O segundo dia do Congresso teve como tema central: a grande história de amor. O dia começou com a recitação do terço, seguida de duas missas matinais, uma em inglês, presidida pelo Cardeal Timothy Dolan, Bispo de Nova Iorque, no Lucas Oil Stadium, e outra em espanhol, celebrada pelo Cardeal Sean O'Malley, Bispo de Boston, no Indiana Convention Center.
Nas suas respectivas homilias, os prelados referiram-se à Eucaristia como o alimento sagrado, indispensável na vida de cada católico. Sem ela não podemos estabelecer uma relação e uma comunhão com Deus, disse o Bispo de Nova Iorque. No entanto, Dolan reconheceu que nos EUA apenas 25 % dos católicos são fiéis ao preceito dominical e que, por isso, é necessário recuperar a centralidade da missa dominical, porque sem a Eucaristia não há igreja: "Precisamos de comer deste alimento sagrado porque queremos estar em comunhão com Ele", disse o bispo de Nova Iorque.
Durante a liturgia espanhola, o Cardeal Sean O'Malley afirmou que o mundo é governado por pessoas que sofrem de amnésia espiritual. "Esqueceram-se de Deus", disse, o que faz com que as pessoas não vão à Missa, e continuou: "Vejo menos pessoas na igreja hoje do que quando eu era criança. Muitos até se esqueceram do que é a Missa". Por isso, sublinhou O'Malley, este Congresso Eucarístico é importante porque nos ajuda a compreender que, como discípulos de Cristo, a Eucaristia deve estar no centro das nossas vidas. "Deus ama-nos e alimenta-nos porque a Eucaristia é a loucura do amor de Deus", disse o cardeal.
Sessões de impacto
No final das liturgias, os participantes no congresso assistiram a uma das sete "sessões de impacto", ou seja, palestras classificadas e direccionadas para católicos em diferentes estados e fases da vida: clero, pais, jovens, catequistas e líderes paroquiais. Houve também duas sessões de "encontro" para os católicos que procuram renovar a sua fé através do mistério da Eucaristia e para aqueles que procuram ferramentas práticas para evangelizar na sua comunidade e tornarem-se "missionários eucarísticos".
Entre as "sessões de impacto" em espanhol, uma reflexão do bispo Daniel Flores, de Brownsville, Texas, falou da necessidade de renovar o espírito de comunhão e de missão na Igreja. A tentação da cultura, disse Flores, "é pensar que o mundo é salvo pela riqueza, mas não é assim. Foi a pobreza de Cristo que nos salvou. O Senhor era vulnerável e deu a sua vida por nós", disse Flores. Por isso, para evangelizar, "temos de tocar na pobreza do Senhor, porque Deus enriquece-nos com a riqueza da sua pobreza".
Sessões de trabalho
A tarde do segundo dia do Congresso foi estruturada em torno das chamadas "sessões de trabalho" e "experiências especiais". As primeiras são mini-workshops ministrados por oradores pertencentes a diferentes ministérios leigos ou instituições educativas católicas, tais como "Augustine Institute", "Catholic University of America", "Catholic University of America", "...", "...", "...", "..." e "...".FOCO"Exodus 90" ou "Our Sunday Visitor", entre outros. Os temas dos workshops incluíram: "Uma caminhada bíblica através da Missa", "Evangelizar através da Eucaristia", "O que significa ser um povo eucarístico", "A família e a educação católica", "Transformar o mundo com a Eucaristia e a evangelização".
Além disso, uma das "experiências especiais" foi um painel de discussão sobre o tema "Uma Igreja Sinodal em Missão", apresentado pelo Cardeal Blase Cupich, Bispo de Chicago, e por D. Daniel Flores, entre outros oradores. O Cardeal Cupich afirmou que "se há uma crise de fé na Igreja, não é tanto porque as pessoas não acreditam que Jesus está presente na Eucaristia, mas porque as pessoas não compreendem e não acreditam plenamente no que significa Jesus ressuscitar dos mortos". Precisamos também de concentrar a nossa atenção "naquilo que Cristo está a fazer e naquilo que nos está a acontecer como indivíduos e como comunidade, ou seja, sermos transformados de modo a podermos assumir mais plenamente a missão de Cristo de levar a justiça, a paz e o amor ao mundo", afirmou.
Adoração Eucarística
À noite, chegou um dos momentos mais esperados pelos participantes no congresso: a apresentação dos principais oradores e a adoração eucarística no Lucas Oil Stadium. Os principais oradores do dia foram a Madre Olga do Sagrado Coração, fundadora das Filhas de Maria de Nazaré na Arquidiocese de Boston, e o Padre Mike Schmitz, sacerdote da Diocese de Duluth. Nos últimos anos, Schmitz tornou-se uma das celebridades do mundo católico de língua inglesa pelas suas mensagens em vídeo, destinadas principalmente aos jovens, e pelos seus podcasts "The Bible in a Year" e "The Catechism in a Year".
Na sua apresentação, Schmitz falou do aspeto sacrificial e redentor da Santa Missa: "Deus torna-se presente entre nós durante a liturgia. Na Missa, faz-se parte da redenção da humanidade. Cada vez que ela é celebrada, o Pai é glorificado e o mundo é renovado". Apesar disso, o prelado salientou que muitos católicos ignoram este mistério ou são indiferentes. Perante isto, o prelado convidou os presentes a dar a conhecer a maravilha do mistério eucarístico e a dizer ao mundo que "foi redimido e que só o amor o pode tornar santo". O dia terminou com a solene exposição do Santíssimo Sacramento, a adoração e a bênção final.
O Iémen sempre foi, como vimos, uma encruzilhada de povos, culturas e rotas comerciais. Nele vivem muçulmanos de várias convicções, judeus e, em menor escala e sob perseguição, cristãos.
Já o referimos, num artigo sobre o Irão, As principais características do Islão xiita em relação ao Islão sunita.
No Iémen, o Islão xiita é representado principalmente pela seita Zaydi e, em menor grau, por outras seitas como os Duodecimanos (a maioria no resto do mundo islâmico xiita, por exemplo no Irão).
O zayditas O seu nome deriva de Zayd ibn Ali, bisneto de Ali, que foi o quarto califa "rashid" após a morte de Maomé e foi também o primeiro imã xiita. Para os Zaydis, existem apenas cinco imãs legítimos, descendentes de Ali e de Fátima, filha do Profeta Maomé.
Distinguem-se dos xiitas duodecimanos (imamitas) pelo facto de não acreditarem na ocultação do último Imã, uma caraterística central da fé duodecimana. A teologia e a jurisprudência zaydi estão, por conseguinte, mais próximas das dos sunitas, ao ponto de serem frequentemente consideradas uma espécie de ponte entre o sunismo e o xiismo.
Os zaidis chegaram ao Iémen no século IX, sobretudo ao noroeste, onde estabeleceram um imamato em Sa'ada. Como vimos no artigo anterior, os imãs zaiditas acabaram por conseguir dominar grande parte do norte do Iémen, consolidando gradualmente o seu poder, ao ponto de o imamato zaidita ter durado quase um milénio, ou seja, até à revolução de 1962, que levou à criação da República Árabe do Iémen e pôs fim ao seu domínio político.
Até à data, os representantes mais conhecidos da corrente islâmica Zaydi no Iémen (à qual se estima que pertençam 45% da população) são os rebeldes Huthi, ou seja, o movimento (que mais tarde se tornou um grupo armado) que tomou o nome de Hussein Badreddin al-Huthi (1959-2004), considerado um dos maiores líderes espirituais, políticos e religiosos pelos Zaydis iemenitas, após o seu assassinato,
De facto, os zaidis iemenitas, especialmente após a reunificação do país (1990), sentiram-se cada vez mais marginalizados na cena política nacional, também devido à crescente influência salafista e wahhabita da Arábia Saudita.
A primavera Árabe e os distúrbios que se seguiram no país constituíram, assim, uma oportunidade para o movimento armado Houthi ascender à proeminência internacional ao capturar a capital, Sana'a, em 2014, e desencadear um conflito armado contra o governo internacionalmente reconhecido e a coligação liderada pela Arábia Saudita que interveio em seu apoio.
Os Houthis, por seu lado, receberam apoio logístico e moral do Irão, embora as relações entre eles e o regime de Teerão não sejam de forma alguma simples (vimos que os Houthis são Zaydis e o regime iraniano é Duodeciman).
A par da maioria zaydi, existe também, em muito menor escala (tanto em termos numéricos como de influência política), uma comunidade xiita entre os xiitas do Iémen. duodecimana ou imamita, cujos seguidores acreditam numa linhagem de doze imãs (líderes políticos e religiosos que, no xiismo, se acredita pertencerem à família direta de Maomé e serem especialmente amados e inspirados por Deus, sendo mesmo considerados por alguns como infalíveis e participantes da natureza divina), o último dos quais, Muhammad al-Mahdi, é considerado oculto (não morto, mas escondido e destinado a regressar como um Mahdi, ou redentor, uma espécie de messias islâmico).
Embora numericamente menos importante, o duodecimanos No entanto, têm uma certa visibilidade no país precisamente devido ao apoio que recebem do Irão, através da difusão de literatura religiosa e da construção de centros culturais, que o regime de Teerão utiliza para promover a sua doutrina.
Judeus no Iémen
O Iémen sempre foi, como vimos, uma encruzilhada de povos, culturas e rotas comerciais. É precisamente nesta terra que se encontra instalada, desde há milénios, uma das mais antigas comunidades judaicas da Diáspora, uma das mais orgulhosas e exóticas, considerada por muitos judeus ocidentais como o testemunho vivo das tradições e do aspeto moral, espiritual mas também físico do povo de Israel antes da sua dispersão pelos quatro cantos do mundo.
As origens desta comunidade são incertas e existem mais lendas do que fontes reais para reconstruir a sua história mais antiga.
Estes judeus viveram sempre isolados do resto da diáspora, até ao êxodo para Israel, à exceção de alguns laços comerciais ou religiosos esporádicos, vivendo dispersos em pequenos grupos no sul do país árabe, por vezes quase sem contacto entre si. A única grande comunidade era a de Sana'a, em cujo distrito se concentravam.
Os costumes comunitários caracterizavam-se por uma estrita adesão às tradições. Os casamentos, por exemplo, eram arranjados pelos pais numa idade precoce e as pessoas casavam logo na adolescência; as mulheres eram analfabetas e dependentes dos homens; a bigamia era generalizada, ao ponto de, ainda recentemente, em Israel, entre as antigas famílias de imigrantes, haver alguns iemenitas com duas mulheres.
O judaísmo deste grupo era estritamente rabínico e a sua presença no país era vista por eles como um período de exílio que terminaria com o seu regresso à Terra Prometida.
Para a maioria dos muçulmanos iemenitas (especialmente os zaidis), os judeus eram considerados impuros e proibidos de viver e de se misturar com os fiéis islâmicos, sendo sujeitos a assédio e discriminação.
Os israelitas iemenitas diferiam dos muçulmanos tanto no aspeto exterior, nomeadamente no vestuário, como noutras particularidades, como a língua. Falavam uma forma de árabe diferente da dos cidadãos de fé islâmica, tanto no vocabulário (o árabe falado pelos israelitas inclui palavras hebraicas e aramaicas) como no sotaque.
A partir de 1872, com a ocupação de Sana'a pelo exército otomano, as condições de vida da comunidade judaica iemenita, que eram bastante precárias e miseráveis, pareciam melhorar. No entanto, a partir de 1905, ano da derrota dos turcos pelos imãs zaydi, a qualidade de vida dos israelitas no sul do país árabe voltou a deteriorar-se.
Depois, em 1918, no final da Primeira Guerra Mundial e com a dissolução do Império Otomano, as tropas turcas abandonaram definitivamente o Iémen, onde as condições da comunidade judaica se mantiveram praticamente inalteradas até 1949-50, o período de emigração em massa para Israel.
Foi em 1947, na sequência da resolução da ONU sobre a partilha da Palestina, que o pogrom foi apenas o culminar de uma vaga de perseguições contra os judeus locais. Em resposta a este acontecimento, entre 1949 e 1950, com a operação "Tapete Voador", também conhecida como "Nas Asas da Águia", o governo israelita organizou uma emigração maciça de grande parte da comunidade para o Estado judaico, através de uma ponte aérea de cerca de 400 voos, que levou 49 000 judeus iemenitas e de Áden, ou seja, quase toda a comunidade, para fora do país.
Nos anos que se seguiram, a já escassa comunidade judaica que restava diminuiu ainda mais, devido à constante emigração e perseguição, até à década de 2000, altura em que a situação se agravou ainda mais com as crescentes ameaças dos extremistas islâmicos e a guerra civil. De facto, muitos dos judeus que restavam foram evacuados por organizações internacionais.
Em 2016, um dos últimos grupos de judeus iemenitas foi transferido para Israel. Hoje, apenas um punhado de judeus permanece no Iémen, o último remanescente de uma antiga comunidade, que vive isolada e sob constante ameaça.
Deve dizer-se que, em Israel, os judeus de origem iemenita representam atualmente uma elite artística e cultural (muitos cantores, actores e artistas são membros desta comunidade, apesar das difíceis condições de integração no passado): os mais famosos internacionalmente são os cantores Noa e a falecida Ofra Haza.
Cristianismo no Iémen
O cristianismo tem raízes muito antigas no Iémen, que remontam ao século IV d.C., portanto, muito antes do nascimento do Islão. A comunidade cristã instalou-se sobretudo na cidade de Nakhran, de que falámos no artigo anterior sobre os "mártires Omaritas" (Himyaritas).
Após a conquista islâmica no século VII, o cristianismo entrou em lento declínio, embora algumas comunidades tenham conseguido sobreviver durante alguns séculos. No entanto, as conversões em massa ao Islão, por vezes forçadas e outras vezes voluntárias (devido às difíceis condições de vida dos que professavam o cristianismo), levaram ao desaparecimento quase total da fé cristã no país.
