uma das características mais marcantes deste estudo. 

Esta edição de Para dar luz As mais de 1.000 páginas do relatório incluem dados obtidos através dos Gabinetes de Proteção de Menores e de Prevenção de Abusos, bem como contribuições de todos os "outros estudos realizados até à data sobre o abuso sexual de menores, tanto na Igreja como na sociedade".

A este respeito, a Igreja Católica lamenta que a colaboração prestada nestes relatórios não tenha sido recíproca, uma vez que não obteve resposta ao pedido dirigido ao Provedor de Justiça no sentido de "receber as informações recolhidas no seu trabalho sobre esta questão, a fim de comparar os testemunhos recebidos e poder oferecer um estudo o mais exato possível da realidade dos abusos sexuais cometidos contra menores".

O número de vítimas

O relatório da Igreja sublinha, de facto, que "a metodologia diversificada utilizada em estudos paralelos sobre o assunto, como o do diário El PaísO facto de, até à data, não partilharem informações entre si torna necessário não fornecer dados agregados sobre os casos. A transferência de dados recolhidos pelos vários relatórios torna muito provável que existam casos que tenham sido incluídos no mesmo relatório duas, três ou mesmo quatro vezes".

Refere-se também ao facto de as fragilidades de investigação do jornal terem sido recentemente expostas. El País na sequência de um caso falso, criado "ad hoc" para verificar a gravidade do estudo e que foi acrescentado ao número de vítimas sem os controlos necessários. 

Neste sentido, o relatório realizado pelo escritório de advogados Cremades & Calvo Sotelo apresenta um total de 1.383 denúncias, sendo o número de vítimas indeterminado. Uma cifra que não é exacta, segundo o relatório da Conferência Episcopal, que assinala que "o Relatório-Auditoria compila basicamente casos que apareceram em estudos anteriores, sem realizar um estudo aprofundado dos mesmos, e comete erros conceptuais como considerar como denúncias diferentes as realizadas nas dioceses e as do Dicastério que têm a sua origem nas anteriores".

De facto, o relatório dos bispos refere que "a análise da totalidade dos grupos analisados leva-nos a afirmar que o número total de denúncias, de acordo com a metodologia indicada, ascende a 1.302 denúncias. Ao mesmo tempo, o facto de somar as 305 denúncias recebidas do Dicastério para a Doutrina da Fé às já comunicadas pelas dioceses e congregações, leva-nos a pensar que muito possivelmente estas denúncias estão duplicadas porque, desde 2001, as denúncias recebidas nas dioceses e congregações são comunicadas ao referido Dicastério. Relativamente ao número de vítimas, pode deduzir-se das denúncias um mínimo de 2.056 vítimas".

O Relatório do Provedor de Justiça tinha recolhido 487 vítimas conhecidas, através de 334 testemunhos directos e 39 indirectos, enquanto os dados do "estudo" do jornal, o El PaísO número de vítimas em junho de 2023 é de 1.014 casos envolvendo 2.104 vítimas. 

Casos registados, comprovados, credíveis ou não

Para dar luz O número de casos registados é de 806: 413 em Dioceses e Províncias Eclesiásticas e, destes, 112 referem-se a ordens e congregações religiosas e a casos que lhes são imputáveis, mesmo que a diocese tenha intervindo e denunciado. Os institutos religiosos representam 369 casos, enquanto a Prelatura da Santa Cruz e o Opus Dei registam 13 casos. Na rubrica "outras instituições específicas da Igreja" há dez casos registados e apenas um caso em institutos seculares. 

No entanto, destes casos registados, a Igreja só conseguiu verificar a realidade em 205 casos.74 em Dioceses e Províncias Eclesiásticas; 118 casos em religiosos (exceto a Congregação Salesiana); 2 casos relativos ao Opus Dei e os 11 casos registados pelas outras instituições específicas da Igreja e pelo Instituto Secular. 

Quanto aos casos não provados mas plausíveis, o relatório aponta para cerca de vinte casos em dioceses e cerca de cinquenta em institutos religiosos.

O número de casos não provados é muito superior, ascendendo a 144 no caso das dioceses, 135 casos em institutos religiosos, 4 relativos ao Opus Dei e um relativo a um instituto secular. 

Atualmente, estão pendentes 75 processos e 13 foram encerrados devido à prescrição ou à morte do arguido.

Uma "dança" de números que "põe em evidência a dificuldade de oferecer um número fechado, tanto em termos de número de vítimas como de número de autores" e que não deve ser utilizada, segundo os bispos, para desacreditar as vítimas, mas para "utilizar as informações oferecidas com a devida prudência, sobretudo quando se trata de números totais ou de percentagens globais, pensando, acima de tudo, na dignidade moral das vítimas".

Um problema social 

O abuso sexual de menores não é um problema da Igreja, mas da sociedade e, portanto, da Igreja. A este respeito, convém recordar que, em Espanha, a maior percentagem de abusos ocorre no seio da família, segundo dados da Associação ANAR, a percentagem de abusos cometidos por sacerdotes é de 0,7%. As agressões perpetradas por familiares ou amigos ultrapassam os 7%. 

Estes dados confirmam que a luta contra o abuso de crianças é mais do que necessária em todas as esferas sociais: família, escola, desporto e, claro, a Igreja. 

Zoom

Um presépio muito "desportivo"

Um presépio concebido por Myriam Lacerenza, de Roma, utilizando uma bola de basebol e luvas de basebol, está patente na exposição "100 Presépios no Vaticano", que pode ser vista sob a colunata da Praça de São Pedro.

Maria José Atienza-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: < 1 minuto
Vaticano

O Papa vai decidir os temas da próxima assembleia sinodal

Relatórios de Roma-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: < 1 minuto
relatórios de roma88

Terminada a terceira fase do Sínodo da Sinodalidade, é tempo de preparar os temas a tratar na Assembleia final, em Roma, em outubro de 2024. Estes temas, a serem decididos pelo Papa, dizem respeito àqueles que são da competência da Igreja universal. Por exemplo: a relação entre as congregações religiosas e os bispos, a formação dos sacerdotes, o significado do diaconado ou se as mulheres podem ser diaconisas.

Assim que o Papa aprovar os temas que deseja aprofundar, em janeiro, serão convocados peritos de todo o mundo para estudar estas questões juntamente com os dicastérios competentes.


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Vaticano

O Papa pede à Cúria para "ouvir, discernir e caminhar".

Esta manhã, o Papa felicitou a Cúria Romana pelo Natal e proferiu um discurso em que, utilizando como exemplos a Virgem Maria, São João Batista e os Reis Magos, se centrou na análise dos verbos "escutar, discernir e caminhar".

Loreto Rios-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

O Papa Esta manhã, numa audiência na Sala da Bênção do Palácio Apostólico do Vaticano, desejou felicitações de Natal aos cardeais e superiores da Cúria Romana.

No seu discursoFrancisco disse que "o Mistério do Natal move os nossos corações a maravilharem-se com um anúncio inesperado: Deus está a chegar, Deus está aqui, no meio de nós, e a sua luz irrompeu para sempre nas trevas do mundo. Precisamos sempre de ouvir e receber este anúncio, especialmente num tempo ainda tristemente marcado pela violência da guerra, pelos enormes riscos a que estamos expostos devido às alterações climáticas, pela pobreza, pelo sofrimento, pela fome e por outras feridas que habitam a nossa história.

O Papa centrou-se depois na análise de três verbos através de diferentes personagens do Evangelho: escutar, discernir e caminhar.

Ouça

Francisco deu o exemplo da escuta da Virgem Maria. "Escutar, de facto, é um verbo bíblico que não se refere apenas à audição, mas implica a participação do coração e, portanto, da própria vida. [...]. Escutar com o coração é muito mais do que ouvir uma mensagem ou trocar informações; é uma escuta interior capaz de compreender os desejos e as necessidades do outro, uma relação que nos convida a superar os esquemas e os preconceitos em que por vezes enquadramos a vida dos que nos rodeiam. A escuta é sempre o início de um caminho. O Senhor pede ao seu povo esta escuta do coração, uma relação com aquele que é o Deus vivo.

O Papa estabeleceu um paralelo entre este tipo de escuta e o tipo de escuta que deve ter lugar na Cúria Romana: "Também na Cúria é necessário aprender a arte de escutar. Antes dos nossos deveres e actividades quotidianas, mas sobretudo antes dos papéis que desempenhamos, é preciso redescobrir o valor das relações e procurar despojá-las de formalismos, animá-las com um espírito evangélico, antes de mais escutando-nos uns aos outros".

Discernir

Como exemplo de discernimento, Francisco citou São João Batista. "É importante para todos nós o discernimento, aquela arte da vida espiritual que nos despoja da pretensão de já saber tudo, do risco de pensar que basta aplicar as regras, da tentação de proceder, mesmo na vida da cúria, simplesmente repetindo esquemas, sem considerar que o Mistério de Deus sempre nos supera e que a vida das pessoas e a realidade que nos rodeia são e permanecem sempre superiores às ideias e às teorias".

Andar a pé

Por fim, como exemplo de "caminhar", o Papa mencionou os Três Reis Magos. "Eles recordam-nos a importância de caminhar. A alegria do Evangelho, quando o acolhemos verdadeiramente, desencadeia em nós o movimento do seguimento, que provoca um verdadeiro êxodo de nós mesmos e nos põe a caminho para o encontro com o Senhor e para a plenitude da vida. [Quando Deus chama, põe-nos sempre a caminho, como fez com Abraão, com Moisés, com os profetas e com todos os discípulos do Senhor".

Como em casos anteriores, Francisco indicou como isto deve aplicar-se à Cúria: "Também no serviço aqui na Cúria é importante permanecer no caminho, não deixar de procurar e aprofundar a verdade, vencendo a tentação de ficar paralisados e de nos "labirintos" dentro das nossas cercas e medos. [...] Quando o serviço que realizamos corre o risco de se aplanar, de se 'enredar' na rigidez ou na mediocridade, quando nos encontramos enredados nas redes da burocracia e do 'desenrascanço', lembremo-nos de olhar para cima, de recomeçar a partir de Deus, de nos deixarmos iluminar pela sua Palavra, de encontrar sempre a coragem de recomeçar".

"Permaneçamos sempre no caminho, com humildade e admiração, para não cairmos na presunção de estarmos satisfeitos e para que o desejo de Deus não se extinga em nós. E obrigado sobretudo pelo trabalho feito em silêncio. Escutar, discernir, caminhar", concluiu o Papa.

Educação

O projeto educativo dos pais

Para enfrentar um processo educativo, é essencial investir não só em meios financeiros, mas também em tempo, dedicação, esforço e entusiasmo, sempre acompanhados de muito afeto.

Julio Iñiguez Estremiana-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 8 acta

No dia 19 de outubro (2023), na sequência da trágica notícia de um jovem rapaz num jovem, em OKdiario Deparei-me com um comentário que me chamou a atenção.

Transcrevo-a de seguida, tal como foi publicada:

"O problema não são as redes sociais ...... mas sim uma juventude inculta, formada numa fase educativa deficiente, com maus professores, sem disciplina, sem objectivos a atingir ..... que chega aos 25 anos acreditando que a vida é uma selva e sem saber como ganhá-la com o seu próprio esforço.
Catequizam tudo em junho e os pais levam-nos para a praia ...... para dormir durante o dia e beber, snifar e fazer sexo à noite ....... em setembro voltam à "escola" à custa do suor do trabalho dos avós ...... Este é um país de deficientes mentais.
Nem sequer são suficientemente bons para ir trabalhar para o estrangeiro.... não são procurados em lado nenhum.... mal sabem gramática espanhola..... ou como lavar copos.
Uma minoria educada em famílias inteligentes e em escolas pagas termina os seus estudos e consegue empregos de 3.000 euros por mês e um bom futuro e, em muitos casos, acaba por ficar bem colocada no estrangeiro.
Conheço inúmeras crianças entre os 5 e os 13 anos que se deitam, se levantam, se sentam à mesa com os pais e têm o telemóvel na mão a ler disparates..... coitadinhos daqui a uns anos..... batatas cozidas para comer e óleo de coco..... para acordarem com tudo aquilo que não foram obrigados a acordar pelos pais".

O autor foi Luis e, em resposta, houve outro comentário de José, que disse

"Não podia ser melhor explicado".

Faço eco do comentário porque penso que há muitos que sentem o mesmo. Não me considero um especialista em sociologia suficiente para justificar ou refutar a visão da juventude espanhola de hoje expressa por Luis - apoiado por Pepe - com demasiada crueza e, certamente, com a sua melhor intenção de ajudar a corrigir o que precisa de ser melhorado no domínio da educação de crianças, adolescentes e jovens. Mas considero necessário, por uma questão de justiça, clarificar o meu próprio pensamento, que é contrário, nalguns aspectos, ao expresso por Luis:

Pela minha experiência no trato e trabalho com os jovens, posso afirmar que a juventude de hoje também possui, enquanto geração, muitas virtudes - responsabilidade cívica, empenhamento social e envolvimento na luta pela igualdade, entre outras - que precisam de ser reforçadas.

E no que respeita ao corpo docente, a grande maioria dos profissionais que conheço e com quem tenho lidado são altamente competentes e desenvolvem o seu trabalho com uma dedicação e um espírito de serviço exemplares; e muitas vezes, nos nossos dias, em condições adversas.

Projeto educativo dos pais para a educação dos filhos

No entanto, o comentário do Luís serve de contraponto à necessidade de um "Projeto Educativo para os pais educarem os filhos" - doravante "Projeto Educativo" - que me proponho desenvolver neste artigo.

Para conseguirmos no final do processo educativo o tipo de criança-aluno que desejamos - jovens que tenham crescido com uma boa educação que lhes permita desempenhar eficazmente as suas responsabilidades - é fundamental investir não só em meios financeiros, mas também em tempo, dedicação, esforço e entusiasmo, sempre acompanhados de muito afeto.

Hoje em dia, conhecemos muitos exemplos de jovens de grande valor que, a julgar pelo seu desempenho na cena pública, estão envolvidos na nobre tarefa de tornar o mundo um lugar melhor e que testemunham o facto de terem sido formados de acordo com um bom "Projeto Educativo".

O exemplo de Ayaan Hirsi Ali

Ayaan Hirsi Ali é um ativista que tem vindo a denunciar, com grande aclamação no Ocidente, o projeto totalitário que, na sua opinião, o Islão encerra. Depois de anos a reivindicar o ateísmo como a melhor forma de defender os valores do Iluminismo contra os excessos das religiões e das políticas identitárias, acaba de anunciar publicamente a sua conversão ao cristianismo.

Evoca o célebre texto de Bertrand Russell "Porque não sou cristão" para afirmar que as palavras do filósofo foram hoje deixadas para trás e que só o cristianismo pode assegurar a preservação dos valores ocidentais.

Refugiada nos Estados Unidos devido às ameaças de morte de que é alvo pelas suas críticas ao Islão, defende com firmeza a "civilização ocidental", acreditando que valores como a "liberdade de consciência e de expressão" só terão lugar através da compreensão de que emergem do próprio cristianismo e "do debate no seio das comunidades judaica e cristã".

"Para mim, esta liberdade de consciência e de expressão é talvez o maior benefício da civilização ocidental. Não é algo natural para o homem. É o produto de séculos de debate no seio das comunidades judaica e cristã. Foram estes debates que fizeram avançar a ciência e a razão, diminuíram a crueldade, suprimiram a superstição e criaram instituições para ordenar e proteger a vida, garantindo simultaneamente a liberdade ao maior número possível de pessoas. Ao contrário do Islão, o Cristianismo ultrapassou a sua fase dogmática. Tornou-se cada vez mais claro que os ensinamentos de Cristo implicavam não só um papel circunscrito para a religião, separado da política. Também implicavam compaixão pelo pecador e humildade pelo crente", explica Ayaan Hirsi Ali no seu texto. 

A ativista diz também que não abraça a sua nova fé apenas por um sentimento de oposição política e militante às "ameaças globais"; pelo contrário, começou a ir à missa aos domingos e a mergulhar nos mistérios da fé.

A educação que Ayaan Hirsi Ali recebeu ajuda-a a amar a verdade e a manter-se firme na luta pelos valores que acredita serem justos e inalienáveis.

O exemplo de Vinicius

Vinicius Jr., um jovem futebolista brasileiro que, aos 23 anos, conquistou muitos títulos com o Real Madrid e alcançou o sexto lugar no ranking da Bola de Ouro de 2023. Além disso, na mesma gala da Bola de Ouro patrocinada pela France Football, recebeu o Prémio Sócrates pelo seu trabalho social fora dos relvados: "Estou muito feliz por poder ajudar tantas pessoas no Brasil, nas favelas, é muito especial para mim", disse ao receber o prémio.

A iniciativa pela qual recebeu o prémio baseia-se numa aplicação para telemóveis, denominada "Base", que visa promover o desenvolvimento educacional de crianças em todo o Brasil através do futebol. Sobre o nascimento do "Instituto Vini Jr", que foi anunciado no verão de 2021 através das redes sociais, o jogador madrileno disse:   

"Quero ter um impacto quando entro em campo e também fora dele, pelas coisas que faço. Quero ter um impacto a curto, médio e longo prazo para que, daqui a uns anos, as pessoas possam dizer que o Vinicius foi importante para o desenvolvimento das crianças, para a educação e para termos menos analfabetos no nosso país."

Vinicius Jr. recebeu, sem dúvida, uma educação que o incentiva a ser solidário com as necessidades dos pobres e desfavorecidos.

Há duas perguntas que nós, educadores, e sobretudo os pais, podemos fazer a nós próprios:

1º) Que modelo escolhemos para os nossos filhos e alunos?

2º) Que meios temos de pôr em prática para ter êxito no nosso projeto educativo?

Obviamente, as respostas a estas duas perguntas orientam o "Projeto Educativo".

No entanto, é importante ter bem claro que "ter sucesso" na educação das crianças não é automático, nem mesmo com os meios adequados, uma vez que os resultados são influenciados por uma grande variedade de factores que escapam ao controlo dos pais e dos professores; e entre eles, talvez o mais importante, a liberdade de cada criança - de cada aluno - que devemos sempre respeitar.

Trataremos do tema da liberdade noutro artigo com o pormenor que merece, mas aproveito para explicar que a verdadeira liberdade consiste em escolher o bem, mesmo que isso implique sacrifícios: ser livre não consiste em fazer o que se quer num dado momento, mas em fazer livremente, porque quero, o que devo fazer nesse momento.

As dimensões do projeto educativo

Pois bem, para além do desenvolvimento físico e corporal, consideramos que existem três dimensões que enquadram um "Projeto Educativo": religiosa, familiar-social e académica, que estão em consonância com as repercussões internas e/ou externas de cada ato humano.

Não podemos abordar estas três dimensões neste artigo - seria demasiado longo - mas fá-lo-emos em artigos futuros, descrevendo em pormenor como podem ser trabalhadas.

Para já, limitar-nos-emos a uma breve explicação. 

A primeira, e na minha opinião a mais importante, é a religiosa, pois somos criaturas de Deus: este é um facto fundamental e decisivo que as crianças devem começar a conhecer e a viver desde a mais tenra infância. É Deus que nos dá a vida, contando com o amor e a generosidade dos pais, que dedicarão os seus melhores esforços para criar e educar os seus filhos, um dom maravilhoso recebido de Deus.

"A fé cristã afirma que o que é dito sobre o primeiro homem ["Deus tomou o pó da terra e soprou nele o fôlego da vida; e o homem tornou-se um ser vivo", Génesis] é aplicável a todos os seres humanos. Cada indivíduo tem uma origem biológica, por um lado, mas por outro lado não é o mero produto de genes existentes, de ADN, mas vem diretamente de Deus. O ser humano transporta o sopro de Deus (...) Nele está o sopro de Deus, ele não é uma mera combinação de materiais, mas uma ideia pessoal de Deus" (God and the World: Believing and Living in Our Time. Uma conversa com Peter Seewald)

É também muito recomendável que as crianças aprendam desde muito cedo a tratar Jesus e a sua Mãe, a Virgem Maria, que é também nossa Mãe e que está sempre atenta para nos ajudar em todas as nossas tarefas e dificuldades. Não esqueçamos que dentro do processo educativo, a criança deve aprender a pedir ajuda a quem confia: a mãe, o pai, os educadores, para fazer o que não sabe fazer e para consultar as suas dúvidas e adquirir segurança na vida.

A educação da dimensão familiar-social é um dos pilares do correto desenvolvimento infantil, fundamental para o futuro das crianças: compreender conceitos como respeito, generosidade, serviço, ajuda, tolerância, diligência, paciência ou companheirismo é tão importante como aprender línguas, matemática ou linguagem. Mas no caso dos valores, não basta conhecer e compreender os conceitos; o que é decisivo é vivê-los, pô-los em prática, que é o que chamamos ter virtudes - bons hábitos adquiridos num ambiente educativo de liberdade.

Melhorar como pessoas consiste em desenvolver as virtudes: ser generoso, leal, trabalhador, sincero, tolerante, etc. Desta forma, para conseguir uma vida bem sucedida "devemos ter deixado a nossa marca, deixando a terra um pouco mais bonita e o mundo um pouco melhor" [G. CHEVROT, El Evangelio al aire libre, Herder, Barcelona 1961, p. 169]; ou seja, uma família mais pacífica e unida pela força dos "valores familiares", algo de progresso para a sociedade, amigos enriquecidos pela nossa amizade...

Finalmente, no que diz respeito à dimensão académica, todos compreendemos a importância de uma excelente preparação no conhecimento das ciências, da história, da filosofia, etc., com dois objectivos fundamentais: aprofundar o conhecimento do mundo e da natureza, que nos ajuda a conhecer a verdade; e adquirir a competência adequada para um bom desenvolvimento na futura profissão. São estes conhecimentos que permitirão aos nossos filhos e alunos devolver à sociedade uma parte daquilo que dela receberam.  

Um terceiro exemplo: Carlo Acutis. Este jovem, beatificado a 10 de outubro de 2020 em Assis, que a Igreja propõe como modelo de santidade para os jovens e adolescentes do nosso século, que encontram satisfação, não no efémero, mas nos valores perenes que Jesus sugere no Evangelho, é um exemplo atual que sintetiza as três dimensões da educação que temos vindo a abordar.

O Carlo era um rapaz normal, simples, simpático, jogava futebol, adorava a natureza e os animais e tinha muitos amigos. Também se sentia atraído pelas redes sociais e pelos computadores, uma ciência para a qual desenvolveu um talento especial, sendo considerado um génio pelos adultos que o conheciam.

Concebeu o sítio Web http://www.miracolieucaristici.org -uma exposição virtual que explica todos os milagres eucarísticos que aconteceram em todo o mundo e que vos recomendo que visitem. O Papa Francisco salientou que também utilizou os seus conhecimentos para transmitir o Evangelho e comunicar valores e beleza.

Também manteve viva a sua relação com Deus através do seu amor pela Eucaristia, que ele próprio definia como "a minha autoestrada para o Céu", e era muito devoto da Virgem Maria. "Ser originais e não fotocópias"era o seu lema. A sua fé e a sua oração levaram-no a confiar-se ao Senhor. Foi com este espírito que viveu com serenidade a doença que o levou à morte aos 15 anos de idade.

Conclusões

É essencial ter um "Projeto Educativo" para garantir que os nossos filhos e alunos cresçam e sejam educados de acordo com o modelo que escolhemos para eles, com vista a serem jovens e adultos que devolvam à sociedade parte do que dela receberam.

Para além do desenvolvimento físico e corporal, há três dimensões que enquadram cada "Projeto Educativo": a religiosa, a familiar-social e a académica, que estão em consonância com as repercussões internas e/ou externas de cada ato humano.

Para a eficácia do projeto educativo, é importante aproveitar os primeiros anos de vida de uma criança - desde antes do nascimento até ao início da adolescência - quando ocorre a grande maioria dos períodos sensíveis da educação de uma pessoa, quando tudo é assimilado da melhor forma e com o mínimo de esforço. 

Leitura recomendada: "Educar hoy". Autor: Fernando Corominas, Coleção: "Hacer familia".

O autorJulio Iñiguez Estremiana

Físico. Professor de Matemática, Física e Religião ao nível do Bacharelato.

Cultura

Nem todos os Papas descansam na Basílica de São Pedro

A decisão recentemente anunciada pelo Papa Francisco de querer o seu próprio túmulo dentro da Basílica de Santa Maria Maggiore não é original. Há vários papas cujos restos mortais repousam fora da basílica do Vaticano.

Antonino Piccione-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Numa entrevista recente ao canal de televisão mexicano N+, Francisco anunciou que estava a preparar o seu túmulo na Basílica de Santa Maria Maggiore.

Um anúncio surpreendente, mas nada de extraordinário: desde 1914, todos os Papas foram sepultados nas grutas do Vaticano (embora alguns deles - após a sua canonização - tenham sido posteriormente transferidos para a Basílica do Vaticano). Os últimos, por ordem cronológica: S. Pio X, S. João XXIII e S. João Paulo II.

Francisco e Santa María la Mayor

A razão desta escolha reside na ligação especial que Francisco tem com a Basílica de Santa Maria Maggiore, mesmo antes de ser Papa.

Foi também aí que Santo Inácio de Loyola, fundador dos jesuítas, a ordem religiosa de onde Bergoglio provém, celebrou a sua primeira missa no Natal de 1538.

Francisco foi à mesma igreja na manhã seguinte à noite do Conclave, a 14 de março de 2013, para dedicar o seu pontificado a Maria. Volta lá antes e depois de cada viagem ao estrangeiro, para rezar diante do ícone da Virgem "...".Salus populi romanoi", salvação do povo romano, e dirigiu-se a ela várias vezes, por exemplo durante a pandemia. 

No dia 8 de dezembro de 2023, como faz todos os anos, o Papa deslocou-se à basílica mariana, antes de prestar a tradicional homenagem à Imaculada Conceição na Escadaria de Espanha, colocando uma rosa de ouro diante do ícone da Virgem Maria. 

A decisão do Papa Francisco de ser sepultado na Basílica de Santa Maria Maggiore, embora invulgar, não deixa de constituir um precedente.

É preciso dizer que Bergoglio é, de facto, o primeiro pontífice em mais de 120 anos a escolher ser enterrado fora de São Pedro. O último foi Leão XIII, enterrado em São João de Latrão, a catedral do bispo de Roma, em 1903. 

Desde quando é que os Papas são enterrados em São Pedro? 

A tradição de enterrar os Papas na Basílica de São Pedro remonta ao século IV.

No entanto, ao longo dos séculos, alguns papas optaram por ser sepultados noutro local por diversas razões: escolhas pessoais ou por motivos religiosos, sentimentais ou políticos.

Nalgumas circunstâncias, porém, o enterro fora do Vaticano foi imposto por razões históricas ou políticas. Por exemplo, o Papa Gregório XII, que morreu em 1415, foi sepultado na catedral de São Flaviano em Recanati, a sua cidade natal.

Por outro lado, o Papa Pio IX, falecido em 1878, foi sepultado na Basílica de São Lourenço Fora dos Muros, em Roma, porque estava particularmente ligado a esse lugar. 

Papas no exterior da Basílica de São Pedro

Também fora de S. Pedro estão Pio IX (1878, S. Lourenço Fora dos Muros), Urbano V (1370, Abadia de S. Victor, Marselha), Clemente VII (1534, Santa Maria sopra Minerva, Roma), Damaso II (1048, S. Lourenço Fora dos Muros), Ilario (468, S. Lourenço Fora dos Muros), Sisto III (440, S. Lourenço Fora dos Muros), Zosimo (418, S. Lourenço Fora dos Muros). 

Nestes dois últimos séculos, é esta a situação dos enterramentos, por ordem cronológica: São Pio X, São João XXIII e São João Paulo II em São Pedro. Leão XIII (1878-1903), sepultado na Basílica de São João de Latrão, a mesma Basílica que alberga os restos mortais de 22 papas.

O antecessor de Leão XIII, o Beato Pio IX (1846-1878), também está sepultado fora do Vaticano: o seu túmulo encontra-se na Basílica de São Lourenço, fora das muralhas. 

A Basílica de S. Pedro (incluindo as Grutas Vaticanas) alberga os túmulos de cerca de noventa papas, enquanto na Basílica de S. Paulo Fora dos Muros (onde se podem admirar, na nave principal, os retratos que representam todos os papas que sucederam a S. Pedro), estão sepultados apenas dois papas: S. Félix III (483-492), que aí tinha um túmulo de família, e João XIII (965-972), que o pediu expressamente em testamento. 

Clemente XIV (1769-1774) está sepultado na Basílica dos Santos XII Apóstolos, enquanto Bento XIII (1724-1730) está sepultado na Basílica de Santa Maria sobra Minerva. 

 Na Basílica de Santa Maria Maggiore, o Papa Francisco encontrar-se-á com cinco dos seus antecessores: Pio V (1566-1572), Sisto V (1585-1590), Clemente XIII (1758-1769), Paulo V (1605-1621) e Clemente IX (1667-1669).

O autorAntonino Piccione

Cultura

Mary Keller, a freira que revolucionou a Informática

Mary Kenneth Keller foi a primeira mulher doutorada em informática nos Estados Unidos, um feito que alcançou enquanto vestia o hábito da sua congregação religiosa.

Paloma López Campos-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

Mary Kenneth Keller nasceu a 17 de dezembro de 1913 ou 1914 em Cleveland, EUA. No início da década de 1930, candidatou-se a uma vaga no Congregação das Irmãs da Caridade da Bem-Aventurada Virgem Maria, um instituto fundado por uma freira irlandesa apenas cem anos antes. Finalmente, em 1940, fez a sua profissão solene.

Sem pendurar os hábitos, a Irmã Mary Keller formou-se em matemática. Isto fez dela uma pioneira num mundo bastante fechado às mulheres e onde a presença de uma freira era uma surpresa. Não satisfeita com isso, prosseguiu os estudos para um mestrado em matemática e física que a prepararia para a sua próxima conquista académica.

Algumas fontes dizem que, em 1958, entrou para um laboratório onde só eram permitidos homens. Juntamente com os seus colegas, desenvolveu a linguagem de programação "BASIC", a base de algumas das linguagens utilizadas atualmente. No entanto, outras fontes consideram este facto falso. O que está provado é que esteve envolvido em alguns projectos no Dartmouth College.

Dra. Mary Kenneth Keller

Seja como for, em 1965, apresentou a sua tese "Inferência indutiva de padrões gerados por computador". Nessa altura, tornou-se a primeira doutorada em Ciências da Computação nos Estados Unidos. No mesmo dia, 7 de junho, Irving Tang também defendeu a sua tese de doutoramento, facto que foi ignorado durante anos, razão pela qual muitos ainda pensam que Keller foi a primeira pessoa a obter um doutoramento em Ciências da Computação nos Estados Unidos, sem mencionar o seu género.

Com a tese concluída, começou a trabalhar na Clark University, um centro fundado pela sua congregação. Aí abriu o departamento de informática e dirigiu-o durante vinte anos.

Ao longo da sua vida, Mary Kenneth Keller promoveu o acesso das mulheres aos computadores e afirmou que havia muito a descobrir sobre o potencial dos computadores. Ajudou a estabelecer parcerias para levar a informática para a área da educação e chegou mesmo a falar de uma inteligência artificial para o futuro. Depois de uma vida dedicada à universidade e à sua congregação, faleceu em 1985.

Evangelho

A promessa de Deus cumprida. Quarto Domingo do Advento (B)

Joseph Evans comenta as leituras do IV Domingo de Advento (B) e Luis Herrera faz uma breve homilia em vídeo.

Joseph Evans-21 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

Quase às portas do nascimento de Cristo, a Igreja faz-nos recuar nove meses até ao momento da Encarnação, aquele dia em Nazaré em que a Virgem Maria concebeu no seu seio o Deus feito homem. E na primeira leitura de hoje, a Igreja leva-nos ainda mais atrás, mais de novecentos anos antes deste acontecimento, ao momento em que Deus, através do profeta Natan, prometeu a David uma dinastia eterna da sua linhagem: "A tua casa e o teu reino permanecerão sempre firmes perante mim, o teu trono durará para sempre".

Essa promessa cumpriu-se quando Maria concebeu e, dentro de poucas horas, o filho da linhagem de David, o filho de Maria, Jesus Cristo, renascerá através da liturgia da Igreja. Como Deus disse a David: "Farei crescer a tua descendência depois de ti. Estabelecerei o seu reino para aquele que sair do teu ventre. Ele edificará uma casa ao meu nome e eu estabelecerei o trono da sua realeza para sempre.. Este é Jesus, o menino que vai nascer em Belém, a cidade de David. E este menino foi anunciado pelo anjo Gabriel, enviado por Deus a Maria: "O Senhor Deus dar-lhe-á o trono de seu pai David; ele reinará eternamente sobre a casa de Jacob, e o seu reino não terá fim".. A promessa de Deus a David, feita todos aqueles séculos antes, cumpre-se agora na conceção e no nascimento de Jesus.

É por isso que a Igreja nos encoraja hoje, com as suas leituras, a confiar em Deus, que cumpre sempre as suas promessas. Podem levar tempo a cumprir-se, mas cumprem-se. "em segredo durante séculos eternos".como diz São Paulo na segunda leitura, mas no final podemos cantar com o salmo de hoje: "Cantarei para sempre as misericórdias do Senhor, proclamarei a vossa fidelidade por todos os séculos. Porque disseste: 'A misericórdia é um edifício eterno', estabeleceste a tua fidelidade mais do que os céus"..

Para que esta promessa se cumprisse, a história teve de dar muitas voltas. A infidelidade repetida de Israel levou a grandes sofrimentos, ao colapso do reino e ao exílio e humilhação da nação. Mas enquanto Israel foi infiel, Deus foi fiel à sua palavra. Deus não nos salva por causa da nossa fidelidade. Pelo contrário, ele salva-nos da nossa infidelidade. Ao celebrarmos o Natal deste ano, com tanto sofrimento no nosso mundo em resultado do pecado humano, faríamos bem em recordar esta verdade.