Atualmente, existem apenas algumas comunidades cristãs no Iémen, na sua maioria trabalhadores estrangeiros e pessoal diplomático. As igrejas presentes são sobretudo católicas e protestantes e servem, tal como noutros países islâmicos (falámos disto num dos artigos sobre Marrocos), sobretudo estrangeiros.
Mesmo no Iémen, a Constituição declara que o Islão é a religião do Estado e que a Sharia é a fonte da lei. A liberdade religiosa é garantida de jure, mas de facto é muito limitada. De facto, a apostasia, ou seja, a conversão do Islão a outra religião, é considerada um crime punível com a morte segundo a lei islâmica. A construção de novas igrejas é, portanto, quase impossível e as actividades missionárias são estritamente proibidas.
A situação dos cristãos iemenitas convertidos ao Islão é muito complicada. Se não morrem, continuam a sofrer graves perseguições e, muitas vezes, têm de professar a sua fé em segredo para evitar a discriminação, a violência e as detenções.
A sociedade fortemente conservadora do Iémen tende a marginalizar aqueles que não seguem o Islão, especialmente numa altura como a atual, em que as tensões e o conflito em curso agravam ainda mais uma situação que, para as minorias religiosas, incluindo os cristãos, já era extremamente difícil.
Considere-se, de facto, um caso que causou comoção internacional, o das Irmãs Missionárias da Caridade (a ordem fundada pela Madre Teresa de Calcutá, presente no Iémen há décadas). Em 2016, quatro freiras desta congregação foram massacradas por um comando de homens armados que atacaram o seu convento em Aden.
A par deles, vários colaboradores etíopes da congregação, bem como pessoas idosas e doentes que as Irmãs cuidavam na altura, perderam também a vida, perfazendo um total de 16 mortos. Este trágico acontecimento pôs mais uma vez em evidência os perigos a que as comunidades cristãs e os trabalhadores humanitários estão expostos neste maravilhoso país que, infelizmente, nunca encontra a paz.
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Papa concede indulgência plenária para o Dia Mundial dos Avós e Idosos
No dia 28 de julho, Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, os católicos poderão obter uma indulgência plenária, de acordo com um decreto publicado pela Penitenciária Apostólica.
Pelo quarto ano consecutivo, a Penitenciaria Apostólica, por mandato do Papa, concede uma Indulgência Plenária por ocasião da Dia Mundial dos Avós e dos Idososque este ano se realizará no domingo, 28 de julho de 2024.
O tema deste ano, "Na velhice não me abandones", retirado do Salmo 71, sublinha a importância de honrar e cuidar das pessoas idosas na sociedade.
O dom espiritual da indulgência será concedido nesta ocasião também a várias categorias de fiéis. Antes de mais, aos avós, aos idosos e a todos os fiéis que participarão nas celebrações litúrgicas organizadas em todo o mundo nesta ocasião.
O mesmo se aplica a todos aqueles que dedicam o seu tempo a visitar os idosos em dificuldade ou em necessidade, bem como a todos os idosos doentes e às pessoas que deles cuidam, que não podem estar fisicamente presentes nas celebrações.
As condições para obter a Indulgência são as habituais: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração segundo as intenções do Sumo Pontífice.
Ao assinar o DecretoO Cardeal Angelo De Donatis, Penitenciário-Mor, sublinhou a importância pastoral da iniciativa, convidando os sacerdotes a disponibilizarem-se para ouvir confissões nesta ocasião.
Este prémio insere-se no contexto mais vasto dos esforços da Igreja Católica para promover a dignidade e o valor das pessoas idosas na comunidade cristã e na sociedade em geral.
A iniciativa reflecte também a atenção especial que o Papa Francisco sempre dedicou aos idosos durante o seu pontificado, reconhecendo o seu papel fundamental como guardiães da memória e transmissores da fé às novas gerações. Não é por acaso que, em 2022, o próprio Pontífice dedicou numerosas catequeses de quarta-feira ao "sentido e valor da velhice", a um "povo novo" e "entre as questões mais urgentes que a família humana é chamada a enfrentar nestes tempos".
A mensagem
Na Mensagem escrita por ocasião deste quarto dia, o Papa Francisco aborda especificamente o problema da solidão e da marginalização dos idosos na sociedade contemporânea, apelando a uma mudança cultural. Antes de mais, é necessário superar o crescente individualismo e as políticas e opções sociais que não reconhecem a dignidade de cada pessoa "para além de todas as circunstâncias".
A mudança de perspetiva proposta pelo Santo Padre não vê os idosos como um fardo, mas como um recurso precioso para a família, a sociedade e toda a Igreja. Não é por acaso que a Mensagem termina com um apelo à ternura e à proximidade para com os avós e os idosos, convidando-os a dizer "não te abandonarei" e a empreender um caminho de solidariedade intergeracional.
Oração
Na oração escrita para a ocasião, as preocupações e esperanças dos idosos são trazidas à tona e, juntamente com o respeito pela dignidade humana e o valor de cada pessoa, a confiança é colocada na renovação dos corações através da Palavra de Deus e da invocação do Espírito Santo.
A luta contra a solidão e a invocação da paz surgem também como um tema crucial, olhando para o futuro com uma esperança renovada.
Abertura do 10º Congresso Eucarístico Nacional com 50.000 pessoas em Indianápolis
No dia 17 de julho, teve início nos Estados Unidos o 10º Congresso Eucarístico Nacional. A abertura do evento contou com a presença de 50.000 pessoas de todo o país.
Gonzalo Meza-18 de julho de 2024-Tempo de leitura: 3acta
Na tarde de 17 de julho, teve início em Indianápolis, Indiana, o 10º Congresso Eucarístico Nacional. Mais de 50.000 pessoas reuniram-se no Lucas Oil Stadium para a abertura solene do evento. É a primeira vez em 83 anos que a Igreja Católica americana se reúne a nível nacional para estar, adorar e aprender sobre Nosso Senhor Jesus Cristo, presente na Santíssima Eucaristia.
O Congresso foi aberto com uma procissão solene e a exposição do Santíssimo Sacramento. Poucos minutos antes, cerca de 50 peregrinos entraram entre aplausos, acompanhando o Santíssimo Sacramento em procissão a partir de quatro percursos diferentes, cobrindo os quatro pontos cardeais dos EUA.
Dois anos de preparação
Em seguida, teve início a adoração, acompanhada de música ao vivo e de momentos de silêncio. A Eucaristia solene foi presidida por D. Andrew Cozzens, bispo de Crookston e presidente do conselho executivo do 10º Congresso. No seu discurso, o prelado dirigiu uma oração a Jesus: "Senhor, preparámo-nos durante dois anos e hoje estamos reunidos para celebrar o dom da Eucaristia. Durante esse tempo, fizemos milhares de horas de adoração em diferentes partes do país, a nível local e diocesano. Fizemos uma peregrinação de 65 dias de diferentes partes dos EUA. Hoje queremos ser transformados. Queremos que nos transformeis em discípulos missionários, cheios da alegria do Evangelho e gratos pela salvação que nos destes. Somos pecadores, mas somos teus. Pelo teu sangue fomos comprados para ti. Desejamos uma conversão profunda. Mudai os nossos corações para que sejam como os vossos. O nosso mundo precisa tanto de paz, especialmente a Ucrânia e a Terra Santa. Dá-nos o dom da unidade e da paz. Rezamos também pelo nosso país e pela nossa Igreja. Que sejamos todos um só, consagrados na tua verdade, unidos como uma só Igreja sob a direção do nosso Santo Padre, o Papa Francisco. Jesus, em Vós confiamos", disse o Bispo Cozzens, que deu a bênção no final.
Depois da adoração eucarística, o Cardeal Christophe Pierre, Núncio Apostólico nos EUA, abriu as sessões do Congresso. No seu discurso, referiu-se à Eucaristia como sacramento e fonte da unidade da Igreja: "Talvez a nossa principal oração para este Congresso Eucarístico seja a de que, como Igreja, possamos crescer em unidade para sermos mais fecundos na nossa missão.
Se estamos a viver bem a iniciativa do Renascimento e o Congresso Eucarístico, disse, um dos frutos deve ser a construção de pontes de unidade. Neste sentido, o cardeal exortou os presentes a pedirem ao Senhor, durante os seus momentos de oração e adoração, que "saiam da vossa zona de conforto para evitar as resistências que impedem a plena unidade e uma relação mais próxima com Deus".
Os caminhos de Deus
A segunda oradora principal do primeiro dia do Congresso foi a Irmã "Betânia" do Instituto Diocesano de Vida Religiosa Feminina "Irmãs pela Vida" ("...").Irmãs da Vida"), fundada em 1991 pelo Cardeal John J. O'Connor, de Nova Iorque. A sua missão é a defesa da vida humana através da evangelização (especialmente junto dos estudantes universitários) e do apoio às mulheres vulneráveis ou que sofreram um aborto.
No seu discurso, a Irmã Bethany fez alusão à Estrada de Emaús e relacionou-a com as suas experiências no seu apostolado pró-vida. As experiências dolorosas das nossas vidas, disse ela, as traições e os fracassos - por mais inesperados e indesejáveis que sejam - "podem ser convites a ter mais fé, esperança e amor. Numa palavra, a ter mais confiança para aceitar a bondade inabalável de Deus. Na fé, disse ela, não devemos medir as coisas pelos padrões do mundo, especialmente pelo sucesso, pois "Jesus morreu sofrendo o que aparentemente era um fracasso total. Mas foi assim que ele redimiu o mundo: triunfante na cruz", disse a Irmã Bethany.
A Irmã exortou os participantes a "não se apegarem aos caminhos do mundo", procurando apenas conforto, evitando as exigências do discipulado e resistindo à vontade do Senhor. A Irmã exortou os congressistas a levarem tudo a Jesus durante o congresso: "Nada é demais para ele. Peçam a sua misericórdia. Peçam a Sua graça e entreguem-se a Ele", concluiu.
Sessões, exposições e relíquias
Para além das sessões plenárias e das oportunidades de assistir a várias catequeses, os participantes no congresso poderão assistir à celebração da missa em várias línguas e recorrer ao sacramento da confissão. Paralelamente ao evento, realizar-se-ão duas exposições, a primeira sobre o manto de Turim e a segunda sobre os milagres eucarísticos.
Haverá também uma capela com as relíquias dos santos padroeiros do Renascimento e do Congresso Eucarístico: Carlo Acutis, Manuel González García, Pascual Baylón, Junípero Serra, Juan Diego e Elizabeth Ann Seton. Outra novidade será a apresentação nos Estados Unidos do musical francês "Bernadette", que narra as aparições da Virgem de Lourdes à pastorinha.
As actividades do Congresso prosseguem até 21 de julho e podem ser seguidas em direto no sítio Web do Congresso. sítio Web.
Joseph Bonnemain, Bispo de Chur: "O meu programa é encontrar o tesouro escondido em cada pessoa".
Joseph Maria Bonnemain é bispo de Chur, na Suíça, há três anos. Trata-se de uma diocese complexa e polarizada, mas a sua nomeação deu início a uma fase de normalização. Recebe a Omnes no seu gabinete, responde às nossas perguntas e explica o contexto em que exerce a sua missão de pastor.
Alfonso Riobó-18 de julho de 2024-Tempo de leitura: 17acta
Enquanto percorremos o andar principal do palácio episcopal a caminho do seu gabinete, D. Joseph Bonnemain aponta para alguns quadros encomendados por um dos seus antecessores para representar as virtudes de um bispo. Sorri e comenta que são um "convite a um exame de consciência". Não lhe pergunto o que é mais necessário, mas reparo na representação do bispo "prudentissimus". De acordo com o que Josef Pieper escreve sobre a prudência, na pessoa prudente "o conhecimento da realidade" seria "moldado para a realização do bem", e parece-me muito apropriado no contexto deste encontro.
Monsenhor Bonnemain explica que este espaço "palaciano" da Casa já não funciona e que, quando for possível obter o dinheiro necessário, tenciona restaurá-lo e torná-lo acessível aos visitantes. A sede episcopal de Chur (em inglês, Coira ou Cuera) tem uma longa história. Já existia no século V; é a mais antiga da Suíça e, mais ainda, a mais antiga a norte dos Alpes.
Conversei animadamente com Monsenhor Joseph Bonnemain durante várias horas. Conversámos em espanhol: Bonnemain nasceu em Barcelona e fala-o fluentemente, embora com as inseguranças ocasionais que são lógicas para quem não usa uma língua regularmente.
Se quiser, comecemos por analisar mais de perto a pessoa do Bispo de Chur. Quem é José Bonnemain?
- Um aprendiz. Penso que conhecer Deus e conhecer o homem é como mergulhar em dois infinitos. Por isso, estou cada vez mais consciente de que é preciso aprender. Na minha juventude, ouvi dizer dos primeiros cristãos: "Vejam como eles se amam". Esta frase deixou-me um pouco nervoso, porque pensei: "vê como eles amam", e não "como eles amam": como eles amam, com um amor aberto a todas as criaturas.
O desejo de aprender a amar sempre esteve comigo. É o que se aprende até ao fim da vida. E é também o tema do "Fratelli tutti"do Papa. Eu sou um aprendiz.
Na opinião pública suíça, há dois traços de carácter, provavelmente relacionados entre si, que são bem conhecidos. O primeiro é o seu amor pelo desporto...
- O meu pai era um grande desportista e praticava todo o tipo de desportos. Quando eu tinha um mês de idade, inscreveu-me num clube de natação em Barcelona, onde vivíamos, e costumava levar-me a nadar. Sempre nadei muito. Quando era estudante, comecei a ter problemas nas costas, mais concretamente na nuca, e comecei a fazer pesos. Também fiz jogging, futebol e outras coisas, mas nunca fui fanático por isso. atleta.
Depois disso, tentei fazer desporto regularmente, em princípio duas vezes por semana: porque sempre gostei muito, e talvez também um pouco por vaidade, para me manter em boa forma. Desde que sou bispo, é bastante difícil. Já é uma conquista se consigo, com algum esforço, ir ao ginásio uma vez por semana. Quando me tornei bispo, um canal de televisão quis fazer um programa sobre mim e, entre outras coisas, filmaram-me a levantar pesos; foi aí que começou o mito de que eu faço musculação.
Outra caraterística é a sua acessibilidade e franqueza. Sente-se à vontade com as pessoas e elas apreciam isso.
- Se um bispo não se sente próximo do povo e não está à disposição do povo de Deus, para que serve? É a isto que o Papa chama "ter o cheiro das ovelhas", e é fundamental para um bispo. Um pastor sem ovelhas? Estaria a perder o seu tempo.
Em todo o caso, não é um traço que me caracterize apenas como bispo. Antes disso, durante trinta e seis anos, estive próximo dos doentes no hospital onde era capelão, de manhã à noite. Este contacto pessoal muito intenso com os doentes, com os seus familiares, com os 1300 empregados e colaboradores do hospital, desde os médicos chefes até ao pessoal da limpeza, sempre preencheu a minha vida. Conhecê-los e conhecê-los, tornar-me uno com as alegrias, as tristezas, as lutas, os problemas, as desgraças de muitas pessoas todos os dias, foi uma escola de vida. E não mudou muito como bispo.
Monsenhor Joseph Bonnemain em conversa com Omnes no seu gabinete (Omnes)
É parecido com o Papa Francisco nesse aspeto?
- Tenho a impressão de que quando o Papa está com as pessoas, ele ilumina-se. É como se o cansaço ou os problemas que carrega sobre os ombros desaparecessem. Para mim é um pouco assim: quando estou com as pessoas, a minha energia volta, o meu entusiasmo pela vida.
Nos seus anos como capelão hospitalar, o que é que o realizou mais?
- Gosto de dizer que os doentes têm sido os meus grandes educadores. Se alguma vez fizer algo de sensato como bispo, será porque os doentes me educaram. Já contei em algumas ocasiões - embora ainda não no mundo de língua espanhola - que no início do meu serviço como capelão encontrei um doente, um italiano de cinquenta anos, que estava na fase terminal de um cancro. Eu ainda tinha a mentalidade de um jovem padre, mais ou menos recém-ordenado e quase inexperiente, pensando que na vida tudo é preto ou branco, bom ou mau, sem nuances. Estava preocupado porque este homem ia morrer e eu não queria que ele morresse sem receber os sacramentos. Fui vê-lo uma vez e ele deu uma desculpa: "Agora não é boa altura..., estou ocupado. Venha outro dia". Passados três ou quatro dias, voltei a tentar, e ele disse de novo: "O fisioterapeuta vem aí, não posso". Eu estava a ficar cada vez mais nervoso: este homem vai morrer sem os sacramentos! Na quarta ou quinta tentativa, ele olhou para mim e disse: "Olhe, Padre, tenho medo de si. O senhor é jovem, tem dois doutoramentos, é um desportista... Não! O que eu preciso é de um capuchinho velho, gordo e bom".
Naquele momento pensei: "Sepp, aqui está o Espírito Santo a falar. Tens de mudar. Um capuchinho velho, gordo e bom. Ótimo!". De facto, aprende-se com os doentes.
Continuas a cuidar dos doentes?
- Não, nem pensar! É claro que tenho algumas ligações com o mundo da medicina. Por exemplo, no ano passado, a associação suíça dos directores de hospitais convidou-me a dar uma conferência no seu congresso; há quinze dias, a associação nacional dos médicos de diagnóstico por ultra-sons, que reúne cerca de 800 médicos, convidou-me a dar uma conferência no seu congresso em Davos. Da mesma forma, todos os médicos directores do hospital ou do pessoal dos cuidados intensivos vieram visitar-me aqui no bispado. Sim, continuo em contacto, mas é muito diferente de quando era capelão.
Depois da medicina, estudou direito canónico. Uma grande parte do seu serviço na diocese esteve relacionado com os tribunais diocesanos. O que é que aprendeu e o que é que pôde contribuir como vigário judicial?
- Sim, sou vigário judicial há quarenta anos. Como sabem, nessa função, ocupo-me principalmente das anulações de casamento. Pude ver todo o leque de possibilidades neste domínio. Quando já o fazia há, digamos, vinte e cinco anos, pensava que já tinha ouvido todos os disparates que o coração humano pode fazer, mas todos os dias havia uma nova história, algo inacreditável. É por isso que repito muitas vezes que conheci toda a patologia do amor humano.
Mas à medida que fui tomando consciência desta patologia, não me tornei cético, antes pelo contrário: tornei-me mais entusiasta do que é o amor humano. Fiquei mais convencido de que o casamento é uma relação fiel, duradoura - e aberta à vida - entre um homem e uma mulher, que é uma escola de vida, um empreendimento incrível.
Desde que me ocupo de questões relacionadas com o abuso sexual, cheguei à convicção de que é um erro reduzir o problema ao abuso de menores por parte de clérigos. Não é uma boa abordagem. Aprendi, acima de tudo, duas coisas. A primeira é que o abuso de adultos, homens ou mulheres, também deve ser considerado. Quando há um tema ou contacto sensual ou sexual entre dois adultos numa relação de dependência, há abuso, porque a pessoa encarregada do cuidado espiritual ou pastoral está numa relação de superioridade em relação à pessoa que acompanha ou trata. Em segundo lugar, que o direito canónico não se deve limitar a considerar os crimes de abuso cometidos por clérigos. Por exemplo, nas nossas dioceses de língua alemã na Suíça, trinta e cinco a quarenta por cento dos responsáveis pela pastoral são leigos, não clérigos, e também eles podem abusar. Apresentei estas duas experiências em várias ocasiões através da Conferência Episcopal, tendo em vista as reformas do Direito Penal Canónico, e finalmente estas duas questões entraram no direito penal atual.
Mesmo assim, a ideia de abuso de adultos ainda está a lutar para entrar na legislação recente e nos documentos universais da Igreja.
Que marcos se destacam nos três anos desde que assumiu a liderança da diocese?
- Depende do que consideramos "marcos". Recordo-me agora de algo que, mais do que um marco, é um momento muito querido para mim. Trata-se da administração da Confirmação a um grupo numa paróquia de Zurique. Quando administro a Confirmação a jovens, tenho um encontro com os crismandos algumas semanas antes. Nesta ocasião, o catequista tinha preparado o encontro de modo a que cada um dos crismandos tivesse alguns momentos para falar um pouco de si - quem era, o que queria fazer na vida -, acender uma vela e fazer um desejo. Foi a vez de um rapaz de dezassete anos, natural de Zurique, que, diante de todos os seus companheiros, acendeu a vela e fez o seguinte pedido: "Peço a Deus que até ao fim da minha vida não perca a minha fé". Naquele momento, pensei: só de ouvir isto já vale a pena ser bispo.
E um outro momento que também pode ser considerado um marco. É sabido que, na diocese, existe uma grande polarização no seio do clero, entre os progressistas, que gostariam de mudar tudo, e os tradicionalistas, que pensam que tudo deve permanecer como sempre foi. Foi essa a situação que encontrei quando fui nomeado bispo, e que já conhecia. Pois bem, há dois anos, juntamente com o Conselho Presbiteral, quisemos organizar uma peregrinação com os padres da diocese a Sachseln, onde está sepultado São Nicolau de Flüe, o Irmão Klaus, considerado em toda a Suíça como o intercessor da paz e da harmonia. Quisemos não só reunir os membros de uma "fração", mas também aproximar-nos uns dos outros em peregrinação. E no final da peregrinação, ao cair da tarde, um padre aproximou-se de mim e disse-me: "Sabes, José, estive a falar com um irmão padre. Estive a falar com um irmão padre com quem tinha tomado a firme decisão de nunca mais falar na minha vida.
Para mim, estes são dois dos marcos mais importantes destes três anos. Para além disso, há a publicação do Código de Conduta da diocese, relativo à promoção de uma relação justa de proximidade e distância. Há alguns meses, publicámos também um documento ou vade-mécum para a transformação da diocese num sentido sinodal. E estamos a preparar um ano diocesano para 2025-2026, que terá como tema "Peregrinos da Esperança", o mesmo lema do Ano Santo Jubilar.
O bispo de Chur abençoa dois paroquianos (Gabinete de Comunicação da Diocese de Chur)
Qual é a transformação sinodal da diocese?
- Em suma, trata-se de aplicar o critério de escutar em conjunto, e não de tentar pôr em prática os seus próprios projectos com base nas suas próprias ideias ou convicções. Temos de agir com a abertura de saber que o Espírito Santo me está a falar através do que os outros estão a dizer. Sinodalidade é caminhar juntos, tentando discernir o que Deus quer. E isto a todos os níveis, desde o conselho paroquial até à direção de um organismo eclesiástico cantonal, na Cúria, etc. Há mesmo um ponto no vade-mécum em que o bispo se compromete a nomear um novo bispo, quando necessário, sinodalmente; ainda não sei como o vou pôr em prática.
A sua nomeação episcopal foi uma decisão pessoal do Papa Francisco, que também decidiu que permanecerá no cargo pelo menos até 2026. Qual é a intenção do Papa?
- Sim, o Papa Francisco escreveu-me a dizer que eu não deveria demitir-me até, pelo menos, cinco anos após a minha nomeação; o que acontece depois de 2026 está em aberto.
A nomeação do Papa foi, sem dúvida, uma resposta ao contexto de uma diocese complicada e muito polarizada. Tratava-se de encontrar uma forma de regressar à normalidade eclesial. Suponho que tentou nomear outros que não aceitaram e, no final, não teve outra alternativa senão pedir a Joseph Bonnemain. Não creio que o Papa tenha ficado entusiasmado comigo desde o início, mas no final Roma deve ter achado que era uma boa solução, porque eu conheço muito bem a Cúria diocesana depois de ter trabalhado lá durante quarenta anos.
A minha opinião é que um bispo não deve ter pretensões nobres ou aristocráticas e, para o meu gosto, todos esses símbolos distintivos devem ser eliminados. Em todo o caso, também não quero impor isso a ninguém.
Joseph Bonnemain, Bispo de Chur
Como é a diocese de Chur?
- É uma diocese complexa. Abrange sete cantões, com tradições culturais diversas. Além disso, existe uma organização religiosa propriamente eclesiástica e outra civil: é o chamado "sistema dual", que não é exclusivo da diocese de Chur, mas de quase toda a Suíça.
Quando o Estado considerou a possibilidade de assumir a coleta dos impostos eclesiásticos, impôs como condição que a instituição a apoiar tivesse uma estrutura democrática. Isto levou à criação de organizações cantonais católicas de direito público, reconhecidas pelo Estado, que cobram os impostos e também os administram. A dualidade existe também a nível paroquial. A paróquia não é apenas uma instituição de direito canónico, mas os seus fiéis são uma figura civil paralela: recebe os impostos, paga os salários dos que trabalham na paróquia, contrata-os e despede-os - incluindo o pároco - e encarrega-se de uma grande parte da administração do património.
As duas partes, canónica e civil, trabalham em coordenação. Isto tem as suas vantagens, porque o padre e os responsáveis pela pastoral podem concentrar-se nos aspectos pastorais, enquanto a administração, o financiamento, a construção, a reparação da igreja, etc. são feitos por estes organismos de direito público. Por outro lado, é evidente que, de certa forma, esta última condiciona a primeira, porque quem tem o dinheiro tem o poder; além disso, torna todos os processos de decisão lentos, como acontece frequentemente na Suíça.
Há quarenta anos, pensava que este sistema devia ser eliminado, mas agora penso que não é necessário; pode ser um bom sistema se as pessoas envolvidas tiverem a posição correcta e a mentalidade certa para serem fiéis. Não existe um sistema perfeito e, enquanto estivermos na Terra, tudo o que é material, financeiro e organizacional é aperfeiçoável. O sistema dual tem os seus prós e os seus contras, mas tudo depende das pessoas. Trata-se de conquistar os corações, de compreender as pessoas, de cuidar muito bem do diálogo, do intercâmbio.
Monsenhor Bonnemain em frente ao palácio episcopal durante a conversa com Omnes (Omnes)
É impensável para um suíço de coração não contar com a sua participação na tomada de decisões. Um suíço que pensa "suíço" pensa responsavelmente no bem comum a nível local: para os bombeiros, para a escola dos filhos, etc. E se eu estiver ativamente envolvido, tenho o direito de participar nas decisões. Do mesmo modo, na Igreja, não se pode esperar comprometer-se e depois só o pároco ou o bispo decidem; isso não funciona.
Basta pensar que, para nomear um pároco, não o posso fazer assim, diretamente. Quando uma paróquia fica vaga, tanto a Cúria diocesana como o órgão público paroquial publicam um anúncio para que os sacerdotes que possam estar interessados em mudar de paróquia se possam candidatar. Inicia-se então um diálogo sobre os candidatos entre a Cúria e o organismo paroquial. É constituído um conselho de discernimento: entrevistam-nos, vão às missas que celebram, perguntam-lhes a sua opinião sobre vários assuntos e, com essa radiografia, escolhem um deles, ou nenhum. Depois perguntam-me se esse pode ser o candidato, e eu apresento-o formalmente para ser eleito pela assembleia do corpo paroquial de direito público eclesiástico; em caso afirmativo, apresentam-no a mim para ser nomeado. Depois disso, são eles que lhe pagam o salário ou o despedem se não estiverem satisfeitos.