Homilia sobre as leituras do IV Domingo do Advento (B)

O sacerdote Luis Herrera Campo oferece a sua nanomiliaUma breve reflexão de um minuto para estas leituras dominicais.

Recursos

Liturgia e bênção de casais do mesmo sexo

O autor, professor de Teologia Sacramental na Faculdade de Teologia da Universidade Pontifícia da Santa Cruz, reflecte sobre a recente Declaração sobre a Teologia Sacramental da Santa Cruz. Fiducia supplicans e aponta para a necessária exclusão das bênçãos não litúrgicas dos sacramentais, a fim de evitar confusões.

Rafael Díaz Dorronsoro-20 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 6 acta

O Dicastério para a Doutrina da Fé acaba de publicar a Declaração Fiducia supplicans "sobre o sentido pastoral das bênçãos", aprovado pelo Sumo Pontífice Francisco. O objetivo do documento é responder às questões "sobre a possibilidade de abençoar casais do mesmo sexo e sobre a possibilidade de oferecer novos esclarecimentos, à luz da atitude paternal e pastoral do Papa Francisco, sobre o Responsum ad dubium formulado pela então Congregação para a Doutrina da Fé e publicado em 22 de fevereiro de 2021" (Apresentação).

Neste Resposta afirma-se que não é lícito conceder uma bênção litúrgica a uniões que envolvam práticas sexuais fora do matrimónio, sublinhando ao mesmo tempo que "a presença em tais relações de elementos positivos, que em si mesmos devem ser apreciados e valorizados, não é, no entanto, capaz de os justificar e de os tornar objeto lícito de uma bênção eclesial, porque tais elementos estão ao serviço de uma união não ordenada segundo o plano de Deus".

Como Declaração, o documento reafirma a doutrina da fé católica ensinada pelo Magistério precedente. Por isso, afirma que "a presente Declaração mantém-se firme na doutrina tradicional da Igreja sobre o matrimónio, não permitindo qualquer tipo de rito litúrgico ou bênção semelhante a um rito litúrgico que possa causar confusão" (Apresentação).

Depois de apresentar brevemente o significado da bênção do sacramento do matrimónio (nn. 4-5), o documento reflecte sobre o significado das várias bênçãos, todas elas pertencentes ao género sacramental (nn. 9-13). O mais significativo é a distinção entre bênçãos litúrgicas ou rituais e bênçãos não litúrgicas ou não rituais.

A Apresentação sublinha que, ao identificar esta segunda espécie de bênção, o documento oferece "um contributo específico e inovador para o sentido pastoral das bênçãos, que permite alargar e enriquecer a compreensão clássica das bênçãos estreitamente ligada a uma perspetiva litúrgica. Tal reflexão teológica, baseada na visão pastoral do Papa Francisco, implica um verdadeiro desenvolvimento do que foi dito sobre as bênçãos no Magistério e nos textos oficiais da Igreja". 

Precisamente em conformidade com a natureza das bênçãos não litúrgicas, a Declaração autoriza que sejam dadas bênçãos por um sacerdote ordenado a casais em situação irregular e a casais do mesmo sexo em relações sexuais. Esta abertura não é considerada como contraditória com o ensinamento do magistério anterior, que não considerava tais bênçãos. E a Declaração reafirma que os ritos de bênção exigem "que o que é abençoado esteja em conformidade com a vontade de Deus, tal como se manifesta nos ensinamentos da Igreja" (n. 9). Uma vez que "a Igreja sempre considerou moralmente lícitas apenas as relações sexuais no seio do matrimónio, não tem o poder de conferir a sua bênção litúrgica quando esta possa de algum modo oferecer uma forma de legitimidade moral a uma união que se presume ser um casamento ou a uma prática sexual extraconjugal" (n. 11).

Bênçãos não litúrgicas

Qual é a natureza das bênçãos não-litúrgicas que podem ser dadas aos casais em situação irregular e aos casais do mesmo sexo? Depois de termos delineado a natureza das bênçãos na Sagrada Escritura (nn. 14-15), concluímos com uma compreensão teológico-pastoral geral que acolhe as bênçãos não rituais. Trata-se de bênçãos que as pessoas pedem espontaneamente ao sacerdote e que são valorizadas, do ponto de vista da pastoral popular, "como actos de devoção que "encontram o seu lugar próprio fora da celebração da Eucaristia e dos outros sacramentos [...]. A linguagem, o ritmo, o desenvolvimento e os acentos teológicos da piedade popular diferem dos das acções litúrgicas". Pela mesma razão, "é necessário evitar acrescentar modos próprios da celebração litúrgica aos exercícios de piedade, que devem conservar o seu estilo, a sua simplicidade e a sua linguagem caraterística" (Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Diretório sobre a piedade popular e a liturgia. Princípios e directrizesLibreria Editrice Vaticana, Cidade do Vaticano 2002, n. 13)" (n. 24).

Como em todas as bênçãos, também esta tem uma dimensão ascendente, porque "quando se toma consciência dos dons e do amor incondicional do Senhor, mesmo em situações de pecado, sobretudo quando se ouve uma oração, o coração crente eleva a Deus o seu louvor e a sua bênção" (n. 29).

E, juntamente com a dimensão ascendente, há a dimensão descendente, porque o seu pedido mostra que ele "tem necessidade da ação salvífica de Deus na sua história" e que reconhece a Igreja "como sacramento da salvação que Deus oferece" (n. 20). Quando "se pede uma bênção, está-se a exprimir um pedido de ajuda a Deus, uma súplica por uma vida melhor, uma confiança num Pai que nos pode ajudar a viver melhor" (n. 21, citando Francisco), As respostas do Santo Padre aos Dubia propostos por dois Cardeaisad dubium 2, e).

Para estas formas de bênção, continua a Declaração, nem sempre é necessário prever procedimentos ou ritos oficiais (cf. n. 30). A prudência e a sabedoria pastoral podem sugerir que, evitando formas graves de escândalo ou de confusão entre os fiéis, o ministro ordenado se associe à oração das pessoas que, embora se encontrem numa união que não pode de modo algum ser comparada com o matrimónio, desejam confiar-se ao Senhor e à sua misericórdia, invocar a sua ajuda, deixar-se guiar para uma maior compreensão do seu projeto de amor e de vida" (n. 30).

Podemos concluir que as bênçãos não rituais, segundo a Declaração, não são consideradas propriamente litúrgicas, mas uma oração pessoal dos fiéis à qual o sacerdote se une a pedido dos próprios fiéis para interceder como ministro ordenado da Igreja diante de Deus. Oração destinada a obter a graça de Deus para viver segundo a sua vontade, com a eficácia própria dos sacramentais (cf. n. 32).

Pedido de assistência, não de pé

Depois de delinear a natureza das bênçãos não litúrgicas, é abordada a possibilidade de casais em situação irregular e casais do mesmo sexo receberem uma bênção não ritual.

A resposta é afirmativa e, em continuidade com a exposição doutrinária apresentada, afirma-se que, "nestes casos, é dada uma bênção que não tem apenas valor ascendente, mas é também a invocação de uma bênção descendente do próprio Deus sobre aqueles que, reconhecendo-se desamparados e necessitados da sua ajuda, não reclamam legitimidade para si próprios estatutoPelo contrário, rezam para que tudo o que é verdadeiro, bom e humanamente válido nas suas vidas e relações possa ser investido, santificado e elevado pela presença do Espírito Santo. Estas formas de bênção exprimem uma súplica a Deus para que conceda as ajudas que provêm dos estímulos do seu Espírito - aquilo a que a teologia clássica chama "graças actuais" - para que as relações humanas amadureçam e cresçam na fidelidade à mensagem evangélica, sejam libertadas das suas imperfeições e fragilidades e se exprimam na dimensão cada vez maior do amor divino" (n. 31).

Ao mesmo tempo, insiste-se que a sua "forma não deve ser ritualmente fixada pelas autoridades eclesiásticas, para não causar confusão com a bênção própria do sacramento do matrimónio" (n. 31).

E especifica-se ainda que "para evitar qualquer forma de confusão ou escândalo, quando a oração de bênção é pedida por um casal em situação irregular, mesmo que seja conferida fora dos ritos previstos pelos livros litúrgicos, esta bênção nunca deve ser realizada ao mesmo tempo que os ritos civis da união, nem em ligação com eles. Nem mesmo com as vestes, os gestos ou as palavras próprias do matrimónio" (n. 39).

O sacerdote, chamado espontaneamente pelo casal para os abençoar, não pode pretender "sancionar ou legitimar nada" (n. 36). E na "breve oração que pode preceder esta bênção espontânea, o ministro ordenado poderia pedir-lhes a paz, a saúde, o espírito de paciência, o diálogo e a entreajuda, mas também a luz e a força de Deus para poderem cumprir plenamente a sua vontade" (n. 38).

Podemos concluir que, ao autorizar a bênção de casais em situação não conforme com os ensinamentos de Jesus Cristo e da Igreja, o Dicastério para a Doutrina da Fé não legitima a situação dessas pessoas, mas autoriza o sacerdote ordenado a juntar-se à oração desses fiéis para implorar a graça de Deus e viver segundo o projeto de Deus.

Reflexão sobre as bênçãos como sacramentais

Por último, poder-se-ia assinalar que a exposição teológico-pastoral da Declaração, ao considerar sacramentais as bênçãos litúrgicas e não litúrgicas (entendidas como sacramentais A Declaração não pretende substituir o ensinamento do Catecismo da Igreja Católica, entre os números 1667 e 1676), o que poderia levar a um tipo de confusão que a Declaração certamente deseja evitar: que a bênção não litúrgica seja entendida como uma legitimação da união irregular.

A Declaração sublinha que as bênçãos rituais são litúrgicas, enquanto as bênçãos não rituais são consideradas como actos de devoção que exprimem súplicas a Deus. Esta distinção leva à conclusão de que as bênçãos não rituais são objetivamente distintas da liturgia (cf. o texto da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Diretório sobre a piedade popular e a liturgia. Princípios e directrizes(Libreria Editrice Vaticana, Cidade do Vaticano 2002, citado no n.º 13 da Declaração), e para justificar a distinção específica entre os dois tipos de bênçãos.

No entanto, a doutrina da Igreja ensina que os sacramentais são celebrações litúrgicas. Esta doutrina é retomada pelo Catecismo da Igreja Católica ao tratar dos sacramentais no capítulo intitulado "Outras celebrações litúrgicas" do Mistério cristão, para além dos sacramentos.

Mas se aceitarmos que ambas as espécies de bênçãos são litúrgicas, isso enfraquece a razão para estabelecer a diferença específica entre elas, que parece resumir-se à forma de celebração: ritual ou não ritual. Parece, pois, difícil encontrar uma razão pela qual não se possa "acrescentar modos próprios da celebração litúrgica"às bênçãos não-litúrgicas. Isto permitiria concluir que a ritualização destas bênçãos não violaria a sua natureza própria e justificaria a concessão da bênção litúrgica às uniões irregulares. Deste modo, a bênção não litúrgica poderia ser entendida como uma forma de legitimar as uniões irregulares.

Para evitar este perigo, parece-me que as bênçãos não litúrgicas deveriam ser excluídas dos sacramentais. Isto permitiria sustentar que tais bênçãos não são verdadeiramente litúrgicas, como argumenta o documento, porque o sacerdote se associaria à oração do casal de uma forma pessoal e não ministerial. Esta medida contribuiria também para reduzir o perigo da sua ritualização.

O autorRafael Díaz Dorronsoro

Professor de Teologia Sacramental, Pontifícia Universidade da Santa Cruz (Roma)

Vaticano

Papa Francisco: Aprendamos com o presépio, que é "o Evangelho vivo".

Na Audiência de hoje, a última antes do Natal, o Papa convidou, a partir da Sala Paulo VI, a "preparar-se para receber o Menino Jesus com alegria e simplicidade de coração, através da oração, da participação nos sacramentos e das obras de caridade", e a aprender em família, desde o presépio, "uma escola de sobriedade e de alegria", "um Evangelho vivo, um Evangelho doméstico".

Francisco Otamendi-20 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 4 acta

"Passaram 800 anos desde o presépio vivo que São Francisco de Assis criou em Greccio, Itália. A sua intenção era representar a cena do nascimento de Jesus, revivendo assim, através dos sentidos, a simplicidade evangélica, a pobreza e a humildade da Sagrada Família na gruta de Belém. E foi aqui que nasceu o presépio vivo", começou o Público O Papa Francisco na Sala Paulo VI.

Nestes dias próximos das festividades natalícias, prosseguiu a sua meditação, "podemos correr o risco de negligenciar o essencial, atraídos pelas muitas ofertas do consumismo e do bem-estar mundano. Neste contexto, as personagens de Belém mostram-nos como celebrar verdadeiramente o Natal, com sobriedade e alegria evangélica".

O presépio e o verdadeiro Natal

"Contemplemos o presépio, na famíliaAjuda-nos a concentrarmo-nos no que é mais importante nas nossas vidas, a nossa relação com Deus, com os outros e com a criação. 

Cultivemos nos nossos ambientes um clima de harmonia, de alegria e de paz", encorajou o Santo Padre na véspera do Natal, na qual centrou a sua meditação no tema: "...o mundo é um lugar de harmonia, de alegria e de paz".O presépio de Greccioescola de sobriedade e de alegria" (Lc 2,10-12 ).

Francisco, sublinhou o Pontífice, referindo-se ao santo de Assis, não quer criar uma obra de arte preciosa, mas suscitar, através do presépio, "o espanto pela extrema humildade do Senhor, pelas privações que sofreu, por amor a nós, na pobre gruta de Belém". De facto, o biógrafo do Santo de Assis nota: "Nesta cena comovente, brilha a simplicidade evangélica, louva-se a pobreza, recomenda-se a humildade". Greccio tornou-se, por assim dizer, uma nova Belén".

Eis a primeira caraterística, sublinhou de novo o Papa. "O Natal tornou-se para muitos uma ocasião para dar presentes uns aos outros. O próprio Senhor advertiu-nos contra isto, dizendo que a tentação mais insidiosa para a fé é a 'dissipação do coração' (cf. Lc 21, 34), a azáfama do bem-estar mundano que anestesia a alma".

Voltar ao que interessa 

E o presépio nasce para "nos reconduzir ao que é verdadeiramente importante", acrescentou o Papa, "a Deus, que vem habitar entre nós, mas também às outras relações essenciais, como a família, presente em Jesus, José e Maria, e os entes queridos, representados pelos pastores".

Sobre este ponto, Francisco quis sublinhar: "As pessoas antes das coisas, as pessoas como elas são: notamos que as personagens do presépio são simples, pobres; e estão em harmonia com a criação: no presépio, a paisagem ocupa o maior espaço e nunca faltam o boi e o burro! É bom, então, estar diante do presépio para reordenar a vida, voltando ao essencial. É como entrar num oásis para se afastar da agitação do quotidiano, para encontrar a paz na oração e no silêncio, na ternura incontaminada.

"Estou a pensar nas crianças e nos jovens, que correm o risco de indigestão de imagens virtuais e violentas: no presépio podem redescobrir a genuinidade e a criatividade. Que bonito é que fiquem ali junto dos avós, fazendo o bem uns aos outros", exclamou nas suas palavras. 

O Presépio, um Evangelho doméstico

Mas o presépio de Greccio não fala apenas de sobriedade, mas também de alegria. Mas de onde vem essa extraordinária alegria natalícia, pergunta ele. "Não é certamente de ter trazido presentes para casa ou de ter vivido festas sumptuosas. Não, era a alegria que transborda do coração quando se toca com a própria mão a proximidade de Jesus, a ternura de Deus, que não deixa sozinho, mas consola". 

É esta a experiência do presépio, sublinhou. "Perceber a proximidade de Deus de uma forma concreta. Representa a realidade tal como ela é: há a vida quotidiana, com os pastores e outros ofícios; há o mal, representado pelo castelo de Herodes; há, enfim, a beleza e a miséria do mundo. Mas tudo é habitado pela Novidade: Deus está no meio de nós e abraça a nossa existência".

Para resumir a sua mensagem, o Papa disse que "o presépio é como um pequeno poço de onde se pode tirar a proximidade de Deus, uma fonte de esperança e de alegria. É como um Evangelho vivo, um Evangelho doméstico. Como o poço da Bíblia, é o lugar do encontro, onde levamos Jesus, como fizeram os pastores de Belén e as pessoas de Greccio, as expectativas e as preocupações da vida. Se, diante do presépio, confiarmos a Jesus tudo o que nos é querido, também nós experimentaremos uma "grande alegria", para citar S. Mateus no capítulo 2.

China, povos em guerra

Ao concluir, o Papa dirigiu o seu pensamento às vítimas e aos feridos causados "pelo devastador terramoto que atingiu a província chinesa de Gansu na passada segunda-feira. Estou próximo, com afeto e oração, das pessoas que estão a sofrer.

Pediu também para não esquecer "os povos que sofrem com o mal de a guerraAs guerras são sempre uma derrota, não o esqueçamos, só os fabricantes de armas ganham. O Santo Padre pediu que se concentrasse a atenção "na Palestina, em Israel, na atormentada Ucrânia, que tanto sofre. O embaixador está aqui. Pensemos nas crianças em guerra. Vamos ao presépio e peçamos a Jesus a paz. Ele é o Príncipe da paz.

Como de costume, saudou de forma especial os idosos, os doentes, os recém-casados e os jovens, antes de rezar o Pai-Nosso e dar a Bênção.

O autorFrancisco Otamendi

Bênçãos litúrgicas e orações de bênção

A moral não só ajuda a discernir o que é correto do que é errado, mas também a facilitar o caminho, por vezes tortuoso, para sair do erro e poder cumprir a vontade de Deus com um entusiasmo renovado.

20 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Em plena sintonia com a caridade pastoral encarnada pelo pontificado do Papa Francisco, o Dicastério para a Doutrina da Fé acaba de publicar uma declaração intitulada Fiducia Supplicans, aprovado pelo próprio Papa, que dá luz verde aos pastores para abençoarem casais que vivem em situações irregulares (uniões civis canónicas não casadas, uniões de facto, casais do mesmo sexo, divorciados e recasados, etc.). 

O documento confirma inequivocamente a doutrina tradicional do matrimónio canónico e deixa claro em todo o documento a doutrina moral da Igreja Católica que considera as relações sexuais fora da intimidade conjugal como contrárias à lei divina. 

O que a Declaração faz, no entanto, é alargar o conceito litúrgico-teológico de bênção. Para o efeito, distingue a bênção litúrgica, que actualiza, ao seu nível, o mistério pascal de Cristo, da bênção não litúrgica, que se poderia chamar "oração de bênção", que faz parte da oração cristã, como expressão do acolhimento e do acompanhamento de todos os homens pela Igreja, que implora a graça do Espírito Santo que, por Cristo, desce do Pai.

Com esta expansão do sentido das bênçãos (que, de resto, está presente no Catecismo, 2626), a Declaração olha para a Igreja como uma Mãe misericordiosa, que acolhe incondicionalmente os filhos que, de coração humilde, se dirigem a ela para obter ajuda espiritual.

Da mesma forma que uma mãe abraça sempre um filho, independentemente do seu comportamento, situação ou circunstância, também a Igreja Mãe acolhe, ama e reza, à imitação da Virgem Maria, por cada pessoa que se dirige ao "hospital de campanha" em busca de proteção. 

É missão da Igreja facilitar a infusão do Espírito Santo nas almas, dando uma resposta prudente, positiva e prática às crianças que se encontram em situações irregulares. Uma criança pode excluir-se a si própria, rejeitando o amor de Deus e da sua Igreja, mas a Igreja nunca abandona um filho seu, porque Deus nunca o faz.

É por isso que o Papa Francisco atribui um estatuto moral aos processos de acompanhamento.

Aqui reside, na minha opinião, o grande contributo do pontificado de Francisco para a teologia moral. A moral não só ajuda a discernir o que é correto do que é errado, mas também a facilitar o caminho, por vezes tortuoso, para sair do erro e poder cumprir a vontade de Deus com um entusiasmo renovado.

Muito em sintonia com o magistério do Papa Francisco, a Declaração procura evitar a pesada e inoportuna casuística, que decorre da elevação à categoria de norma universal de situações que, na realidade, são particulares (por mais generalizadas que sejam) e que, como tal, requerem um discernimento prático feito à medida. Uma coisa é a existência de eventos objetivamente pecaminoso (por exemplo, relações sexuais fora do casamento) e outra coisa é se existe situações objetivamente pecaminoso.

É certo que há situações que facilitam o pecado e a rejeição de Deus (por exemplo, a coabitação extraconjugal), mas isso não significa que qualquer pessoa nessa situação esteja necessariamente em pecado (por exemplo, aqueles que decidem viver como irmãos). Por isso, estas situações requerem um discernimento especial e um acompanhamento qualificado.

Uma abordagem fundamentalista da teologia moral, que apela a uma adesão rígida e irreflectida às normas e regras estabelecidas, impede uma pastoral adequada às pessoas nestas situações, deixando-as num beco sem saída.

Confusão e caridade

É verdade que a confusão doutrinal deve ser evitada, como esta declaração deixa claro, mas também é verdade que a possível confusão de alguns não deve levar a impedir os actos de caridade da Igreja Mãe para com os seus filhos mais necessitados.

A Declaração não deixa dúvidas sobre este ponto: "Precisamente para evitar qualquer forma de confusão ou escândalo, quando a oração de bênção for pedida por um casal em situação irregular, mesmo que seja conferida fora dos ritos previstos pelos livros litúrgicos, esta bênção nunca será efectuada ao mesmo tempo que os ritos civis da união, nem em ligação com eles. Nem mesmo com as vestes, os gestos ou as palavras próprias de um matrimónio. O mesmo se aplica quando a bênção é pedida por um casal do mesmo sexo". 

A Igreja, insiste a Declaração, é o "sacramento do amor infinito de Deus". É uma Igreja santa e maternal, cheia de pecadores, de pessoas que avançam por "pequenos passos". Em cada novo passo, resplandece a beleza do amor salvífico de Deus e a ternura da Igreja, que se sente mãe, muito mãe. Nisso reside o seu forte apelo evangelizador e o esplendor da sua mensagem.

O autorRafael Domingo Oslé

Professor e titular da Cátedra Álvaro d'Ors
ICS. Universidade de Navarra.

Cultura

A teologia tem de voltar a estar em sintonia com a Igreja

Dois teólogos da Universidade de Viena, um católico e outro protestante, defendem que viver o cristianismo fora da Igreja se revelou uma ilusão. Concluem também que acabou o tempo em que a teologia universitária se dedicava a criticar o Papa e o Magistério.

José M. García Pelegrín-20 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 4 acta

Tradicionalmente, os estudos de teologia na Alemanha são efectuados em universidades estatais, embora haja excepções, como os colégios de filosofia e teologia de várias ordens - o mais conhecido é o colégio dos jesuítas em Sankt Georgen, perto de Frankfurt - e alguns colégios episcopais.

A mais recente é a Escola de Teologia Católica de Colónia (KHKT), sucessora da Faculdade de Teologia da Sociedade do Verbo Divino. Estas são reconhecidas pelo Estado.

Durante os seus estudos, os futuros padres podem viver em comunidade ("Konvikt"), mas só permanecem no seminário depois de terminarem os seus estudos.

Este sistema tem a vantagem de permitir que a teologia se relacione com outras disciplinas ensinadas e investigadas na universidade. No entanto, tem também o seu lado negativo devido à tensão entre a liberdade de investigação e de cátedra, por um lado, e a submissão à doutrina da fé, por outro.

A nomeação de professores de teologia nas universidades estatais requer a aprovação da Igreja, como estipulado nas concordatas. Em termos concretos, isto significa que o Ministério da Ciência de um Estado federal consulta o respetivo bispo diocesano se tiver alguma reserva sobre o ensino ou o estilo de vida de um determinado candidato ou se não houver nada que impeça a sua nomeação ("nihil obstat").

De acordo com as orientações da Congregação para a Educação Católica do Vaticano (agora "Dicastério para a Cultura e a Educação") de 25 de março de 2010, o bispo diocesano deve, em primeiro lugar, solicitar o "Roman nihil obstat": apresentar um pedido ao referido dicastério, que o examina num procedimento "interdicasterial", com a participação de outros dicastérios do Vaticano, em particular o da Doutrina da Fé.

Nas últimas décadas, porém, nas faculdades de teologia, a "liberdade de investigação" parece prevalecer sobre a obediência ou a lealdade ao Magistério. Isto tem consequências concretas, por exemplo, no "Caminho Sinodal" alemão.

Um dos seus principais representantes, Thomas Söding, vice-presidente do Comité Central dos Católicos Alemães (ZdK) e do próprio Caminho Sinodal, é professor de exegese do Novo Testamento na Universidade de Bochum.

Na última reunião da ZdK ficou claro como funciona esta "exegese": a propósito de uma carta enviada a 16 de janeiro de 2023 pelo Cardeal Secretário de Estado e pelos Cardeais Prefeitos dos Dicastérios para a Doutrina da Fé e para os Bispos, com a aprovação expressa do Papa Francisco, afirmava-se: "Nem a Via Sinodal, nem um organismo por ela nomeado, nem uma conferência episcopal têm competência para constituir um Conselho Sinodal a nível nacional, diocesano ou paroquial".

Em vez de se refletir sobre o seu conteúdo claro e tirar as devidas conclusões, interpretam-se as supostas razões pelas quais o Papa ou os cardeais da Cúria poderiam ter emitido tal proibição. Thomas Söding, literalmente: "Nesta carta, na minha opinião, a objeção expressa por Roma foi formulada muito claramente no sentido de que não deveria haver nem um Conselho Sinodal a nível federal, que é, por assim dizer, uma autoridade superior à Conferência Episcopal, nem que o bispo - para usar as minhas próprias palavras - deveria ser uma espécie de gestor de um Conselho Sinodal. O Comité Sinodal não tem precisamente por objetivo relativizar e retirar poder ao bispo".

Num ensaio publicado no site oficial da Conferência Episcopal Alemã "katholisch.de", Ulrich Körtner, professor de Teologia Sistemática (Teologia Reformada) na Faculdade de Teologia Protestante, e Jan-Heiner Tück, professor de Dogmática e História do Dogma na Faculdade de Teologia Católica, ambos da Universidade de Viena, discutem a situação atual das faculdades de Teologia.

Segundo os autores, "há muito tempo que existe uma certa tendência para 'aprofundar' a teologia no sentido de uma investigação religiosa interdisciplinar, que se afasta cada vez mais das igrejas e prefere ocupar-se da religião 'vivida' ou 'invisível'".

Em vez de criticar a hierarquia - "os dias em que a teologia académica era sobretudo uma crítica do Papa e da Igreja também já acabaram, uma vez que as poucas pessoas que hoje se interessam pela teologia eclesiástica vão cada vez mais para centros de formação eclesiásticos ou evangélicos para estudar" -, defendem que a teologia atual "está a revelar-se uma forma medíocre de sociologia religiosa".

Num processo de secularização e também de "individualização da religião", dizem os autores, surge uma ideia generalizada da existência de uma "religião invisível", que descrevem como um "mito baseado na ideia errónea de que todas as respostas às questões de sentido são religiosas".

Por um lado, a ideia de que é possível viver o cristianismo fora da Igreja revelou-se "em grande parte uma ilusão", porque "sem uma ligação à Igreja, as crenças e as práticas evaporam-se".

Por outro lado, mesmo na Igreja e na teologia "há o perigo de a fé cristã se evaporar num cristianismo sem Cristo", porque em vez de se falar do Deus da revelação, o foco está muitas vezes na questão da migração e da proteção do clima.

Neste caso, "Deus é sobretudo uma vaga 'cifra' que serve para elevar o moral, mas que também pode ser dispensada, se necessário, na formação de alianças com outros sectores da sociedade civil".

A solução, segundo estes autores, é "uma teologia académica que pensa a partir da Igreja e para a Igreja, mas que não se limita aos âmbitos eclesiásticos internos, mas procura o intercâmbio académico com outras disciplinas académicas. No entanto, em vez de aceitar acriticamente as teorias da sociologia e da filosofia e usar o vocabulário da moda para se dar um verniz mais interessante, é necessário reapropriar-se hermeneuticamente dos fundamentos da fé e incorporá-los no diálogo".

Körtner e Tück concluem: embora "seja necessário prestar mais atenção ao tema da Igreja em todas as disciplinas teológicas, isso não deve ser confundido com uma clericalização da teologia académica". Esta conclusão está mais de acordo com as conclusões da sociologia da religião, segundo as quais a religiosidade e a filiação na Igreja estão muito mais próximas do que se pensava.

Por isso, "uma teologia contemporânea deve ser entendida como um encorajamento para se empenhar publicamente e testemunhar em palavras e acções o evangelho do amor de Deus, que encontrou uma forma concisa na pessoa e na história de Jesus".

Evangelização

O servo de Deus Isaac Hecker a caminho dos altares

Isaac Hecker foi padre, editor e pregador missionário. O seu trabalho ajudou a difundir a fé católica nos Estados Unidos e está agora a caminho dos altares.

Jennifer Elizabeth Terranova-20 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 5 acta

Na recente assembleia da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos, que teve lugar em BaltimoreOs bispos votaram a favor da causa de canonização de um nova-iorquino, Isaac Hecker, outrora conhecido como "Ernest the Seeker".

O Padre Hecker nasceu em Nova Iorque em 1819, filho de pais alemães pobres. A sua mãe era uma metodista devota, e isso influenciou Isaac. Com a tenra idade de três anos, o jovem Isaac contraiu varíola e a morte parecia iminente. A família reuniu-se à sua volta e disse-lhe que ele não sobreviveria e que em breve iria para junto de Deus. Isaac tinha outros planos e respondeu: "Não, não vou morrer agora; Deus tem uma grande obra para mim, e eu viverei para realizá-la.

A infância de Isaac não foi fácil e sofreu uma interrupção inesperada quando o pai abandonou a família quando ele tinha cerca de quatro ou cinco anos. Com dificuldades económicas, os seus dois irmãos mais velhos abandonaram a escola e abriram uma padaria, que viria a ter muito sucesso. Isaac trabalhava para os seus irmãos, mas nunca se contentou com o ofício, porque a sua alma ansiava por compreender o que Deus queria dele.

Aos vinte anos de idade, Isaac Hecker teve o que é descrito como uma "experiência mística". Escreveu: "Vi um belo ser angélico e eu próprio ao seu lado, sentindo a mais pura alegria celestial. Foi apenas um sonho; ainda não tenho o poder de falar sobre isso. Descansa em mim subdesenvolvido". Começava assim o seu profundo caminho religioso, mas ainda não podia dar-lhe um nome. Depois da sua "visão", deixa de comer e fica demasiado distraído para trabalhar. Escreve no seu diário: "Esta visão paira sobre mim, e a sua beleza impede-me de aceitar qualquer outra coisa.

Os seus irmãos, preocupados, contactaram Orestes Bronson, um ministro e escritor que viria a influenciar positivamente a vida de Isaac. Ele também foi contemporâneo de Emerson e de outros homens com ideias semelhantes, e colocava questões como Isaac, tais como: "Será que o mundo é mais do que parece? Haverá um lado mais profundo da vida? Haverá algo por que passamos que nos abre os olhos para as questões últimas da vida?" Bronson e Emerson eram na altura os intelectuais mais famosos do país.

Ernest O Buscador

Orestes Bronson actua como a figura paternal de Isaac Hecker. Convida-o a ir para Brook Farm, uma comunidade transcendentalista onde teria a oportunidade de estar entre os homens da época que tinham uma nova visão para a América. Estes homens eram ministros, filósofos e escritores, como Henry David Thoreau e Emerson, que lideravam este movimento. Isaac foi exposto às suas ideias, filosofias e sabedoria. Gostava deles pela sua "sinceridade e curiosidade", o que lhe valeu a alcunha de "Ernest, o Buscador". Escreveu:

"Fui passear na floresta, e a paisagem era linda; os pinheiros verdes e o musgo de vários matizes, e as nuvens com o sol a romper por entre elas; o silêncio e o mistério sombrio da floresta produziam um encanto tão grande para mim".

Os místicos

Ainda à procura de algo mais profundo, Isaac passou algum tempo em Fruitlands, outra comuna do Clube dos Transcendentalistas, cuja biblioteca estava repleta de místicos católicos, como Catarina de Sena, Teresa de Ávila e Catarina de Génova, mas que Isaac considerou insatisfatória. Escreveu: "Sem a religião como base, guiada pelo Espírito Santo, parece-me que não há esperança para estes movimentos comunitários". Isaac acreditava que havia algo mais e deixou Fruitlands e, em 1844, voltou para a cidade de Nova Iorque.

Quando regressou, podia mergulhar no negócio da família, que se tornou bastante bem sucedido, ou seguir o caminho para o qual estava destinado, mas que ainda era desconhecido e indescritível para ele. "O facto é que não posso fazer nada enquanto houver uma presença tão profunda, não sei como lhe chamar, tão profunda dentro de mim", escreveu Isaac.

Isaack Hecker continua a procurar um sentido, encontra-se com líderes de muitos grupos religiosos da época e "apaixona-se pelo catolicismo". Na altura, a Igreja Católica Romana era "a igreja mais desprezada da América e a menos respeitável, mas tão rica e cheia", diz Isaac Hecker. Assistiu a várias missas católicas e disse: "Não sei se esta Igreja é ou não é aquilo a que certos homens lhe chamam, mas sei que tem a vida de que o meu coração tem sede e de que o meu espírito tem grande necessidade." A 4 de agosto de 1844, Isaac Hecker foi batizado na antiga Basílica de S. Patrício, em Manhattan.

Pouco depois do batismo, Isaac Hecker foi ordenado sacerdote e entrou para a Comunidade Redentorista. Aprecia o trabalho missionário a que se dedica e considera-o "uma grande fonte de consolação". Chegou a pregar a não-católicos numa época em que o sentimento anti-católico era muito difundido na América e em que as pessoas se perguntavam se era possível ser católico e americano ao mesmo tempo. Mesmo assim, Isaac Hecker era otimista e acreditava que "as perspectivas da nossa santa fé nunca foram tão encorajadoras na América como neste momento; o povo americano é capaz de grande entusiasmo; produzirá os efeitos dignos da nossa fé e da nossa mãe espiritual, a Igreja Católica".