Pode ser um sistema complicado, mas creio, mais uma vez, que a receita é estar próximo das pessoas, compreendê-las e motivá-las para as coisas certas.
Falou há pouco de tensões no clero - existe algum movimento no sentido do "Caminho Sinodal" na Alemanha?
- Não. Desde o início, na Suíça, o caminho que seguimos é o processo sinodal da Igreja universal. Houve grupos e inquéritos a nível diocesano, e todos os resultados dos inquéritos diocesanos foram resumidos num documento nacional que foi enviado a Roma.
Neste processo normal da Igreja universal, é claro que há vozes ou grupos de pressão que querem incluir toda a questão da ordenação das mulheres, a aceitação dos homossexuais ou outras questões que são discutidas noutros locais. Mas eles levantam a questão no âmbito do processo geral.
Poucas pessoas estão tão familiarizadas com o problema dos abusos sexuais como o senhor, que desde 2002 é Secretário da Comissão Episcopal para esta questão.
- De facto, em 2002, foi criado um grupo de peritos da Conferência Episcopal e eu fui nomeado Secretário. Era uma nomeação provisória, mas durou vinte anos. Quando fui nomeado bispo, pensei que depois de todos estes anos deixaria o assunto, mas não, ainda lá estou. Agora sou responsável na Conferência por toda a questão. A Comissão é um grupo de peritos, onde há juristas, psicólogos, médicos, canonistas... A sua missão é aconselhar a Conferência Episcopal sobre as medidas a tomar, não é fazer investigações.
Por outro lado, no ano passado, os três "pilares" da Igreja na Suíça - as dioceses, as corporações eclesiásticas cantonais e as ordens religiosas - encomendaram um projeto de investigação específico à Faculdade de História do Direito da Universidade de Zurique, pedindo uma revisão histórica do que aconteceu no domínio dos abusos sexuais na esfera eclesiástica católica, desde 1950 até hoje. Pusemos à sua disposição todos os arquivos das Cúrias. Esse armário que vêem aí, atrás de vós, é o arquivo secreto diocesano da nossa Cúria; abri-o para eles e deixei-o aqui para que lessem, estudassem ou fotocopiassem o que quisessem. Isso foi apenas um estudo piloto. Agora encomendámos à mesma Faculdade um estudo aprofundado, que levará três anos a ser concluído.
Um dos efeitos da publicação dos resultados deste primeiro estudo, a 12 de setembro de 2023, foi o aparecimento de novas queixas: quase 200 novos casos. Já notámos que, sempre que o assunto está nos meios de comunicação social, aparecem novas vítimas; também vimos isso depois de a Conferência ter realizado um evento público para pedir perdão.
Notou algum progresso desde então?
- Parece-me, de facto, que fizemos progressos. Gostaria de recordar que, nesta matéria, sempre insisti na necessidade de "menos conversa e mais ação", porque penso que, como Igreja, já dissemos o suficiente sobre este assunto. Não quero que continuemos a repetir "blá, blá, blá", mas que passemos à ação, que levemos as vítimas a sério.
Ao longo do tempo, houve mudanças normativas, mas também mudanças a nível da cultura eclesial. Houve uma mudança de mentalidade e criámos confiança. No entanto, temos de continuar a trabalhar arduamente para que esta mudança de mentalidade seja interiorizada, se torne viva e se torne uma convicção de todos. É um longo caminho.
Como sempre digo, temos de conseguir uma Igreja que se liberte de si própria; que se esqueça de si própria; que não esteja preocupada consigo própria. Essa é também a grande ousadia a nível pessoal: um eu liberto de si mesmo; um eu que compreende que só se encontra no tu e no nós. O homem é comunicação, como disse Bento XVI. Enquanto nós, na Igreja, continuarmos a preocupar-nos com o bom nome, com a credibilidade, com a instituição, não percebemos nada. Temos de estar do lado das vítimas e não do lado da instituição. Esta mudança de mentalidade está gradualmente a ganhar terreno, mas ainda há muito a fazer.
E depois, a todos os níveis da Igreja, temos de tomar todas as medidas preventivas necessárias para criar uma relação de distância e de proximidade, de acompanhamento, que seja verdadeiramente profissional, em que a medida certa seja o respeito, o apoio e a liberdade. Tudo isto é um grande projeto.
Desde que me ocupo de questões relacionadas com abusos sexuais, aprendi duas coisas: que os abusos com adultos também devem ser considerados e que o direito canónico não deve limitar-se a considerar os crimes de abuso cometidos por clérigos.
Joseph Bonnemain, Bispo de Chur
A Santa Sé encarregou-o, há alguns meses, de investigar as alegações de má gestão contra seis bispos e de abusos contra um abade territorial (também membro da Conferência) e outros sacerdotes. Em que consistiu essa comissão?
- Tratava-se apenas de uma investigação preliminar ou prévia, não se tratava de julgar nada. De acordo com o cânone 1717 do Código, quando há uma possível transgressão ou uma abordagem imprópria, os factos são recolhidos primeiro para ver se há realmente um crime, um erro ou o que quer que seja; e cabia-me a mim.
Joseph Bonnemain cumprimenta uma menina (Gabinete de Comunicação da Diocese de Chur)
A imprensa perguntou se era apropriado que eu, como bispo, investigasse as acções de outros bispos. A conferência das corporações públicas cantonais propôs que eu fosse assistido por peritos leigos em direito, o que aceitei de bom grado. Fui assistido e acompanhado por um juiz cantonal da Suíça francófona e por um professor de direito penal e processual da Universidade de Zurique, que fizeram um trabalho maravilhoso. Nós os três redigimos o relatório final, com cerca de 21 páginas, frase a frase, e eu apresentei-o ao Dicastério Episcopal no final de janeiro de 2024. Desde então, estamos à espera.
Na Alemanha, há quem fale de "causas sistémicas" dos abusos. Na sua experiência, existem tais causas?
- Penso que se pode antes falar de "elementos" ou "circunstâncias" que favorecem os abusos. Por exemplo, um deles é o facto de não se examinar e avaliar suficientemente a idoneidade dos futuros sacerdotes e outros colaboradores pastorais. Numa altura em que se constata uma falta de padres, clérigos e assistentes pastorais, ou também uma falta de vocações nas ordens religiosas, poderíamos pensar: esta pessoa quer entrar, então que entre. A seleção teria de ser muito mais séria. Deveríamos perguntar-nos cem vezes se há idoneidade, se há maturidade psicológica e afectiva, uma sã compreensão da sexualidade, etc.
Uma das medidas que tomámos a partir de setembro de 2023 é exigir que todos aqueles que vão iniciar um percurso de formação teológica para depois trabalharem pastoralmente, tanto seminaristas como estudantes de teologia não seminaristas, se submetam a um exame psicológico minucioso, a fim de esclarecer se têm realmente as aptidões básicas para o trabalho pastoral baseado no trato com as pessoas em termos de afetividade, equilíbrio psicológico, saúde mental, etc. Penso que o facto de não se ter tido isto em conta foi uma dessas circunstâncias.
Por outro lado, penso que não ajuda o facto de haver pouca distinção de papéis na Igreja, ou seja, o chefe da diocese é, ao mesmo tempo, aquele que julga as situações. Isto cria um cenário difícil. Há que fazer um esforço muito maior para diversificar as funções de governação na Igreja. Relacionado com isto está também a questão de saber porque é que os clérigos devem estar envolvidos naquilo que é simplesmente administração e gestão. Tudo isto está também a ser levantado no Sínodo da Igreja universal.
A propósito do Sínodo sobre a Sinodalidade, o que espera da fase final em outubro?
- Estou a ler o "Instrumentum laboris" e vejo que a abordagem é a de uma Igreja sinodal missionária. O que o Papa repete sobre a Igreja em saída: "uscire, uscire, uscire...", "em saída", "em saída", "em saída", "em saída", "em saída", "em saída". Uma Igreja em saída é uma Igreja que não está preocupada consigo mesma; que não se preocupa em ser "rude"; que está convencida de que o único lugar para encontrar Deus é na periferia mais periférica, que sabe que quando tentamos levar Deus para algum lugar, descobrimos que Ele chegou antes de nós. E trata-se de "contaminar" este vírus, esta atitude, a toda a Igreja. Repito mais uma vez: precisamos de uma Igreja que não esteja preocupada consigo mesma, mas apaixonada pelo homem, como Deus se apaixonou pelo homem.
Penso também que um dos resultados concretos do Sínodo será o de fazer muito mais uso da subsidiariedade. Não se trata de querer governar tudo a partir do centro, mas de dar soluções concretas para situações concretas, regionais ou nacionais; de admitir que as coisas evoluem a um ritmo diferente nas diferentes regiões do mundo: que aquilo que talvez esteja maduro na Suíça - por exemplo, toda esta forma de colaborar, discernir e decidir entre todos, algo que para nós é muito mais normal do que noutros países - pode não estar maduro noutros lugares. Seria útil ter em conta as diferentes idiossincrasias. No fundo, trata-se de levar muito a sério a vocação universal dos baptizados e de eliminar todo o clericalismo.
Penso que um dos resultados concretos do Sínodo será a utilização muito maior da subsidiariedade: não querer governar tudo a partir do centro, mas dar soluções concretas para situações concretas, regionais ou nacionais.
Joseph Bonnemain, Bispo de Chur
Em vez do clássico brasão episcopal, utilizam um símbolo simples que representa uma cruz. Porquê?
- O meu lema episcopal é: "O homem é o caminho da Igreja", tirado da primeira encíclica de São João Paulo II. É importante ir ao essencial, e o essencial é isto: se Deus se fez homem em Cristo, é porque está apaixonado pelo homem, por cada homem e por todos os homens. É isto que temos de fazer: ir ao encontro do homem. Ou encontramos Cristo em cada homem, ou nunca o encontraremos.
No que diz respeito ao brasão episcopal, a minha opinião é que temos de dar graças a Deus pelo facto de a figura dos "bispos principescos" ("Fürstbischöfe"), como eram chamados alguns dos meus antecessores, os bispos de Chur, até 1830, ter terminado há dois séculos. A minha opinião é que um bispo não deve ter pretensões nobres ou aristocráticas e, na minha opinião, todos esses símbolos distintivos devem ser abolidos. Em todo o caso, também não quero impor isso a ninguém.
Certamente que a minha nomeação responde ao contexto de uma diocese complicada e com uma enorme polarização. Tratava-se de encontrar uma forma de regressar à normalidade eclesial.
Joseph Bonnemain, Bispo de Chur
Quais são os seus objectivos para o futuro, para além de 2026?
- Quando estou na rua e encontro pessoas, procuro transmitir a confiança de que Deus nos ama, ama cada homem e cada mulher e, por isso, não nos deixará escapar da sua mão. Por vezes, perante as guerras, as catástrofes climáticas, etc., alguém me pergunta se não estamos já no tempo do Apocalipse e se o mundo está a chegar ao fim. Eu digo-lhes sempre que não penso assim. Parece-me mais que está apenas a começar, porque há muito a fazer. Há muito trabalho pela frente até que o bem se instale, e Deus está do nosso lado.
O meu objetivo é transmitir essa confiança, essa esperança: a convicção das possibilidades de cada pessoa, de amar cada um, de saber que em cada homem e mulher há um tesouro escondido a encontrar. Pode estar um pouco sujo, mas no fundo está o que São Josemaria dizia, e que sempre me comoveu muito: que todas as pessoas são boas, embora algumas tenham de descobrir que podem ser boas. Este é o meu programa
Pastores segundo o coração de Cristo. 16º Domingo do Tempo Comum (B)
Joseph Evans comenta as leituras do 16º Domingo do Tempo Comum e Luis Herrera apresenta uma breve homilia em vídeo.
Joseph Evans-18 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
Cuidar das ovelhas é uma tarefa exigente e que consome tudo. E, por mais fracos e pecadores que sejamos, todos sentimos um sentimento de responsabilidade e de ternura para com aqueles que estão ao nosso cuidado: "Se vós, pois, que sois maus, sabeis dar coisas boas aos vossos filhos". (Lc 11,13). Somos simultaneamente ovelhas e pastores.
Certamente, somos ovelhas, e quando Jesus olhava para as multidões, como nos ensina o Evangelho de hoje, e as via como ovelhas sem pastor, tinha-nos também em mente. Por isso, Ele, o Bom Pastor, deu-nos pastores, sobretudo o Papa, a quem confiou em primeiro lugar o cuidado das ovelhas (cf. Jo 21, 15-17).
Temos de nos reconhecer como ovelhas, e isso faz parte da nossa humildade. Temos grande necessidade de proteção e há muitos lobos e feras à solta, desejosos de nos devorar (cf. Jo 10,12; 1 Pd 5,8). Se aceitarmos que precisamos dos cuidados do Bom Pastor, Ele manter-nos-á seguros no seu redil (Jo 10,1-16), dar-nos-á pastores que nos guiem e nos ensinem longamente, como ensinou à multidão.
Mas também somos pastores e isso significa que temos de suportar o fardo de cuidar dos outros, quer sejamos pais, exerçamos autoridade espiritual na Igreja ou simplesmente sintamos responsabilidade pelos irmãos, amigos, colegas ou subordinados no trabalho.
"Ai dos pastores que se dispersam e deixam perder as ovelhas do meu rebanho" - oráculo do Senhor.-Jeremias ensina na primeira leitura. Ai também dos pastores negligentes, tão preocupados com a sua própria comodidade que se descuidam das ovelhas que têm ao seu cuidado. Como Caim teve de aprender, sim, somos o guardião do nosso irmão (Gn 4,9). Aspiremos, antes, a estar entre os bons pastores que Deus promete, através de Jeremias, suscitar para cuidar e alimentar o seu rebanho. Somos bons pastores quando somos bons pais, bons sacerdotes, bons amigos ou irmãos, bons patrões ou colegas.