Escreveria o seu primeiro livro, "Questões da Alma", e outros; no entanto, o que se seguiu foi um período de escuridão para ele, pois enfrentou desafios quando o seu novo superior geral discordou das suas abordagens e ideias. Mas, determinado e guiado pelo Espírito Santo, foi a Roma e defendeu a sua causa. Numa entrevista, o Cardeal Edward Egan (abril de 1932-5 de março de 2005), antigo Cardeal da Arquidiocese de Nova Iorque, disse: "Hecker tinha razão... precisávamos de levar o Evangelho à América à maneira americana".

Homenagem a São Paulo Apóstolo

A 6 de março de 1858, os padres redentoristas formaram outra comunidade religiosa, a primeira comunidade religiosa masculina fundada nos Estados Unidos, a Sociedade Missionária de S. Paulo Apóstolo, conhecida por muitos como Padres Paulistas. Isaac Hecker deu-lhe o nome de São Paulo Apóstolo, que foi "o maior responsável pela difusão inicial do cristianismo". "Os Padres Paulistas queriam difundir a mensagem do catolicismo no novo mundo", como São Paulo tinha feito no mundo antigo.

"A nossa vocação é acolher as almas na fé católica, difundir a fé através de conferências, missões, palestras, sermões, a pena e a imprensa", dizem os Padres Paulistas sobre o seu trabalho.

O padre do vapor

Isaac Hecker entrou numa era alegre e produtiva. Criou a primeira editora católica nos Estados Unidos, chamada Paulist Press. Dava palestras para leigos e encorajava-os a rezar: "A oração está para a vida da alma como a respiração está para a vida do corpo. Rezem quando se levantam e se vestem, rezem quando vão para o trabalho...". Foi-lhe dado o nome de "o sacerdote do vapor". Muitos académicos salientam que ele "falava americano, conhecia o povo americano e fez o seu melhor para levar a Igreja Católica a esse ambiente". Quando o antigo arcebispo de Nova Iorque, John Hughes, criou uma nova paróquia a oeste do Central Park, recentemente urbanizado, atribuiu-a à nova comunidade religiosa. "Isaac acreditava que a América tinha uma missão salvífica no mundo, especialmente para a Igreja Católica", escreve o autor e teólogo William Portier.

Isaac Hecker, sacerdote, editor, pregador missionário e editor, morreu a 22 de dezembro de 1888 na reitoria da igreja de S. Paulo Apóstolo em Manhattan, rodeado pelos seus irmãos paulistas. A causa de beatificação e canonização do Padre Hecker foi formalmente aberta em 2008, quando recebeu o título de "Servo de Deus".

Espanha

Aumento do número de baptismos e casamentos canónicos em Espanha em 2022

A Conferência Episcopal Espanhola apresentou hoje o Relatório sobre as actividades da Igreja que, tal como tem vindo a fazer nos últimos 10 anos, compila dados sobre a variada presença da Igreja na sociedade.

Maria José Atienza-19 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 5 acta

Ester Martin, directora do Gabinete de Transparência da Conferência Episcopal Espanhola, e o Secretário-Geral dos Bispos, Francisco Cesar García Magán, apresentaram os dados relativos a 2022. Em termos gerais, os dados são muito semelhantes, embora ligeiramente inferiores em quase todos os aspectos aos do ano passado.

Embora, em geral, esta apresentação fosse feita por volta do mês de junho, coincidindo também com a "campanha do imposto sobre o rendimento", os bispos decidiram antecipar esta apresentação para dezembro a partir de agora, a fim de dar a conhecer os dados do ano anterior e não de dois anos civis anteriores. "Vamos sempre apresentar o Relatório Anual do ano anterior no final do ano civil", disse o porta-voz dos bispos, Cesar García Magán.

"O mais importante são as pessoas e as realidades eclesiais que estão por detrás, não nos podemos limitar aos números", sublinhou o Secretário-Geral da Conferência Episcopal Espanhola, que reiterou que "estamos orgulhosos da nossa Fé, dos nossos sacerdotes e seminaristas".

Por sua vez, Ester Martín sublinhou que a antecipação da data é um grande esforço, mas é uma forma de ajudar a sociedade, que exige esta transparência, e é fruto da implementação dos sistemas de trabalho e de prestação de contas nas dioceses espanholas. Martín defendeu o compromisso da Igreja com a transparência e afirmou que "a Igreja em Espanha é pioneira".

O Relatório está estruturado em cinco blocos, nos quais se diferenciam os dados gerais da Igreja: número de sacerdotes, vida consagrada, missionários, etc.; e os três domínios em que tradicionalmente "divide" a sua tarefa: o anúncio da fé, a celebração da fé e a "vivência da fé". Também se discriminam os dados relativos ao processo e à distribuição da dotação fiscal e da economia diocesana.

Menos assistência à missa mas aumento dos baptismos e dos casamentos canónicos

De acordo com os dados do relatório, mais de 8 048 484 pessoas assistem regularmente à missa.

Mais de 9,5 milhões de missas são celebradas em Espanha todos os anos. O trabalho pastoral dos sacerdotes totaliza mais de 27.430.000 horas.

O ano de 2022 marcou, surpreendentemente, uma quebra na tendência decrescente da receção dos sacramentos. Em 2022, registou-se um aumento notável do número de baptismos (159 129 em 2022 (149 711 em 2021) e de crismas (104 600).

No entanto, um dos aumentos mais encorajadores foi o dos casamentos canónicos, que passou de 25.762 em 2021 para 35.253 em 2022. No entanto, o número de primeiras comunhões diminuiu e o número de unções dos doentes aumentou ligeiramente.

"A pandemia tem sido um tempo de procura de sentido e de regresso às paróquias", disse Ester Martín, referindo-se a este aumento.

Declínio geral, exceto para os diáconos permanentes

Um dos aspectos que emana deste relatório é o ligeiro decréscimo do número de sacerdotes (15 669), seminaristas (974), religiosos e religiosas (32 967), catequistas (83 435), professores de religião (35 799), missionários (10 147) e monjas e monges de clausura (7 906).

A única coisa que está a aumentar é o número de diáconos permanentes, que passará de 539 em 2021 para 572 em 2022. Este ministério está cada vez mais difundido em Espanha e constitui uma fonte de oxigénio em lugares com escassez de sacerdotes.

O número de associações e movimentos laicais nacionais e o número de associados laicos territoriais também diminuíram, embora muito ligeiramente, para 80 e 407 563, respetivamente.

Mais alunos de origem imigrante nas escolas subsidiadas

Uma das secções mais importantes deste relatório, pelo seu alcance e importância na sociedade espanhola, refere-se à presença da Igreja no âmbito educativo, especialmente nas escolas. Os 1.502.868 alunos que frequentam uma das 2.536 escolas católicas em Espanha, a grande maioria das quais são subsidiadas.

Neste domínio, registou-se um aumento significativo do número de alunos de origem imigrante a frequentar uma destas escolas charter, passando de 76.283 em 2021 para 82.199. De facto, como refere o relatório, 5% dos alunos imigrantes estão matriculados em escolas subvencionadas.

As escolas católicas continuam a permitir que o Estado espanhol poupe uma quantia considerável de dinheiro: em 2022, essas poupanças ascenderam a 4.213 milhões de euros.

O aumento evidente da idade reflecte-se numa diminuição do número de estudantes nas escolas e num aumento do número de estudantes nas universidades católicas e pontifícias.

Se há algo que caracteriza a Igreja em Espanha, é o seu vasto património cultural. Esta memória recorda que "toda a atividade gerada pela presença do património cultural da Igreja no nosso país tem um impacto total no PIB espanhol de 22.620 milhões de euros e contribui para mais de 225.000 empregos directos, indirectos e induzidos".

A conservação do património cultural é um dos elementos mais importantes das economias diocesanas, devido também à geração de emprego, à riqueza turística e ao impulso económico que estes templos representam para as zonas em que se situam.

Em 2022, as dioceses gastaram 47.244.310,75 euros em meio milhar de projectos de construção, conservação e reabilitação.

A caridade, o ponto forte

O trabalho social e assistencial levado a cabo pelas dioceses, paróquias e instituições como a Caritas é uma das chaves da presença da Igreja hoje. Um total de 3.778.740 pessoas foram acompanhadas e cuidadas num dos 8.796 centros de assistência social da Igreja.

Embora o número de centros de combate à pobreza tenha diminuído, o número total de pessoas atendidas praticamente não se alterou; em 2021, eram 2 277 434 pessoas, enquanto em 2022 eram 2 066 694. Uma tendência semelhante é observada nos centros de assistência a migrantes, refugiados e fugitivos, que atenderam 90 214 pessoas, um número ligeiramente inferior ao de 2021, e nos centros de defesa da vida e da família, onde foram atendidas 74 631 pessoas

Por outro lado, os centros de promoção do trabalho (386) estão a aumentar e, este ano de 2022, atenderam 155 906 pessoas, quase mais 25 000 do que em 2021. Também se regista um aumento do número de

Os centros para menores e jovens e outros centros de tutela de crianças, que este ano aumentaram para 381, com um total de 55 451 beneficiários, e os centros de promoção da mulher e das vítimas de violência, onde foram assistidas 31 514 mulheres.

A Cáritas, o rosto visível da caridade no nosso país, também registou um aumento do número de pessoas que a ela recorreram para obter diversas formas de assistência: 2.830.156 beneficiários totais e um aumento substancial dos recursos investidos a favor dos mais vulneráveis, no montante de 457.230.391 euros.

Um aumento semelhante foi registado por Manos Unidas que, apesar da diminuição do número de projectos, 488, chegou a mais países com um montante de 34 782 534 euros, graças à solidariedade do povo espanhol.

O bloco económico: a repartição dos impostos e a economia diocesana

No capítulo sobre a destinação do imposto, o relatório lista o total de 358.793.580 euros que os contribuintes destinaram à Igreja Católica, aumentando o valor em mais de 38 milhões de euros. O total a ser distribuído entre as dioceses foi de 320.892.666 euros, uma vez que o pagamento por conta de 2022 e a liquidação da declaração de imposto apresentada em 2021 (IRPF 2020) foram feitos.

O número total de declarações a favor da Igreja aumentou em 16 das 17 comunidades autónomas (especialmente na Andaluzia, Madrid, Castela-La Mancha e Valência) e 209 218 pessoas assinalaram pela primeira vez a caixa "X" a favor da Igreja Católica na sua declaração de impostos de 2022.

As finanças diocesanas ocupam a penúltima secção deste relatório, que se centra, uma vez mais, nos critérios de distribuição do dinheiro proveniente da dotação fiscal que é incluída no orçamento diocesano para o financiamento de todas as actividades pastorais, assistenciais e de manutenção ordinária. De um modo geral, esta verba é a segunda fonte de financiamento mais importante para as dioceses, depois das contribuições dos fiéis, embora este ponto seja diferente em algumas dioceses mais pobres em termos de património ou com poucos fiéis.

Ester Martin quis sublinhar que, com esta contribuição financeira, a Igreja está a realizar "um trabalho mais transparente e mais eficiente". Ester Martin afirmou que o trabalho da Igreja "é mais transparente e mais eficaz". Sem a presença da Igreja, "mais de 4 milhões de pessoas não teriam podido obter ajuda".
Em relação ao declínio da assistência à missa e ao aumento das declarações a favor da Igreja, o porta-voz dos bispos espanhóis sublinhou que "vemos que o número de pessoas que marcam o "x" é muito superior ao número de pessoas que vão à missa".

América Latina

Dr. Cofiño mais perto da beatificação

O Papa Francisco declarou venerável o médico guatemalteco Ernesto Cofiño, que morreu com fama de santo em 1991.

José Carlos Martín de la Hoz-19 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

Na manhã do dia 14 de dezembro de 2023, a imprensa noticiou a notícia, há muito esperada pelos devotos de todo o mundo, de que o Santo Padre Francisco tinha autorizado o Dicastério para as Causas dos Santos a publicar o Decreto das Virtudes Heróicas que nomeia Ernesto Cofiño Ubeco "Venerável Servo de Deus".

Na prática, isto significa que a Igreja, depois de ouvir a voz do povo de Deus através de documentos, testemunhos, cartas, favores e graças, determinou que Ernesto viveu todas as virtudes cristãs em grau heroico. Termina assim a segunda fase do processo de canonização iniciado em 2002, quando o dicastério concedeu o decreto de validade do processo diocesano do médico guatemalteco Ernesto Cofiño (1889-1991), que morreu com fama de santidade.

Durante estes mais de vinte anos da fase romana, a Igreja, através do Postulador da Causa e do relator do Dicastério, estudou seriamente a vida heróica do Dr. Cofiño e os abundantes favores e graças atribuídos à sua intercessão que foram chegando à postulação dos quatro cantos do mundo e, finalmente, os consultores teológicos e históricos, bispos e cardeais confirmaram o decreto do Venerável.

Com este passo jurídico e teológico, começa a terceira fase do processo: a escuta atenta da voz de Deus, a prova de um milagre concedido por Deus por intercessão deste Venerável. Com um primeiro milagre, ou seja, um acontecimento sobrenatural por intercessão do santo e a prova da sua origem cientificamente inexplicável, a beatificação seria o início do culto público restrito a uma parte do povo de Deus.

A demonstração de um milagre posterior, com o correspondente aparato científico, teológico e jurídico, abriria o caminho para a canonização e, com ela, o início do culto público universal.

Assim, é mais fácil compreender as declarações do postulador romano, Santiago Callejo, que encorajou os fiéis cristãos a pedir a Deus graças materiais e espirituais através do Dr. Cofiño e a registar por escrito os favores obtidos, pois é justo que se registem esses factos.

Como o biógrafo do Dr. Cofiño (José Carlos Martín de la Hoz, "Cumplicidade divina e humana. Uma imagem do Dr. Cofiño"Gostaria de sublinhar que Ernesto é literalmente um "santo do lado" e "um santo do nosso tempo", pois lutou incansavelmente pela defesa de todas as vidas humanas, dos nascituros e, como pediatra, de todos os que nascem.

Na sombra, permanece a figura inesquecível de Clemencia Somoyoa, a esposa que partilhou com Ernesto aquele lar luminoso e alegre e em cujo amor conjugal ambos alcançaram a graça do céu. Embora ainda não tenha sido aberto um processo de beatificação para ela, já são muitas as vozes que o pedem.

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Estados Unidos da América

Igreja em movimento: Dioceses na fronteira EUA-México

Neste primeiro artigo da série "Igreja em movimento", entramos na diocese de San Diego, na fronteira entre os Estados Unidos e o México. Esta série de artigos apresentará a diversidade da Igreja nos EUA, as suas realizações, esperanças e trabalho pastoral.

Gonzalo Meza-19 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 6 acta

A Igreja nos Estados Unidos (EUA) é a quarta maior do mundo (70 milhões de católicos) e uma das mais diversificadas. O vasto território tem 196 jurisdições eclesiásticas que abrangem os 50 estados e os territórios extra-continentais. Neste país, a palavra de Deus é proclamada e os sacramentos são administrados desde o século XVI. A vastidão do território inclui diferenças geográficas, sociais e demográficas abismais. Há dioceses aninhadas no deserto com um calor extremo que pode atingir os 50 graus, como a diocese de Phoenix (deserto do Arizona); outras onde a maior parte do ano se vive debaixo do gelo com temperaturas negativas, como a diocese de Fairbanks no Alasca; outras ainda que são paraísos tropicais, como a diocese de Honolulu no Havai. Como é que a palavra de Deus é proclamada e os sacramentos são administrados nestes lugares? Como é que o trabalho pastoral é organizado em função das circunstâncias geográficas, sociais e demográficas? Quais são os problemas mais prementes, dada a vastidão do território?

Esta série de artigos, que inicia Omnes USA, apresentará a diversidade da Igreja nos EUA, as suas realizações, esperanças e trabalho pastoral na perspetiva da unidade fundamental da Igreja: as suas paróquias. Elas são um microcosmo da realidade diocesana e pastoral. Viajaremos a várias partes do país, chegando às suas periferias geográficas e existenciais. Estes artigos apresentarão os seus desafios, os seus êxitos e as suas múltiplas histórias que, embora possam não aparecer nas primeiras páginas dos tablóides, transformaram a vida de milhões de americanos.

O objetivo é apresentar, através das suas dioceses, paróquias e actividades pastorais, algumas das particularidades que distinguem cada jurisdição. Desta forma, visitaremos algumas das dioceses de missão nos EUA (que não têm fundos próprios suficientes para sobreviver e dependem de recursos externos) que se situam nos Apalaches, nas Montanhas Rochosas ou na fronteira sul e noroeste do país. Apresentaremos também o apaixonante trabalho pastoral nas reservas dos índios americanos. Iremos às periferias geográficas e existenciais deste país. Começamos esta série por uma delas: a fronteira entre o México e os Estados Unidos.

A fronteira sul dos EUA

A fronteira entre os Estados Unidos e o México é um dos espaços transnacionais mais dinâmicos e diversificados do mundo. Tem 3.141 km de comprimento. Estende-se desde o Oceano Pacífico até ao Golfo do México. De ambos os lados da fronteira, 19 milhões de americanos vivem em quatro estados dos EUA, bem como 11 milhões de mexicanos em seis estados dos EUA. Existem 48 pontos de passagem de fronteira entre o México e os EUA. O mais movimentado é o de "San Ysidro", em San Diego, Califórnia. É o ponto de passagem terrestre mais movimentado do hemisfério ocidental e um dos mais movimentados do mundo. 

Estes portos são as veias que alimentam o sistema económico de ambos os países. O México é o terceiro maior parceiro económico dos Estados Unidos, com um comércio anual de cerca de 614 mil milhões de dólares. O México, os Estados Unidos e o Canadá fazem parte de um acordo comercial (inicialmente denominado NAFTA, depois T-MEC) desde 1994. Esta zona é a segunda maior região comercial do mundo, a seguir à União Europeia. O dinamismo transfronteiriço tem um lado negro: a migração não documentada. Embora a maioria das travessias terrestres diárias seja efectuada com documentos, centenas de pessoas tentam entrar nos EUA sem as autorizações necessárias. 

Diocese de Fronteira: San Diego 

Situado no sudoeste dos Estados Unidos, o Diocese de San DiegoA Diocese de Los Angeles, no estado da Califórnia, faz fronteira com a Diocese de Tijuana a sul. Antes da sua criação como jurisdição própria, pertencia à Diocese de Los Angeles. 

A presença católica na região remonta ao século XVIII com as missões franciscanas. Os primeiros frades, liderados por São Junípero Serra, estabeleceram a Missão San Diego de Alcalá em 1769 e, mais tarde, a Missão San Luis Rey de Francia em 1798. Atualmente, a diocese cobre 22.926 quilómetros quadrados. É presidida pelo Cardeal Robert W. McElroy, que foi nomeado bispo de San Diego em 15 de abril de 2015 e cardeal em maio de 2022. A diocese tem cerca de 1.392.000 católicos, 97 paróquias e várias missões. Há um total de 154 sacerdotes sacerdotes diocesanos, 88 sacerdotes religiosos e 181 religiosas. Como a maioria das dioceses da América do Norte, possui uma importante estrutura de serviços educativos, sociais e de saúde que servem mais de 400.000 pessoas por ano. Mais de 32.000 alunos estão matriculados nas suas escolas, desde a escola primária até à universidade. 

As prioridades pastorais da Diocese de San Diego incluem a promoção da espiritualidade católica, especialmente a Santa Missa, a evangelização e a catequese sistemática, a promoção e o reforço das vocações matrimoniais, sacerdotais e religiosas, a família e a juventude, a promoção da cultura e a defesa da vida em todas as suas fases. Neste domínio, uma das prioridades é a atenção aos refugiados, imigrantes, migrantes documentados e não documentados. Estima-se que existam cerca de 200.000 migrantes sem documentos na região, a maioria dos quais provenientes do México. "A nossa diocese cobre toda a fronteira entre a Califórnia e o México. A fronteira influencia a vida pastoral de toda a diocese, não apenas das paróquias e escolas católicas mais próximas da fronteira", diz Aida Bustos, directora dos meios de comunicação da Diocese de San Diego. 

Trabalho paroquial na fronteira: levar a misericórdia de Deus 

Uma das paróquias situadas a poucos passos da fronteira é a paróquia de Nossa Senhora de Guadalupe, em Calexico, Califórnia, a sudoeste de San Diego. Faz fronteira com a cidade de Mexicali. O seu pároco é o Padre José Sosa, religioso da Ordem dos Clérigos Pobres Regulares da Mãe de Deus das Escolas Pias, Escolápios. A cidade de Calexico tem cerca de 40.000 habitantes, dos quais cerca de 3.000 frequentam a missa dominical e as diversas actividades paroquiais. A maioria da população é hispânica, imigrantes de segunda geração. Trabalham no campo e no sector comercial. Na paróquia existem vários apostolados orientados para a família, tais como o Movimento Familiar Cristão, o estudo do catecismo e a preparação sacramental para crianças e jovens. 

Trabalhar com migrantes

Sendo uma paróquia periférica, situada na fronteira, um dos seus ministérios é o cuidado dos migrantes. O Padre José Sosa fala à Omnes sobre este apostolado que se tornou especialmente importante nos últimos cinco anos (exceto em 2020 e parte de 2021 por causa da pandemia), devido a um aumento sem precedentes do número de imigrantes que chegam à fronteira com o México, tentando entrar nos EUA em busca do sonho americano.

Os migrantes estão a fugir da pobreza e da violência que aumentaram no México e na América Central. É uma situação que afecta particularmente as cidades fronteiriças mexicanas, onde milhares de migrantes estão presos, à espera da sua vez de serem chamados pelas autoridades de imigração ou simplesmente de uma oportunidade para atravessar sem autorização. Do lado americano, nas paróquias fronteiriças da diocese de San Diego, a situação também se faz sentir, mas não com a mesma intensidade. Muitos dos que conseguem entrar nos Estados Unidos sem documentos vêm às paróquias à procura de ajuda ou simplesmente de um lugar para descansar e depois continuar a sua viagem.

Relativamente ao apoio que a paróquia presta aos migrantes que conseguem passar a fronteira, o Padre José afirma que "a misericórdia do Senhor é o mais importante. Todo o ser humano tem a sua própria dignidade, quer tenha ou não autorização de migração. Nesse sentido, a paróquia está aberta para lhes proporcionar um local onde possam descansar, contactar familiares e receber alimentos. Muitos deles viajaram milhares de quilómetros desde a América Central ou do México, passando por lugares geograficamente perigosos como o deserto.

Alguns chegam doentes, a sangrar, com bolhas nos pés. O Padre José diz que na paróquia recebem os cuidados de que necessitam, mas sobretudo amor, "para que sintam que têm uma família e que há pessoas que os tratam como irmãos e irmãs".

O Padre José conta que, para além deste serviço, a paróquia organiza todos os anos, no Natal, a "posada del migrante". Nesta atividade, os paroquianos vão até à fronteira onde se formam dois grupos, divididos pela vedação metálica. De ambos os lados, cantam canções tradicionais para "pedir posada" e cantam canções de Natal e, no final, distribuem presentes ou mantimentos. Há uma outra paróquia em Calexico, que recolhe regularmente bens para levar para o lado mexicano da fronteira. 

Foram muitas as histórias que tocaram os corações do Padre José e da comunidade de Nossa Senhora de Guadalupe. Uma delas foi a de três jovens guatemaltecos sem documentos que chegaram com uma criança de quatro anos. "Foi no dia 31 de dezembro", conta o Padre José, "vieram à procura de um futuro melhor para as suas famílias. Acolhemo-los na nossa casa paroquial e jantámos juntos. A certa altura, começaram a chorar a pensar no que iria acontecer às suas vidas. As lágrimas desvaneceram-se quando ela viu o seu filho de quatro anos que estava muito feliz a brincar com um carrinho de bebé que lhe foi oferecido pela comunidade paroquial. Na sua inocência, ele não sabia que, com a sua idade, já era um imigrante. A sua alegria e ternura contagiam os seus familiares e os padres e o sofrimento dissipa-se. "A ternura é uma das coisas mais preciosas da vida", diz o Padre Sosa.

Os imigrantes continuarão a passar por esta e por muitas outras paróquias fronteiriças norte-americanas. O que fazer e como ajudá-los? O Padre Sosa recomenda: "A misericórdia é o coração de Cristo. Nós, que nos dizemos católicos, somos chamados a ter o mesmo coração de Cristo e a apoiar cada um dos nossos irmãos e irmãs que procuram um futuro melhor para as suas famílias, fugindo da violência e das muitas desgraças que vivemos nos nossos países.

Notícias

O Vaticano decide sobre as bênçãos para "casais irregulares e do mesmo sexo".

A 18 de dezembro de 2023, o Vaticano publicou uma declaração em que, nas palavras do Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, o objetivo é "oferecer um contributo específico e inovador para o desenvolvimento da Igreja no mundo". ao significado pastoral das bênçãosA "bênção dos casais em situação irregular e, em particular, dos casais do mesmo sexo.

Giancarlos Candanedo-18 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

"Fiducia supplicans".é o nome da Declaração Pastoral emitida pela Santa Sé em 18 de dezembro de 2023. A Declaração é acompanhada por uma apresentação de Mons. Víctor Manuel Fernández, Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, que sublinha que este texto é o resultado das frequentes consultas do Dicastério nos últimos anos sobre "a possibilidade de abençoar casais em situação irregular e casais do mesmo sexo".

O texto começa com uma introdução que defende uma visão que combina coerentemente aspectos doutrinais e pastorais. O próprio documento sublinha repetidamente este carácter mais pastoral do que doutrinal, recordando que a Igreja mantém inalterada a doutrina do matrimónio como "união exclusiva, estável e indissolúvel entre um homem e uma mulher, naturalmente aberta à geração de filhos".

Além disso, recorda o significado das bênçãos e, embora sublinhe que "quando, com um rito litúrgico apropriado, se invoca uma bênção sobre certas relações humanas, o que é abençoado deve poder corresponder aos desígnios de Deus inscritos na Criação", no ponto seguinte afirma que as bênçãos não podem ser reduzidas a este significado, nem se podem pedir para elas "as mesmas condições morais que se pedem para a receção dos sacramentos".

Percurso histórico-bíblico

Nesta perspetiva, devemos ter em mente que o objetivo do documento é apresentar uma breve visão histórico-bíblica das bênçãos na nossa tradição eclesial.

Se é verdade, como se afirma na Apresentação da Declaração, que "a Declaração tomou em consideração uma série de questões que foram apresentadas a este Dicastério tanto nos últimos anos como mais recentemente", é igualmente verdade que o documento não especifica essas "questões" ou "Dubia".

No entanto, a partir do que está expresso na terceira parte da Declaração, intitulada "Bênção de casais em situação irregular e de casais do mesmo sexo", podemos intuir que os "Dubia" tinham como objetivo procurar esclarecimentos sobre a possibilidade ou não de abençoar pessoas que se encontram em algumas circunstâncias particulares no que diz respeito aos ensinamentos morais da Igreja.

É de notar que a primeira parte da Declaração, "A bênção no sacramento do matrimónio", reitera que se deve evitar reconhecer como matrimónio algo que não o é, como "ritos e orações que possam criar confusão entre o que é constitutivo do matrimónio, como 'união exclusiva, estável e indissolúvel entre um homem e uma mulher, naturalmente aberta à geração de filhos'" (n. 4).

Bênçãos não rituais

Além disso, recorda-se que "a Igreja tem o direito e o dever de evitar todo o tipo de rito que possa contradizer esta convicção ou levar a qualquer confusão" (n. 5), porque, entre outras coisas, a bênção no rito do matrimónio "não é uma bênção qualquer, mas o gesto reservado ao ministro ordenado. Neste caso, a bênção do ministro ordenado está diretamente ligada à união específica de um homem e de uma mulher que, com o seu consentimento, estabelecem uma aliança exclusiva e indissolúvel" (n. 6).

Tendo em conta o que precede, podemos perguntar-nos quais são as bênçãos de que fala a Declaração? Fiducia supplicans. Neste sentido, "a possibilidade de bênção de casais em situação irregular e de casais do mesmo sexo não deve encontrar qualquer fixação ritual por parte das autoridades eclesiásticas, para não causar confusão com a bênção própria do sacramento do matrimónio" (n. 31). "Por isso, não se deve promover nem prever um ritual para a bênção dos casais em situação irregular, mas também não se deve impedir ou proibir a proximidade da Igreja a todas as situações em que se procura a ajuda de Deus através de uma simples bênção" (n. 38).

A bênção não é o mesmo que o casamento

É importante ter em conta que, precisamente porque não se trata de um tipo de bênção assimilável ao sacramento do matrimónio, a Declaração chama a atenção para a necessidade de "evitar qualquer forma de confusão ou escândalo", para o que indica que a "bênção nunca deve ser realizada ao mesmo tempo que os ritos civis da união, nem em ligação com eles. Nem sequer com as vestes, os gestos ou as palavras próprias do matrimónio. O mesmo se aplica quando a bênção é pedida por um casal do mesmo sexo" (n. 39).

Indica também os contextos em que a bênção correspondente pode ter lugar, como "uma visita a um santuário, um encontro com um sacerdote, uma oração recitada em grupo ou durante uma peregrinação" (n. 40).

Trata-se, sem dúvida, de um documento que, como também se afirma na Apresentação, procura "oferecer um contributo específico e inovador para o sentido pastoral da bênção".

O contexto atual impõe-nos novos desafios, um dos quais é a sensibilização e a educação, antes de mais dos pastores (cf. n. 35) e também dos leigos, uma educação que deve ser sempre guiada pelo Espírito Santo, na fidelidade ao Evangelho e ao Magistério da Igreja. 

O autorGiancarlos Candanedo

Mundo

Novo Plebiscito no Chile: business as usual

Após dois projectos constitucionais, o processo de alteração da Carta Magna chilena chegou ao fim sem vitória de nenhuma das partes.

Pablo Aguilera L.-18 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

2020: num plebiscito, 78 % dos chilenos votaram a favor de uma nova Constituição.

2022 62 % dos chilenos rejeitaram o projeto da nova constituição política, que tinha sido redigido por uma maioria de membros de esquerda da convenção.

Em maio de 2023, foram eleitos 50 vereadores (50 mulheres %), na sua maioria candidatos de direita. A partir de 7 de junho, começaram a redigir um novo texto, que foi aprovado por 3/5 dos conselheiros.

A obra foi entregue ao público no início de novembro.

A posição da Igreja

Em meados de novembro, a Conferência Episcopal Chilena deu o seu parecer ao público. Não encontraram objecções éticas ao texto. No que se refere à dignidade humana e ao respeito pela vida, valorizam o facto de se especificar que "a lei protege a vida do nascituro".

Ao afirmar "de quem" é feito um reconhecimento mais explícito da pessoa humana desde o momento da conceção, o que significa uma salvaguarda mais rigorosa contra eventuais projectos de lei que visem promover o aborto livre".

Sublinharam ainda que, no domínio da educação, "as famílias, através dos pais ou tutores, são consideradas como tendo o direito e o dever preferencial de educar os seus filhos ou pupilos, de escolher o tipo de educação e o seu estabelecimento de ensino".

No que diz respeito à liberdade religiosa e à objeção de consciência, o texto "desenvolve o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, que inclui a liberdade de adotar a religião ou as convicções da sua escolha, de viver de acordo com elas e de as transmitir, introduzindo, além disso, a objeção de consciência como salvaguarda constitucional. (...) A proposta acrescenta algo de novo e decisivo nesta matéria, como o direito dos pais a transmitirem os valores religiosos, éticos e morais e a escolherem a educação religiosa que decidirem para os seus filhos, afirmando ainda que as famílias têm o direito de criar entidades educativas com projectos educativos próprios, de acordo com as suas convicções religiosas ou morais. (...) Consideramos que estas normas sobre liberdade religiosa são um contributo para a vigência deste direito fundamental, agora explicitado na Constituição".

Embora apreciando os aspectos assinalados, os Bispos deixaram claro que não são eles que determinam o sentido de voto dos chilenos, sejam eles católicos ou não.

Novo plebiscito

Em 17 de dezembro, os chilenos votaram neste plebiscito obrigatório. Ao cair da noite, o Serviço Eleitoral divulgou os resultados: a proposta constitucional foi rejeitada por 55 % dos eleitores e aprovada por 45 %. Este resultado consolida a atual Carta Magna, que data de 1980, mas que foi objeto de várias reformas (a principal das quais em 2005).

À primeira vista, seria uma derrota para a centro-direita, que não convenceu os cidadãos a aprovar sua proposta. Mas é também uma derrota para a esquerda, cuja bandeira de luta desde 2019 era uma mudança na constituição, e que não teve sucesso.

Após dois projectos constitucionais, este processo está encerrado. Não haverá qualquer nova proposta de alteração da Constituição chilena a médio ou longo prazo. O governo do Presidente Gabriel Boric terá de se concentrar nos problemas reais da população - a economia, a luta contra a criminalidade, que aumentou nos últimos anos, o emprego, etc. - que são as principais preocupações dos cidadãos.

O autorPablo Aguilera L.

Vaticano

Ernesto Cofiño, o pediatra a caminho dos altares

Relatórios de Roma-18 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: < 1 minuto
relatórios de roma88

Francisco declarou venerável um pioneiro da medicina pediátrica na Guatemala, Ernesto Cofiño. Cofiño nasceu em 1899 e em 1933 casou com Clemencia Samayoa, com quem teve cinco filhos. Em 1956, Ernesto descobriu a sua vocação para o Opus Dei.

O seu prestígio profissional levou-o a ocupar a Cátedra de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade de San Carlos.


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Estados Unidos da América

Os bispos dos EUA apelam à paz no Médio Oriente após os ataques a católicos em Gaza

A USCCB emitiu uma declaração apelando à paz no Médio Oriente na sequência do ataque a uma igreja e a um convento católicos em Gaza.

Gonzalo Meza-18 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

"É com grande tristeza e horror que continuamos a assistir ao assassínio de pessoas inocentes na terra do nascimento do nosso Senhor. Na sequência do assassínio de duas mulheres cristãs na paróquia da Sagrada Família em Gaza, apelamos à cessação imediata de todas as hostilidades, à libertação dos reféns e ao início de negociações com vista a uma resolução pacífica deste conflito", afirmou o Arcebispo Timothy P. Broglio, Arcebispo para os Serviços Militares dos EUA e Presidente da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA (USCCB).USCCB(ver também o relatório da Comissão Europeia da Comissão Europeia).

De acordo com um comunicado de imprensa do gabinete do Patriarcado Latino de Jerusalém -dirigido por Mons. Pierbattista Pizaballa - no dia 16 de dezembro, ao meio-dia, um atirador das FDI entrou na paróquia da Sagrada Família (um local de refúgio para famílias cristãs) e disparou sobre Nahida Khalil Anton e a sua filha Samar Kamal Anton, matando-as. Sete outras pessoas foram também baleadas e feridas.

O comunicado acrescenta que, nessa mesma manhã, um tanque das IDF disparou um foguete contra o convento das Missionárias da Caridade, onde viviam 54 pessoas deficientes. O impacto deixou inúmeros danos, incluindo a destruição do gerador de eletricidade, do tanque de reserva de água e um enorme incêndio que deixou a casa em ruínas.

Unir-se pela paz com o Papa

"Esta violência não deve continuar", disse D. Timothy Broglio, acrescentando que os bispos americanos juntaram a sua voz à do Santo Padre "recordando a todas as partes em conflito que a guerra nunca é a resposta, mas sempre uma derrota. Pedimos paz, por favor, paz!", exclamou o prelado.

Durante o Angelus de 17 de dezembro, a partir do Palácio Apostólico do Vaticano, o Pontífice reiterou a sua consternação pelo ataque à paróquia de Gaza e pela morte das duas mulheres: "Os civis indefesos estão a ser bombardeados e alvejados. E isto aconteceu mesmo dentro do recinto da paróquia da Sagrada Família, onde não há terroristas, mas famílias, crianças, doentes, deficientes e freiras. A casa das Irmãs de Madre Teresa foi danificada, o seu gerador foi destruído. Alguém diz: "É o terrorismo, é a guerra". Sim, é a guerra, é o terrorismo. É por isso que a Escritura diz que "Deus acaba com as guerras... quebra os arcos e despedaça as lanças". Peçamos ao Senhor pela paz", concluiu o Santo Padre.

As Forças de Defesa de Israel negaram a duas agências noticiosas, a AFP e a Fox News, que fossem responsáveis pelos ataques à paróquia e pela morte das duas mulheres: "As forças israelitas não atacam civis, seja qual for a sua religião", sublinharam.

Ecologia integral

Mercedes Vallenilla: "Como cristãos, temos de compreender as nossas crises a partir da fé".

A organização Mindove integra os valores da fé cristã com os cuidados psicológicos. Destina-se aos católicos, mas também está aberta a todos os que o solicitem, "porque a Igreja é assim, tem os braços abertos para acolher todos os que precisam de ajuda", afirma a sua fundadora, a Dra. Mercedes Vallenilla.

Loreto Rios-18 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 6 acta

O projecto Mindove foi fundada pela Dra. Mercedes Vallenilla. É uma organização formada por psicólogos católicos cujo objetivo é integrar a assistência psicológica com a fé cristã. Nesta entrevista, a sua fundadora, Mercedes Vallenilla, fala-nos das características do projeto e dos desafios que encontraram no seu percurso. saúde mental.

Quais são, na sua opinião, os principais desafios para a saúde mental no panorama atual?

Há uma série de desafios actuais nos cuidados de saúde mental a nível mundial, mas estes desafios são ampliados no contexto em que a Mindove realiza a sua missão, que é o contexto da igreja.

O primeiro desafio decorre do divórcio histórico entre ciência e fé, uma crença central profundamente enraizada nos cristãos, de que a ciência da psicologia pode ser prejudicial à fé ao questionar o sistema de crenças cristãs. Isto baseia-se na própria história do conhecimento científico, uma vez que, no início do século XX, Sigmund Freud, o fundador da psicanálise, afirmou que as neuroses eram causadas pela religião. A religião dominante na altura era a católica. Este facto, juntamente com outros elementos históricos, representava uma ameaça para o catolicismo, uma ameaça que foi herdada de geração em geração.

A própria evolução do trabalho científico tem demonstrado, através da perspetiva da Psicologia da Religião, o benefício de integrar o Fator R/S, ou seja, o sistema de crenças do paciente, na terapia. Gostaria de esclarecer que esta perspetiva não pretende validar verdades de fé, nem questionar a existência ou inexistência de Deus, nem dizer qual a religião verdadeira. Simplesmente convida os profissionais de saúde mental a formarem-se, quer incluindo o Fator R/S em geral na terapia, quer recorrendo a conhecimentos de religiões politeístas ou monoteístas, bem como de algumas espiritualidades, quer especializando-se numa única religião. No nosso caso, é a religião católica.

Dito isto, na América Latina há um grande e profundo desconhecimento destes avanços científicos. Por esta razão, não só estes avanços não penetraram na academia, mas muito menos este conhecimento chegou ao "católico comum".

Portanto, o maior desafio é este obstáculo histórico, em que o paciente crente acredita que não há psicólogos católicos que possam integrar profissionalmente o seu sistema de crenças num processo terapêutico que se baseia na ciência, mas também no corpo de crenças cristãs; porque historicamente acreditou que isso não pode ser feito de uma forma harmoniosa e integrada. Para além disso, quando tentou ir a um psicólogo, a oferta que existe é basicamente de psicólogos laicos, reafirmando esta crença histórica.

Quais são as dificuldades que encontra ao abordar esta questão na Igreja?

A pastoral da Igreja, com a boa intenção e o desejo de dar uma solução à procura de cura das "feridas emocionais" dos seus fiéis, levou actores não qualificados a assumirem o papel de terapeutas sem o serem de facto.

É sabido que, quando temos um problema, como cristãos, o primeiro sítio a que recorremos para pedir ajuda é a nossa comunidade. Porque, como cristãos, não podemos ignorar o facto de que precisamos de nos compreender a nós próprios, e sobretudo as nossas crises psico-emocionais, a partir da ciência, mas também da fé. Precisamos de compreender a vontade de Deus nesse facto da dor e de iluminar o humano com o divino.

Se é verdade que a Igreja não é diretamente responsável pelas feridas emocionais dos seus paroquianos, ela é responsável por acompanhar os católicos de hoje nos seus problemas emocionais, nos seus problemas reais. Caso contrário, ele só sentirá um discurso teológico distante da sua própria realidade de dor, e é aí que perdemos a capacidade de acolher o cristão na sua dor e no seu sofrimento, de dar uma resposta efectiva sem mudar a mensagem teológica de há dois mil anos, mas respondendo à sua realidade humana de hoje.

O desafio, portanto, é que o paciente, não acreditando que a ciência e a fé possam ser unificadas e que ele possa receber uma terapia integral de um profissional que estudou 4 ou 5 anos numa universidade e que também se especializou, tenta resolver o seu problema emocional falando com um padre, ou com um catequista ou com o seu companheiro espiritual, e aí as competências se sobrepõem, criando uma confusão ainda maior no problema.

A primeira é a espiritualização: centrar-se no espiritual, negligenciando o psicológico e o físico; a segunda é o fideísmo, ou seja, a tendência para ignorar a razão e a vontade humana para dar peso apenas à fé. No fim de contas, os problemas de saúde mental não são geralmente um problema de fé, mas o facto de se recorrer apenas à fé para os resolver aumenta a crise.

O Santo Padre Francisco, durante uma audiência este ano, aconselhou os padres a não assumirem o papel de profissionais de saúde mental, como psiquiatras ou psicólogos, sublinhando que não foram chamados a "brincar aos psiquiatras ou psicanalistas".

Quando todos os membros da Igreja reconhecerem os limites das nossas competências, então encontraremos uma solução de raiz para o problema da saúde mental no contexto eclesial.

De que trata o projeto? Mindove?

A Mindove é uma organização feita por católicos que procura dar uma resposta integral aos católicos do mundo, oferecendo uma terapia católica virtual. Queremos acompanhar os católicos de hoje através de uma resposta profissional integral para que possam viver o seu estado de vida, a sua vocação e ser o que são chamados a ser. Mas também estamos profissionalmente e eticamente preparados para oferecer terapia a qualquer pessoa que peça ajuda, mesmo que não seja cristã, porque é assim que a Igreja é, ela tem os braços abertos para acolher qualquer pessoa que precise de ajuda.

Como é que surgiu a ideia de criar esta iniciativa?

A ideia surgiu-me enquanto rezava na praia. Vivo em Cancun e estava a rezar pelos meus doentes enquanto olhava para o mar. Naquela altura, atendia padres, religiosos, leigos consagrados e era conselheiro de congregações e institutos religiosos. Era um trabalho muito delicado e cuidadoso.

Nesse momento, surgiram algumas ideias em cascata, uma delas foi a de criar uma organização para aumentar a enorme procura que o meu gabinete de Psicologia Católica Integral já estava a ter, e a outra foi a de criar uma Escola de Psicólogos Católicos com o Modelo de Acompanhamento Psicoespiritual que eu estava a utilizar na terapia.

Passaram-se vários anos e observei o efeito que a psicoespiritualidade tinha nos meus pacientes. Com isso, a procura foi aumentando de forma desproporcionada, de tal forma que tive de começar a ter uma assistente e outros telemóveis para dar conta de toda a procura, não conseguindo dar resposta à mesma.

Estes foram os primeiros passos, há 5 anos, para fundar a Mindove, aos quais se seguiram muitos outros.

O que há de novo Mindove para o domínio da saúde mental?

A nossa diferença e valor mais importante em relação a outras plataformas de saúde mental é que, em primeiro lugar, temos uma abordagem inovadora, integrando todos os elementos que a ciência nos dá da psicologia da religião com a riqueza da espiritualidade cristã.

Em segundo lugar, não utilizamos plataformas de videochamada como o Zoom, o Skype ou o Meet, somos uma organização que oferece uma abordagem integradora e que tem vindo a construir uma plataforma há mais de quatro anos que integra vários processos que facilitam a experiência do utilizador, bem como os elementos característicos da nossa espiritualidade cristã, como a frase do dia baseada na Bíblia, ferramentas inovadoras para a gestão de compromissos, entre muitas outras coisas.

Um exemplo disso é o facto de tanto o paciente como o psicólogo receberem uma marcação no seu fuso horário, pelo que não há este tipo de confusão, que é caraterística da virtualidade.

Outro exemplo é o facto de as nossas salas de videochamadas terem certificação de conformidade com a HIPAA para garantir a confidencialidade.

Quais são as características da nova aplicação e como é que facilita os cuidados aos doentes?

A aplicação tem, entre outras, as seguintes características:

  • Filtra de forma inteligente os psicólogos pelo tipo de patologia que o paciente indicou ao indicar previamente os seus sintomas, o que faz com que as opções que oferece ao paciente sejam as mais adequadas para tratar o caso.
  • O psicólogo tem a possibilidade de enviar ao paciente um questionário de auto-diagnóstico baseado na American Psychological Association (APA) antes da primeira consulta. Se o paciente quiser respondê-lo, o psicólogo tem informação diagnóstica prévia e chega à primeira consulta mais informado sobre o caso.
  • Apresenta as horas e datas de disponibilidade dos psicólogos com base no fuso horário do paciente e também do psicólogo, para evitar confusões com mudanças de horário.
  • Dispõe de salas de videoconferência com certificação HIPPA Compliance, que é uma certificação internacional para a saúde mental que indica que se trata de salas altamente fiáveis onde existe proteção de dados.
  • Dispõe de um chat interno, também protegido durante a chamada, para a comunicação entre o paciente e o psicólogo.
  • Dispõe de um sistema de cobrança automatizado com certificados de cibersegurança que permite pagar a partir de qualquer parte do mundo com cartão de crédito ou de débito. Os pacientes recebem os seus recibos automaticamente.
  • A plataforma permite-lhe ligar-se a partir do seu telemóvel ou computador, a partir do conforto da sua casa ou onde quer que o doente escolha para a sua consulta.
  • Em vez de uma palavra-passe, o acesso é feito através de um código, o que constitui o nível mais elevado de segurança, uma vez que impede a quebra da palavra-passe. Na saúde mental, a proteção de dados é muito mais importante.
  • Para além disso, o perfil de cada psicólogo não só descreve a sua formação e experiência profissional, como também tem um vídeo onde o psicólogo explica porque é psicólogo, porque é católico, porque está na Mindove e qual é o seu santo padroeiro, bem como uma citação favorita de um santo. Isto facilita a experiência de contacto e a identificação do psicólogo certo.
  • A nossa plataforma oferece aos pacientes psicólogos a preços diferentes, uma vez que decidimos incentivar a meritocracia, que classificámos em Dover, Super Dover e Ultra Dover com base nos seus estudos e experiência, o que dá a oportunidade de aceder a um psicólogo de acordo com as possibilidades económicas do paciente sem afetar a qualidade do serviço.
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Vaticano

O Papa reflecte sobre João Batista, lâmpada de Cristo

No dia do seu aniversário, na meditação do Angelus, o Papa Francisco falou de São João Batista, "lâmpada da luz de Cristo".

Paloma López Campos-17 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

O Papa Francisco não só celebrou a sua aniversário neste domingo, ele também rezou o Angelus e proferiu uma meditação sobre o Evangelho do dia. Nesta ocasião, o Pontífice centrou as suas palavras na figura de São João Batista, "um homem extraordinário".

O Santo Padre recordou a razão pela qual tantas pessoas vinham ver João. Era um homem que atraía pela sua maneira de ser "coerente e sincera". Por isso, o seu testemunho chamava a atenção, pela "franqueza da sua linguagem, pela honestidade do seu comportamento e pela austeridade da sua vida".

Francisco explicou porque é que pessoas como João são importantes nas nossas vidas. As "figuras luminosas" são pessoas que "nos inspiram a ultrapassar a mediocridade e, por sua vez, a ser modelos de boa vida para os outros".

Mas São João Batista não é o único personagem da história. "O Senhor envia homens e mulheres assim em todas as épocas", e cabe-nos a nós aprender a reconhecê-los. Por esta razão, o Papa convidou todos a perguntarem-se se aprendemos com o testemunho destas pessoas, se nos questionamos.

Mas de onde vem a luz de São João e dos que se lhe assemelham? Respondeu o Papa, seguindo as palavras do próprio Batista. A luz é Jesus, o Cordeiro de Deus, "Deus que salva", como diz o seu nome. Só ele redime, liberta, cura e ilumina". Em suma, João "é uma lâmpada, enquanto a luz é Cristo".

Lâmpadas de Cristo

Graças à luz que São João transmite, graças ao seu testemunho, aprendemos duas coisas que Francisco assinalou. "Em primeiro lugar, que não nos podemos salvar a nós próprios. Precisamos de Deus para nos dar a vida. "Em segundo lugar, que cada um de nós, com o serviço, a coerência, a humildade, com o testemunho de vida - sempre com a graça de Deus - pode ser uma lâmpada que brilha e ajuda os outros a encontrar o caminho para encontrar Jesus".

O Papa terminou a sua meditação convidando todos a refletir sobre duas questões:

  • "Como posso eu, nos ambientes em que vivo, não num dia distante, mas já, agora, neste Natal, ser uma testemunha da luz, uma testemunha de Cristo?"
  • "Como posso eu, nos muitos encontros, nas conversas, nas celebrações dos próximos dias, dar testemunho da "luz verdadeira", isto é, do Senhor Jesus, que brilha na minha vida, para que os outros também O conheçam e se alegrem n'Ele?"

E, como de costume, o Papa Francisco recorreu à intercessão de Maria, "espelho de santidade", para ajudar os católicos a "serem homens e mulheres que reflectem Jesus, a luz que vem ao mundo".

Depois do Angelus, o Santo Padre celebrou a beatificação do "Cardeal Eduardo Pironio, pastor humilde e zeloso, testemunha da esperança, defensor dos pobres". Recordou também "os milhares de migrantes que tentam atravessar a selva de Darien, entre a Colômbia e o Panamá". E a todos os que "sofrem por causa da guerra, na Ucrânia, na Palestina, em Israel e noutras zonas de conflito".

Vaticano

O Papa Francisco celebra o seu 87º aniversário com um novo livro e um olhar sobre o futuro da Igreja

O Papa Francisco tem 87 anos. Passou os últimos dez anos à frente da Igreja Católica, tendo as desigualdades sociais, a crise climática, a guerra, as armas nucleares e a discriminação racial como alguns dos seus principais temas.

Antonino Piccione-17 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 4 acta

Hoje é o seu 87º aniversário. O primeiro Papa vindo da América, o jesuíta argentino Jorge Mario Bergoglio, antigo arcebispo de Buenos Aires. É uma ocasião para lhe desejar felicidades, para continuar a rezar por ele, pela sua saúde e pela sua missão de guiar a Igreja, e para formular votos sinceros e sentidos de uma continuação frutuosa do seu magistério.

A pior coisa que pode acontecer na Igreja, explicou, "é aquilo a que de Lubac chama mundanidade espiritual", que significa "pôr-se a si próprio no centro". E quando fala de justiça social, convida-nos a regressar ao Catecismo, aos Dez Mandamentos e às Bem-Aventuranças.

A vida do Papa Francisco

Nasceu na capital argentina a 17 de dezembro de 1936, filho de emigrantes piemonteses: o pai, Mario, era contabilista e trabalhava nos caminhos-de-ferro, enquanto a mãe, Regina Sívori, cuidava da casa e da educação dos cinco filhos.

Depois de se ter formado como técnico químico, escolheu o caminho do sacerdócio, entrando no seminário diocesano. A 11 de março de 1958, entrou no noviciado da Companhia de Jesus. Completou os seus estudos humanísticos no Chile e em 1963, de regresso à Argentina, licenciou-se em filosofia no Colégio São José de São Miguel.

Entre 1964 e 1965 leccionou literatura e psicologia no Colegio de la Inmaculada em Santa Fé e em 1966 leccionou as mesmas disciplinas no Colegio del Salvador em Buenos Aires. De 1967 a 1970 estudou teologia, formando-se também no Colégio San José.

A 13 de dezembro de 1969 foi ordenado sacerdote pelo Arcebispo Ramón José Castellano. Continuou a sua preparação entre 1970 e 1971 em Espanha, e fez a sua profissão perpétua nos Jesuítas a 22 de abril de 1973. De regresso à Argentina, foi Mestre de Noviços em Villa Barilari em San Miguel, Professor na Faculdade de Teologia, Consultor da Província da Companhia de Jesus e Reitor do Colégio. 

A 31 de julho de 1973, foi nomeado provincial jesuíta da Argentina. Seis anos mais tarde, retomou o seu trabalho a nível universitário e, entre 1980 e 1986, foi novamente reitor do Colégio de S. José, bem como pároco em S. Miguel.

Em março de 1986, viajou para a Alemanha para terminar a sua tese de doutoramento; os seus superiores enviaram-no depois para o Colégio do Salvador em Buenos Aires e depois para a Igreja dos Jesuítas em Córdova como diretor espiritual e confessor.

Nomeação de um bispo

Foi o Cardeal Quarracino que o quis como seu colaborador próximo em Buenos Aires. Assim, a 20 de maio de 1992, João Paulo II nomeou-o bispo titular de Auca e bispo auxiliar de Buenos Aires. A 27 de junho foi ordenado bispo na catedral pelo próprio Cardeal.

Como lema, escolheu Miserando atque eligendo e no brasão de armas inseriu o cristograma ihs, símbolo da Companhia de Jesus.

Foi imediatamente nomeado Vigário Episcopal da zona de Flores e tornou-se Vigário Geral a 21 de dezembro de 1993. Não é de estranhar que, a 3 de junho de 1997, tenha sido promovido a Arcebispo Coadjutor de Buenos Aires.

Apenas nove meses depois, com a morte do Cardeal Quarracino, sucedeu-lhe, a 28 de fevereiro de 1998, como Arcebispo, Primaz da Argentina, Ordinário para os fiéis de Rito Oriental residentes no país e Grão-Chanceler da Universidade Católica.

No Consistório de 21 de fevereiro de 2001, João Paulo II criou-o Cardeal, com o título de São Roberto Belarmino. Em outubro de 2001 foi nomeado Relator Geral Adjunto da X Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, dedicada ao ministério episcopal. Entretanto, na América Latina, a sua figura ganhava cada vez mais popularidade.

Em 2002, recusou a nomeação para presidente da Conferência Episcopal Argentina, mas três anos mais tarde foi eleito e reconfirmado para um novo mandato de três anos em 2008. Entretanto, em abril de 2005, participou no conclave que elegeu Bento XVI.

Como arcebispo de Buenos Aires - três milhões de habitantes - pensou num projeto missionário centrado na comunhão e na evangelização.

Tem quatro objectivos principais: comunidades abertas e fraternas; protagonismo de um laicado consciente; evangelização dirigida a todos os habitantes da cidade; atenção aos pobres e aos doentes. Convida sacerdotes e leigos a trabalharem juntos.

"Vida. A minha história na História"

Eleito Sumo Pontífice em 13 de março de 2013. 10 anos e mais no Trono de Pedro: inúmeras publicações sobre o assunto, embebidas em páginas de crónica e história.  

O seu novo livro A vida. A minha história na HistóriaO primeiro relato da sua vida através dos acontecimentos que marcaram a humanidade, desde o início da Segunda Guerra Mundial em 1939, quando tinha quase três anos de idade, até aos dias de hoje.

Memórias de um pastor que, do seu ponto de vista, relata os anos do extermínio nazi dos judeus, os bombardeamentos atómicos de Hiroshima e Nagasaki, a grande recessão económica de 2008, o colapso das Torres Gémeas, a pandemia, a demissão de Bento XVI e o conclave que o elegeu Papa Francisco.

Acontecimentos que se cruzam na vida do "papa da rua", que excecionalmente reabre o baú das suas memórias para contar, com a franqueza que o distingue, os momentos que mudaram o mundo.

Centrando-se nas questões mais candentes da atualidade: desigualdades sociais, crise climática, guerra, armas nucleares, discriminação racial.

A voz do Papa alterna com a de um narrador, Fabio Marchese Ragona, um vaticanista do grupo televisivo Mediaset, que em cada episódio descreve o contexto histórico em que o Papa viveu.

Neste livro, contamos uma história, a história da minha vida, através dos acontecimentos mais importantes e dramáticos que a humanidade viveu nos últimos oitenta anos", diz o Papa Francisco.

Este volume é publicado para que, acima de tudo, as gerações mais jovens possam ouvir a voz de um velho e refletir sobre o que o nosso planeta tem passado, para não repetir os erros do passado. Pensemos, por exemplo, nas guerras que devastaram e continuam a devastar o mundo; pensemos nos genocídios, nas perseguições, no ódio entre irmãos e irmãs de religiões diferentes! 

Tanta dor! A partir de uma certa idade, é importante, mesmo para nós próprios, reabrir o livro de memórias e recordar: aprender olhando para trás no tempo, redescobrir as coisas que não são boas, as coisas tóxicas que vivemos juntamente com os pecados que cometemos, mas também reviver todo o bem que Deus nos enviou. É um exercício de discernimento que todos devemos fazer, antes que seja tarde demais!

Feliz aniversário do Papa Francisco!

O autorAntonino Piccione

Recursos

A grandeza de Maria, Nova Eva: Prefácio do Advento IV

O quarto e último Prefácio do Advento é dedicado ao tempo que precede imediatamente a solenidade do Natal, ou seja, os dias de 17 a 24 de dezembro. O texto introduz-nos no mistério que estamos a celebrar: o da Virgem Maria, a nova Eva, que com o seu fiat abriu o caminho para a Encarnação do Verbo. Cristo está às portas.

Giovanni Zaccaria-17 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

O texto do presente Prefácio IV do Advento é uma reelaboração de um antigo prefácio ambrosiano, que foi revisto na sua forma atual.

"É justo dar-vos graças, Senhor, Pai santo, Deus todo-poderoso e eterno. Nós te louvamos, te bendizemos e te glorificamos pelo mistério da Virgem Mãe. Porque, se a ruína nos veio do antigo adversário, no seio virginal da filha de Sião germinou aquele que nos alimenta com o pão dos anjos, e a salvação e a paz brotaram para todo o género humano. A graça que Eva nos tirou foi-nos restituída em Maria. Nela, a mãe de todos os homens, a maternidade redimida do pecado e da morte, abre-se ao dom da vida nova. Assim, onde o pecado tinha crescido, a vossa misericórdia transbordou em Cristo, nosso Salvador. Por isso, enquanto aguardamos a vinda de Cristo, unidos aos anjos e aos santos, cantamos o hino da vossa glória: Santo, Santo, Santo...".

Mais uma vez, tal como no Prefácio do Advento III, o motivo da gratidão a Deus já está expresso no protocolo: "Nós vos louvamos, bendizemos e glorificamos pelo mistério da Virgem Mãe", uma expressão única no corpus dos Prefácios, que nos introduz no mistério que estamos a celebrar: o da Virgem Maria, que com o seu fiat abriu o caminho para a Encarnação do Verbo; por isso é louvada como Virgem Mãe e este título já nos abre à contemplação da grandeza de Maria, uma grandeza que é expressa ao longo do Prefácio através de uma série de paralelismos antitéticos de rara beleza.

A primeira das três secções que compõem o corpo do Prefácio está entrelaçada com imagens bíblicas, que remetem para o poder tipológico da Virgem Maria. A ruína provocada pelo antigo adversário (cf. Geração 314-15) não foi a última palavra sobre o destino do homem, porque do seio virginal da filha de Sião (Is 62,11; Zc 2,14 e 9,9) nasceu aquele que nos alimenta com o pão dos anjos (Sb 16,20; Jo 6,38).

Esta última expressão é particularmente bela e importante, pois relaciona o tema do pão eucarístico com o mistério da Encarnação: o seio virginal, uma realidade muito carnal, torna-se o seio de uma realidade celeste.

A queda, totalmente reparada graças ao "sim" de Maria.

A segunda secção abre com o paralelismo antitético Eva/Maria, que dá também o título a este texto eucarístico. A queda dos nossos progenitores, já evocada na secção anterior na imagem da vitória do demónio, é totalmente reparada graças ao sim de Maria, que nos restitui à nossa condição primordial. A maternidade de Eva adquire uma nova dimensão na maternidade de Maria: de facto, a transformação operada pela Encarnação transforma-nos de condenados à morte em destinados à imortalidade.

O paralelismo típico de Maria, a nova Eva, termina na figura de Cristo, que surge com força na terceira secção: em Cristo Salvador, a misericórdia de Deus transborda precisamente onde é mais necessária, ou seja, onde o pecado parece vencer tudo.

É a experiência da vida sapiencial da Igreja que indica precisamente na fraqueza humana o lugar da manifestação do poder de Deus (cf. 2 Cor 12, 7-10) e no pecado o lugar da emergência da grandeza de Deus.

Cada secção do corpo do Prefácio termina com uma ênfase nos dons messiânicos (salvação e paz, o dom da vida nova, a misericórdia), que indicam que Cristo está à porta; neste tempo antes do Natal.

O autorGiovanni Zaccaria

Pontifícia Universidade da Santa Cruz (Roma)

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Vaticano

Cardeal Becciu condenado a 5,5 anos de prisão por desvio de fundos

O Tribunal do Estado do Vaticano condenou esta tarde o chamado caso Becciu contra 10 arguidos e várias empresas. O Cardeal Angelo Becciu, que substituiu o Secretário de Estado na altura do investimento imobiliário em Londres, foi condenado a cinco anos e meio de prisão, inibição de direitos e pagamento solidário de 200 milhões de dólares ao Vaticano, juntamente com outros arguidos.

Francisco Otamendi-16 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Foram necessárias 86 audiências, com centenas de horas de sessões, para que o tribunal pronunciasse a sentença sobre os factos que, segundo o comunicado do Vaticano, dizem respeito a dez arguidos, entre os quais o então Monsenhor Becciu e várias empresas envolvidas num investimento imobiliário de alto risco em Londres.
O Tribunal do Vaticano, presidido pelo magistrado Giuseppe Pignatone, juntamente com os juízes Venerando Marano e Carlo Bonzano, considerou a existência de "um crime de peculato (artigo 168 do Código Penal) em relação à utilização ilícita na administração dos bens eclesiásticos" da soma de 200 milhões de dólares, equivalente a cerca de um terço das disponibilidades na altura da Secretaria de Estado. Ou seja, cerca de 183,8 milhões de euros.

Esta soma, segundo o comunicado do Vaticano, "foi paga entre 2013 e 2014, a mando do então Monsenhor Substituto Giovanni Angelo Becciu, para a subscrição de acções da Athena Capital Commodities, um fundo de cobertura, referível ao Dr. Raffaele Mincione, com características altamente especulativas e que implicava um elevado risco de capital para o investidor sem qualquer possibilidade de controlo da gestão".

Como explicou Omnes, o processo envolveu três casos contra o Cardeal Becciu, "muito diferentes uns dos outros e todos relacionados com a questão da gestão dos fundos da Secretaria de Estado".
O primeiro é o mais importante e diz respeito, como já foi referido, ao investimento da Secretaria de Estado nas acções de um pequeno palácio de luxo em Londres, por cerca de 200 milhões de dólares. O investimento foi entregue primeiro ao agente Raffaele Mincione e depois ao agente Gianluigi Torzi, explicou Andrea Gagliarducci.

De acordo com a sentença, foram considerados "culpados do crime de peculato Monsenhor Becciu e Raffaele Mincione, que tinham estado em contacto direto com a Secretaria de Estado para obter o pagamento do dinheiro mesmo sem as condições terem sido cumpridas, bem como, em conluio com eles, Fabrizio Tirabassi, um funcionário do Gabinete de Administração, e E.C.".

As condenações

Considerando as infracções imputadas a cada um dos arguidos, as sentenças do Tribunal são as seguintes

"BRUHLART René e DI RUZZA Tommaso a uma coima de mil setecentos e cinquenta euros;

E.C. a sete anos de prisão e a uma coima de dez mil euros com inibição vitalícia de funções públicas;

Raffaele a cinco anos e seis meses de prisão e a uma multa de 8.000 euros, com inibição vitalícia do exercício de cargos públicos;

BECCIU Giovanni Angelo a uma pena de cinco anos e seis meses de prisão, uma coima de 8.000 euros e inibição vitalícia do exercício de funções públicas;

TIRABASSI Fabrizio a sete anos e seis meses de prisão, uma coima de dez mil euros e inibição vitalícia do exercício de funções públicas;

SQUILLACE Nicola, após a concessão de uma circunstância atenuante geral, a uma pena suspensa de um ano e dez meses de prisão;

TORZI Gianluigi a seis anos de prisão e a uma coima de 6.000 euros, à inibição vitalícia do exercício de funções públicas e a uma vigilância especial durante um ano;

MAROGNA Cecilia a três anos e nove meses de prisão com interdição temporária de exercer funções públicas pelo mesmo período; e funções públicas pelo mesmo período;

LOGSIC HUMANITARNE DEJAVNOSTI D.O.O. a uma coima de 40 000 euros e à proibição de celebrar contratos com entidades públicas durante dois anos;

Além disso, o Tribunal ordenou a perda, em montantes equivalentes, das somas que constituem o corpo de delito das infracções contestadas, num montante total de mais de 166 000 000 euros.

Por último, os réus foram condenados, solidariamente, a pagar uma indemnização a favor das partes civis, uma indemnização liquidada num montante total de mais de 200.000.000,00 euros".

Obrigação de indemnização

No que diz respeito a dois outros casos em investigação, o Cardeal Becciu e Marogna Cecilia "foram considerados culpados, solidariamente, da infração prevista no artigo 416-ter do Código Penal, em relação ao pagamento, pela Secretaria de Estado, de somas que totalizam mais de 570.570.000 a favor da Marogna, através de uma sociedade que lhe foi indicada, com o fundamento, que não corresponde à verdade, de que o dinheiro se destinava a facilitar a libertação de uma freira, vítima de rapto em África".

O Cardeal Becciu foi também considerado "culpado de peculato (artigo 168.º do Código Penal) por ter depositado, por duas vezes, numa conta em nome de

Caritas-Diocese de Ozieri, o pagamento do montante total de 125.000 euros destinado efetivamente à cooperativa SPES, da qual o seu irmão Becciu Antonino era presidente".

Recursos

Os advogados do cardeal afirmaram num comunicado: "Respeitamos a sentença, leremos os motivos, mas estamos certos de que, mais cedo ou mais tarde, será reconhecido o absurdo da acusação contra o cardeal e, por conseguinte, a verdade: Sua Eminência está inocente", afirmaram.

O autorFrancisco Otamendi

Cultura

As origens do presépio

Todos os Natais, a criação de um presépio é uma tradição muito querida de muitas famílias católicas.

Jennifer Elizabeth Terranova-16 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Foi na cidade de Greccio, em Itália, conhecida por ser o local de nascimento do primeiro presépio da história. Uma tradição que se espalhou por todo o mundo, é amada e acarinhada, e é a tradição mais conhecida do Natal.

A tradição diz que uma família grega fundou a cidade de Greccio e aí se estabeleceu, daí a origem do nome Greccio - grego em italiano. A cidade medieval data dos séculos X e XI e está situada nos Apeninos italianos, uma cidade pitoresca situada no topo de uma das colinas com vista para o Vale Sagrado.

Em 1223, S. Francisco de Assis, um jovem eremita, tinha acabado de regressar a casa depois de Terra Santa e passeou por Greccio, ficando impressionado com a sua beleza, que lhe fez lembrar a cidade santa de Belém. Numa entrevista, o Padre Domenico, frade menor, partilhou: "Francisco tinha um sonho: reviver com os seus próprios olhos o que o recém-nascido Jesus tinha sofrido pela humanidade, e este sonho tornou-se realidade na véspera de Natal de 1223". Para isso, contou com a ajuda do seu amigo Giovanni de Greccio, o Velita, proprietário das grutas. Precisava de uma pedra, que ainda lá está, de feno, de um boi, de um burro e de um altar.