Mas, como no caso de Jesus, isso exigirá a perda de tempo e de conforto pessoal. Jesus tinha ouvido falar da morte de João Batista e, sem dúvida, essa foi uma das razões pelas quais quis retirar os seus discípulos para um lugar solitário. Queria ter tempo para chorar a morte do seu amigo. Também queria passar algum tempo com os discípulos para os ajudar a processar e a celebrar os seus primeiros êxitos no trabalho de evangelização. Jesus queria tempo e espaço para chorar e para se alegrar. Nenhum dos dois lhe foi concedido. As multidões vieram e isso foi o fim do seu descanso. No entanto, ensinou-lhes generosamente "uma série de coisas". Isto é ser um pastor segundo o coração de Cristo: estar disposto a renunciar ao descanso legítimo e ao cuidado de si próprio quando o cuidado dos outros o exige.
Homilia sobre as leituras de domingo 16º Domingo do Tempo Comum (B)
O sacerdote Luis Herrera Campo oferece a sua nanomiliaUma breve reflexão de um minuto para estas leituras dominicais.
Indianápolis prepara-se para o 10º Congresso Eucarístico Nacional
De 17 a 21 de julho, os católicos americanos nos Estados Unidos celebrarão o 10º Congresso Eucarístico Nacional, um evento muito especial que faz parte da iniciativa do Renascimento Eucarístico.
Gonzalo Meza-17 de julho de 2024-Tempo de leitura: 3acta
Está tudo pronto em Indianápolis, Indiana, para o início do 10º Congresso Eucarístico Nacional, de 17 a 21 de julho, que terá lugar no Centro de Convenções de Indianápolis e no Lucas Oil Stadium.
Alguns dos mais de 50.000 participantes registados de todos os Estados Unidos já começaram a chegar. O Congresso é o primeiro a ser realizado a nível nacional desde a Segunda Guerra Mundial e faz parte da iniciativa "Renascimento Eucarístico", um programa de três anos que começou em 2022 e foi promovido pelos bispos do país com o objetivo de renovar a Igreja Católica nos Estados Unidos através do conhecimento e do encontro de Nosso Senhor Jesus Cristo presente na Sagrada Eucaristia.
Para este evento, o Papa Francisco nomeou o Cardeal Luis Tagle como seu enviado extraordinário. Na carta de nomeação, o pontífice pede ao cardeal que "transmita aos paroquianos uma ardente devoção à Eucaristia" e estende a sua bênção apostólica a todos os participantes. O Cardeal Tagle presidirá à Missa de encerramento no domingo, 21 de julho.
O que vai acontecer no Congresso Eucarístico?
Ao longo dos cinco dias, os participantes no 10º Congresso poderão participar na Santa Missa em inglês, espanhol e outras línguas; poderão também assistir ao Sacramento da Confissão e ter momentos de adoração diante do Santíssimo Sacramento. Haverá também uma secção dedicada à exposição e veneração das relíquias de Elizabeth Ann SetonManuel González García, Junípero Serra e Carlo Acutisentre outros.
O congresso oferecerá uma série de conferências com temas diferentes para públicos diferentes (jovens, líderes paroquiais, clero, etc.). Estas serão apresentadas por oradores e académicos de renome do mundo católico americano, incluindo o Cardeal Christophe Pierre, Núncio Apostólico nos EUA, o Bispo Robert Barron, o Padre Mike Schmitz, o Padre Robert Spitzer, o Dr. Scott Hahn e o Dr. Hosffman Ospino, entre muitos outros.
Tim Glemkowski, diretor executivo do Congresso, disse que, na véspera do evento, "há muita excitação e energia", porque este foi preparado durante muitos meses, mas até agora "a graça de Deus tem sido derramada abundantemente". Jason Shanks - que substituirá Tim Glemkowski a 1 de agosto - afirmou que "este momento faz parte de um movimento muito mais vasto no seio da nossa Igreja", acrescentando que a missão deste Renascimento Eucarístico não estará completa enquanto cada católico não tiver uma relação pessoal e profunda com o Senhor Jesus, que está real e verdadeiramente presente na Santíssima Eucaristia.
Rezar pela paz
Andrew Cozzens, Bispo de Crookston e Presidente do Conselho de Administração do 10º Congresso Eucarístico, referiu que o Congresso foi planeado para garantir todas as condições de segurança. "Contratámos os serviços de uma empresa de segurança reconhecida a nível nacional, que tem trabalhado em coordenação com as unidades de informação e as autoridades policiais a nível local, estatal e federal", afirmou.
O prelado acrescentou que é um privilégio "reunirmo-nos em oração com Nosso Senhor Jesus no Santíssimo Sacramento, numa altura em que o nosso país e o mundo precisam da paz que só vem d'Ele. Estaremos a rezar pela cura das divisões nos EUA e pelo fim da violência", concluiu o Bispo Cozzens.
Preparativos para o Congresso Eucarístico
Como parte do Reavivamento Eucarístico e em preparação para o 10º Congresso, realizaram-se várias iniciativas locais e diocesanas em todo o país, incluindo uma peregrinação eucarística nacional que culminou em Indianápolis a 16 de julho e percorreu 6.500 milhas ao longo de quatro rotas. Cerca de 250.000 pessoas participaram na peregrinação. Realizaram-se também dezenas de congressos eucarísticos e procissões diocesanas com o Santíssimo Sacramento.
Além disso, com a ajuda de teólogos, os organizadores produziram uma série de sete vídeos formativos intitulados "Jesus e a Eucaristia". Este material foi concebido para fazer parte e encorajar pequenos grupos de estudo a nível paroquial. Até à data, os vídeos tiveram 300.000 visualizações em várias plataformas de streaming. Mais de 12.000 líderes paroquiais e uma equipa de "pregadores eucarísticos" estiveram envolvidos na divulgação destas iniciativas. No final do congresso, os bispos enviarão "missionários eucarísticos", cuja tarefa será ir às periferias das suas comunidades e continuar a promover o amor e o conhecimento de Nosso Senhor presente no Santíssimo Sacramento do Altar.
Algumas das liturgias e sessões do Congresso podem ser seguidas de 17 a 21 de julho no sítio Web do evento.
Na Ucrânia devastada, o trabalho da diplomacia da Santa Sé
Mais de dois anos após o início da invasão da Ucrânia pela Rússia, a ação diplomática da Santa Sé centrou-se na questão humanitária.
Andrea Gagliarducci-16 de julho de 2024-Tempo de leitura: 4acta
Não houve tempo para nos regozijarmos com a libertação de dois padres católicos gregos presos há mais de dois anos, quando o sonho de paz na Ucrânia foi mais uma vez posto à prova.
De facto, a Rússia atacou Kiev em 8 de julho, atingindo duas importantes instalações médicas ucranianas, incluindo o maior hospital pediátrico da Ucrânia, fazendo 27 mortos só na capital e 38 no total, e mais de uma centena de feridos.
Foi um ataque brutal, que conduziu, excecionalmente, à A Santa Sé enviará um comunicado O Papa Francisco sublinhou a sua "profunda angústia" e o seu apelo a "formas concretas de pôr termo aos conflitos em curso".
A declaração foi feita em 10 de julho e referia-se também ao ataque a uma escola gerida pela ONU em Gaza. Mas se a entrada da Terra Santa em cena é relativamente mais recente, na sequência da resposta israelita aos brutais ataques de 8 de outubro de 2023, nos últimos dois anos a Terra Santa tem sido um ator importante no conflito de Gaza. Papa Francisco sempre dirigiu um pensamento à "Ucrânia atormentada" no final das audiências gerais e das orações do Angelus.
No entanto, a diplomacia da Santa Sé parece bloqueada, incapaz de funcionar efetivamente. A vontade de mediação da Santa Sé não foi ouvida. No entanto, a Santa Sé foi bem sucedida no domínio humanitário e, sobretudo, na troca de prisioneiros.
Libertação dos dois padres greco-católicos
A 28 de junho chegou a notícia de que os padres católicos gregos Ivan Levytskyi e Bohdan Heleta tinham sido libertados do cativeiro russo. Os dois, membros da Congregação do Santíssimo Redentor, foram libertados na sequência de uma troca de prisioneiros. Tinham passado quase dois anos em cativeiro depois de terem sido detidos em Berdyansk a 16 de novembro último. Há muito tempo que não se ouvia falar deles.
A Igreja greco-católica ucraniana, à qual pertenciam os dois sacerdotes, não se tem poupado a esforços nos últimos anos para garantir a sua libertação, tal como a Santa Sé, que abriu canais discretos nos últimos dois anos para permitir a libertação dos dois sacerdotes.
Antes do bênção urbi et orbi na Páscoa passada, O Papa Francisco lançou a campanha "Todos por Todos", apelando a uma troca total de prisioneiros entre a Rússia e a Ucrânia. A libertação dos dois padres também faz parte dos esforços desta campanha.
A troca de prisioneiros é uma iniciativa separada da do regresso a casa das crianças ucranianas que se encontram atualmente em território russo devido à guerra.
O regresso a casa das crianças - deportadas segundo os ucranianos, acolhidas por famílias segundo os russos - era o objetivo da missão do Cardeal. Matteo Zuppi, O Papa foi o enviado do Papa à Ucrânia e à Rússia - bem como aos Estados Unidos e à China - precisamente com o objetivo de abrir um canal de intercâmbio. O mecanismo funcionou, embora para menos crianças do que os ucranianos tinham afirmado. Agora, há também um bom sinal do mecanismo de troca de prisioneiros.
Em suma, a diplomacia da Santa Sé está a produzir alguns resultados positivos. De tal forma que Sua Beatitude Sviatoslav Shevchuk, o arcebispo maior da Igreja greco-católica ucraniana, quis agradecer diretamente ao Papa Francisco, numa declaração publicada a 29 de junho, por ter "contribuído pessoalmente para a libertação dos nossos padres redentoristas Bohdan e Ivan", sublinhando que "apesar dos grandes obstáculos, uma vez que o seu cativeiro durou mais de um ano e meio, os esforços da diplomacia vaticana alcançaram um resultado vitorioso".
Para além de agradecer aos diplomatas da Santa Sé, o Cardeal Parolin e o Cardeal Zuppi, "a quem o Santo Padre confiou a libertação dos cativos e prisioneiros ucranianos", Shevchuk agradeceu também especialmente ao Arcebispo Visvaldas Kulbokas, Núncio Apostólico na Ucrânia.
O Presidente ucraniano Zelensky agradeceu igualmente à Santa Sé pelo seu trabalho.
A frente diplomática
O que está a acontecer na frente diplomática? O Cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado do Vaticano, que participou na Cimeira de Alto Nível para a Paz na Ucrânia, realizada na Suíça a 15 e 16 de junho, deu orientações claras.
A Santa Sé não assinou a declaração final por ser apenas um país observador. No entanto, partilhou o seu espírito com um discurso do Cardeal Parolin.
Parolin sublinhou a ausência da Rússia na cimeira e recordou que a única forma de alcançar uma paz verdadeira, estável e justa é "o diálogo entre todas as partes envolvidas", esperando que "os esforços diplomáticos atualmente promovidos na Ucrânia e apoiados por tantas nações sejam reforçados".
Parolin recordou que a Santa Sé "reafirma a validade do princípio fundamental do respeito pela soberania de cada nação e pela integridade do seu território", palavras que não são triviais e que constituem uma clara condenação da agressão russa.
Ao mesmo tempo, acrescentou que a Santa Sé está "preocupada com as trágicas consequências humanitárias do conflito" e, por isso, está na vanguarda dos esforços para facilitar o repatriamento de crianças e encorajar a libertação de prisioneiros.
De facto, a Santa Sé é também observadora na Coligação Internacional para o Repatriamento das Crianças Ucranianas da Rússia e está em contacto direto com as autoridades russas e ucranianas através de um mecanismo criado na sequência da visita do Cardeal Matteo Zuppi a Kiev e Moscovo.
A Santa Sé está também preocupada com a falta de respeito pelas Convenções de Genebra no tratamento dos prisioneiros, tanto civis como militares, e lamenta "a dificuldade de criar com o Comité Internacional da Cruz Vermelha uma comissão médica conjunta para tratar da situação dos prisioneiros de guerra que necessitam de cuidados urgentes".
Mas, acima de tudo, o Cardeal Parolin também declarou que a Santa Sé está empenhada em manter contactos com as autoridades russas e ucranianas e está pronta a ajudar na implementação de possíveis iniciativas de mediação que sejam "aceitáveis para todas as partes e benéficas para os interessados".
Em suma, no caso de uma réstia de esperança de paz, a Santa Sé estaria pronta a ajudar.
O autorAndrea Gagliarducci
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Tinha cerca de 12 anos quando, numa dinâmica de grupo na minha escola, uma freira sábia e simpática nos perguntou: "Quem é que admiram e porquê?
As respostas foram variadas, alguns mencionaram actores ou actrizes famosos, outros desportistas de renome, eu lembro-me que pensei muito seriamente primeiro nos meus pais, mas quis referir-me a alguém externo porque era o que os outros faziam e disse: "São João Bosco!"
Os meus pais falavam muito dele porque eram colaboradores salesianos. Falavam dele com admiração, lembro-me que me impressionava o facto de ele ser um grande educador e de se aproximar dos jovens com a força do amor. Fazia malabarismos e outros truques para os atrair a Jesus. Convidava-os a estarem sempre alegres, com um sorriso sincero.
Ao longo dos anos, apercebi-me de que a sua personalidade me influenciou. Quis ser como ele em muitos aspectos e o seu exemplo contribuiu definitivamente para o meu próprio modo de vida, em que tento agradar a Deus mesmo no meio de tropeções e quedas.