São Francisco, na altura diácono, celebrou a Missa de Natal e muitos se reuniram para ver o primeiro presépio. Durante a celebração, Giovanni Velita e outros tiveram uma visão: viram um bebé a acordar de um longo sono sobre a pedra. O Padre Domenico diz que o bebé sorriu para Francisco, que o abraçou e o adorou.

"O de Greccio era um presépio bastante atípico, um pouco diferente do que podemos encontrar atualmente nas famílias italianas e em todo o mundo; é o único que não tem a Virgem Maria e José...", afirmou o antigo presidente da Câmara de Greccio, Antonio Rosati.

Tradição universal

Todos os anos, os habitantes revivem estes momentos históricos com orgulho porque "fazem parte da nossa história, do nosso coração e também do nosso património iconográfico, que é universal... A Natividade é algo que nos une, não nos divide, e assim também Greccio une e não divide", disse o Presidente da Câmara Rosati numa entrevista.

Todos os Natais, a criação de um presépio é uma tradição muito cara a muitas famílias católicas; é uma tradição querida que se transmite, e criam-se memórias à medida que pais, filhos e familiares compram novas figuras e decidem onde as colocar. É tudo muito comovente", afirmou o antigo vice-presidente da Câmara Municipal de Greccio, Federico Giovanelli, que recordou: "Se todos nós criamos o nosso presépio hoje, é porque Francisco criou o primeiro aqui naquela noite".

Quando São Francisco pregou e leu o Evangelho na noite de Natal, uma testemunha ocular relatou: "Aconteceu um milagre nessa noite. Posteriormente, outros milagres foram citados durante esse período. Diz-se que aqueles que tocavam na palha da manjedoura onde aparecia o Menino Jesus eram curados, assim como as mulheres em trabalhos forçados e os animais doentes.

O Papa Francisco e o presépio

O Papa Francisco escolheu o seu nome em honra do santo que criou o primeiro presépio há tantos anos. Ele fez duas visitas ao santuário do eremitério em Greccio em 2017 e 2019, quando assinou uma carta apostólica, "O Santuário de Greccio".Admirabile Signum". Nele escreveu:

"Porque é que o presépio de Natal suscita tanta admiração e nos comove tão profundamente? Antes de mais, porque mostra a ternura de Deus: o Criador do universo inclina-se para assumir a nossa pequenez. O dom da vida, em todo o seu mistério, torna-se ainda mais maravilhoso quando nos apercebemos de que o Filho de Maria é a fonte e o sustento de toda a vida. Em Jesus, o Pai deu-nos um irmão que vem ao nosso encontro quando estamos confusos ou perdidos, um amigo fiel que está sempre ao nosso lado. Deu-nos o seu Filho que nos perdoa e nos liberta dos nossos pecados".

O Presidente do Parlamento Europeu encorajou também as famílias a manterem viva esta tradição nas suas casas e disse esperar que "este costume nunca se perca". Em muitos lares, esta é uma prática celebrada e ansiosamente aguardada. Em todo o mundo, há competições para ter o "melhor" presépio. Muitos bairros, como o de Dyker Heights, em Brooklyn, Nova Iorque, recebem anualmente turistas de todo o mundo que vêm ver os seus famosos presépios e as suas exibições de Natal nos quintais.

O presépio no Vaticano

Enquanto no primeiro presépio não apareciam nem a nossa Mãe Maria Santíssima nem São José, hoje a Sagrada Família está presente, bem como São Francisco de Assis, que está junto ao presépio, como vimos no Vaticano aquando da inauguração do presépio deste ano.

Este ano foi homenageado São Francisco de Assis. O Papa Francisco dirigiu-se às comunidades que doaram o presépio e a árvore de Natal e disse que o facto de nos debruçarmos sobre qualquer presépio deveria "despertar em nós a nostalgia do silêncio e da oração na nossa vida quotidiana, muitas vezes agitada".

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Estados Unidos da América

Os Estados Unidos celebram a Virgem de Guadalupe

De Nova Iorque a Los Angeles, de Chicago a Miami, centenas de milhares de peregrinos reuniram-se a 12 de dezembro nas igrejas de várias dioceses do país para celebrar a Virgem de Guadalupe.

Gonzalo Meza-15 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 4 acta

O ano de 2023 marca o 492º aniversário das aparições da Virgem de Guadalupe na colina de Tepeyac, na Cidade do México. Foi declarada "Padroeira das Américas" pelo Papa Pio XII em 1946, título confirmado por João Paulo II em 1999. É a padroeira principal de muitas dioceses, incluindo a de Los Angeles. Como os Estados Unidos são o segundo país com maior número de mexicanos, as celebrações de Guadalupe são realizadas com o mesmo fervor e calor que os mexicanos trazem a esta tradição.

De Nova Iorque a Los Angeles, de Chicago a Miami, centenas de milhares de peregrinos reuniram-se no dia 12 de dezembro nas igrejas de diferentes dioceses do país para celebrar a "Morenita del Tepeyac". As celebrações incluíram danças típicas regionais, cânticos, representações ao vivo das aparições de Guadalupana, bem como as "mañanitas" (canção tradicional mexicana de aniversário), o rosário e a Santa Missa. No final das cerimónias, os paroquianos partilharam alguns pratos típicos mexicanos, como os tamales (massa de farinha de milho envolta em palha de milho cozida a vapor), o atole (bebida de farinha de milho) e o "pan de dulce" (pastelaria mexicana).

Nos Estados Unidos, existem dois sítios de Guadalupe que têm uma caraterística única no país: o Catedral de Los Angeles onde se conserva o único fragmento da tilma de Tepeyac, e o santuário de Nossa Senhora de Guadalupe em Des Plaines, Illinois, perto de Chicago, onde os paroquianos podem "pagar as suas mandas" como se estivessem na Cidade do México.

Catedral de Nossa Senhora dos Anjos

Na catedral de Los Angeles, Califórnia, a celebração da Guadalupana 2023 começou no dia 11 de dezembro, às 18h00, com bailarinos tradicionais e o Ballet Folklorico na praça da catedral. Às 22h00, foi rezado o terço no interior da catedral, seguido de um tributo musical com mariachis e cantores convidados. Antes do início da Missa, cantaram-se as "mañanitas" à Virgem. A missa foi presidida pelo Arcebispo José H. Gómez.

Durante a homilia, o prelado referiu: "Esta noite, quando estivermos sob o olhar compassivo da nossa Mãe e olharmos para os seus olhos, reflictamos sobre esta maravilhosa verdade: Jesus Cristo ama-nos tanto que veio partilhar as nossas esperanças e os nossos sonhos e oferecer a sua vida por nós. Dirijamo-nos com confiança a Nossa Senhora de Guadalupe esta noite e digamos-lhe mais uma vez que estamos aqui para servir, que queremos oferecer as nossas vidas como uma oferta de amor a ela e a Jesus.

A Catedral de Los Angeles é o único lugar no mundo fora da Basílica de Guadalupe, no México, que possui um pequeno fragmento da tilma guadalupana. Esta relíquia foi oferecida pelo então arcebispo da Cidade do México como sinal de gratidão e amizade ao arcebispo John J. Cantwell, de Los Angeles, que liderou uma peregrinação à Basílica de Guadalupe no início dos anos 40. É conservada numa capela lateral e está exposta para veneração dos fiéis. A tilma foi analisada cientificamente e é considerado um milagre o facto de ter sobrevivido cinco séculos, apesar de ser feita de fibras naturais de agave, que em condições normais se decompõem facilmente com o tempo. 

Santuário de Nossa Senhora de Guadalupe, Des Plaines

Desde a sua fundação em 2013, o Santuário de Guadalupe na cidade de Des Plaines atrai milhares de peregrinos todos os anos em dezembro, que vêm de todos os Estados Unidos para prestar homenagem à Virgem Maria. As celebrações de Guadalupe 2023 começaram a 11 de dezembro com as "mañanitas" à Virgem antes da meia-noite, seguidas da missa solene.

Durante todo o dia foi rezado o Santo Rosário, alternado com a Santa Missa. À tarde, houve uma encenação das aparições da Virgem. Milhares de pessoas participaram nas várias cerimónias. Vieram de diferentes partes do país, de autocarro, de carro, de bicicleta ou a pé. Os peregrinos trouxeram as suas preocupações e problemas aos pés da Virgem. Outros vieram "pagar as suas mandas", ou seja, as promessas que fizeram à Virgem por um favor recebido.

Muitos paroquianos fizeram a promessa de ir ao México para agradecer pessoalmente à Virgem, mas depois se deram conta de que não poderiam cumpri-la por falta de documentos, dinheiro ou tempo. Perante esta realidade, desde a sua inauguração em 2013, o então Arcebispo da Cidade do México, Cardeal Rivera Carrera, concedeu ao Arcebispo de Chicago uma concessão especial para que os fiéis pudessem "pagar" no Santuário de Guadalupe em Des Plaines "as mandas ou promessas" prometidas à Virgem sem terem de se deslocar à Cidade do México. Esta concessão foi reiterada em 10 de junho de 2023 durante uma visita ao santuário pelo Cardeal Carlos Aguiar Retes, Arcebispo do México.

Durante a homilia da missa concelebrada com o Cardeal Cupich de Chicago, disse: "Jesus acompanha-nos, não só caminhando connosco, mas ajuda-nos a enfrentar os desafios que surgem nas nossas vidas. Ajuda-nos a resolver os problemas e as situações de conflito e a saber desfrutar do encontro com os outros como um encontro de irmãos, como estamos a fazer aqui, enquanto eu represento o México, e o Cardeal meu irmão Blase Cupich, esta grande arquidiocese que recebeu tantos de nós aqui, neste país, sempre sob os cuidados de Maria de Guadalupe".

Mas o que é que os meus olhos vêem!

Belém é um reflexo das realidades últimas, mostra-nos o amor inesgotável de Deus que satisfaz todos os nossos desejos e, ao mesmo tempo, o coração fechado de Herodes que vive um inferno.

15 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Se não o vejo, não acredito. Com esta frase, o materialismo que nos rodeia afasta qualquer referência à transcendência. Mas e se fosse possível ver Deus com os nossos olhos? São Francisco de Assis pensou nisso e conseguiu.

Na primeira biografia escrita do santo, Tomás de Celano conta que, em 1223, quando se encontrava perto da cidade italiana de Greccio, pediu a um certo João, um nobre de boa reputação, que lhe preparasse uma manjedoura para o Natal, a fim de poder contemplar o presépio. As suas palavras foram: "Quero celebrar a memória do menino que nasceu em Belém e quero contemplar de algum modo com os meus olhos o que ele sofreu na sua incapacidade infantil, como foi deitado na manjedoura e como foi colocado sobre o feno entre o boi e o burro".

O cronista descreve como, nessa noite de Natal, o primeiro presépio da história reuniu uma multidão de frades e famílias das redondezas, que vieram com velas e fogueiras acesas, e a alegria com que o santo o contemplou e pregou na Eucaristia que um sacerdote celebrou no próprio presépio. No meio dos cânticos de louvor da comunidade improvisada, um dos presentes teve uma visão extraordinária. Diz-se que viu "uma criança sem vida deitada na manjedoura" e que, quando Francisco se aproximou, acordou do seu sono. Esta visão não é sem sentido", explica o autor, "pois o menino Jesus, sepultado no esquecimento de muitos corações, ressuscitou por sua graça, através de seu servo Francisco, e sua imagem ficou gravada no coração dos apaixonados". No final da solene vigília, todos voltaram para casa cheios de alegria".

No 800º aniversário deste acontecimento único, o costume de reconstituir o nascimento de Jesus para que crianças e adultos possam contemplar "com os seus olhos" o mistério de Belém continua bem vivo.

Há presépios monumentais e em miniatura, vivos e de cerâmica, populares e napolitanos, estáticos ou mecanizados?

Em cada casa, em cada estabelecimento, em cada paróquia, instituição ou confraria há um "João", como o primeiro presépio de Greccio, que, sozinho ou com um grupo de colaboradores, se esforça todos os anos por montar o melhor presépio possível.

Na carta apostólica "O belo sinal da manjedoura Sobre o significado e o valor do presépio, que recomendo a todos que releiam nesta altura do ano, o Santo Padre recordou que "não é importante o modo como o presépio é preparado, pode ser sempre o mesmo ou ser modificado todos os anos; o que conta é que fale à nossa vida". E é verdade que os presépios falam. Falam-nos da presença quotidiana de Deus no meio da nossa vida quotidiana, mesmo que muitas vezes vivamos longe dele. O seu valor como recurso de transmissão e de renovação da fé é inquestionável.

Ainda no outro dia, estava a tentar resolver as dúvidas de um dos meus filhos sobre o que seria o céu. E é realmente difícil imaginar essa "contemplação de Deus" de que fala o Catecismo. "Que maçada ver Deus todo o dia! diz-me a criança. À procura de uma resposta, olhei para o presépio que já estava montado na sala e reparei na alegria da Virgem Maria, de São José, dos anjos, dos pastorinhos, dos reis... Todos estavam cheios de alegria ao contemplar o Menino Deus.

Imagina que estás em Belém, a dormir ao relento", disse eu, "e de repente aparece um coro de anjos e anuncia-te que nasceu o menino Jesus. Irias vê-lo ou não, porque achas aborrecido? 

-Seria espetacular. Ia a correr", respondeu.

-Imagina o céu assim. Um lugar onde, todos os dias, se pode assistir a um acontecimento extraordinário que nos enche de alegria. Um lugar onde os reis e os pobres partilham o mesmo destino e o mesmo desejo: estar perto de Deus, o mais perto possível e durante o maior tempo possível, porque aborrecer-se... Aborrece-se ao ver um bebé, o seu primo, por exemplo?

-Nem pensar, ela é tão engraçada, podia brincar com ela durante horas.

-Porque um velho amargurado não pensaria em criar o Universo para partilhar a sua vida contigo!

À medida que avançávamos, a conversa fez-me compreender ainda mais profundamente como Belém é um reflexo das realidades últimas, pois mostra-nos também o inferno de Herodes, decrépito e triste porque não quis aceitar a boa nova que lhe é dada. No alto do seu castelo, só tem a si próprio e a sua crueldade, longe da comunhão com Deus e com os homens.

Então, mais uma vez, São Francisco conseguiu. Aquela criança adormecida num sono muito profundo ressuscitou graças a ele para me trazer, 800 anos depois, um novo ensinamento, uma nova esperança. E simplesmente contemplando umas figuras de barro. Ver para crer.

O autorAntonio Moreno

Jornalista. Licenciado em Ciências da Comunicação e Bacharel em Ciências Religiosas. Trabalha na Delegação Diocesana dos Meios de Comunicação Social em Málaga. Os seus numerosos "fios" no Twitter sobre a fé e a vida diária são muito populares.

Vaticano

Mons. StaglianòA ciência teológica deve ser cada vez mais concebida como sabedoria".

O presidente da Academia Pontifícia de Teologia e arcebispo emérito de Noto concedeu uma entrevista à Omnes na qual explica, em linhas gerais, as mudanças introduzidas pelo Papa Francisco com o Motu Proprio. Ad theologiam promovendam.

Federico Piana-15 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

"Uma reforma em continuidade". Monsenhor Antonio Staglianò escolhe cuidadosamente estas palavras para começar a descrever as profundas mudanças que o Papa, com a carta sob a forma de motu proprio Ad theologiam promovendamintroduziu nos estatutos da Pontifícia Academia de Teologia a que ele preside. Uma revolução de grande importância que representou mesmo uma mudança de paradigma para a Academia fundada por Clemente XI em 1718.

Numa longa conversa com a Omnes, Staglianò salienta que, normalmente, quando se usa a expressão "revolução paradigmática" na ciência, faz-se referência à obra de Thomas Samuel Kuhn intitulada "Revolução Paradigmática". A estrutura das revoluções científicasem que o filósofo americano explica como a ciência produz perturbações que geram novos métodos e uma nova forma de proceder na própria ciência.

"Tomamos emprestada a ideia de paradigma de Kuhn, mas não podemos deixar de a ler no interior da Igreja. Afinal, a teologia é uma forma eclesial, não apenas a ciência, que deve situar-se na Tradição", diz Staglianò. A revolução está aí, mas na continuidade.

Nova teologia

A construção de uma nova ideia de teologia é a maior novidade desta revolução. Monsenhor Staglianò chama-lhe Teologia da SabedoriaChamamos-lhe assim, de acordo com as instruções do Santo Padre. No fundo, a ciência teológica deve ser concebida cada vez mais como sabedoria". 

E se tudo isto é novo, acrescenta, "é novo em relação ao contexto que se criou desde há 300 anos até hoje, ou seja, desde o Iluminismo e o nascimento da ciência, o conhecimento é cada vez mais concebido em termos intelectualistas, racionalistas". 

Este preconceito que o Iluminismo impôs à cultura, segundo Staglianò, "é um preconceito que deve ser derrubado, porque se o conhecimento é fruto da ciência, então a Revelação cristã não pode ser considerada conhecimento, mas acaba por ser classificada como opinião: porque tudo o que não é conhecimento, o preconceito iluminista coloca-o no domínio da opinião, da não-verdade".

Uma nova língua

Estamos, portanto, perante uma situação incómoda, admite Staglianò: "Por um lado, acreditando na Revelação de Deus em Jesus Cristo, chegamos a conhecer realmente Deus, mas este conhecimento - que seria a Verdade de Deus - segundo a abordagem iluminista não teria o carácter de verdade". 

Por isso, defender que a teologia é sabedoria significa sobretudo pedir que "a indicação de que a teologia é sabedoria se aplique também à teologia". Bento XVI O objetivo da razão é alargar os limites da razão num sentido sapiencial. Isto significa que "a razão deve ser medida em relação a toda a experiência humana". 

O conhecimento vem da Revelação, do Evangelho. E a verdadeira novidade consiste em "recuperar, numa nova linguagem, aquilo que a teologia sempre foi antes de se constituir como ciência: a sabedoria", explica Staglianò.

Teologia sem fronteiras

Uma teologia que se redescobre como sabedoria não tem limites nem fronteiras. "E isto - diz Staglianò - por uma razão missionária que está na base da própria fé cristã. A fé corresponde ao Evangelho, e Jesus é o filho de Deus em carne humana, e é portanto a salvação e a redenção que Deus quis para todos". 

Daí uma consequência lógica que o Presidente da Academia Pontifícia de Teologia resume da seguinte forma: "Se o Evangelho é para todos, então todos podem ouvir o Evangelho: refiro-me também àqueles que pertencem a outras religiões ou mesmo àqueles que não acreditam. 

Todos precisam de ser salvos por Jesus Cristo e aqui, diz Staglianò, "entra a questão do serviço que a teologia sapiencial pode prestar à evangelização da própria Igreja Católica, que, talvez, depois de mais de 2000 anos, precisa de ser revigorada. O grande risco é que ela tenha perdido o verdadeiro rosto de Deus".

Novos instrumentos

Entrar em diálogo com estes mundos diversos e distantes é uma das novas e importantes prioridades da Pontifícia Academia de Teologia. Para o efeito, os novos estatutos prevêem novas estruturas. 

Antes de mais, explica Staglianò, "um Conselho de Estudos Superiores chamado a interagir com as esferas da cultura superior, incluindo a cultura institucional. E depois pensamos em cenáculos teológicos com os quais relacionar a teologia sapiencial com o povo, para falar de Deus através dos temas da vida, da carne sofredora, das questões políticas e sociais".  

Para tudo isto, conclui Staglianò, "seremos ajudados por algumas figuras criadas graças aos novos estatutos: a do interlocutor de referência. Serão pessoas ou grupos de pessoas a quem a Pontifícia Academia de Teologia poderá referir-se para abrir espaços de interlocução alargados".

O autorFederico Piana

 Jornalista. Trabalha para a Rádio Vaticano e colabora com L'Osservatore Romano.

Cultura

"A teologia de Ratzinger é sinfónica", diz Pablo Blanco

O padre Pablo Blanco, recentemente galardoado com o Prémio Ratzinger 2023, foi o orador do Fórum Omnes, no dia 14 de dezembro, com o tema "Bento XVI. Razão e fé".

Loreto Rios-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Na quinta-feira, 14 de dezembro, o Fórum Omnes "Bento XVI. La razón y la fe" com o sacerdote Pablo Blanco, galardoado em novembro deste ano com o prémio Prémio Ratzinger 2023. O colóquio foi moderado por Juan Manuel Burgos, Presidente do Associação Espanhola de Personalismo.

Pablo Blanco é professor de Teologia Dogmática na Universidade de Navarra, além de ser membro do comité editorial que publica em espanhol as obras do Papa Emérito da Universidade de Navarra. Editora BAC. Para além disso, é autor de numerosas publicações em editoras como BAC, Rialp, Palavra, Edições Cristianismo, St. Paul's, o Planeta.

O Fórum, realizado no Universidade de Villanuevafoi patrocinado por Banco Sabadell e a Fundação CARF.

Em primeiro lugar, o professor Blanco reflectiu sobre a relação de Joseph Ratzinger com a fé, "um fio de ouro que atravessa todo o seu pensamento", mas que é também um aspeto "marcadamente cristão", uma vez que o cristianismo nunca hesitou em "entrar em diálogo" com a filosofia e os intelectuais. "Razão e religião é algo que está no ADN do cristianismo", afirmou o professor Blanco, e esta relação diferencia o cristianismo das outras religiões.

Discurso de Regensburg

Pablo Blanco analisou depois em profundidade o discurso de Ratsibona, um dos discursos mais famosos de Ratzinger, que foi inicialmente motivo de grande controvérsia devido a uma citação do imperador bizantino Manuel Paleólogo II, na qual este se referia ao Islão.

No entanto, o Professor Blanco explicou que se tratava inicialmente de um discurso puramente académico, do qual "o todo foi tomado pela parte". O objetivo inicial desta passagem era explicar que a verdade só pode ser proposta, não imposta. "Era uma afirmação pacífica, mas incendiou um rasto de pólvora", explicou o vencedor do Prémio Ratzinger.

Logos

Por outro lado, em relação ao tema da razão no mundo ocidental, Pablo Blanco explicou que o logos é entendido no discurso de Ratzinger como razão criadora, de modo que razão e amor estão intimamente unidos. "Com a nossa capacidade racional podemos compreender a natureza e chegar ao Logos com letra maiúscula. Através das coisas criadas podemos conhecer o mundo e Deus". O Professor Blanco salientou que "isto é uma provocação no mundo alemão".

Além disso, "a união entre o logos grego e a fé é uma constante no cristianismo". Em contraste com as afirmações de Adolf Harnack, que acusava o cristianismo de ter sido helenizado, ou melhor, platonizado, Ratzinger afirma o contrário: o cristianismo cristianizou o helenismo.

Habermas

Por outro lado, Pablo Blanco também se debruçou sobre a relação entre o filósofo Jürgen Habermas e Ratzinger. Habermas queria estabelecer uma ponte entre a fé e a razão porque, embora fosse ateu, via a necessidade de uma "energia moral" que o cristianismo podia fornecer. A fé e a razão podem "curar-se" mutuamente: a razão pode impedir o fundamentalismo da fé e a fé pode impedir que a razão conduza a situações como a de Auschwitz. No entanto, após o discurso de Regensburg, Habermas afirmou que Ratzinger era "anti-moderno", porque interpretou o seu discurso como uma tentativa de regressar ao diálogo entre fé e razão da Idade Média.

No entanto, o Professor Blanco argumenta que se trata de uma falta de compreensão do pensamento de Ratzinger em profundidade, uma vez que o que ele está a fazer é a revisão do conceito iluminista de razão.

Conclusões

Finalmente, a releitura do discurso levou a um entendimento e à declaração de Abu Dhabi entre o Papa Francisco e o Grande Imã de al-Azhar em 2019. "Nunca houve tanto diálogo entre católicos e muçulmanos como na sequência deste discurso, e o diálogo continua", afirma Pablo Blanco.

A concluir a sua reflexão, o Prémio Ratzinger comentou, usando a expressão do Papa Francisco, que a teologia de Ratzinger é "uma teologia ajoelhada, e não uma teologia de gabinete ou de laboratório (...) É uma teologia viva. É sinfónica, tudo se liga a tudo".

No final do colóquio, os participantes puderam fazer perguntas ao Professor Blanco e o diretor da Omnes, Alfonso Riobó, agradeceu a presença de todos e aos patrocinadores pela sua colaboração.

O relatório completo da reunião estará disponível no próximo número da revista Omnes.

Vaticano

O Papa reflecte sobre a inteligência artificial

O Papa Francisco divulgou a sua mensagem para o 57º Dia Mundial da Paz, que se celebrará a 1 de janeiro de 2024, com o tema "Inteligência Artificial e Paz".

Loreto Rios-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 6 acta

No mensagem para o 57º Dia Mundial da Paz o Papa reflecte sobre os aspectos positivos do progresso científico, mas também sobre os desafios éticos que alguns avanços, como a inteligência artificial, colocam.

Em primeiro lugar, Francisco recorda que a Sagrada Escritura afirma que "Deus deu aos homens o seu Espírito para que tenham 'habilidade, talento e experiência no desempenho de todo o tipo de trabalho' (Ex 35,31).

Também na constituição pastoral "Gaudium et spes" do Concílio Vaticano II, se afirma que o homem sempre "se esforçou, com o seu trabalho e engenho, por aperfeiçoar a sua vida". Por isso, o Papa sublinha que o progresso da ciência e da técnica "na medida em que contribui para uma melhor ordem da sociedade humana e para o aumento da liberdade e da comunhão fraterna, leva à perfeição do homem e à transformação do mundo", e exprime a sua alegria pelo progresso da ciência, graças ao qual "foi possível remediar inúmeros males que afectavam a vida humana e causavam grandes sofrimentos".

Riscos e algoritmos

Mas, por outro lado, Francisco salienta que estes desenvolvimentos podem conduzir a uma risco em alguns domínios: "O progresso técnico e científico, que permite exercer um controlo sobre a realidade como nunca antes, coloca nas mãos da humanidade um vasto leque de possibilidades, algumas das quais representam um risco para a sobrevivência humana e um perigo para a casa comum".

Francis menciona também as tecnologias que utilizam algoritmos, que extraem "vestígios digitais deixados na Internet, dados que permitem controlar os hábitos mentais e relacionais das pessoas para fins comerciais ou políticos, muitas vezes sem o seu conhecimento, limitando o seu exercício consciente da liberdade de escolha. De facto, num espaço como a Web, caracterizado por uma sobrecarga de informação, o fluxo de dados pode ser estruturado de acordo com critérios de seleção que nem sempre são percebidos pelo utilizador".

O Papa recorda-nos que as inovações não são "neutras, mas sujeitas a influências culturais. Como actividades plenamente humanas, as direcções que tomam reflectem escolhas condicionadas pelos valores pessoais, sociais e culturais de cada época.

Inteligência artificial

O Papa continua a refletir sobre a inteligência artificial, porque "o próprio termo, que entrou na linguagem comum, engloba uma variedade de ciências, teorias e técnicas destinadas a fazer com que as máquinas reproduzam ou imitem, no seu funcionamento, as capacidades cognitivas dos seres humanos".

"O seu impacto", recorda o Papa, "independentemente da tecnologia de base, depende não só do projeto, mas também dos objectivos e interesses do proprietário e do promotor, bem como das situações em que são utilizados.

Por todas estas razões, Francisco salienta que não se deve partir do princípio de que o desenvolvimento da chamada inteligência artificial trará necessariamente algo de positivo para a humanidade: "Tal resultado positivo só será possível se formos capazes de agir de forma responsável e respeitar os valores humanos fundamentais (...). Não basta assumir, mesmo por parte de quem concebe algoritmos e tecnologias digitais, o compromisso de agir de forma ética e responsável. É necessário reforçar ou, se necessário, criar organismos para examinar as questões éticas emergentes e proteger os direitos das pessoas que utilizam formas de inteligência artificial ou são influenciadas por elas.

Além disso, o Papa reflecte sobre a aprendizagem automática e a aprendizagem profunda, uma tecnologia que, embora esteja "numa fase pioneira, já está a introduzir mudanças significativas no tecido das sociedades, exercendo uma influência profunda nas culturas, nos comportamentos sociais e na construção da paz".

Desinformação e preconceito

Além disso, "a capacidade de alguns dispositivos para produzir textos sintáctica e semanticamente coerentes, por exemplo, não é garantia de fiabilidade (...) Podem (...) gerar afirmações que, à primeira vista, parecem plausíveis, mas que, na realidade, são infundadas ou revelam parcialidade. Isto cria um problema grave quando a inteligência artificial é utilizada em campanhas de desinformação que espalham notícias falsas e conduzem a uma desconfiança crescente em relação aos meios de comunicação social. A confidencialidade, a propriedade dos dados e a propriedade intelectual são outras áreas em que as tecnologias em causa apresentam sérios riscos, com outras consequências negativas associadas à sua utilização indevida, como a discriminação, a interferência nos processos eleitorais, a criação de uma sociedade que vigia e controla as pessoas, a exclusão digital e a intensificação de um individualismo cada vez mais desligado do coletivo.

Além disso, o Papa sublinha que os algoritmos não podem fornecer "previsões garantidas do futuro, mas apenas aproximações estatísticas. Nem tudo pode ser previsto, nem tudo pode ser calculado (...). Além disso, a grande quantidade de dados analisados pelas inteligências artificiais não é, por si só, uma garantia de imparcialidade. Quando os algoritmos extrapolam a informação, correm sempre o risco de a distorcer, reproduzindo as injustiças e os preconceitos dos ambientes em que têm origem. Quanto mais rápidos e complexos se tornam, mais difícil é compreender porque é que geraram um determinado resultado.

Por outro lado, as inteligências artificiais não são imparciais, "o objetivo e o sentido das suas operações continuarão a ser determinados ou possibilitados por seres humanos que têm o seu próprio universo de valores". O risco", sublinha o Papa, "é que os critérios subjacentes a certas decisões se tornem menos transparentes, que a responsabilidade das decisões seja escondida e que os produtores possam fugir à obrigação de atuar para o bem da comunidade".

Por isso, é importante o "sentido dos limites", que, segundo Francisco, é "um aspeto muitas vezes negligenciado na mentalidade tecnocrática e eficientista atual, mas decisivo para o desenvolvimento pessoal e social". O ser humano, de facto, mortal por definição, pensando em ultrapassar todos os limites graças à tecnologia, corre o risco, na obsessão de querer controlar tudo, de perder o controlo de si mesmo e, na busca de uma liberdade absoluta, de cair na espiral de uma ditadura tecnológica".

Discriminação e injustiça

O Papa sublinha que todas estas questões colocam grandes desafios éticos: "No futuro, a fiabilidade de um mutuário, a aptidão de um indivíduo para um emprego, a possibilidade de reincidência de uma pessoa condenada ou o direito de asilo político ou de assistência social poderão ser determinados por sistemas de inteligência artificial (...) Os erros sistémicos podem facilmente multiplicar-se, produzindo não só injustiças em casos individuais mas também, por efeito dominó, autênticas formas de desigualdade social".

Por outro lado, existe o risco de influência e de limitação da liberdade humana, uma vez que "as formas de inteligência artificial parecem frequentemente capazes de influenciar as decisões dos indivíduos através de escolhas predeterminadas associadas a estímulos e persuasões, ou através de sistemas de regulação das escolhas pessoais baseados na organização da informação. Estas formas de manipulação ou de controlo social exigem uma atenção e um controlo precisos e implicam uma responsabilidade jurídica clara por parte dos produtores, dos utilizadores e das autoridades governamentais.

O Papa recorda-nos que os direitos humanos devem estar sempre em primeiro lugar: "Não devemos permitir que os algoritmos determinem a forma como entendemos os direitos humanos, que ponham de lado os valores essenciais da compaixão, da misericórdia e do perdão, ou que eliminem a possibilidade de um indivíduo mudar e deixar o passado para trás".

Além disso, outra questão importante a considerar é o impacto "das novas tecnologias no local de trabalho. Os empregos que outrora eram do domínio exclusivo do trabalho humano estão a ser rapidamente absorvidos pelas aplicações industriais da inteligência artificial.

Armas

Outra das grandes preocupações do Papa neste domínio é a corrida aos armamentos: "A possibilidade de conduzir operações militares por meio de sistemas telecomandados levou a uma menor perceção da devastação que causaram e da responsabilidade pela sua utilização, contribuindo para uma abordagem ainda mais fria e distante da imensa tragédia da guerra. A prossecução de tecnologias emergentes no domínio dos chamados "sistemas de armas letais autónomas", incluindo a utilização da inteligência artificial na guerra, constitui uma preocupação ética de monta.

Os sistemas de armas autónomos nunca poderão ser sujeitos moralmente responsáveis. A capacidade exclusivamente humana de julgamento moral e de tomada de decisões éticas é mais do que um conjunto complexo de algoritmos e não pode ser reduzida à programação de uma máquina que, embora "inteligente", não deixa de ser uma máquina. Por esta razão, é imperativo assegurar um controlo humano adequado, significativo e coerente dos sistemas de armamento".

Além disso, outro aspeto a ter em conta é "a possibilidade de armas sofisticadas poderem ir parar às mãos erradas, facilitando, por exemplo, ataques terroristas ou acções destinadas a desestabilizar instituições governamentais legítimas".

Educação

O Papa recorda também que estas tecnologias podem ter um impacto na educação e sublinha a necessidade de "promover o pensamento crítico". Os utilizadores de todas as idades, mas sobretudo os jovens, devem desenvolver uma capacidade de discernimento na utilização dos dados e dos conteúdos obtidos na Internet ou produzidos pelos sistemas de inteligência artificial. As escolas, as universidades e as sociedades científicas são chamadas a ajudar os estudantes e os profissionais a apropriarem-se dos aspectos sociais e éticos do desenvolvimento e da utilização das tecnologias.

Apelo à comunidade internacional

Na mensagem, o Papa indica que estas preocupações não são da responsabilidade de alguns, mas de todos os seres humanos, e que a utilização deste tipo de tecnologia deve ser regulada: "Exorto a comunidade das nações a trabalhar em conjunto para adotar um tratado internacional vinculativo que regule o desenvolvimento e a utilização da inteligência artificial nas suas múltiplas formas".

"A minha oração no início do novo ano é que o rápido desenvolvimento das formas de inteligência artificial não aumente as já numerosas desigualdades e injustiças presentes no mundo, mas ajude a pôr fim às guerras e aos conflitos e a aliviar tantas formas de sofrimento que afectam a família humana", conclui o Papa.

Vaticano

A caminho do veredito do "julgamento do século" no Vaticano. O que precisa de saber

O veredito de culpa ou inocência dos dez arguidos e das quatro empresas relacionadas com o chamado caso Becciu será anunciado a 16 de dezembro, embora o veredito completo, com os motivos e as alegações, seja conhecido mais tarde.

Andrea Gagliarducci-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 5 acta

Foi apelidado de "o julgamento do século". Na realidade, porém, o processo do Vaticano sobre a gestão dos fundos da Secretaria de Estado assemelha-se mais a um processo de direito comercial, sendo as acusações mais comuns a corrupção, a fraude e o desvio de fundos.

Mesmo assim, o processo ganhou repercussão internacional porque, pela primeira vez, um cardeal, Angelo Becciu, foi acusado num tribunal do Vaticano. Até ao Motu proprio do Papa Francisco de 30 de abril de 2021De facto, os cardeais só podiam ser julgados pela Cassação do Vaticano, que é um colégio de três cardeais. 

O veredito, ou seja, a declaração de "culpado" ou "inocente" dos dez arguidos e das quatro empresas em prisão preventiva, será anunciado a 16 de dezembro. Em contrapartida, o veredito completo, fundamentado, deverá ser publicado alguns meses mais tarde.

No entanto, o dispositivo terá de ser interpretado, uma vez que as acusações são múltiplas, por vezes intersectadas e envolvendo vários arguidos, e estão sujeitas a alterações.

Também é possível que o tribunal decida que certas infracções não são exatamente as que constam da acusação prevista pelo Ministério Público, decidindo penas mais leves ou simplesmente declarando que os actos cometidos não constituem um crime. Para o fazer, é necessário começar por compreender em que consiste o julgamento. 

Um ensaio, três ensaios

Os investigadores seguiram três pistas muito diferentes, todas relacionadas com a questão da "gestão dos fundos da Secretaria de Estado". 

A primeira pista é a mais importante: o investimento da Secretaria de Estado nas acções de uma mansão de luxo em Londres, por cerca de 200 milhões de euros. O investimento foi entregue primeiro ao agente Raffaele Mincione e depois ao agente Gianluigi Torzi. Torzi, por sua vez, ficou com as acções do investimento e manteve apenas as 1.000 acções com direito de voto, mantendo assim o controlo total da propriedade.

Por conseguinte, o Secretaria de Estado decidiu comprar as acções e assumir o controlo do edifício. A negociação que levou a Secretaria de Estado a pagar a Torzi uma indemnização pela perda das acções foi considerada "extorsão" pelos investigadores do Vaticano. A Santa Sé vendeu então o palácio sem realizar as operações de desenvolvimento previstas (o investimento não era tanto no palácio em si, mas num projeto para o ampliar e reafectar a sua utilização para fins de arrendamento) por um preço inferior ao valor de mercado. De acordo com a Promotoria de Justiça do Vaticano, o prejuízo para a Santa Sé situar-se-ia entre 139 e 189 milhões de euros. 

125 000 euros à Caritas de Ozieri, na Sardenha, a diocese natal do Cardeal Angelo Becciu. O dinheiro foi entregue pela Caritas à SPES, uma cooperativa ligada à Caritas que desenvolve actividades sociais, e destinava-se a cobrir os custos de uma padaria criada para criar empregos para os marginalizados e a construção de uma "cidadela de caridade". O crime seria o de peculato, porque, segundo a acusação, Becciu utilizou o dinheiro da Secretaria de Estado para fins pessoais e para enriquecer a sua família.

A terceira pista diz respeito à contratação pela Secretaria de Estado de Cecilia Marogna, uma autodenominada especialista em inteligência que alegou colaborar na libertação de alguns reféns, incluindo o da Irmã Cecilia Narvaez, a freira colombiana sequestrada no Mali em 2017. A mulher, segundo a procuradoria, teria gasto para si dinheiro que havia sido destinado pela Secretaria de Estado para completar as operações de libertação.

O que os arguidos arriscam

O promotor de justiça do Vaticano pediu penas totais de 73 anos e um mês de prisão, bem como várias inibições de direitos e multas. De acordo com o promotor de justiça Alessandro Diddi, o fio condutor destas três linhas de investigação é sempre e apenas o Cardeal Angelo Becciu. Pouco importa que Becciu tenha estado envolvido no negócio do palácio de Londres apenas no início, porque foi sob a sua gestão que começou a venda e a compra das acções do edifício.

Precisamente porque o cardeal nunca deu sinais de arrependimento, foi-lhe pedida a pena máxima possível: 7 anos e 3 meses de prisão, inibição de funções públicas, uma multa de 10.329 euros e um pedido de confisco de 14 milhões.

Para René Bruelhart, antigo presidente da Autoridade de Informação Financeira, foi pedida uma pena de prisão de 3 anos e 8 meses, a inibição temporária do exercício de funções públicas e uma coima de 10 329 euros.

Para Tommaso Di Ruzza, diretor da Autoridade de Informação Financeira, foi pedida uma pena de prisão de 4 anos e 3 meses, uma inibição temporária do exercício de funções públicas e uma coima de 9600 euros.

Para o Monsenhor Mauro Carlino, que era o secretário do deputado na altura da operação, são pedidos 5 anos e 4 meses de prisão, inibição vitalícia de funções públicas e uma multa de 8.000 euros.

Enrico Craso, que foi diretor financeiro da Secretaria de Estado através do Credit Suisse, deverá cumprir 9 anos e 9 meses de prisão, uma multa de 18.000 euros e a inibição vitalícia de exercer funções públicas, segundo a acusação.

Cecilia Marogna incorre numa pena de 4 anos e 8 meses de prisão, inibição vitalícia de exercer funções públicas e uma coima de 10 329 euros.

Raffaele Mincione incorre numa pena de 11 anos e 5 meses de prisão, inibição vitalícia de funções públicas e uma multa de 15450 euros, enquanto Gianluigi Torzi incorre numa pena de 7 anos e 6 meses de prisão, inibição vitalícia de funções públicas e uma multa de 9000 euros. 

Para o advogado Nicola Squillace, que alegou ter agido em nome do Secretário de Estado, 6 anos de prisão, suspensão do exercício da sua profissão e uma coima de 12500 euros. 

A pena mais elevada pedida foi para o funcionário da Secretaria de Estado Fabrizio Tirabassi: 13 anos e 3 meses de prisão, inibição vitalícia de funções públicas e uma coima de 18750 euros. 

Além disso, a Secretaria de Estado do Vaticano, a Administração do Património da Sé Apostólica e a Instituto para Obras de Religião juntaram-se ao processo como demandantes civis: o primeiro pediu uma indemnização pelos danos de imagem causados pelas operações entre 97 e 177 milhões de euros, enquanto o IOR pediu a restituição de 206 milhões de euros e quase um milhão de euros por danos morais e de reputação ao Instituto.

Defesas

As defesas apontaram o que consideram ser contradições na reconstrução do promotor de Justiça e pediram a absolvição dos seus arguidos, por duas razões principais: porque o ato não existe e porque o ato não constitui um crime.

Segundo os arguidos, não houve crime de investimento, nem foi apresentada qualquer prova de que as perdas na compra do edifício constituíssem um crime. A defesa sublinhou também que não havia provas de que o Cardeal Angelo Becciu e a sua família tivessem recebido fundos ilegalmente, pelo que não podia ser acusado de peculato. Por último, a defesa acusou o promotor de justiça do Vaticano de inventar um teorema, independentemente do resultado da audiência.

A sentença permitirá compreender a resiliência do sistema judicial do Vaticano. Se for demonstrado que as investigações foram caracterizadas pela parcialidade, como alegam as defesas, isso poderá minar o próprio sistema judicial do Vaticano. Já um juiz londrino, Baumgartner, num processo relacionado com este processo, chamou às conclusões das investigações uma descaraterização, uma acusação que o promotor de Justiça devolve ao remetente. 

A presença de nada menos do que quatro rescritos papais que alteraram apressadamente as regras da investigação é também uma questão importante. Os rescritos dizem respeito apenas a este processo. Mas será que um processo justo se pode caraterizar por decisões extemporâneas?

O autorAndrea Gagliarducci

Vaticano

O Cardeal Pell compreendeu a reforma económica da Santa Sé antes de outros o fazerem

Numa carta dirigida ao Dicastério para a Economia, o Papa Francisco reconhece os passos dados para melhorar a gestão económica da Santa Sé e oferece mais indicações sobre como continuar o caminho, desde o reconhecimento de uma remuneração justa até investimentos justos.

Giovanni Tridente-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 4 acta

O Cardeal George PellNo seu papel de primeiro prefeito da Secretaria para a Economia, demonstrou coragem e - como na vida cristã - zelo, convicção e determinação, tendo "visto" e compreendido antes dos outros "qual era o caminho a seguir". O Papa Francisco colocou-o preto no branco numa carta dirigida às pessoas que trabalham na Secretaria para a Economia. Economiaescrita uma semana depois de as ter recebido numa audição em meados de novembro.

Naquela ocasião, o Santo Padre lançou um convite a avançar no caminho já iniciado há quase dez anos com a constituição do Organismo, especialmente no que diz respeito à transparência, ao controlo e a procedimentos mais ágeis e eficientes no seio da Cúria Romana.

Conceitos que agora reitera com mais clareza nesta carta divulgada pelo mesmo Dicastério para a Economia a 12 de dezembro: "Olhando para a situação atual, não posso deixar de ver os muitos progressos que foram feitos", começou Francisco, sublinhando também as numerosas apreciações recebidas pelo trabalho realizado na sequência das indicações do primeiro prefeito Pell, para que o património da Santa Sé fosse orientado para a missão, evitando os riscos e os erros do passado.

As bases lançadas pelo Cardeal Pell permitiram aos seus sucessores promover novas reformas, muitas das quais foram aprovadas sob a direção do Padre Juan Antonio Guerrero, que trabalhou "com um estilo baseado no diálogo, na concretude e na simplicidade", reconhece o Pontífice.

A viagem ainda agora começou

Mas o caminho da reforma não está de modo algum terminado. "Pelo contrário", escreve o Papa, "está apenas a começar", porque como para todas as realidades vivas da Igreja em geral, e da Cúria Romana em particular, é sempre necessário orientar-se para o que é melhor, mantendo-se atento aos efeitos das várias mudanças, adaptando-se onde for necessário.

"Não devemos esquecer - acrescenta o Santo Padre - que a boa gestão do património e a sua utilização é um testemunho dado a todos de como se pode fazer muito com pouco", e o trabalho desenvolvido por aqueles que trabalham neste contexto de "economia de missão" é um verdadeiro serviço prestado à Igreja universal.

Trata-se, sem dúvida, de um trabalho "delicado", porque o risco de transformar a autoridade em mando ou o reconhecimento e o respeito em medo está ao virar da esquina, bem como a tentação de "exercer o poder em vez de tomar decisões" ou mesmo de evitar utilizar o dinheiro onde ele é necessário para aumentar e fazer florescer a missão da Igreja, por exemplo, nas circunstâncias "onde há mais necessidade de forma desinteressada".

Um alerta claro para investir adequadamente os recursos, a par da necessidade de exercer a "capacidade de ouvir e ser ouvido", mas também de envolver as várias competências profissionais e técnico-económicas não com base na "vontade arbitrária de quem decide ou autoriza", mas com o objetivo de orientar as várias iniciativas a apoiar "para o bem comum".

É claro que também é necessário ser leal para saber "dizer não quando o que lhe é apresentado ou o que encontra nos controlos trai a missão", mais a favor de interesses particulares, ou com a violação das regras para fins estranhos à Santa Sé e à Igreja e à sua missão.

Prudência e lealdade

"Prudência e lealdade", pede o Papa, "para o bem comum da nossa comunidade de trabalho, da Igreja, dos fiéis e dos necessitados". Um serviço que deve certamente ser efectuado com "profissionalismo, dedicação, estudo aprofundado", sem, no entanto, esquecer "a humildade, a disponibilidade para ouvir, o espírito de serviço e, finalmente, a vigilância e a cultura da legalidade e da transparência".

Perante o défice económico da Santa Sé, que corrói anualmente uma parte do seu património, o Papa apela a "inverter a tendência", convidando todos a "estarem dispostos, com modéstia e espírito de serviço, a renunciar aos seus interesses particulares pelo bem comum", libertando-se da rigidez e abrindo-se à atualização.

Recompensar o mérito

O pensamento do Pontífice é, por um lado, contratar novas figuras - competentes, eticamente preparadas e profissionais - mas também dar aos que já trabalham na Santa Sé a possibilidade de se renovarem, oferecendo-lhes "formação, oportunidades de crescimento, novas experiências", sem diminuir os sinais de confiança e reconhecimento. Isto significa também "uma remuneração justa", "tanto mais justa quanto mais ligada aos resultados e ao contributo que cada um dá ao serviço da Igreja". Evitar o carreirismo, mas certamente premiar o mérito.

O mesmo se deve aplicar aos fornecedores externos a que a Santa Sé recorre: "ética, competência e profissionalismo, ao preço certo para um lucro justo", como já foi regulamentado nos últimos anos. E para o património em geral, cujos frutos da gestão devem também ser partilhados de forma equitativa "para que todos tenham aquilo de que realmente necessitam".

Os investimentos, especifica ainda o Papa Francisco, "não devem ter nem o objetivo de especulação nem o de acumulação" e o mesmo se deve aplicar aos orçamentos e dotações à disposição das várias entidades, para que não haja "entidades ricas e entidades pobres", mas sim harmonia em toda a Santa Sé, porque todos "participam na realização e na busca do mesmo bem".

O autorGiovanni Tridente

Recursos

Vós e Deus preparai-vos para a festa. Coleta do 3º Domingo do Advento

Estamos a meio do Advento e a Igreja surpreende-nos com este domingo chamado GaudeteTrata-se de uma alusão à antífona de entrada da Missa: "Alegrai-vos sempre no Senhor; repito-vos, alegrai-vos. O Senhor está próximo" (Fil 4,4-5).

Carlos Guillén-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

É precisamente esta alegria, motivada pela proximidade do Senhor, que se reflecte também na correspondente oração coleta:

Ó Deus, que contemplais a fidelidade com que o vosso povo espera a festa do nascimento do Senhor, concedei-nos que nos alegremos com tão grande acontecimento de salvação e o celebremos sempre com solenidade e alegria transbordante.

Deus, qui cónspicis pópulum tuum nativitátis domínicae festivitátem fidéliter exspectáre, presta, quaésumus, ut valeámus ad tantae salútis gáudia perveníre, et ea votis sollémnibus semper laetítita celebráre.

Mais uma vez, os responsáveis pela reforma litúrgica acharam por bem transferir a antiga oração em uso para outro dia e encontrar uma que reflectisse melhor a essência deste domingo. Com pequenas modificações, utilizamos atualmente esta oração, que provém do Ritual de Ravena (século VIII). 

Na sua estrutura, encontramos uma breve invocação (Deus), a anamnese que se refere à aproximação do Natal e uma oração subordinada que introduz uma epiclese com duas petições.

Esperar, chegar e festejar

O uso abundante de verbos nesta frase é interessante. Por um lado, os verbos com forma pessoal apresentam-nos dois sujeitos: Deus e o seu povo. Deus é aquele que contempla (conspícuo) sempre com amor paternal e benevolente pelo seu povo peregrino. Nós, como seu povo, dirigimo-nos a ele com confiança filial para lhe pedir (quaésumus) a vossa ajuda, para que possamos (valeámus) para alcançar os bens de salvação que Ele nos destinou. Este é o dinamismo de toda a vida cristã.

Por outro lado, os três verbos que aparecem no infinitivo dão-nos uma boa ideia das atitudes com que a Igreja se coloca neste tempo litúrgico. 

Em primeiro lugar, há a espera (exspectáre): aguardar com esperança o nascimento do Salvador. Sem dúvida, isto desperta no cristão um forte desejo e este desejo origina nele, nela, o movimento de querer ir ao encontro (perveníre) esse horizonte maravilhoso que Deus abre aos olhos da fé. E, claro, a chegada tornar-se-á uma festa (celebrar), com a sua dupla nuance: de celebração, logicamente, mas também de ação litúrgica e, portanto, de participação real e efectiva no mistério da salvação.

Alegria e solenidade

A última ação mencionada, a celebração do nascimento do Senhor, é acompanhada por duas características que lhe dão um tom particular: a alegria (laetítia) e solenidade (votis sollémnibus). 

A alegria é a caraterística específica deste terceiro domingo do mês. Advento. Uma alegria particularmente viva, animada e entusiástica (alacri). Desta forma "muito alegre", Deus encoraja-nos a não nos contentarmos com a alegria que já temos, mas a procurarmos uma alegria mais plena. Uma plenitude que só é possível aproximando-nos dele, confiando mais nele, deixando-nos amar mais por ele. Mesmo sabendo que, no fim de contas, só alcançaremos a alegria perfeita depois desta vida. E, precisamente por isso, compreendemos a necessidade de corresponder mais plenamente à graça de Deus aqui na terra, aproveitando ao máximo o tempo que Deus nos dá.

A outra caraterística a que nos referimos são os ritos solenes e esplêndidos que costumam acompanhar o Natal. Certamente que têm como objetivo ajudar-nos a saborear a bem-aventurança do Céu, juntando-nos já à felicidade perfeita dos coros dos anjos e dos santos. 

Mas, paradoxalmente, tal celebração contrasta radicalmente com a humildade do nascimento do Menino Deus em Belém, numa manjedoura. E contrasta também com a nossa pequenez pessoal, com a nossa falta de mérito e, por vezes, com as nossas derrotas. Talvez assim possamos ver que Deus tem mesmo de providenciar tudo. É ele que faz a festa. Sem Deus, sem a Redenção, não haveria motivo para festejar. Sem dúvida, foi Deus que nos deu o direito de festejar. Mesmo que ainda festejemos sob o véu deste mundo que passa, é uma realidade que o motivo da nossa alegria e da nossa festa já está connosco, e isso é razão suficiente para querermos transformar a nossa vida.

O autorCarlos Guillén

Sacerdote do Peru. Liturgista.

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Estados Unidos da América

O Departamento de Segurança Interna dos EUA procura aumentar a proteção nos locais de culto.

Os locais de culto católico, cristão, judeu e muçulmano tornaram-se alvos potenciais de vandalismo ou ataques, especialmente desde o conflito entre Israel e o Hamas.

Gonzalo Meza-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Desde 2020, registaram-se pelo menos 308 incidentes de vandalismo e destruição em paróquias ou capelas de igrejas nos Estados Unidos. Fogo posto, imagens destruídas, vitrais, objectos litúrgicos roubados, paredes e portas pintadas com linguagem anti-católica, são alguns dos casos de vandalismo ocorridos nos últimos três anos.

Por vezes, estes crimes podem transformar-se em ataques de ódio que resultam na perda de vidas, como aconteceu em 2017 na Igreja de Santo Agostinho em Des Moines, Iowa. Noutras ocasiões, os ataques podem ser cibernéticos, como aconteceu em 2019 na Igreja de Santo Ambrósio, em Brunswick, Ohio, um crime cibernético que causou perdas de milhões de euros. As ameaças aos locais de culto nos EUA são cada vez mais complexas e generalizadas, variando de actos de vandalismo ou ciberataques a ataques com armas.

Perante esta realidade, o Arcebispo Timothy Dolan, Arcebispo de Nova Iorque e presidente do Comité para a Liberdade Religiosa da USCCB, observou em 2022: "Os bispos dos EUA registaram uma tendência preocupante de vandalismo nas igrejas católicas. Não estamos sós. Os nossos amigos de outros grupos religiosos também sofrem estes ataques e, em algumas comunidades, ocorrem com maior frequência".

Locais de culto católicos, cristãos, judeus e muçulmanos tornaram-se alvos potenciais de vandalismo ou ataques, especialmente desde o conflito entre Israel e o Hamas. O diretor do FBI, Christopher Wray, referiu numa comparência perante os legisladores, a 6 de dezembro, que os crimes de ódio nos EUA têm vindo a aumentar há algum tempo, mas o número de casos aumentou 60 % desde outubro de 2023.

Segurança para as comunidades religiosas

Em resposta a estes desenvolvimentos, o Departamento de Segurança Interna (DHS), através da Agência para a Segurança das Infra-estruturas e Cibersegurança, publicou em 6 de dezembro um conjunto de directrizes de segurança para locais de culto. O documento de 16 páginas, intitulado "Physical Security Performance Goals for Religious Communities", contém uma série de acções especificamente concebidas para ajudar as organizações religiosas a planear, proteger os seus edifícios e responder a ameaças.

"Os objectivos de desempenho em matéria de segurança física que hoje divulgamos proporcionam às igrejas, sinagogas, mesquitas e outras instituições religiosas estratégias acessíveis e facilmente implementáveis para melhorar a sua segurança e reduzir o risco para as suas comunidades", afirmou Alejandro N. Mayorkas, Secretário do Departamento de Segurança Interna. Jen Easterly, Directora da Agência do DHS responsável pela Agência de Cibersegurança e Infra-estruturas do DHS, afirmou: "A agência tem uma longa história de apoio às comunidades religiosas para melhorar as práticas de segurança física e cibernética. 

Algumas das recomendações apresentadas no documento são: Monitorizar os pontos de acesso com sistemas de videovigilância, colocar iluminação exterior activada por movimento, instalar alarmes em janelas e portas, controlar o acesso a áreas reservadas como escritórios, instalações eléctricas ou informáticas. No caso das escolas, recomenda-se a existência de um único ponto de entrada controlado.

Para prevenir os ciberataques, a agência recomenda a atualização regular do software, a exigência de palavras-passe fortes para aceder aos ficheiros do computador, a proteção dos dados com métodos de encriptação e a verificação da existência de ligações ou dispositivos não autorizados nos computadores. O texto sugere ainda a formação de uma equipa de planeamento de segurança com membros da comunidade e a existência de um líder, idealmente com experiência profissional na área, para ajudar em situações de emergência.

O DHS também recomenda que os líderes de grupos religiosos entrem em contacto com os agentes e agências locais de aplicação da lei para saberem como podem ajudar a lidar com uma emergência quando esta surgir.

Evangelho

O amigo do noivo. Terceiro Domingo do Advento (B)

Joseph Evans comenta as leituras do terceiro domingo do Advento e Luis Herrera faz uma breve homilia em vídeo.

Joseph Evans-14 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

O que sobressai no Evangelho de hoje é a transparência de João Batista: a luz da verdade de Deus flui através dele como através da mais clara das janelas. De facto, o evangelista usa a luz como metáfora para descrever o ministério do Batista: "Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos acreditem por meio dele. Ele não era a luz, mas aquele que dava testemunho da luz".

E a sinceridade de João, a sua clareza, transparece nesta passagem: "...a verdade, a clareza, de João transparece nesta passagem: "...".E este é o testemunho de João, quando os judeus enviaram sacerdotes e levitas de Jerusalém para lhe perguntarem: "Quem és tu?" Ele confessou e não negou; confessou: "Eu não sou o Messias"".. Ele vê-se apenas como uma "voz" no deserto: não o conteúdo, a Palavra (que é o próprio Cristo), mas apenas um meio que a Palavra utiliza para transmitir a sua mensagem, tal como a nossa voz poderia falar as palavras, as ideias, de outra pessoa.

E quando os sacerdotes e os levitas enviados de Jerusalém perguntam a João porque é que ele baptiza, se não é o Cristo, nem Elias, nem o profeta anunciado por Moisés, ele responde: "Eu batizo com água; no meio de vós há um que não conheceis, aquele que vem depois de mim e cuja correia das sandálias não sou digno de desatar.". O que confere tanta autoridade ao testemunho de João é a sua extraordinária humildade. Ele é muito claro sobre o pouco que é e o que não é: ele não é o Cristo, ele não é o conteúdo da mensagem, mas um mero meio para a sua transmissão. Considera-se mesmo indigno de ser escravo de Cristo: indigno de fazer o trabalho do escravo de desamarrar as sandálias do seu senhor.

Noutra passagem (Jo 3,28-30), que também mostra a humildade de João, ele descreve Cristo como o "marido" dos casamentos e o seu próprio papel como mero "amigo do marido". cuja voz "regozija-se". muito para ouvir. Por isso, não é de estranhar que a Igreja nos ofereça como primeira leitura de hoje um belo texto de Isaías, que também exprime alegria na expetativa da salvação: "Transbordo de alegria no Senhor e regozijo-me com o meu Deus"..

Enquanto os mensageiros das autoridades judaicas se mostram tão sérios e sem alegria ("Quem és tu, para que possamos dar resposta a quem nos enviou? Que dizes de ti mesmo?"), João regozija-se humildemente. Saber que não somos importantes, meros servidores da verdade, é profundamente libertador.

Homilia sobre as leituras do terceiro domingo do Advento (B)

O sacerdote Luis Herrera Campo oferece a sua nanomiliaUma breve reflexão de um minuto para estas leituras dominicais.

Cultura

Santa Lúcia, testemunha da verdade e da luz

Hoje, 13 de dezembro, celebramos Santa Luzia, uma mártir cristã que foi decapitada em 304 sob o imperador Diocleciano. Desde o século XV, a devoção popular identificou Santa Luzia como a padroeira da visão, sendo organizados eventos em muitos países do mundo.

Antonino Piccione-13 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

"Lúcia, mártir de Siracusa, recorda-nos com o seu exemplo que a mais alta dignidade da pessoa humana consiste em dar testemunho da verdade, seguindo a própria consciência a todo o custo, sem duplicidade e sem compromissos. O Papa Francisco, há apenas um ano, dirigiu-se assim aos membros da União Italiana de Cegos e Deficientes Visuais (UICI), recebidos em audiência na Sala Clementina, na véspera da memória litúrgica de Santa Luzia, padroeira dos deficientes visuais.

A fragilidade é um recurso: "Isto significa estar", acrescentou o Santo Padre, "do lado da luz, ao serviço da luz, como o próprio nome Lúcia evoca. Sejam pessoas claras, transparentes, sinceras; comuniquem com os outros de forma aberta, clara, respeitosa. É assim que ajudais a difundir a luz nos ambientes em que viveis, para os tornar mais humanos, mais habitáveis".

Hoje, 13 de dezembro, celebramos Santa Luzia, uma mártir cristã que foi decapitada em 304 sob o imperador Diocleciano. Desde o século XV, a devoção popular identificou Santa Luzia como a padroeira da visão, sendo organizados eventos em muitos países do mundo.

A história de Lúcia começa em Siracusa, entre 280 e 290 d.C.. Nascida no seio de uma família abastada, fica órfã e é desposada por um patrício. A sua vida sofre uma grande reviravolta quando a sua mãe, Eutichia, adoece gravemente. Durante uma peregrinação ao túmulo de Santa Ágata, Lúcia reza pela recuperação da mãe, altura em que tem uma visão em que Santa Ágata lhe anuncia o seu destino como futura padroeira de Siracusa. Após a recuperação da mãe, Lúcia dedicou a sua vida a servir o Senhor, distribuindo os seus bens pelos pobres. Foi perseguida por se recusar a casar, mas apesar das torturas e da ameaça de morte, Lúcia manteve-se firme na sua fé cristã até ao dia em que foi decapitada.

Ao contrário do que se pensa, o dia 13 de dezembro não coincide com o dia mais curto do ano, uma vez que coincide com o solstício de inverno, a 22 de dezembro. No entanto, no período entre 13 e 14 de dezembro, pode desfrutar de um espetáculo celeste com as Geminídeas, semelhante às Perseidas em agosto.

Diz-se que, após a sua conversão ao cristianismo, Santa Luzia perdeu a visão ou mesmo arrancou os olhos, numa tentativa de resistir ao pecado. Em Itália, existe a tradição de que ela leva presentes às crianças, que tem origem num gesto de generosidade atribuído à santa. Após a sua morte, segundo a lenda, Santa Luzia regressa à terra para trazer felicidade às crianças na noite de 13 de dezembro, simbolizando a luz que trouxe ao mundo. A figura de Santa Luzia evoluiu assim no folclore italiano como uma espécie de Pai Natal antecipado que leva alegria e presentes aos mais pequenos, num gesto carregado de significado espiritual. Esta tradição, enraizada na generosidade e no simbolismo, contribuiu para moldar a iconografia da santa como uma figura luminosa e benéfica, especialmente amada pelas crianças.

Em todo o mundo há celebrações diferentes e atractivas ligadas a Santa Luzia. Em Siracusa, a cidade da qual é padroeira, a Festa Nacional das Luzes e da Renovação realiza-se a 12 de dezembro, antecipando a procissão com uma estátua de prata pelas ruas no dia da festa. Na Suécia, as raparigas vestidas de branco levam em procissão biscoitos e pãezinhos de açafrão, usando vestidos brancos que simbolizam a pureza. Na Toscânia, a "Fiera di Santa Lucia" oferece produtos típicos, doces e decorações de Natal, enquanto em Florença a árvore de Natal é acesa com música e brindes.

Noutras partes de Itália, como em Lucca, o hospital de San Luca organiza iniciativas para este dia dedicado ao santo padroeiro da visão. Uma das tradições desta festa é a bênção dos olhos, e haverá também um concerto da banda da brigada de pára-quedistas Folgore. A catedral de Milão, também envolvida na celebração da santa, conserva uma cópia da sua estátua, na qual Lúcia é representada com os olhos sobre um pires, simbolizando o facto de ser a padroeira dos pedreiros.

O autorAntonino Piccione

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Mundo

"A minha mãe ensinou-nos que tínhamos de perdoar", diz a vítima do Boko Haram

A Ajuda à Igreja que Sofre lançou uma campanha para ajudar a Igreja nigeriana com o slogan "Help Nigeria. Igreja martirizada, Igreja viva". De acordo com o Relatório sobre a Liberdade Religiosa lançado pela AIS este ano, "a Nigéria é um dos piores países do mundo para viver a fé cristã".

Loreto Rios-13 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Esta manhã, realizou-se uma conferência de imprensa na sede da GRUPO ACN Espanha, uma fundação da Santa Sé, para explicar a situação atual na Nigéria e os pormenores da Campanha da Ajuda à Igreja que Sofre.

A Nigéria é atualmente um dos países mais perigosos do mundo para os cristãos devido aos numerosos ataques terroristas dos grupos Boko Haram e Estado Islâmico da África Ocidental, bem como dos "Fulani" no centro do país. Desde 2022, foram mortos 39 padres, raptados 30 padres e assassinados 17 catequistas.

Projectos de assistência às vítimas na Nigéria

A conferência de imprensa contou com a presença de Kinga von Schierstaedt, Chefe de Equipa para África no Departamento de Projectos da Ajuda à Igreja que Sofre Internacional (AIS), do Padre Joseph Bature Fidelis, Diretor do Centro de Recursos Humanos e Trauma da Diocese de Maiduguri, e de Janada Marcus, uma sobrevivente dos ataques do Boko Haram.

Segundo a ACN, "os bispos pediram projectos para melhorar a segurança dos padres e dos religiosos". Entre esses projectos contam-se a construção de cercas de segurança nos conventos, carros para que os padres se possam deslocar nas zonas mais rurais em vez de andarem a pé ou de bicicleta, o que dificulta os raptos, e sistemas de alarme nos presbitérios para que os padres possam pedir ajuda em caso de ataque.

Outro projeto foi a construção do Centro de Traumatologia em Maiduguri, uma vez que muitas pessoas necessitam de aconselhamento sobre traumas após os ataques terroristas, especialmente no norte do país. "Chegam aqui destroçadas. Fogem da violência e acorrem à Igreja em busca de apoio e conforto, encontrando cuidados profissionais e espirituais e promoção social. A verdadeira paz só é alcançada quando o trauma dos feridos profundos é curado", diz o diretor do centro, Padre Joseph Bature Fidelis.

Em 2022, a Ajuda à Igreja que Sofre financiou 122 projectos num total de 2,1 milhões de euros: construção ou reconstrução de igrejas, seminários, casas paroquiais e outros edifícios eclesiásticos, formação do clero local, apoio aos padres, ajuda de subsistência às freiras, financiamento de material de catequese e apoio aos meios de transporte e de comunicação.

Testemunho de Janada Marcus

Atualmente, como explicou Kinga von Schierstaedt, a campanha centra-se em quatro tipos de projectos: assistência psico-espiritual e segurança, formação, manutenção do centro de adoração eucarística dedicado aos mártires nigerianos e formação e apoio aos sacerdotes.

Janada Marcus, 25 anos, foi vítima de ataques terroristas quatro vezes. Numa ocasião, foi raptada após uma cirurgia, ainda com uma ferida inflamada e sob anestesia, e mantida em cativeiro durante um ano e oito meses, juntamente com outras pessoas, até conseguir escapar. Noutra ocasião, viu o seu pai ser morto pelo Boko Haram. Janada foi tratada no Maiduguri Trauma Care Centre, para onde a mãe a levou quando a filha tinha pesadelos contínuos e não conseguia falar com as pessoas. Janada disse esta manhã que conseguiu perdoar os terroristas e que agora tem paz de espírito: "A minha mãe ensinou-nos que temos de perdoar. Faz parte da nossa fé cristã.

Agora, conseguiu retomar a sua vida, tem um diploma em Saúde Tropical e Controlo de Doenças e, em março deste ano, visitou o Vaticano e teve a oportunidade de cumprimentar o Papa Francisco.

Apesar do terrorismo, a AIS constata que "a Nigéria é o país com o maior número de seminaristas em África e, apesar da discriminação e da perseguição, o número de aspirantes continua a crescer".

Pode colaborar na campanha a partir da secção Sítio Web da Ajuda à Igreja que Sofre.