84 % das pessoas afirmam que o facto de terem um modelo a seguir as fez sentir-se mais confiantes em relação ao que querem na vida. Quem admira alguém, fá-lo devido a certos traços de personalidade que se harmonizam com um sentido de vida.
Quando as crianças e os jovens têm modelos a seguir e reflectem sobre as razões pelas quais o fazem, encontram um sentido para as suas vidas. E este é, de facto, um pilar formidável para a construção de vidas saudáveis, felizes, santas e frutíferas.
No mundo atual, os nossos filhos seguem "influenciadores" que não praticam necessariamente virtudes ou têm ideais elevados. Há muitos que apenas nos convidam a experimentar sensações novas, extremas, arrepiantes...
Nós, pais, estamos lá para orientar. Apresentemos aos nossos filhos verdadeiros modelos a seguir. Há jovens que sabem aproveitar a vida de uma forma saudável e de acordo com uma fé madura.
Três deles são relativamente recentes e estão a caminho dos altares. Vejamos as suas vidas e qualidades: Schäffer, Frassati e Acutis.
Guido Shäffer
O brasileiro Guido Shäffer (1974-2009), o "anjo do surf". De carácter alegre, tinha uma paixão pelo surf porque, quando surfava, sentia-se mais próximo de Deus. De família católica, vivia a sua fé com naturalidade. Organizava-se com os amigos para rezar o terço na praia antes de entrar nas ondas. Era médico e entrou para o seminário porque queria ser padre. Trabalhou na Santa Casa da Misericórdia, cuidando de doentes pobres e, sobretudo, de pessoas com VIH. Tinha um grupo de oração chamado "Fogo do Espírito Santo". Por esta razão, a sua vida é descrita no livro intitulado: "Guido, mensageiro do Espírito Santo".
Morreu aos 34 anos, enquanto surfava... A prancha que transportava bateu-lhe na nuca e sofreu um traumatismo craniano. Um dia, comentou que gostaria de morrer assim, no mar, a fazer o que mais gostava. Morreu pouco antes de ser ordenado sacerdote, deixando uma marca indelével naqueles que o conheceram.
Pier Giorgio Frassati
Pier Giorgio Frassati (1901-1925), italiano. Montanhista. Aprende a fé com a mãe, mas o pai é anti-clerical e não crente. Numa altura em que a Itália estava em conflito após a Primeira Guerra Mundial, chegou a dizer: "Daria a minha vida para acabar com a guerra".
Esteve envolvido em organizações católicas empenhadas em fazer o bem. Dedica-se a cuidar dos pobres, dos doentes e dos sem-abrigo. Queria estar próximo dos mineiros que sofriam condições terríveis, injustas, quase de escravatura. Fundou um grupo de oração e adoração de jovens a que chamava, em tom de brincadeira, "Os Tipos Suspeitos", cuja máxima era: "poucos, mas bons como macarrão". Quando morreu de poliomielite, foram muitas pessoas ao seu funeral, os pobres que ele amava, os seus amigos e muitos que o admiravam. O pai lamentou não ter conhecido bem o filho e diz-se que o primeiro milagre de Pier Giorgio foi a conversão do pai, que morreu depois de receber o Santo Óleo como filho da Igreja.
Carlo Acutis
Carlo Acutis (1991-2006). Italiano, "o influenciador de Deus". Filho de pais católicos, mas não praticantes. Desde muito cedo demonstrou grande amor pela Eucaristia, pelas devoções marianas, pelos lugares sagrados. Um millennial, um verdadeiro nativo digital que sabe evangelizar com as novas tecnologias. Poderia tornar-se "o santo padroeiro da Web". Criou um sítio sobre os milagres eucarísticos e outro sobre as aparições marianas, atraindo assim os jovens para os temas da fé. Foi um catequista ideal para o seu tempo, com grande pedagogia e convicção. Costumava dizer que a Eucaristia é a autoestrada para o céu.
Que em cada família saibamos falar daqueles que admiramos. Façamos o exercício de conhecer melhor esses santos jovens e actuais que tanto nos podem inspirar. Como mudaria a face da terra se os nossos maiores influenciadores fossem como eles: saudáveis, felizes e santos!
Eliminar o sofrimento das nossas vidas impede-nos de amadurecer e de compreender a nossa natureza humana e, por conseguinte, vulnerável.
15 de julho de 2024-Tempo de leitura: 3acta
É preciso ser um homem corajoso para fazer o que a cantora canadiana fez no seu documentário "Eu sou: Céline Dion" (Prime). O seu testemunho preenche a doença e a dor com dignidade. São temas tabu na nossa sociedade ocidental, mas é preciso falar deles.
O filme, realizado por Irene Taylor, mostra-nos a face mais humana da artista multimilionária de sucesso: sem maquilhagem, com roupas do dia a dia, sem qualquer glamour, a pessoa na sua realidade mais crua. Uma crueza que advém do facto de sofrer há 17 anos de uma síndrome muito rara, conhecida pela sigla SPR (Síndrome da Pessoa Rígida), que provoca rigidez muscular e espasmos dolorosos que a incapacitam não só para prosseguir a sua carreira musical como estrela internacional, mas também para as tarefas mais básicas da vida quotidiana.
"I am" permite-nos admirar a sua beleza, o seu sucesso e a sua voz prodigiosa com fragmentos das suas melhores interpretações e, ao mesmo tempo, contemplar a mesma pessoa nos seus momentos de fracasso, de dor, de incerteza. Qual das duas histórias de Celine é a boa e qual é a má? Podem as duas ser separadas? O que é mais admirável nela, a sua incrível modulação de voz enquanto actua? O meu coração vai continuar Ou o gemido indescritível com que suporta a aterradora crise espasmódica que, durante seis intermináveis minutos, nos mostra no seu documentário?
Uma única história, uma única pessoa dotada de uma dignidade infinita em qualquer circunstância, em qualquer situação, porque a dor, a doença ou o sofrimento moral fazem parte da vida humana, de toda a vida humana, e não são incompatíveis com a felicidade.
Num mundo repleto de ibuprofeno e paracetamol, a mais pequena dor parece insuportável. Também temos uma ânsia pelos chamados "medicamentos da alma", como os ansiolíticos ou os antidepressivos, porque reduzimos ao mínimo o limiar do sofrimento psicológico.
Sempre me impressionou o testemunho dos missionários que trabalham nas zonas mais pobres e abandonadas do mundo, quando sublinham a alegria das pessoas que servem, por oposição à tristeza das pessoas do nosso primeiro mundo. Igualmente paradoxal é a alegria essencial das crianças deficientes desde a mais tenra idade ou a das freiras de clausura cuja vida é cheia de privações.
Não é verdade que, ao tentarmos fugir a todo o custo de qualquer sofrimento, conseguimos vivê-lo com mais angústia? O que é pior, a dor ou o medo da dor? O que causa mais sofrimento, contemplar a agulha hipodérmica a aproximar-se do braço ou a própria picada graças à qual podemos evitar a doença e até a morte?
Evitar até a mais pequena dor acaba por funcionar contra nós próprios, prejudicando a nossa capacidade de a enfrentar quando ela se apresenta de forma grave. Afastar o sofrimento das nossas vidas impede-nos de amadurecer e de compreender a nossa natureza humana e, por conseguinte, a nossa vulnerabilidade. É por isso que acredito que este documentário é tão necessário, porque desmascara a falsidade deste mundo doentio de felicidade instagramável que leva tantos ao desespero e até ao suicídio. Eu sou a Celine dá-nos um banho de humanidade face à bolha de vaidade a que as redes sociais nos conduziram.
E não, não se trata de nos deleitarmos com o sofrimento dos ricos e famosos para tornar a nossa vida cinzenta mais suportável, nem de exaltar o sofrimento por uma espécie de masoquismo, mas de o contemplar e enfrentar, sem o esconder, como um mistério que pertence à essência do homem. Um mistério que se ilumina à luz de Jesus Cristo. Ele, como o Bom Samaritano, ensina-nos a aliviar a dor das pessoas que sofrem à nossa volta. É por isso que acompanhar, cuidar e curar foram historicamente verbos elevados ao estatuto de heróis por aqueles que acreditavam que "tu fizeste isso a mim"; e, por outro lado, o Crucificado convida-nos a sermos participantes dos seus sofrimentos e a completarmos com o nosso próprio sofrimento o que falta ao dele.
Em Salvifici DolorisNa sua carta, São João Paulo II resumiu este duplo aspeto do significado do sofrimento da seguinte forma: "Cristo, ao mesmo tempo, ensinou aos homens fazer o bem com o sofrimento e fazer o bem aos que sofrem".
A dor de Céline Dion, tal como a sua ou a minha, pode ser transformada em vida com o poder de Jesus. É o poder de se dar pelos outros, ou, como diz um dos maiores êxitos da nossa querida cantora, de se dar pelos outros, O poder do amor.
Jornalista. Licenciado em Ciências da Comunicação e Bacharel em Ciências Religiosas. Trabalha na Delegação Diocesana dos Meios de Comunicação Social em Málaga. Os seus numerosos "fios" no Twitter sobre a fé e a vida diária são muito populares.
Muitos casais aperceberam-se da necessidade de um acompanhamento ao longo do percurso. Daí a importância de iniciativas como "Kana Welcome", um projeto em que vários casais se encontram mensalmente para treinar, conversar e criar uma comunidade.
Martina Berlim-15 de julho de 2024-Tempo de leitura: 3acta
De acordo com as estatísticas oficiais, em 2022, realizaram-se 12 341 casamentos em Berlim. No mesmo período, registaram-se 5 851 divórcios. Os católicos representam uma minoria na capital alemã; em toda a arquidiocese, que abrange também uma grande parte dos estados federais de Brandenburgo e Mecklenburg-Vorpommern, o que a torna a segunda maior diocese alemã, representam apenas sete por cento da população total. Em 2023, foram realizados 1 610 baptismos, 1 952 primeiras comunhões, 1 157 crismas e apenas 269 casamentos.
A realidade mostra que são cada vez menos os católicos que optam pelo casamento canónico, e aqueles que o fazem, muitas vezes, não se encontram suficientemente preparados para este importante passo.
Casamentos não acompanhados
Quando o meu marido e eu frequentámos um curso de formação para preparação para o casamento há quase 25 anos, as conversas com o padre limitavam-se a verificar os impedimentos canónicos e os pormenores da cerimónia. Não recebemos muitas orientações sobre o significado do matrimónio cristão ou católico, nem sobre o apoio que poderíamos receber em tempos de crise (que inevitavelmente surgem).
Há alguns anos, uma amiga falou-me de um programa intensivo e frutuoso de preparação para o matrimónio na sua comunidade espiritual. Perguntámo-nos se, mesmo que já estivéssemos casados, poderíamos receber algum tipo de acompanhamento na nossa vida conjugal. Descobrimos que eram muito poucos os casamentos católicos que tinham este tipo de acompanhamento, embora os que tinham o considerassem muito benéfico.
Com o tempo, apercebemo-nos de que o casamento pode ser difícil e que as crises são inevitáveis, para uns mais cedo, para outros mais tarde. Ficámos preocupados ao ver casamentos falharem, casais separarem-se e amigos que se amavam tornarem-se inimigos. Perguntámo-nos: não deveria ser diferente para nós, cristãos? Não é Deus o terceiro membro da nossa aliança? Como podemos convidar Deus para o nosso casamento e permitir que a nossa fé nos ajude a enfrentar as tempestades?
Juntamente com outros casais da nossa paróquia (St. Matthias, no bairro berlinense de Schöneberg), começámos a procurar programas para casais. Visitámos paróquias, participámos em cursos e partilhámos as nossas experiências. Descobrimos cursos de preparação para o matrimónio e de crise matrimonial, conhecemos as ofertas da "Equipe Notre Dame" em França e do "Marriage Encounter" nos Estados Unidos, participámos em cursos online para famílias e convidámos casais do "Marriage Encounter" a juntarem-se a nós.Kana Bem-vindo".
"Kana welcome", os casamentos em destaque
"Kana Welcome" é uma oferta para casais que se organizam de forma prática. O princípio vem da comunidade "Chemin Neuf", um movimento carismático da Igreja Católica com vocação ecuménica: quatro ou cinco casais reúnem-se em nove sessões mensais e passam um fim de semana ou um dia em família juntos. Um dos casais assume a organização e os casais revezam-se na direção de cada um dos serões. No final das sessões, pode ser organizada uma atividade conjunta na paróquia, como um pequeno-almoço ou um café, o que permite à paróquia conhecer "Kana Welcome" e aos casais que ainda não conheciam a paróquia encontrar um lugar para a sua vida espiritual.
Achámos o conceito de "Kana Welcome" acessível devido à sua simplicidade. Os temas, detalhados num folheto, centram-se na vida quotidiana de um casal, mas podem ser adaptados de acordo com as necessidades. Para nós, era fundamental incluir um aspeto espiritual nos encontros. É por isso que os nossos serões começam e terminam com uma oração e as reuniões são presididas por uma imagem piedosa.
O nosso pároco apoiou com entusiasmo a nossa iniciativa. Em cada reunião, ele faz uma breve introdução espiritual relacionada com o tema do dia e dá-nos uma bênção antes de partir. De seguida, um dos casais apresenta o tema e o debate decorre em pares, seguindo uma regra: um fala e o outro ouve, depois trocam-se os papéis. Esta dinâmica ajuda os mais faladores a aprender a ouvir e os mais calados a exprimir as suas opiniões. No final, juntamo-nos todos para partilhar as nossas reflexões e terminar com uma oração final. O programa é propositadamente simples, sem discussões nocturnas.
Esta atividade permitiu-nos finalmente reservar um "tempo para nós", enquanto casados, apesar dos nossos horários preenchidos.
Renovar o compromisso
"Kana Welcome" está connosco há um ano. Foi emocionante e novo falar tão intensamente e deixar que o outro se exprimisse: houve muitas surpresas, tanto agradáveis como difíceis. Mas vale a pena correr o risco, porque podem surgir novos caminhos para a nossa relação.
Um participante comenta: "A combinação de falar como um casal, passar tempo juntos e partilhar experiências cria um ambiente de apoio e carinho que nos ajuda a construir uma relação feliz e gratificante. Descobrimos que estas reuniões mensais são muito valiosas para as nossas relações.
As conversas e as trocas de impressões ajudam-nos a viver uma relação mais feliz; convidamos sempre o "terceiro" a abençoar o nosso casamento, a cumprir a promessa que fizemos um ao outro quando nos casámos:
"Recebo-te como meu marido/esposa e entrego-me a ti, e prometo ser-te fiel na prosperidade e na adversidade, na doença e na saúde, e assim amar-te e respeitar-te todos os dias da minha vida".
Mensagem do Papa sobre a sobriedade e a comunhão na missão
No Angelus deste domingo, o Papa Francisco transmitiu a mensagem do Senhor na missão evangelizadora que São Marcos relata: comunhão, harmonia e sobriedade de vida. Recordou também o Domingo do Mar, que a Igreja celebra hoje, e encorajou-nos a rezar pela paz a Nossa Senhora do Carmo, cuja festa se celebra na terça-feira, 16 de julho.
Francisco Otamendi-14 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
São Marcos narra no evangelho deste domingo, 14 de julho: "Chamou os Doze e começou a enviá-los de dois em dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros; e ordenou-lhes que não levassem nada para o caminho, nem pão, nem alforge, nem dinheiro na bolsa, mas apenas um cajado, e que usassem sandálias e não levassem duas túnicas".
O Papa retomou esta mensagem de Jesus no AngelusEncorajou uma missão evangelizadora "em comunhão, harmonia entre todos e sobriedade na nossa vida cristã". Por exemplo, o Santo Padre perguntava a si mesmo: "Sinto a alegria de anunciar o Evangelho, de levar, onde vivo, a alegria e a luz que brotam do encontro com o Senhor? Para isso, comprometo-me a caminhar ao lado dos outros, partilhando com eles ideias e capacidades, com abertura de espírito e coração generoso? E, finalmente, cultivo um estilo de vida sóbrio e atento às necessidades dos meus irmãos e irmãs?
O Pontífice começou por seguir diretamente o filho evangélico de Jesus que envia os discípulos, dois a dois, levando "apenas o necessário e não indo sozinhos, mas juntos, como uma comunidade", "para serem livres", porque de outra forma cairíamos na escravidão.
Convidou também os romanos e os peregrinos presentes na Praça de São Pedro a pedir à Mãe de Deus, Rainha dos Apóstolos, que "nos ajude a ser verdadeiros discípulos missionários, em comunhão e sobriedade de vida", e que conceda a paz à Ucrânia martirizada, à Palestina, a Israel, a Myanmar?
Estilo de vida sóbrio
O Papa Francisco reiterou em mais de uma ocasião que no anúncio do Evangelho é importante saber manter a sobriedade. "Saber ser sóbrio no uso das coisas", sublinhou, "partilhando recursos, capacidades e dons, e prescindindo do supérfluo, para sermos livres e para que todos tenham o necessário para viver com dignidade e contribuir ativamente para a missão".
Mais adiante, Francisco acrescentou que é necessário saber "ser sóbrio nos pensamentos e nos sentimentos, abandonando visões parciais, preconceitos e rigidezes que, como bagagem inútil, pesam e dificultam o caminho, para favorecer o debate e a escuta, e assim tornar mais eficaz o testemunho".
Do mesmo modo, o Santo Padre encorajou-nos a observar o que acontece nas nossas famílias ou nas nossas comunidades, sobretudo "quando nos contentamos com o necessário, mesmo que seja pouco, com a ajuda de Deus, conseguimos dar-nos bem e conviver, partilhando o que temos, renunciando a alguma coisa e apoiando-nos uns aos outros". E este "é já um anúncio missionário, antes e mais do que as palavras, porque encarna a beleza da mensagem de Jesus" na concretude da vida. "Uma família ou uma comunidade que vive assim, de facto, cria à sua volta um ambiente rico de amor, no qual é mais fácil abrir-se à fé e à novidade do Evangelho, e a partir do qual se pode recomeçar melhor, mais sereno".
Se, em vez disso, cada um segue o seu caminho, se o que importa são apenas as coisas - que nunca são suficientes - se não nos ouvimos uns aos outros, "se o individualismo e a inveja prevalecem, o ar torna-se pesado, a vida torna-se difícil e os encontros tornam-se mais uma fonte de ansiedade, tristeza e desânimo do que de alegria", concluiu, antes de rezar a oração mariana do Angelus.
Cristian Mendoza: "A riqueza integral não se resume a dar dinheiro".
Entrevista com o autor de "Em Busca do Indispensável", um livro que trata dessas riquezas indispensáveis, sejam elas materiais, racionais ou espirituais, e de como lidar com a sua escassez.
"Se trabalhares, não há pobreza. Se rezares, não há pecado. Se te calas, não há guerra. Se fores sábio, não há medo. Este aforismo sânscrito é o eixo em torno do qual o padre e professor Cristian Mendoza faz girar as suas reflexões sobre a pobrezao riquezae a atitude humana em relação a eles em "Em busca do Indispensável".
Este pequeno livro, editado pela Rialp, oferece uma interessante abordagem dos conceitos, atitudes e, sobretudo, do empenhamento pessoal inerente a cada cristão no desenvolvimento espiritual e material da sociedade.
Não se trata de um livro de teoria socioeconómica, nem sequer de "economia" no sentido habitual, mas de uma reflexão que, como salienta o seu autor nesta entrevista à Omnes, combina o mandato de guardar a criação que Deus dá ao homem na génese com o desapego dos bens materiais.
O seu livro aborda a pobreza ou a riqueza de uma forma holística (humana, espiritual e material). Para compreender uma ou outra, é necessário ter em conta as outras, e é possível desenvolver uma delas sem as outras?
-Poderíamos pensar em cada uma das riquezas possíveis como uma porta de entrada para outras riquezas, que alargam a possibilidade de acesso, mas não ocorrem automaticamente.
Por exemplo, quando temos mais riqueza material, podemos ter mais riqueza humana (educação, cultura, etc.), mas não necessariamente.
Ou então, tendo uma maior riqueza espiritual, valorizamos os bens superiores e, por isso, compreendemos o valor da sobriedade, de evitar o supérfluo que poderia conduzir a uma maior riqueza material.
Afirma que ninguém aspira à pobreza..., mas assistimos a atitudes de "exaltação" da mediocridade, será isto sustentável a longo prazo?
-O pobreza humana que a mediocridade representa não é sustentável a longo prazo, porque a manutenção de uma pobreza abre caminho a outras pobrezas. Neste caso, aqueles que não se esforçam por trabalhar melhor acabarão numa maior pobreza material e, possivelmente, também espiritual.
A aspiração ao desenvolvimento é, como disse São Paulo VI, parte da vocação do homem.
A tradição judaico-cristã considera o Criador que confiou a Adão e Eva toda a criação, pelo que podemos pensar que Deus quer que os seres humanos sejam muito ricos em todos os sentidos.
A pobreza e a riqueza remetem sempre para "o outro", podemos dizer que vêm com o ser humano e que haverá sempre pobreza?
-É claro que haverá sempre pobreza porque haverá sempre possibilidades humanas de melhoria em todos os sentidos. Pela mesma razão, haverá sempre riquezas.
A pobreza e a riqueza referem-se a outra no sentido em que somos sempre ricos ou pobres em relação a outra, é uma medida de valor.
O importante é refletir sobre quem é esse outro: podemos aprender muito com os nossos pais, amigos, mentores, mas também com grandes sábios, escritores ou santos que deixaram a sua marca neste mundo.
Também é verdade que haverá sempre alguém mais rico e mais pobre do que nós, o que nos pode levar a ser mais solidários com o nosso tempo, a nossa criatividade, etc.
Por fim, a perceção da nossa pobreza ou da nossa riqueza determina-nos: sentirmo-nos espiritualmente pobres leva, por exemplo, à procura de paz interior, de um maior equilíbrio, de uma ponderação da nossa própria vida, o que é muito saudável.
O desenvolvimento (material, espiritual) é o trabalho dos dons de Deus, então porque é que vemos na Igreja uma certa "reticência" ou mesmo desprezo pelo desenvolvimento económico ou pelos "ricos"? Teremos caído no reducionismo capitalista da riqueza?
-O cristianismo não rejeita a riqueza, mas o apego desordenado aos bens materiais. Jesus na terra era amigo de pessoas ricas, como Lázaro, Marta e Maria, que viviam em Betânia e eram conhecidos entre os judeus. Assim como José de Arimatéia, que a Escritura diz explicitamente ser um homem rico.
Por fim, o Senhor trata com Nicodemos, que era um chefe da Sinagoga e chamou apóstolo Mateus, que era um cobrador de impostos, um cobrador de impostos, que possivelmente tinha meios para viver.
A mensagem do Evangelho pede-nos que vivamos a virtude da pobreza, que é desprendimento de bens materiais, mas pede-nos também que guardemos os bens da terra em nome de Deus e que, para isso, façamos o melhor uso possível dos nossos talentos, atitude que é fonte de riqueza.
No livro, há exemplos claros de iniciativas de vários tipos: educativas, económicas, laborais, que abordaram o desenvolvimento de uma forma holística. Serão elas aplicáveis aos vários tipos de sociedade que vemos?
-São aplicáveis em muitos casos, mas são sobretudo cada vez mais necessárias. Após a publicação do livro, tomei conhecimento de uma iniciativa que tem por objetivo gerar riqueza humana, permitindo que aqueles que não podem pagar um psicólogo ou um psiquiatra possam consultar um terapeuta.
Uma universidade em São Paulo (Brasil) dá formação a centenas de mulheres para ouvirem outras mulheres, melhorando as suas relações com os filhos e os maridos, mudando a educação e a família. É provável que isto resulte numa maior riqueza material e espiritual.
A riqueza integral não se produz apenas dando dinheiro, mas é muitas vezes necessário desenvolver e reconhecer os talentos dos que nos rodeiam.
Domingo do Mar e Nossa Senhora do Carmo, Estrela dos Marinheiros
O Domingo do Mar, nascido em Inglaterra em 1975, é celebrado na Igreja no segundo domingo de julho e recorda milhões de marítimos e os capelães e voluntários da "Stella maris" (Apostolado do Mar). Paralelamente, a festa litúrgica de Nossa Senhora do Carmo, a 16 de julho, é celebrada em muitas cidades costeiras de todo o mundo.
Francisco Otamendi-13 de julho de 2024-Tempo de leitura: 6acta
"Ao prestar homenagem aos marítimos todos os anos no segundo domingo de julho, também conhecido como Domingo do Mar, as comunidades católicas de todo o mundo desejam chamar a atenção e rezar por aqueles que trabalham neste sector".
Estes incluem "as tripulações dos navios que transportam mercadorias, os trabalhadores portuários, os operadores de rebocadores e os estivadores, a guarda costeira, o pessoal do tráfego marítimo, os trabalhadores de salvamento, os funcionários aduaneiros e os pescadores, e todos aqueles com quem trabalham, bem como as suas famílias e comunidades", afirma um Mensagem pelo Cardeal M. Czerny S.J., Prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral da Santa Sé, escrito para este domingo e datado de 24 de junho.
O número total destes trabalhadores e das suas famílias é seguramente de milhões, refere o texto. "No domingo de mardá visibilidade aos aspectos quotidianos das suas vidas que, de outro modo, permaneceriam invisíveis. Atualmente, tal como no passado, a navegação marítima implica longos períodos de ausência, meses ou mesmo anos, de casa e de terra. Os marítimos e as suas famílias podem perder momentos importantes da vida das suas famílias.
Exemplo de S. Paulo
"O exemplo de São Paulo, que passou muito tempo em alto mar durante as suas viagens missionárias, é uma fonte de encorajamento e de força", acrescenta. "O cristianismo espalhou-se por mar para terras distantes; não havia outra opção. A Igreja de hoje pode inspirar-se nos habitantes das comunidades costeiras, que foram os primeiros a ouvir a novíssima mensagem de Cristo pela boca dos apóstolos do mar e de outros missionários".
"A chegada de novos navios significava mais encontros e intercâmbios, mais abertura às novidades e às imensas possibilidades que existiam para além das costas locais. O apelo a acolher o estrangeiro pode desafiar-nos quando preferimos permanecer social e espiritualmente isolados. Não nos podemos abrir às possibilidades da vida se preferirmos o conforto do familiar. O caminho da abertura é o caminho da esperança", escreve o Prefeito Michael Czerny num texto recolhido pelo conferências episcopais.
Dignidade dos marítimos
O cardeal aborda depois as questões da dignidade e dos direitos dos marítimos, como as possíveis injustiças. "É certo que o salário que recebem pode ser um incentivo para que estes sacrifícios valham a pena, mas este benefício pode ser ameaçado pela injustiça, exploração e desigualdade. Por isso, é maravilhoso quando voluntários, capelães e membros das Igrejas locais nos portos, que estão ativamente envolvidos no ministério dos marítimos, defendem a dignidade e os direitos dos marítimos".
Além disso, recorda-se que, perante a tendência para permanecer distantes e afastados uns dos outros, "o Papa Francisco afirma: "A verdadeira sabedoria pressupõe o encontro com a realidade (...). O problema é que um caminho de fraternidade, local e universal, só pode ser percorrido por espíritos livres e dispostos a encontros reais" (Fratelli tutti, 47, 50).