Vaticano

Francisco apela à abertura a Jesus e à paz na Terra Santa

Na última sessão do ciclo sobre a paixão de evangelizar, o Papa Francisco convidou a audiência de hoje a refletir sobre a palavra de Jesus aos surdos e mudos, EffetáDirige-se a todos os baptizados para que proclamem o Evangelho e troquem "o dom da amizade". O Papa apelou ainda a um cessar-fogo humanitário e à libertação de todos os reféns na Terra Santa.

Francisco Otamendi-13 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 4 acta

Com um tom de voz mais recuperado e, nalgumas ocasiões, de pé, o Santo Padre presidiu esta manhã à festa de Santa LúciaO Papa, virgem e mártir, realizou a 30ª e última sessão do ciclo de catequeses sobre a paixão de evangelizar, o zelo apostólico do crente, na Sala Paulo VI do Vaticano. O tema da catequese Público foi "EffatáA "Igreja Aberta", baseada na passagem evangélica da cura de um surdo-mudo por Jesus (Mc 7,31-35).

Numerosos cânticos mexicanos à Virgem de Guadalupe, cuja festa foi celebrada ontem, precederam a catequese, juntamente com gritos de Viva o Papa! 

O Pontífice voltou a insistir que "não devemos esquecer-nos de pedir o dom da paz O Presidente do Parlamento Europeu, Jerzy Buzek, apelou a um cessar-fogo humanitário para os povos que sofrem com a guerra, especialmente Israel, a Palestina e a atormentada Ucrânia. O Presidente do Parlamento Europeu recordou a dor e o sofrimento destes povos e apelou a um cessar-fogo humanitário, porque a ajuda humanitária é urgentemente necessária em Gaza. O Presidente do Parlamento Europeu apelou também à libertação de todos os reféns e voltou a gritar: "Não à guerra, sim à paz".

"Lançarmo-nos ao mar do mundo".

Na sua meditação, o Pontífice recordou que "Effatá" é uma expressão dita pelo celebrante no momento do batismo, enquanto toca os ouvidos e os lábios do batizado. "É um apelo a abrir e a alargar toda a pessoa para acolher o anúncio de Jesus e para sair em missão.

"Deixemos que o Senhor toque as nossas línguas e os nossos ouvidos, os abra, os desate para proclamar a sua presença que liberta e conforta todos, especialmente os que mais sofrem", disse o Papa. "Que Ele nos encha com a efusão do Espírito Santo para acender a chama do amor divino no coração de todos, sem medo, com coragem. Abandonando as seguranças pessoais e confiando no chamamento de Jesus, lançar-nos-emos ao mar do mundo, prontos a partir e a anunciar a todos os povos o que vimos e ouvimos".

Não esqueçamos - continuou o Santo Padre - que o Senhor nos chama a abrir-nos ao sopro do Espírito Santo, a escutar a sua voz e a deixar-nos impelir pela paixão de evangelizar; esta é uma tarefa que diz respeito a todos os cristãos. (...) "Também nós, que recebemos o Espírito Santo, somos chamados a abrir-nos ao Espírito Santo, a escutar a sua voz e a deixar-nos impelir pela paixão de evangelizar; esta é uma tarefa que diz respeito a todos os cristãos (...)". effetá do Espírito no batismo, somos chamados a abrir-nos. "Abre-te", diz Jesus a cada crente e à sua Igreja: abre-te porque a mensagem do Evangelho precisa de ti para ser testemunhada e anunciada! Abri-vos, não vos fecheis nas vossas comodidades religiosas e no "sempre se fez assim"! Abri-vos, Igreja, ao sopro do Espírito Santo, que vos impele a ser missionários, evangelizadores".

"O amor que damos

O "Effatá (Abre-te)" de Jesus, "é um convite a redescobrir a alegria da missão no fogo do Espírito. O zelo missionário, de facto, não é propaganda para obter consenso, não é proselitismo, nem encher a cabeça de noções, mas é acender no coração a centelha do amor de Deus. Parafraseando uma bela expressão, poderíamos dizer que o coração daqueles a quem anunciamos não é um recipiente a encher, mas um fogo a acender", explicou o Papa.

Por isso, "o zelo apostólico não depende da organização, mas do ardor; não se mede pelo consentimento que recebemos, mas pelo amor que damos (...). A mensagem é clara: para sermos pastores do povo de Deus, temos de ser pescadores de homens, prontos a deixar as margens da nossa própria segurança para zarpar com o Evangelho no mar do mundo".

Francisco convidou-nos também a examinarmo-nos a nós próprios com estas perguntas: "Perguntemo-nos também a nós próprios: amo realmente o Senhor, a ponto de querer anunciá-lo? Quero tornar-me sua testemunha ou contento-me em ser seu discípulo? Tomo a peito as pessoas que encontro? Levo-as a Jesus na oração? Quero fazer alguma coisa para que a alegria do Evangelho, que transformou a minha vida, torne também a delas mais bela?

"Celebrar a vinda do Menino Jesus no Natal".

Na sua saudação aos peregrinos em várias línguas, o Santo Padre convidou "todos nós, como cristãos baptizados, a dar testemunho de Jesus e a anunciá-lo. Peçamos também a graça de, como Igreja, realizar uma conversão pastoral e missionária" (francês). Peçamos também a graça de, como Igreja, realizar uma conversão pastoral e missionária" (francês). Aos anglófonos, recordou os Advento e a NatalDou as boas-vindas a todos os peregrinos de língua inglesa, especialmente aos grupos da Malásia e dos Estados Unidos da América. A cada um de vós, e às vossas famílias, desejo um frutuoso caminho de Advento para celebrar no Natal a vinda do Menino Jesus, o Salvador do mundo. Que Deus vos abençoe.

Aos germanófonos, recordou: "Que Santa Luzia, Virgem e Mártir, cuja memória litúrgica se celebra hoje, nos ajude a fazer brilhar Cristo através do nosso testemunho de fé, luz dos povos".

O Papa disse aos árabes que "em virtude do batismo, cada cristão é chamado a ser profeta, testemunha e missionário do Senhor, pela força do Espírito Santo e até aos confins da terra. Que o Senhor vos abençoe a todos e vos proteja sempre de todo o mal.

O Papa sublinhou aos polacos que "uma forma especial de viver o Advento na sua terra natal é participar nas missas. Rorate caeli. Que esta bela tradição, que exprime com Maria a expetativa da vinda do Salvador, se torne uma oportunidade para testemunhar a vossa fé viva. 

E encorajou os falantes de espanhol a "não esquecerem que o Senhor nos chama a abrirmo-nos ao sopro do Espírito Santo para escutarmos a sua voz e para nos deixarmos levar pela paixão de evangelizar; esta é uma tarefa que diz respeito a todos os cristãos. Que Jesus vos abençoe e a Virgem Santa vos guarde".

Por fim, em italiano, Francisco recordou Santa Luzia e recordou que "nalgumas partes de Itália e da Europa é costume trocar presentes nesta festa por causa da proximidade do Natal. Gostaria de vos convidar a todos a trocar o dom da amizade e do testemunho cristão, que é um dom precioso".

O autorFrancisco Otamendi

Vaticano

O Papa apela à comunhão entre os católicos siro-malabares

O modo de celebração da Santa Qurbana, o rito eucarístico desta antiga Igreja de rito oriental em comunhão com Roma, tem sido recentemente objeto de controvérsia. O Papa enviou uma forte mensagem vídeo à arquidiocese de Ernakulam-Angamaly pedindo que o rito eucarístico seja celebrado no próximo Natal segundo o modo adotado pelo Sínodo da Igreja Siro-Malabar.

Antonino Piccione-13 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

O Papa remodelou a direção da Igreja siro-malabar da Índia, no Estado de Kerala, aceitando a demissão do arcebispo sénior, o cardeal George Alencherry, e de D. Andrew Thazhath, o administrador apostólico que nomeou há dois anos para a arquidiocese "rebelde" de Ernakulam-Angamaly. Uma medida que se seguiu à missão mal sucedida, como delegado pontifício, do arcebispo eslovaco Cyril Vasil, antigo secretário da Congregação para as Igrejas Orientais, que em nada contribuiu para aliviar as tensões entre a arquidiocese de Ernakulam-Angamaly e o resto da Igreja Siro-Malabar.

O objeto de controvérsia, uma vez que tanto o Notícias do Vaticano como Asia News, continua a ser o modo de celebração adotado pelo Sínodo Siro-Malabar em 2021, que prevê que o celebrante fique de frente para o altar durante o momento central da liturgia. Uma solução que a grande maioria do clero de Ernakulam-Angamaly - a maior arquidiocese da Igreja Siro-Malabar, compreendendo cerca de um décimo dos fiéis - não quer aceitar, tendo adotado o rito em que o celebrante está virado para a assembleia após o Concílio Vaticano II. Assim, a disputa de longa data sobre uma liturgia unificada, que há muito divide esta antiquíssima Igreja dos Índias Os orientais continuam por resolver.

A chamada de atenção do Papa

O Papa Francisco, longe de subestimar a gravidade da situação, envia uma forte mensagem de vídeo à arquidiocese de Ernakulam-Angamaly, pedindo que o rito eucarístico seja celebrado no próximo Natal em todas as Igrejas, de acordo com a modalidade "unificada" adoptada pelo Sínodo da Igreja Siro-Malabar após anos de discussão, mas rejeitada pelo clero da diocese onde se encontra a sede do arcebispo maior.

"Vós sois Igrejas, não vos torneis uma seita", diz Francisco. "Não obrigueis a autoridade eclesiástica competente a tomar nota de que abandonastes a Igreja, porque já não estais em comunhão com os vossos pastores e com o sucessor do apóstolo Pedro, chamado a confirmar todos os irmãos na fé e a conservá-los na unidade da Igreja."

O Cardeal Alencherry, que foi eleito arcebispo maior pelo Sínodo Siro-Malabar em 2012, está envolvido desde 2017 num caso relacionado com a venda de terrenos pertencentes à Igreja, que causou escândalo e controvérsia na comunidade católica de Kerala. Na sua carta ao cardeal, o Pontífice renova, no entanto, a sua estima pessoal, recordando também que Alencherry já tinha apresentado a sua demissão em 2019, mas a Santa Sé - aceitando o parecer do Sínodo - tinha-a rejeitado. Agora, portanto, a liderança da Igreja Siro-Malabar, de acordo com a lei, foi confiada ao bispo curial Sebastian Vaniyapurackal, até à eleição do novo arcebispo maior, que deverá ter lugar em janeiro.

Novo administrador apostólico

Quanto à arquidiocese de Ernakulam-Angamaly, aceitando a demissão do bispo Andrews Thazhath como administrador apostólico (que continua a ser arcebispo de Trichur), Francisco nomeou o bispo Bosco Puthur, bispo emérito da eparquia de Melbourne do Syro-Malabar, como novo administrador apostólico. Thazhath foi também amplamente questionado sobre a forma como cumpriu o mandato que lhe foi conferido pelo Papa Francisco para resolver a disputa sobre a liturgia.

Nos últimos dias, foi também publicada uma carta em que se dizia que os oito diáconos da diocese que aguardam a ordenação sacerdotal só poderiam ser ordenados depois de terem prestado o juramento de celebrar a Qurbana (o rito eucarístico) apenas segundo as modalidades estabelecidas pelo Sínodo, que, como já foi referido, exige que o celebrante esteja virado para a assembleia durante a primeira parte da liturgia, mas que depois se volte para o altar no momento da consagração.

Mensagem vídeo do Papa à Arquidiocese de Ernakulam-Angamaly.
O autorAntonino Piccione

Recursos

Começa uma nova era: Prefácio do Advento III

Neste "tempo forte" do ano litúrgico, continuamos a série sobre os Prefácios do Advento. Para além dos Prefácios presentes na edição típica latina, o nosso Missal acrescenta dois outros, compostos de novo. O primeiro, chamado Prefácio III do Advento, pode ser usado até 16 de dezembro. 

Giovanni Zaccaria-13 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

Também aqui, como no Prefácio do Advento IO carácter escatológico desta parte do tempo de preparação para o Natal é predominante.

É de facto justo agradecer-vos,

é nosso dever cantar em vossa honra

hinos de bênção e louvor,

Pai todo-poderoso, princípio e fim de toda a criação.

Escondeste-nos o dia e a hora

em que Cristo, vosso Filho,

Senhor e juiz da história,

aparecerá, revestido de poder e glória

acima das nuvens no céu.

Nesse dia terrível e glorioso

a figura deste mundo passará

e nascerão os novos céus e a nova terra.

O mesmo Senhor que depois se nos mostrará cheio de glória

vem agora ao nosso encontro

em cada homem e em cada acontecimento

para o recebermos com fé

e pelo amor testemunhemos

da feliz expetativa do seu reino.

Por isso, enquanto aguardamos a sua última vinda,

unidos aos anjos e santos,

cantamos o hino da tua glória:

Santo, Santo, Santo...

O texto apresenta uma certa novidade desde o início, pois apresenta um protocolo inicial diferente da maioria dos outros Prefácios. Desde as primeiras expressões, dirige o olhar contemplativo dos fiéis para Deus Pai todo-poderoso, princípio e fim de todas as coisas: deste modo, introduz-nos imediatamente numa perspetiva simultaneamente cósmica e histórico-escatológica.

O embolismo do prefácio é composto por três secções, também indicadas graficamente no texto do Missal. A primeira secção recorda o texto de Mateus 2436, em que o próprio Jesus afirma que ninguém sabe o dia e a hora da manifestação final do Filho; estas palavras são, em si mesmas, um convite à vigilância, um tema típico deste tempo de Advento.

Passamos então à visão profética da segunda vinda de Cristo, quando "verão o Filho do Homem vir sobre as nuvens do céu com grande poder e glória" (Mt 24,30). Ele virá como Senhor (cf. Act 2,36) - que traduz o grego Kyriose Juiz (cf. Act 10, 42), ou seja, o encarregado de estabelecer a justiça de uma vez por todas (cf. Ap 20, 11-12).

Do "fim dos tempos" à vida quotidiana

A segunda parte continua com a descrição desse último dia e define-o como tremendo (cf. Gl 2,11) e glorioso (cf. Ez 39,13 e Act 2,20), adjectivos que mostram a extraordinariedade do momento, que infunde admiração e, ao mesmo tempo, revela a majestade de Deus (glorioso é um adjetivo que normalmente se refere a Deus). A visão, porém, não se esgota aqui, mas abre-se à contemplação grandiosa dos novos céus e da nova terra: a figura deste mundo passa (cf. 1 Cor 7,31) e começa uma nova era, caracterizada não mais pela fragilidade, mas pela plenitude e pela definitividade, como testemunham as profecias de Isaías (cf. Is 65,17 e 66,22), retomadas mais tarde por 2 Pd 3,13 e Ap 21,5.

Na Epístola aos Romanos, Paulo também olha para esta plenitude quando diz: "Porque a criação foi sujeita à queda (...) na esperança de que também a própria criação seja libertada da escravidão da corrupção para a liberdade da glória dos filhos de Deus" (Rm 8, 20-21). É belo observar como, neste fresco do que será, a dimensão material não só não é desprezada, mas, pelo contrário, é exaltada, nesta recapitulação de todas as coisas que inclui não só o homem, mas todo o cosmos.

Por fim, a terceira parte do prefácio propõe a passagem desta contemplação grandiosa dos acontecimentos do "fim dos tempos" para a vida quotidiana: preparar a vinda do Senhor significa, antes de mais, abrir o coração ao próximo e acolher cada pessoa e cada acontecimento; nas pessoas que o Senhor coloca ao nosso lado e nos acontecimentos que nos ocorrem, Deus fala. Há aqui um eco das palavras de Gaudium et Spes 22: "Pela encarnação, o Filho de Deus uniu-se, de certo modo, a cada homem".

O texto conclui com uma frase tripartida, que sublinha a necessidade das virtudes teologais para a vida quotidiana: a fé é necessária para poder reconhecer Cristo que se faz presente nos acontecimentos da vida e para poder acolher esta sua presença; a caridade é indispensável para testemunhar a vida cristã, que se abre à esperança, isto é, à espera confiante da realização dos projectos de salvação que Deus tem para nós.

Por fim, precisamente por alimentarmos a expetativa da segunda vinda, somos convidados a juntar-nos aos anjos e aos santos no canto do Sanctus.

O autorGiovanni Zaccaria

Pontifícia Universidade da Santa Cruz (Roma)

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Vaticano

O que esperar do Sínodo sobre a Sinodalidade em 2024

Todos os bispos do mundo receberam um documento que os encoraja a aprofundar os trabalhos do Sínodo da Sinodalidade e a preparar a sessão de outubro de 2024.

Paloma López Campos-12 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

O portal de notícias Notícias do Vaticano informa que todos os bispos do mundo receberam um documento e uma carta dos Cardeais Mario Grech e Jean-Claude Hollerich sobre o Sínodo da Sinodalidade que a Igreja está a viver.

O documento enviado começa por encorajar o episcopado a refletir sobre a sessão que teve lugar em outubro de 2023, durante a qual foi seguida uma dinâmica de trabalho baseada no diálogo e na experiência. No final da Assembleia, foi tornada pública a síntese dos temas tratados, à qual os bispos são convidados a regressar para continuar a refletir sobre o trabalho realizado.

O texto esclarece ainda que o Sínodo não se baseia nas questões debatidas. Citando o Papa Francisco explica que "o importante é a forma como a reflexão é feita, ou seja, de uma forma sinodal". No entanto, é importante não perder de vista os temas que os participantes irão debater em 2024. Por isso, o Papa indicará as questões que considera relevantes e convocará grupos de peritos de todos os continentes para trabalhar, com a participação dos Dicastérios competentes da Cúria Romana, numa dinamização eclesial coordenada pela Secretaria Geral do Sínodo". Por fim, os grupos apresentarão relatórios de trabalho na reunião do próximo ano.

Por outro lado, o documento enviado aos bispos pede-lhes que aprofundem "as formas concretas do compromisso missionário a que somos chamados, no dinamismo entre unidade e diversidade próprio de uma Igreja sinodal". Para isso, o trabalho será feito tanto a nível da Igreja local como a nível das Igrejas locais com o Papa, para o que é necessário que cada bispo consulte a sua comunidade.

Directrizes

As directrizes de trabalho enviadas a todos os bispos encorajam uma "reflexão focalizada sobre o tema da corresponsabilidade diferenciada pela missão de todos os membros do Povo de Deus". No entanto, também se insiste na procura de vozes de peritos. O documento apela ao "envolvimento de peritos e instituições académicas presentes na área, de modo a que a contribuição da perícia teológica e canónica, bem como das ciências humanas e sociais relevantes, possa estar presente".

Por outro lado, o Conselho Ordinário do Sínodo quer alargar as experiências de sinodalidade a nível local, promovendo iniciativas, convidando aqueles que vivem em situações de exclusão, cristãos de outras confissões e pessoas que confessam outras religiões.

Para facilitar o processo, o Secretariado Geral do Sínodo publicou uma possível ficha de trabalho na qual as Igrejas locais podem inspirar-se. O documento pode ser consultado no sítio oficial do Sínodo e está disponível em várias línguas.

Novo Instrumentum Laboris

Após a consulta, cada conferência episcopal deverá enviar um resumo dos trabalhos ao Secretariado Geral do Sínodo até 15 de maio de 2024. Com as contribuições das Igrejas locais, o "Instrumentum Laboris" da sessão de outubro será redigido pelo órgão responsável.

Embora o material enviado pelas igrejas locais "não constitua diretamente o objeto de discernimento" da reunião de 2024, ajudará a "compor um quadro no qual situar os trabalhos da Assembleia".

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Educação

Lançamento de um mestrado sobre João Paulo II

A Associação Espanhola de Personalismo (AEP) vai oferecer um mestrado sobre Karol Wojtyla/João Paulo II que decorrerá de janeiro a outubro de 2024. A data limite para a inscrição é 10 de janeiro de 2024.

Loreto Rios-12 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

O Associação Espanhola de PersonalismoA "associação civil sem fins lucrativos de carácter cultural", cujo objetivo é "promover, divulgar, aprofundar e desenvolver a filosofia personalista" tem o seu novo título: "Filosofia Personalista".Mestrado em linha em Karol Wojtyla-João Paulo II".

O mestrado decorrerá de janeiro a outubro de 2024 e o o prazo de inscrição termina a 10 de janeiro de 2024.. As sessões, que se realizarão às quartas-feiras à tarde, terão uma duração de três horas e serão gravadas para que os inscritos as possam apreciar mais tarde.

O custo total da inscrição é de 1500 euros, embora exista a possibilidade de efetuar o mestrado em módulos de duas disciplinas. Os membros da Associação Espanhola de Personalismo beneficiarão de um desconto de 5 % na taxa de inscrição no mestrado.

"Este mestrado oferece uma visão completa e inter-relacionada das múltiplas facetas de Karol Wojtyla/João Paulo II: a sua vocação poética e teatral inicial, a sua formação filosófica e teológica, a sua própria proposta antropológica, a que chamou personalismo, e a sua inovadora teologia do corpo. O mestrado pode ser entendido como uma homenagem a Karol Wojtyla/João Paulo II que procura divulgar o seu imenso legado pessoal, doutrinal e espiritual", afirmam no web. O título também "oferece uma visão completa da sua vida e obra, única na língua espanhola".

Para mais informações, contactar a directora adjunta do mestrado, Nieves Gómez, através do seguinte endereço eletrónico [email protected].

Temas

O primeiro bloco de disciplinas decorrerá de janeiro a fevereiro com os seguintes temas: "Karol Wojtyla / João Paulo II (1920-2005)" ("O contexto polaco. Estudante de filologia durante o nazismo. Sacerdote e professor de ética. Arcebispo de Cracóvia na Polónia ocupada. O Concílio Vaticano II. O Papa João Paulo II e a sua influência no século XX"); e "A beleza da palavra: obra poética e teatral" ("Dos sonetos e do Saltério renascentista aos poemas da maturidade. As peças do período neorromântico: Job e Jeremias. Dramas do período rapsódico. A oficina do ourives. Tríptico romano: síntese e cume da sua obra literária").

O segundo bloco decorrerá de março a abril, com dois outros temas: "Ética, amor e responsabilidade" ("A renovação da ética na escola de Lublin sob a influência de Scheler, Kant e Tomás de Aquino. Amor e responsabilidade. A norma personalista. Prazer e sexualidade. A pessoa e o amor"); e, em segundo lugar, "Antropologia personalista" ("O personalismo de Karol Wojtyla. O projeto de Pessoa e ação. Consciência e autoconsciência. Liberdade como escolha e auto-determinação. Psique, soma, integração e auto-realização. A estrutura da afetividade").

O terceiro bloco terá lugar em maio e junho e centrar-se-á nos dois temas seguintes: "Teologia do corpo" ("O mistério do princípio: homem e mulher os criou. O casal humano como imagem da Trindade. A redenção do coração. O corpo e a obra de arte. A ressurreição da carne"); e "O matrimónio e a família como 'communio personarum'" ("O génio feminino e a 'mulieris dignitatem'. Amor conjugal e fecundidade. O matrimónio como instituição. A família como lugar da pessoa. Paternidade, maternidade, filiação").

Finalmente, de setembro a outubro, será desenvolvido o quarto e último bloco, com os temas "Pensamento sócio-político" ("Participação e alienação. Trabalho: dimensão objetiva e subjectiva 'Laborem exercens'. O debate da Teologia da Libertação. Democracia, sociedade, solidariedade, mercado"); e, em segundo lugar, "Igreja e cristianismo em João Paulo II ("A perspetiva cristológica: Cristo revela o homem ao homem, 'Redemptor hominis'. Ciência, razão e fé. A Igreja e a sua história. Uma perspetiva ecuménica. Do Concílio Vaticano II ao terceiro milénio. Totus tuus").

Docentes

Quanto ao corpo docente, o diretor do mestrado é Juan Manuel Burgos, presidente da AEP e da AIP, e professor na Universidade CEU San Pablo e na Universidade Villanueva de Madrid. Editou as obras completas de Karol Wojtyla em espanhol, e é autor, entre outros, dos livros "Para comprender a Karol Wojtyla" (BAC) e "La filosofía personalista de Karol Wojtyla" (Palabra).

A vice-diretora do mestrado é Nieves Gómez Álvarez, doutora em Filosofia pela UCM e professora na Universidad Villanueva e UDIMA em Madrid, e na Universidad Anáhuac no México. Foi professora colaboradora do Pontifício Instituto João Paulo II e em 2021 leccionou na Cátedra João Paulo II do CITES (Ávila) o curso intensivo "A defesa da pessoa. Wojtyla face aos humanismos ateus".

Participarão também Juan José Pérez Soba, diretor da Área Internacional de Investigação em Teologia Moral do Pontifício Instituto Teológico João Paulo II, em Roma, e professor de Teologia Pastoral do Matrimónio e da Família no mesmo instituto, e Bogdan Piotrowski, autor, tradutor e coautor de 14 livros relacionados com a obra e os ensinamentos de Karol Wojtyla, e membro da Academia Colombiana da Língua. Conheceu pessoalmente João Paulo II e a Santa Sé nomeou-o tradutor oficial das suas obras em espanhol para a América Latina. Leccionará o módulo "A beleza da palavra: obra poética e teatral".

Outros professores incluem Benjamin Wilkinson, Alejandro Burgos, Marco Lome, Patricia Garza Peraza e Andrzej Dobrzynski.

Recursos

A Virgem Maria aparece?

A aparição da Virgem de Guadalupe ao índio Juan Diego é uma das aparições marianas verificadas pela Igreja e conhecidas em todo o mundo. Embora existam muitos relatos de aparições, a Igreja Católica é muito cuidadosa na determinação da sua veracidade, falsidade ou possibilidade.

Alejandro Vázquez-Dodero-12 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 6 acta

Desde o início do cristianismo, a proteção e a ajuda da Virgem Maria aos cristãos são uma constante na história. A devoção mariana, húmus de fé confiante e filial, baseia-se muitas vezes nas aparições da Mãe de Deus a diferentes pessoas, em diferentes tempos e lugares.

As aparições de Nossa Senhora são um dos temas sobre os quais a Igreja se debruça com mais cuidado e estudo antes de determinar a veracidade dessas aparições que são, quando ocorrem, o epicentro da fé em Deus.

Conceito de "aparição mariana".

Para a Igreja Católica, a Revelação - o dar a conhecer Deus através do homem - terminou com a morte do último dos Apóstolos. Com isso, o depósito da Fé já apresentava tudo o que devia necessariamente ser acreditado ou praticado para que as almas se salvassem eternamente ou chegassem ao céu.

Mas isso não impede de forma alguma as revelações privadas - aparições, visões, mensagens... - de Deus, dos santos e também da Virgem Maria.

Naturalmente, a Igreja reserva-se a autoridade para emitir um juízo autêntico sobre as visões ou aparições, para as aprovar ou desaprovar, tendo em conta que, embora ajudem as pessoas cristãs a aumentar a sua religiosidade, não são questões de fé necessárias.

As aparições marianas são manifestações da Virgem Maria a uma ou mais pessoas, num determinado lugar e num determinado momento da história, que a Igreja Católica pronuncia para determinar a sua veracidade, falsidade ou possibilidade.

Algumas das aparições deram origem a lugares de culto ou de peregrinação de grande significado religioso, como a Basílica de Guadalupe, ou os santuários de Fátima e Lourdes. Outras aparições inspiraram o nascimento de ordens religiosas, como os Carmelitas, os Mercedários ou as Concepcionistas.

No que diz respeito a possíveis aparições, a Igreja é extremamente cautelosa, prudente e caridosa, e sobretudo sublinha a distinção entre a revelação pública, contida na Sagrada Escritura e na Tradição, que constitui o "depositum fidei", e as revelações privadas, a que nos referimos neste fascículo. A revelação pública, como dissemos, é completa, mas não completamente explícita, e cabe ao Magistério - a tarefa pedagógica da Igreja - aprofundar a riqueza do seu conteúdo ao longo do tempo, sob a orientação do Magistério.

Não podemos afirmar que a aprovação de uma aparição mariana garanta que as palavras que os videntes transmitem tenham sido ditas por Maria. Não se trata da Sagrada Escritura ou de inspiração divina, mas de algo que a Mãe de Deus quis comunicar num determinado momento, com um determinado objetivo e através de determinados videntes.

Assim, o Catecismo afirma no ponto 67 que ".Ao longo da história, houve as chamadas revelações "privadas", algumas das quais foram reconhecidas pela autoridade da Igreja. Estas, porém, não pertencem ao depósito da fé. A sua função não é "melhorar" ou "completar" a Revelação definitiva de Cristo, mas ajudar a vivê-la mais plenamente numa determinada época da história.".

Algumas aparências são verdadeiras e outras falsas?

Quanto às aparições - que seriam revelações privadas - também as podemos classificar como públicas ou privadas.

Entre as aparições públicas, ou com relevância externa, a Igreja reconheceu, até à data, quase trinta como sendo de origem sobrenatural. Estas são algumas das mais conhecidas:

A primeira é a Virgem do Pilar, que apareceu ao apóstolo Santiago em Saragoça, Espanha, por volta do ano 40.

Mais tarde, no século XIII, a Virgem do Rosário, em França, e a Virgem do Carmo, na Terra Santa.

No século XVI, a Virgem de Guadalupe no México, Nossa Senhora de Velankanni na Índia - hoje Bharat -. No século XVII, Nossa Senhora de Laus em França.

No final do século XVIII, Nossa Senhora de La Vang, no Vietname.

No século XIX, em França, a Medalha Milagrosa, Nossa Senhora das Vitórias, Nossa Senhora de La Salette, Nossa Senhora de Lourdes, Mãe da Esperança e Mãe da Misericórdia; também no século XIX, Nossa Senhora de Knock, na Irlanda.

E no século XX, Nossa Senhora de Fátima, em Portugal; Mãe de Deus e Nossa Senhora dos Pobres, na Bélgica; Nossa Senhora de Todas as Nações, na Holanda; em Itália, Nossa Senhora do Apocalipse e Nossa Senhora das Lágrimas; Nossa Senhora das Preces, em França; Nossa Senhora da América nos EUA; Nossa Senhora de Akita no Japão; Nossa Senhora e Mãe Reconciliadora na Venezuela; Nossa Senhora de Cápua na Nicarágua; a Mãe da Palavra no Ruanda; Nossa Senhora Soufanieh na Síria; Nossa Senhora do Rosário de São Nicolau na Argentina; e a Guardiã da Fé no Equador.

A Igreja também declarou a falsidade de algumas aparições, incluindo Bayside, nos EUA, Belluno, em Itália, e Palmar de Troya, em Espanha.

Por fim, referiremos algumas aparições de veracidade duvidosa, o que não implica que sejam necessariamente consideradas falsas, uma vez que no futuro se poderia esperar que fossem reconhecidas: Garabandal em Espanha, Nossa Senhora de Zeitun no Egipto e a Rainha da Paz em Medjugorje, na Bósnia.

Como é que a Igreja aprova uma aparição mariana?

Em primeiro lugar, é preciso notar que não existe qualquer regulamentação deste fenómeno, nem no Código de Direito Canónico ou qualquer outro instrumento. Temos o Observatório de aparições e fenómenos místicos ligada à figura da Virgem Maria no mundo, criada pelo Pontifícia Academia Mariana Internacional com o objetivo de analisar e interpretar os vários casos de aparições marianas que aguardam um pronunciamento da autoridade eclesiástica sobre a sua autenticidade.

A Igreja reconhece que Deus - pessoalmente ou através, por exemplo, da sua Mãe - pode falar diretamente a algumas almas e comunicar-lhes algum bem, para elas próprias ou para a sociedade. Mas, como já foi dito, essas revelações nada acrescentam à doutrina cristã, já revelada por Cristo e sempre em processo de estudo e discernimento pelo Magistério. O objetivo destas revelações seria a ajuda dada por Nossa Senhora para viver a fé de acordo com o ensinamento da Igreja.

Para verificar a autenticidade das aparições, a Igreja avaliará fundamentalmente os seguintes elementos: o equilíbrio mental da pessoa que se diz vidente; o seu nível de formação cultural e doutrinal, bem como a sua comunhão com a Igreja; a sua probidade de vida ou vida virtuosa, pois embora Maria possa aparecer a qualquer pessoa, não parece admissível que se mostre a quem parece ser pecador ou estar longe de Deus; se existe algum desejo de lucro financeiro com as aparições; a transparência e naturalidade das aparições, para excluir a possibilidade de alguma aparição estar centrada na pessoa que se diz vidente; o número de aparições e o conteúdo da mensagem recebida; os sinais extraordinários ligados às aparições, como curas, milagres, fenómenos cósmicos, etc.; os frutos espirituais, como curas, milagres, fenómenos cósmicos, etc.; os frutos espirituais, como os frutos espirituais das aparições, como os milagres dos videntes, etc.Os frutos espirituais, como as conversões ou, em geral, os frutos nas almas dos que desfrutam das aparições; e a conformidade dos supostos videntes com as disposições do ordinário local, geralmente o bispo.

Se, após essa verificação, a autoridade eclesiástica - o bispo local ou a Santa Sé - aprovar a aparição em estudo, esta pode ser acreditada apenas com a fé humana, desde que nada de contrário à fé e aos bons costumes apareça na aparição e se prove que ela se deve a causas sobrenaturais.

Em suma, os aspectos a ter em conta para aprovar uma alegada aparição mariana são a pessoa do vidente, o conteúdo da visão ou aparição, a sua natureza, forma e objetivo.

Em termos de processo de aprovação, há várias fases: uma declaração favorável do bispo, quando este declara que as alegadas aparições não contêm nada contrário à fé ou à moral; a permissão para a celebração da liturgia, quando é permitido celebrar a Santa Missa no local das aparições; o reconhecimento papal, quando a aparição tem um impacto notório a nível mundial; e, finalmente, o reconhecimento litúrgico, quando a aparição passa a fazer parte do calendário litúrgico.

A aprovação pode ser dada pelo próprio bispo, no pressuposto de que, se a Santa Sé não interveio na aprovação, isso não significa que a rejeite.

Notas comuns às aparições marianas aprovadas pela Igreja.

Das várias aparições aprovadas pela Igreja podemos concluir uma série de aspectos que, de um modo geral, são comuns a todas elas e que, de algum modo, comprovam a sua autenticidade:

Os videntes são pessoas psicologicamente sãs e simples. Não manifestam desvios emocionais e evitam chamar a atenção para a sua pessoa. Antes da aparição, em vários casos, não eram particularmente espirituais e não afirmavam ter visões.

A humildade, o evitar a auto-referencialidade e a admissão de que pode ser algo ilusório se a autoridade eclesiástica assim o dispuser, são notas comuns aos visionários. Além disso, um outro sinal da sua humildade é o facto de serem capazes de obedecer à autoridade quando esta assim o dispõe.

A aparição implica uma série de provas e dificuldades para a vida dos videntes, que serão normais ou não, e exigirão sempre factos ou sinais sobrenaturais.

Normalmente, têm lugar em locais isolados e silenciosos que convidam ao recolhimento e à oração.

A mensagem de Nossa Senhora que lhes é dirigida exorta-os habitualmente a viver o Evangelho, a aumentar a vida de piedade e as obras de misericórdia e a recordar aspectos esquecidos da Fé ou em vias de esquecimento.

Em suma, encontramos acontecimentos que, embora não façam parte do depósito da Fé, podem ajudar a fortalecer essa Fé e a saber o que Deus, através da Virgem Maria, quer para os seus filhos homens num determinado momento da história da sua salvação.

O aroma da tuberosa fina e da mulher-perfume

Cada vez que tu, mulher, derramas aos pés de Jesus lágrimas de quebrantamento, de arrependimento e de ação de graças, transformas a tua dor num perfume precioso.

11 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 5 acta

Ao longo dos Evangelhos, vemos Jesus ser seguido por milhares de pessoas que procuravam os seus favores misericordiosos. Multidões afluíam facilmente a ele em busca de cura, de libertação ou para ouvir os seus ensinamentos transformadores. Apresentavam-Lhe necessidades reais, como a paralisia, a cegueira, a lepra, ou traziam-Lhe os doentes e os desesperados em repetidas cenas e quadros de dor.

Seria estranho ver uma igreja cheia de fiéis agradecidos, que não vêm pedir, mas apenas oferecer em sinal de gratidão! Mas sejam todos bem-vindos, pois Ele convidou-os incondicionalmente a dizer, Vinde a mim, os cansados e oprimidos, e trazei-me os vossos fardos. (Mateus 11, 28).

Nos Evangelhos, lemos duas excepções que poderíamos destacar daqueles que vieram prostrar-se para lhe oferecer presentes: uma no início da sua vida e outra no final. Na primeira ocasião, alguns personagens interessantes do Oriente (reis, magos ou astrólogos) que, seguindo o presságio da estrela, o procuravam obsessivamente para lhe oferecerem arcas caras de incenso, ouro e mirra.

A segunda ocasião foi o caso da mulher misteriosa com um perfume de nardo puro num frasco de alabastro que custava 300 denários, o salário anual de um operário no tempo de Jesus. Naqueles tempos, quando se transportava ou armazenava um óleo ou um perfume caro, o frasco era fechado para não correr o risco de se evaporar ou de ser utilizado como desperdício. Por isso, era necessário partir o frasco para utilizar finalmente o conteúdo dispendioso.

A mulher com o perfume 

Uma interessante tradição dos tempos antigos ajuda-nos a compreender este Evangelho. Diz-se que, em certas culturas, as donzelas solteiras costumavam preparar um vaso com um perfume caro e guardá-lo até ao dia em que o homem desejado as pedisse em casamento. Se a jovem aceitasse o pedido, provava-o partindo o vaso e deitando-lhe o perfume nos pés, como que a dizerRecebo-te no meu coração e na minha vida, e dou-te o tesouro da minha pureza reservado para ti.. O Cântico dos Cânticos também menciona o perfume de nardo fino como símbolo de fidelidade e pureza no amor conjugal.  

Em Marcos 14, 3-9Uma mulher conhecida como pecadora, ao ouvir dizer que Jesus estava a comer em casa de um fariseu, entrou com um frasco de alabastro cheio do perfume caro de nardo fino, partiu-o e, aproximando-se de Jesus, ungiu-lhe a cabeça e todos os cabelos e caiu-lhe aos pés, molhando-os com as suas lágrimas e secando-os com os seus próprios cabelos. Quem é esta mulher, que não estava incluída na lista de convidados para essa suculenta ceia? Uma amante silenciosa de Jesus? Uma que encontrou o amor da sua vida e quis mostrá-lo a ele, como as donzelas enamoradas da antiguidade? Ou é uma figura profética da humanidade prostrada aos seus pés, chorando de amor e arrependimento, oferecendo a sua única riqueza em troca do perdão dos seus muitos pecados? 

É interessante que os quatro Evangelhos falem dela: em Lucas, Mateus e Marcos, a mulher é anónima, mas no Evangelho de João é identificada como Maria de Betânia, irmã de Lázaro e amiga de Jesus. Agora faz mais sentido! Aquela que, noutros tempos, se sentava aos seus pés e o escutava durante longas horas, fica obcecada por ele e professa o seu amor, oferecendo-lhe o seu fino nardo conservado. Mas, à sua maneira, Jesus transforma um momento carregado de sentimentos e realidades humanas em linguagens espirituais e experiências sobrenaturais. O lugar tornou-se um daqueles confessionários onde ninguém jamais não se ouvem palavras, mas vêem-se as lágrimas de rostos arrependidos.

O mulher é profeticamente dimensionado para prefigurar todos aqueles que, de coração contrito, diante dos seus pés, valorizam finalmente as riquezas espirituais acima das riquezas materiais ou humanas e comunicam em linguagem de amor santificado. Os convidados do jantar são os mesmos de sempre, que não vêem para além do mundano e do quotidiano e questionam o valor dos ganhos espirituais. E os pobres que devem ser sempre atendidos são aqueles que são afetivamente mais do que materialmente carenciados, e que precisam não só de pão físico, mas também de alimento para a alma.

Cristo e as murmurações

Fosse quem fosse esta mulher, no final do momento de renome, Jesus disse algo que não Nunca se disse nada de nenhum dos convidados do jantar, nem de nenhum dos seguidores ou discípulos."Onde quer que este evangelho for pregado em todo o mundo, também o que ela fez será contado para sua memória" (Marcos 14,9). 

Os observadores tabelavam e contavam avidamente esta oferta, como ainda hoje o fazem. O mundo, com a sua mentalidade bancária, não compreende a dedicação desmedida de uma vida consagrada, nem um ato de entrega e de sacrifício incondicionais. Um ano de salário desperdiçado num momento de sentimentalismo exagerado... Que desperdício de tão magras riquezas! Além disso, não faltava quem achasse que esse perfume estava manchado de pecado, pois que mulher, naquele tempo, podia dar-se a esse luxo? Só quem ganhava bem a vida em negócios pecaminosos.

Jesus não quer saber dos comentários do seu passado ou do seu pecado. Tudo isso se dilui nas lágrimas de arrependimento de uma mulher contrita. "Deixa-a em paz, porque, tendo sido muito perdoada, muito me amou" (Lucas 7,47-50). Os convidados viram apenas uma jarra partida e um caro nardo desperdiçado. Mas, para Jesus, o "ouro moído" da nardo não se compara com as suas lágrimas sinceras, que brotam de um coração despedaçado: estas são muito mais caras e valiosas. Porque, tal como só a quebra do alabastro faz nascer o nardo, assim também a quebra interior desencadeia invocações poderosas, virtudes irreconhecíveis e correntes de graça. O cheiro do unguento importado encheu a casa e impregnou até as roupas dos convidados que estavam naquela sala. Era o tipo de fragrância cara que se usava aos poucos, devido ao seu cheiro forte, e o derrame de um frasco inteiro inundava a atmosfera até que ainda se podia sentir vários dias depois.

O bom cheiro de Cristo

Poucos dias depois dos acontecimentos desta penúltima ceia pública, Jesus lava os pés dos seus discípulos na última ceia e, horas mais tarde, enfrenta a sua paixão e morte. Mas no caminho para o Calvário, Jesus não cheirava a sangue, suor ou morte. O perfume de nardo fino impregnou-o ao longo do caminho de dor, simbolizando a fragrância da misericórdia. Jesus derramaria o seu sangue em benefício de todos os prostrados diante daquela cruz ao longo da história. O frasco estilhaçado é uma figura do corpo de Jesus, que seria quebrado. O seu sangue derramado seria mais precioso do que o óleo mais puro: uma fragrância de perdão eternamente presente e penetrante, de valor incomparável e de poder redentor.

Cada vez que tu, mulher, derramas aos pés de Jesus lágrimas de quebrantamento, de arrependimento e de ação de graças, transformas a tua dor num perfume precioso, estás a entregar-lhe toda uma história de alegrias e de lágrimas, de conquistas e de fracassos, de esforços e de recompensas, de ganhos e de perdas. Valerá a pena sacrificar esse dízimo em troca da vida eterna! Valerá a pena assinar esse tratado de paz e esse acordo de misericórdia para ouvires as mesmas palavras que Jesus lhe disse: os seus muitos pecados estão perdoados porque ela me mostrou muito amor (Lucas 7,47). Já não serão os teus pecados passados ou as tuas fraquezas que te identificarão, mas serás reconhecido pelo aroma da fina nardoa que a Sua misericórdia impregnará em ti.

O autorMartha Reyes

Doutoramento em Psicologia Clínica.

Vaticano

Papa Francisco institui o Dia Mundial da Criança: paz, ambiente e fraternidade

O primeiro Dia Mundial da Criança terá lugar a 25 e 26 de maio de 2024, anunciou recentemente o Papa Francisco.

Giovanni Tridente-11 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

Depois de instituir o Dia Mundial dos Pobres, em 2017, como legado do Jubileu da Misericórdia, e o Dia Mundial dos Avós e Idosos, em 2021, ainda em tempos de pandemia, o Papa Francisco anunciou no Angelus de 8 de dezembro a instituição do Dia Mundial da Criança, cuja primeira edição se realizará a 25 e 26 de maio de 2024.

"A iniciativa responde à pergunta: que tipo de mundo queremos legar às crianças que estão a crescer?", disse o Papa, também em resposta ao convite de Jesus para cuidar delas. Os pobres, os idosos e as crianças, juntamente com os jovens (cujo Dia Mundial foi instituído pela primeira vez por São João Paulo II em 1986), sempre estiveram no centro do magistério do Papa Francisco.

Enquanto a primeira iniciativa, dedicada aos pobres, é coordenada pelo Dicastério para a Evangelização, o dia dos avós e dos idosos está a cargo do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida. A segunda, destinada às crianças, será promovida pelo Dicastério para a Cultura e a Educação.

O evento no Vaticano

No passado dia 6 de novembro, na Sala Paulo VI do Vaticano, realizou-se uma alusão a este dia com milhares de crianças de diferentes partes do mundo, cerca de 80 países, que puderam contar os seus sonhos e desejos diretamente ao Papa. O Pontífice passou algum tempo com elas, ouvindo as perguntas de alguns dos "representantes": Isidora do Brasil, Rania da Palestina, Massimo de Roma, Ivan da Ucrânia, Kim Ngan do Vietname, Antrànik da Síria, Celeste do Peru, Pauline do Congo, Sofia das Filipinas, Luxelle de África, Susa de Samoa Tonga, Chris do Haiti, Drew da Austrália, Salma do Gana.

Foram convocados pelo mesmo Dicastério da Cultura para o evento "Aprendamos com as crianças", em sinergia com a Comunidade de Santo Egídio, a Cooperativa Auxilium e com o apoio dos Franciscanos.

"Falámos de muitas coisas bonitas, mas a coisa mais bonita que toca os vossos corações é a paz, porque vocês não querem a guerra, querem a paz no mundo", disse o Papa Francisco no final do encontro, depois de responder individualmente a cada criança.

Um mundo mais belo e bom

Para a ocasião, foi apresentada a "Encíclica das Crianças", um livro assinado pelos franciscanos Enzo Fortunato e Aldo Cagnoli, no qual o Papa escreve no prefácio: "Queridas crianças, abraço-vos e saibam que o vosso Papa e o vosso 'avô' farão tudo o que for possível para que vivais num mundo mais belo e bom".

O mesmo grupo coordenador da iniciativa de novembro criará a base para os futuros Dias Mundiais da Criança. Comentando a decisão do Santo Padre de instituir a Jornada de forma permanente, a comissão organizadora sublinhou o espírito com que nasceu o projeto: querer imaginar com as crianças "um mundo diferente, onde haja paz, cuidado com o ambiente e opção pela fraternidade".

O autorGiovanni Tridente

Cinema

A história de Carlo Acutis, a recomendação de filme deste mês

"A pulsação do céu" e "A oferta" são as recomendações deste mês para ver no cinema ou nas plataformas audiovisuais.

Patricio Sánchez-Jáuregui-11 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: < 1 minuto

Carlo Acutis era um jovem católico italiano e web designer, mais conhecido por documentar milagres eucarísticos e aparições marianas aprovadas em todo o mundo, catalogando-os num sítio Web que criou antes de morrer precocemente de leucemia.

O bater do coração do céu

DirectorJosé María Zavala e Borja Zavala
FotografiaMiguel Gilaberte
MúsicaLuis Mas
Plataforma: Cinemas

"The Heartbeat of Heaven" é um documentário sobre a sua vida e obra. Um compêndio que nos leva ao seu universo, entrevistando a sua família, o seu pároco e as pessoas que ele mudou ao longo da sua vida, como o indiano Rajesh Mohur, membro de uma casta sacerdotal brâmane que abraçou o catolicismo graças ao exemplo quotidiano do Beato italiano.

Carlo, apóstolo da Eucaristia, dedicou anos inteiros da sua curta vida à investigação de milagres eucarísticos em todo o mundo.

Os irmãos Zavala viajam por todo o mundo para seguir o seu rasto e fornecem um vasto material inédito, entrelaçando documentário e ação animada. Desde gravações do próprio Carlo Acutis na sua voz original, até recriações da sua vida e dos seus milagres eucarísticos.

A oferta

As anedotas que rodeiam a rodagem de "O Padrinho" sempre encantaram cinéfilos e agnósticos. O conflito com a mafia, o boicote de Frank Sinatra, a capacidade de pôr de pé o projeto com uma equipa talentosa e um orçamento escasso...; é disso que se trata. A oferta.

A oferta

CriadorMichael Tolkin
ActoresMiles Teller, Matthew Goode, Dan Fogler, Burn Gorman, Colin Hanks, Giovanni Ribisi, Juno Temple
Plataforma: Sky Showtime e Paramount +

Uma série fechada das experiências nunca antes reveladas do seu produtor, Albert S. Ruddy. 10 capítulos que se podem devorar apreciando a história, os diálogos, as actuações, os figurinos ....;

Uma criação premiada que galvanizou a opinião pública e cujos fãs - incluindo eu próprio - a recomendam a todos os que a querem ouvir. Esta é uma série cuidadosamente elaborada. Uma carta de amor ao cinema.

Vaticano

"O silêncio e a sobriedade são essenciais na vida cristã", diz o Papa

No Angelus de hoje, o Papa reflectiu sobre a figura de São João Batista, o precursor do Senhor. Recordou também os prisioneiros arménios e azeris, e o sofrimento na Ucrânia, em Israel e na Palestina.

Loreto Rios-10 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 2 acta

No Angelus de hoje, o Papa reflectiu sobre a figura de São João Batista, centrando-se em dois aspectos: o "deserto" e a "voz". O deserto, comentou o Papa, é um "lugar vazio, onde não há comunicação, e a voz, o meio de falar, parecem ser duas imagens contraditórias, mas no Batista estão combinadas".

Sobre o deserto, Francisco disse que "João prega ali, nas margens do rio Jordão, perto do ponto onde o seu povo, muitos séculos antes, entrou na Terra Prometida", o que tem um simbolismo: "Para escutar Deus é preciso voltar ao lugar onde durante quarenta anos ele acompanhou, protegeu e educou o seu povo, no deserto. Este é o lugar do silêncio e da essencialidade, onde não nos podemos deixar distrair por coisas inúteis, mas devemos concentrar-nos no que é indispensável à vida".

O Papa afirmou que tudo isto pode ser aplicado à nossa realidade atual: "Para prosseguir no caminho da vida é necessário despojar-se do 'extra', porque viver bem não significa encher-se de coisas inúteis, mas libertar-se do supérfluo, ir ao fundo de si mesmo, para captar o que é verdadeiramente importante diante de Deus. Só se, através do silêncio e da oração, dermos espaço a Jesus, que é a Palavra do Pai, é que saberemos libertar-nos da contaminação das palavras vãs e da conversa fiada. O silêncio e a sobriedade - nas palavras, no uso das coisas, dos media e das redes - não são apenas "ornamentos" ou virtudes, são elementos essenciais da vida cristã.

Sobre o simbolismo da "voz", o Papa disse que "é o instrumento com o qual exprimimos o que pensamos e o que trazemos no coração. Compreendemos então que ela está intimamente ligada ao silêncio, porque exprime o que amadurece no interior, a partir da escuta do que o Espírito sugere. Irmãos e irmãs, se não se sabe fazer silêncio, é difícil ter algo de bom para dizer; por outro lado, quanto mais atento for o silêncio, mais forte será a palavra. Em João Batista, essa voz está ligada à autenticidade da sua experiência e à limpidez do seu coração".

Na conclusão do Angelus, o Papa recordou que há 75 anos, a 10 de dezembro, foi assinada a Declaração Universal dos Direitos Humanos. "A este respeito, estou próximo de todos aqueles que, sem proclamações, na vida concreta de cada dia, lutam e pagam pessoalmente para defender os direitos daqueles que não contam", disse Francisco.

O Papa expressou também a sua alegria "pela libertação de um número significativo de prisioneiros arménios e azeris. Vejo com grande esperança este sinal positivo para as relações entre a Arménia e o Azerbaijão, para a paz no Cáucaso do Sul, e encorajo as partes e os seus líderes a concluir o tratado de paz o mais rapidamente possível.

Francisco recordou ainda o sofrimento na Ucrânia, em Israel e na Palestina, e assegurou as suas "orações também pelas vítimas do incêndio no hospital de Tivoli, há dois dias".

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Cultura

Simbang Gabi, a devoção do Advento nas Filipinas

O "Simbang Gabi" é uma tradição filipina que consiste numa novena de missas em honra de Nossa Senhora que começa a 16 de dezembro (ou na noite de 15 de dezembro) e termina no dia 24, com a missa da meia-noite na véspera de Natal.

Gonzalo Meza-10 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 3 acta

O tempo do Advento é um tempo de preparação espiritual para a celebração da Encarnação do Verbo Divino. Com esperança, alegria e certeza, os paroquianos renovam o desejo ardente da sua segunda vinda. Deste modo, o CatecismoA Igreja actualiza a expetativa do Messias.

Ao longo da história, diferentes culturas desenvolveram muitas formas de viver o tempo do Advento em preparação para a vinda de Cristo. Natal. Uma delas é a "Simbang Gabi", que significa literalmente "Missa ao amanhecer". Esta devoção, que tem as suas origens na Nova Espanha e no arquipélago das Filipinas no século XVI, chegou aos Estados Unidos com os imigrantes filipinos. É o terceiro maior grupo étnico asiático nos EUA, com cerca de 4,5 milhões de pessoas, das quais 65 % se consideram católicas. Estão presentes na maioria dos estados norte-americanos, mas sobretudo na Califórnia, no Havai e no Texas.

Significado e origens

O "Simbang Gabi" é uma novena de missas em honra de Nossa Senhora que começa no dia 16 de dezembro (ou na noite do dia 15) e termina no dia 24, com a Misa de Gallo na véspera de Natal. Esta devoção tem as suas raízes no século XVI, na Nova Espanha. Foi trazida por missionários que viajavam do México para as Filipinas, durante o tempo em que o arquipélago era governado pelo Vice-Reino da Nova Espanha.

Nos primeiros tempos, muitos dos trabalhadores que participavam no "Simbang Gabi" nas Filipinas eram agricultores ou pescadores que começavam ou acabavam o seu dia de madrugada. Por isso, esta novena de missas é celebrada de madrugada, entre as 4 e as 5 horas da manhã. Ao toque dos sinos, bandas musicais convidavam as pessoas a participar na celebração litúrgica. As famílias dirigiam-se para as igrejas iluminadas por velas colocadas dentro de pequenas lanternas ou de lanternas em forma de estrela feitas de bambu e papel colorido. Na missa, os paroquianos entravam em procissão, vestidos com os seus trajes tradicionais e transportando as lanternas, que eram depois expostas no interior das igrejas. A cerimónia incluía cânticos e expressões de fé locais.

No final da missa, as famílias e os amigos partilhavam as suas refeições, reforçando os laços espirituais e de fraternidade. Atualmente, as missas "Simbang Gabi" mantêm os elementos centrais que lhes deram origem; por exemplo, os paroquianos vêm à missa vestidos com trajes tradicionais. No início da cerimónia, há uma procissão de lanternas. A missa é celebrada em inglês, tagalo ou num dialeto e, no final da liturgia, as pessoas partilham a comida num ambiente familiar.

"Simbang Gabi" nos EUA

O "Simbang Gabi" realiza-se em dezenas de igrejas de pelo menos vinte dioceses dos Estados Unidos. Sendo uma devoção que inclui uma missa durante o tempo do Advento, os ordinários de cada diocese dos EUA emitem uma série de directrizes litúrgicas para a sua celebração. Por exemplo, a Arquidiocese de Los Angeles declara que as missas do "Simbang Gabi" nesta jurisdição devem ser celebradas em inglês e tagalo (língua das Filipinas), mas podem incluir o uso de outros dialectos falados no arquipélago, como o ilocano ou o cebuano.

Da mesma forma, a cor litúrgica será o roxo ou o rosa (no terceiro domingo do Advento) e os paramentos decorativos e a música sacra (devidamente aprovados pela autoridade eclesiástica) deverão ser sóbrios, reflectindo "o carácter do Advento, de alegria expetante em preparação para o Natal", diz a Arquidiocese de Los Angeles. Nesta arquidiocese, a primeira missa, a 15 de dezembro, será presidida pelo Arcebispo José Gómez. A cerimónia na catedral contará com a presença de delegações que representam mais de 120 paróquias de Los Angeles onde está presente a comunidade filipina. 

Esta devoção não só ajuda os paroquianos a preparar os seus corações e almas para a vinda de Cristo no Natal, como também reforça os laços de fraternidade entre a comunidade filipino-americana. É também uma oportunidade para os católicos de outras nacionalidades conhecerem a rica cultura filipina, não só através da fé, mas também através da comida, da música e dos trajes do arquipélago. 

Vocações

Frei ManuelÉ comovente ver cristãos convencidos de que a paz é possível".

Frei Manuel vive em Jerusalém, num bairro de "uma zona árabe bastante radical". No entanto, afirma que o tempo de guerra "impele-nos, com grande força, a viver algo que só é próprio do cristianismo: a cultura do perdão".

Loreto Rios-10 de dezembro de 2023-Tempo de leitura: 7 acta

Fray Manuel pertence ao Custódia da Terra SantaA Ordem, fundada por S. Francisco de Assis, foi encarregada pela Santa Sé de guardar os lugares que testemunharam a Encarnação de Cristo. Manuel encontra-se atualmente no santuário de Betfagésituado no Monte das Oliveiras. Deste ponto, Jesus iniciou a sua viagem para Jerusalém antes da Paixão, montado num burro e rodeado por uma multidão que o aplaudia com ramos de palmeira.

Este frade, que também residiu em Nazaré y Beit Sahour (o acampamento dos pastores a quem o anjo apareceu, perto de Belém), diz que, apesar de a guerra os ter "abalado com uma força invulgar", vêem Deus presente no meio de todas as pessoas de diferentes crenças que se reúnem para rezar pela paz.

Como foi o teu processo vocacional, onde estás agora e qual é o teu trabalho?

Há muitos anos, depois de ter terminado os meus estudos de Filologia Hispânica, pude dar um nome a um processo interior que não sabia muito bem em que consistia e como se desenvolvia. Depois de dois anos, compreendi que era possível seguir Jesus no caminho da vida consagrada, no caminho franciscano, uma vez que São Francisco desempenhou um papel essencial em todo o processo. Servi na antiga Província Bética OFM e, depois de ter vivido fortes experiências interiores com grupos de peregrinos na Terra Santa, Deus deu-me o desejo de vir à terra onde começou e terminou a nossa salvação.

Depois da união de sete províncias franciscanas na Província da Imaculada Conceição de Espanha, foi-me concedida a obediência para servir a Custódia. Vivi em Nazaré, Beit Sahour e, atualmente, estou em Jerusalém, no Monte das Oliveiras, no Santuário das Palmas, em Betfagé, que recorda o lugar de onde Jesus partiu, montado num burro, com os seus discípulos e o grupo para Jerusalém, para viver a sua paixão, morte e ressurreição.

Qual é a missão da Custódia?

No seu ministério pastoral, a Custódia da Terra Santa abrange vários campos de ação:

-Santuários e atendimento aos peregrinos: os franciscanos estão presentes em 50 santuários, lugares que recordam acontecimentos da salvação do Senhor ou fazem referência aos apóstolos ou à Sagrada Escritura; além disso, as pedras dos santuários e sua permanência ao longo dos séculos garantem a verdade histórica do que é recordado e celebrado. Os frades acolhem uma multidão de peregrinos de todo o mundo, acompanhando os grupos como assistentes espirituais, fornecendo tudo o que é necessário para as celebrações, escutando, partilhando e oferecendo um testemunho sobre o lugar que favorece o fortalecimento da fé ou a sua consolidação. Para além disso, a Custódia oferece aos peregrinos lugares para ficarem durante dias, chamados "Casa Nova": hotéis ou albergues onde podem trabalhar a partir de uma perspetiva diferente.

-Paróquias: o ministério paroquial da Custódia é exercido em 29 paróquias, sendo as mais importantes e conhecidas as de Jerusalém, Belém, Yaffo (Jaffa) e Nazaré, com igrejas na Síria e no Líbano. As paróquias árabes são uma das actividades mais importantes da Custódia; foram criadas para o cuidado pastoral dos cristãos de rito latino, uma minoria no Oriente, e com as actividades das paróquias, as pedras vivas (os cristãos locais) que mantiveram a fé ao longo dos séculos, sentem-se fortalecidos e acompanhados na sua peregrinação diária.

-Ensino, atividade artística e intelectual: a educação e a cultura são outras actividades importantes da Custódia, que tem 15 escolas chamadas "Terra Sancta College" e cerca de 10.000 alunos em centros em Israel, PalestinaJordânia, Líbano e Chipre. Nas escolas, a coexistência entre muçulmanos e cristãos, o diálogo efetivo e a aceitação mútua são procurados desde a mais tenra idade.

Esta tarefa é uma das que mais contribuem para a busca do caminho da paz, pois, a exemplo de São Francisco, nas escolas da Custódia, a paz é encontrada onde há ódio, e os caminhos são procurados onde podem ser deixados traços de harmonia. A tarefa de ensinar exige um grande esforço, porque as possibilidades económicas dos cristãos são escassas e a Custódia acolhe estes alunos gratuitamente, mesmo nos cursos que seguem a escolaridade obrigatória. Para os jovens qualificados, a Custódia concede-lhes uma bolsa de estudos para prosseguir os estudos na universidade.

Para além disso, a Custódia tem a "Studium Biblicum Franciscanum"O "Centro Muski para os Estudos Cristãos Orientais", no Cairo, e o Instituto "Magnificat", em Jerusalém, que é um conservatório aberto a cristãos, judeus e muçulmanos; a música reúne frequentemente pessoas de diferentes credos e condições, e o conservatório desenvolve um trabalho inestimável neste domínio. A Custódia dispõe também de um "Centro de Informação Cristã", que fornece a todo o mundo, através dos meios de comunicação social, a transmissão dos principais acontecimentos, notícias e tudo o que diz respeito à vida cristã na Terra Santa.

-O ministério da caridade, o trabalho social: apoiar os cristãos locais e outras pessoas que se dirigem à Caritas ou aos seus próprios centros, como lares para idosos, ou que cuidam de crianças, adolescentes e jovens de famílias desestruturadas, como é o caso da "Caritas para idosos".Casa del fanciullo"em Belém. A Custódia constrói também casas para os cristãos: o exemplo mais significativo é o do bairro de S. Francisco, em Betfagé; além disso, oferece alojamento com casas, propriedade da Custódia, a troco de uma renda simbólica, uma realidade de que beneficiam 350 famílias.

-Pastoral dos migrantes: outra realidade encontrada na área territorial da Custódia é a assistência aos católicos das Filipinas, da América Latina, da Europa de Leste e de África que vêm, sobretudo mulheres, para Israel para trabalhar. Em particular, a paróquia de Santo António de Yaffo (Jaffa) serve uma grande comunidade de filipinos, não só com celebrações litúrgicas, mas também oferecendo locais para encontros e actividades.

Através de todas estas actividades, a Custódia desenvolve um trabalho silencioso e quotidiano na procura da convivência e da paz.

Como é que é viver a fé na Terra de Jesus?

Viver a fé nos lugares que contemplaram a nossa salvação implica uma grande responsabilidade porque, por um lado, passamos ou visitamos os santuários que recordam um acontecimento de Jesus, seja ele histórico ou ressuscitado, e este facto faz-nos sentir privilegiados, já que muitos cristãos gostariam de fazer a mesma experiência e não podem; por outro lado, assumimos a responsabilidade de ser testemunhas do que vemos perante os outros, procurando sempre a coerência de vida e caminhando na verdade.

Os vestígios deixados pelo Mestre de Nazaré são intensos e basta ir ao Santo Sepulcro ou ao Calvário para reviver diariamente o grande amor com que fomos amados e para descobrir a beleza do Evangelho, uma vez que ressoam continuamente as palavras: "Porque procurais o vivo entre os mortos? Ele não está aqui, ressuscitou" (Lc 24,5-6). Este facto faz de ti um portador de esperança, um mensageiro de paz e de bondade; impele-te a caminhar com as pessoas e a despojar-te de muitas coisas para confortar, escutar e tornar credível que o Reino é uma realidade.

Fechar-me em mim mesmo, não ser acolhedor ou não partilhar a vida dos outros seria ir contra aquilo que vejo todos os dias: as pedras que me recordam as pedras vivas que constituem a Igreja, onde o Senhor continua a ensinar, a curar, a encorajar e a ter palavras de vida.

Para além da guarda dos Lugares Santos, a Custódia tem também um papel ecuménico. Que diligências foram feitas junto das outras confissões cristãs e qual é o clima atual?

Os Estatutos Particulares da Custódia da Terra Santa dedicam um capítulo inteiro ao ecumenismo e às relações com as outras religiões. Seguindo a tradição secular de tantos franciscanos que, no Médio Oriente, trabalharam incansavelmente para o encontro e o diálogo com as várias confissões cristãs, a Custódia continua o seu empenho na busca do respeito e do diálogo com as outras confissões e suas tradições.

Muitos gestos, pequenos ou mais significativos, são realizados: o acolhimento de outras confissões nos santuários e a disponibilização do espaço e dos meios necessários para as celebrações e o culto (ortodoxo e protestante); a organização de concertos, através do Instituto MagnificatAs actividades da UE nesta terra multifacetada incluem um encontro de Natal de judeus, cristãos e muçulmanos, reuniões de Natal com os patriarcas das denominações cristãs, a assinatura de documentos conjuntos e a tomada de decisões face a circunstâncias adversas, bem como uma série de outras actividades que marcam a vida quotidiana desta terra multifacetada.

Atualmente, existe um bom clima com as outras Igrejas, quer na Comissão do "Conselho Mundial das Igrejas" (CMI), quer no "Conselho Mundial das Igrejas" (CMI).Status quo"A Custódia participa também nos eventos de oração pela paz, nos quais participam fiéis, patriarcas e delegados. Finalmente, a Custódia mantém um diálogo fluido tanto com a Autoridade Palestiniana como com o Estado de Israel, pois, como se poderia dizer, estamos no mesmo barco.

Como é que se vive a vocação no meio da guerra?

A guerra abalou-nos com uma força invulgar e atirou-nos para o pior do género humano: o confronto, o ódio, a violência e a discórdia. Se Jerusalém já vive no meio de ataques, rusgas, vigilância e todas as outras medidas que se possam imaginar, durante este tempo de guerra tudo se alterou. A cultura do ódio e do medo leva-me a procurar, acima de tudo, a paz e a compreensão com todos; sei que isto é específico da nossa vocação franciscana, mas estes tempos difíceis na Terra Santa fazem com que esta dimensão se manifeste ainda mais fortemente.

Da mesma forma, a guerra leva-me a um exercício de introspeção para ver o que é realmente valioso e bom no meu coração, para conhecer as minhas zonas obscuras e para começar um exercício sério de reconciliação comigo mesmo. São Francisco dizia que se não houver paz no nosso coração, não podemos dar paz aos outros. Da mesma forma, o tempo de guerra impele-me, com grande força, a viver algo que é único no cristianismo: a cultura do perdão. Não é fácil, mas uma frase do beneditino Anselm Grün sustenta-me: "Se aceitares perdoar-te a ti próprio, perdoarás".

No meio de um conflito como o que estamos a viver, que testemunhos de esperança já experimentaram? Em que situações puderam ver a mão de Deus?

Para mim, os maiores testemunhos vieram dos encontros de oração pela paz na Terra Santa, porque vemos pessoas de diferentes credos reunirem-se com base na única coisa que é a nossa força: a oração. No meu santuário de Betfagé, que tem um bairro cristão construído pela Custódia, e que se situa numa zona árabe bastante radical, às terças, quintas e sábados reunimo-nos para rezar o terço pela paz. É comovente ver os cristãos, na sua maioria palestinianos, reunirem-se convencidos de que a paz é possível se soubermos permanecer unidos no Deus da paz e que Maria, Rainha da Paz, é a nossa força.