Integração na vida e no ministério da Igreja
"A pastoral do mar pode ajudar de muitas maneiras a integrar a periferia com o centro, por exemplo, indo ao encontro dos marítimos pessoalmente e na oração, melhorando as condições materiais e espirituais dos trabalhadores, defendendo a sua dignidade e os seus direitos, e promovendo relações internacionais e políticas destinadas a proteger os direitos humanos daqueles que viajam e trabalham longe das suas famílias e países de origem.
"A Igreja é chamada a servir todos os membros da família humana. Uma vez que os marítimos vêm de todos os países do mundo e professam todas as religiões do mundo, incluí-los na vida e no ministério da Igreja facilita o crescimento da compreensão mútua e da solidariedade entre todos os povos e religiões", continua o Cardeal, que se dirige à Virgem Maria: "Pedimos a Nossa Senhora, Estrela do Mar, que acompanhe todos aqueles cuja vida e trabalho são marcados pelo mar e que seja a sua estrela-guia no caminho para Cristo.
Virgen del Carmen e Dia do Marinheiro
"Cuidar dos mares; cuidar das suas gentes" é o lema com que a Igreja celebra o Dia dos Povos do Mar 2024. Este dia é celebrado todos os anos a 16 de julho, coincidindo com a festa da sua padroeira, a Virgen del Carmen.
Tal como em países europeus como Itália e Espanha, na América Latina a devoção à invocação de Nossa Senhora do Carmo é profunda: ela é Rainha e Padroeira de ChileSanto Padroeiro de ColômbiaPrefeita perpétua de Lima (Peru), padroeira do exército venezuelano, referência mariana na Costa Rica, Nicarágua, Guatemala, México, Panamá, Porto Rico..., etc.
O Bispo Luís Quinteiropromotor do Apostolado do Mar em Espanha, e administrador apostólico de Tui-Vigo ao escrever estas linhas, defendeu aquilo a que o tema deste ano responde. "No atual contexto de graves problemas ambientais e de persistente desrespeito pelas necessidades e direitos dos marítimos, sobretudo em alguns países, Maria chama-nos a cuidar dos mares e a cuidar das suas gentes. A poluição dos mares é um problema premente, a assistência aos marítimos é uma exigência constante. Por isso, 'cuidem deles'".
Origens
A devoção a Nossa Senhora do Carmo tem as suas raízes no Monte Carmelo em Terra Santaonde viveram os primeiros eremitas cristãos. Estes eremitas, inspirados pelo profeta Elias, veneravam Maria como a Flor do Carmelo. A Ordem dos Carmelitas, fundada no século XII, adoptou Nossa Senhora do Carmo como padroeira e difundiu a sua devoção por todo o mundo, explicou o Fundação CARF.
O Papa Francisco destacou o papel de Nossa Senhora do Carmo como guia e protetora dos marinheiros e pescadores, sublinha a Fundação. Numa audiência geral, comentou: "Nossa Senhora do Carmo é uma estrela-guia para aqueles que procuram paz e segurança na sua fé.
O prior do convento de Santa Teresa de Madrid, P. António González, Carmelita DescalçaNuma semana intensa devido às novenas nas igrejas, comentou à Omnes, entre outras coisas, que "a devoção à Virgem do Carmo nasceu no coração da nossa Ordem", e que "o escapulário é uma parte central do nosso hábito".
Escapulário do Carmelo
O historiador e também carmelita descalço Daniel de Pablo Maroto destacou algumas experiências que o fazem viver a festa da Virgen del Carmen com especial intensidade. Entre outras, "a memória da Monte Carmelo na Palestinaonde se encontra o convento carmelita de "Stella Maris", Estrela do Mar, com o santuário da imagem da Virgem do Monte Carmelo, um santuário com vista para a bela baía de Haifa, uma festa extraordinária para os olhos.
"A principal graça e prerrogativa do uso do escapulário carmelita", escreve ainda o autor carmelita, "provém de uma tradição verbal secular (1251), confirmada num documento litúrgico do século XIV como uma revelação de Nossa Senhora do Carmo a São Simão Stock, que soa assim: 'Este será o privilégio para ti e para todos os carmelitas: quem morrer com ele [o escapulário] não sofrerá o fogo do inferno: isto é, quem morrer com ele, salvar-se-á'".
Compromisso do Sabbatha
Mais tarde, uma segunda graça protetora de Nossa Senhora do Carmo foi acrescentada aos portadores do seu escapulário, acrescenta Daniel de Pablo: "o chamado 'privilégio do sábado', também em relação à morte do cristão: a própria Senhora prometeu aos seus confrades sair do purgatório o mais depressa possível, o mais tardar no sábado seguinte à sua morte. Em suma, os "privilégios" do uso do escapulário do Carmelo são a ajuda em todas as fases em que os seus confrades se podem encontrar: "Na vida protejo; na morte ajudo; e depois da morte salvo"".
"Atualmente, o uso do escapulário é uma devoção muito difundida entre os devotos de Nossa Senhora do Carmo", informa a Fundação CARF. "Esta pequena peça de vestuário, que lembra o hábito carmelita, é usada à volta do pescoço e simboliza o jugo que Jesus nos convida a carregar, mas que Maria nos ajuda a carregar. Quem a usa compromete-se a viver uma vida de oração, de devoção à Virgem Maria e de compromisso com a Igreja".
É também justo salientar que existe uma outra invocação da nossa Mãe Santíssima Maria, a Virgem do Rosário, à qual muitas pessoas têm devoção e que é celebrada em outubro. A presença da Virgem do Rosário entre as gentes do mar, a Galeonaestá profundamente enraizado em Cádis, por exemplo, de que é o padroeiro há 150 anos, como explicou o frade dominicano ao Omnes Irmão Pascual Saturio.
A mensagem do Papa em Trieste: Participação e democracia a partir do coração
No domingo, 7 de julho, o Papa Francisco efectuou uma visita pastoral a Trieste para encerrar a 50ª Semana Social dos Católicos Italianos, promovida pela Conferência Episcopal do país sobre o tema da democracia. Participaram mais de 1200 delegados.
No dia 7 de julho, o Papa Francisco efectuou uma visita pastoral a Triesteonde a Igreja em Itália tinha convocado delegados de todo o país para participarem na 50ª Semana Social dos Católicos Italianos. Falou a cerca de dez mil pessoas, sublinhando a necessidade de uma democracia restaurada e, sobretudo, participativa.
Enquanto a abertura da iniciativa foi conduzida pelo Presidente da República Italiana, Sergio Mattarella, o encerramento foi marcado pela participação do Papa. Francisco começou por se encontrar no Centro de Congressos de Trieste com os 1200 delegados que debateram o tema da democracia ao longo da semana, e depois celebrou a Santa Missa perante mais de 8000 fiéis reunidos na Piazza Unità d'Italia.
Denunciando a corrupção, a exclusão social e a cultura do desperdício, o Papa exortou os cristãos a um empenhamento ativo na vida pública, que deve estar enraizado numa fé "encarnada e profética". Sublinhou ainda a importância de passar da mera presença nas urnas para uma participação mais autêntica, alimentada pela criatividade e pela solidariedade, a fim de construir uma sociedade mais justa e fraterna. De facto, a fé deve entrar na história e curar as feridas da sociedade, tornando-se assim um fermento de esperança e de justiça.
A crise da democracia
Antes de os delegados convocados pelo Conferência Episcopal Italianaque organiza as Semanas Sociais desde há décadas, o Papa sublinhou a crise da democracia moderna, comparando-a a um "coração ferido".
O Comissário reiterou que a participação democrática é prejudicada pela corrupção, pela exclusão social e pela conhecida cultura da exclusão. "Sempre que alguém é marginalizado, todo o corpo social sofre. A cultura do descarte desenha uma cidade onde não há lugar para os pobres, os que não nasceram, os frágeis, os doentes, as crianças, as mulheres, os jovens, os idosos".
Depois, citando o Beato Giuseppe Toniolo, também criador das Semanas Sociais Católicas, o Pontífice descreveu a democracia como uma ordem civil em que "todas as forças sociais, jurídicas e económicas, na plenitude do seu desenvolvimento hierárquico, cooperam proporcionalmente para o bem comum, revertendo no resultado final para o benefício prevalecente das classes mais baixas". Este conceito evidencia como uma democracia saudável deve ter como objetivo o bem comum, especialmente em benefício das classes mais fracas.
A responsabilidade dos cristãos
O Papa sublinhou também a responsabilidade dos cristãos nas transformações sociais, apelando a um empenho ativo e ao mesmo tempo crítico, formativo e participativo desde a mais tenra idade. Neste ponto, referiu-se a outro político italiano, Aldo Moro, que afirmou que "um Estado não é verdadeiramente democrático se não estiver ao serviço do homem, se não tiver como objetivo supremo a dignidade, a liberdade e a autonomia da pessoa humana".
Daí o apelo a restaurar o coração da democracia, através da criatividade e da solidariedade: "enquanto o nosso sistema económico e social continuar a produzir apenas uma vítima e houver apenas um descartado, a fraternidade universal não poderá ser celebrada", acrescentou.
Uma fé inquieta
No entanto, na sua homilia, o Papa recordou a experiência de Jesus e dos profetas, muitas vezes rejeitados e considerados fonte de escândalo pela forma como tratavam as suas comunidades. O Papa criticou ainda o consumismo e a indiferença, qualificando-os de "praga" e "cancro", por adoecerem o coração e tornarem as pessoas egoístas.
A solução é, pelo contrário, viver uma fé inquieta que ponha o dedo nas feridas da sociedade e se torne fermento de esperança. "Precisamos do escândalo da fé, uma fé enraizada no Deus que se fez homem e, portanto, uma fé humana, uma fé de carne, que entra na história, que acaricia a vida das pessoas, que cura os corações partidos".
Construir uma civilização da fraternidade
Por fim, dirigindo-se à comunidade triestina, mas com uma projeção que diz respeito a todos os homens de boa vontade, o Pontífice sublinhou a importância de não se escandalizar com Jesus, mas de se indignar perante as situações de degradação e de sofrimento: "Levemos na nossa carne a profecia do Evangelho, mais com as nossas escolhas do que com as palavras.
Por isso, uma democracia restaurada e participativa só é possível - para resumir a visão do Santo Padre - através de uma fé encarnada e profética, capaz de enfrentar os desafios sociais e políticos com coragem e criatividade. Deste modo, torna-se também uma fonte de vida e de esperança para toda a comunidade humana.
Semanas sociais
As Semanas Sociais nasceram em 1907 por iniciativa do Beato Giuseppe Toniolo, economista e sociólogo católico. Desde a sua criação, têm constituído um fórum onde os católicos podem debater os principais problemas da sociedade e identificar propostas e estratégias para promover o bem comum.
Ao contrário do que muitas vezes se diz ou se pensa, existe um historial rico em complicações para a saúde das mulheres decorrentes dos compostos utilizados nos abortos químicos.
Bryan Lawrence Gonsalves-13 de julho de 2024-Tempo de leitura: 11acta
Uma análise dos meios de comunicação social revela múltiplos artigos sobre o chamado "aborto medicinal". Estes artigos sublinham a suposta segurança e proteção do método de aborto baseado na mifepristona e no misoprostol. Esta conclusão, no entanto, é incorrecta.
Antes de nos debruçarmos sobre as várias preocupações de saúde e morais associadas ao aborto medicinal, temos de começar por compreender o que é que o aborto medicinal implica. O termo "medicamento" deve ser entendido como "qualquer substância utilizada para tratar uma doença ou afeção", de acordo com o Cambridge Dictionary.
A gravidez não é uma doença nem uma enfermidade, e o medicamento mifepristona não foi desenvolvido para tratar ou curar qualquer doença ou enfermidade. É uma pílula abortiva auto-induzida utilizada para pôr termo à vida de uma criança no ventre da mãe. Por conseguinte, o termo "aborto medicinal" é enganador, sendo mais apropriado o termo "aborto químico".
Aborto químico
O aborto químico é um processo de dois fármacos. Começa com a mifepristona (nome comercial Mifeprex, legalmente conhecido como RU486), que bloqueia a hormona progesterona, essencial para manter a gravidez da mulher, preparando o seu corpo para a conceção e regulando o seu ciclo menstrual, como salienta o ginecologista norte-americano Steven R. Goldstein. O bloqueio desta hormona prejudica e rompe o revestimento uterino e impede a transferência de uma nutrição adequada para o feto em desenvolvimento, provocando a sua morte.
O misoprostol (comercializado como Cytotec) é tomado 24-48 horas depois de tomar mifepristona para provocar contracções uterinas no corpo, com o objetivo principal de esvaziar o ciclo uterino. Isto ocorre no primeiro trimestre da gravidez.
O coração da criança é detetável nesta fase, e o cérebro e os pulmões também se estão a desenvolver, explica M. Israel num artigo publicado em "A Fundação Heritage"em março de 2021.
Quando é que a vida começa?
A utilização da mifepristona e o processo de aborto químico, em geral, não são seguros nem algo que possa ser apoiado em boa consciência. Em primeiro lugar, temos de reconhecer que a vida começa efetivamente na conceção.
A este respeito, o American College of Pediatricians, uma associação médica nacional de médicos e profissionais de saúde licenciados, emitiu uma declaração em março de 2017, que se centrava nas provas científicas de quando começa uma vida humana individual: "A predominância da investigação biológica humana confirma que a vida humana começa na conceção-fertilização. No momento da fertilização, o ser humano emerge como um organismo humano vivo zigótico completo, geneticamente distinto, um membro da espécie Homo sapiens, necessitando apenas do ambiente adequado para crescer e se desenvolver. A diferença entre o indivíduo adulto e o zigoto é uma questão de forma, não de natureza.
Por outro lado, a Dra. Maureen Condic, neurocientista e membro do National Science Board dos EUA, escrevendo sobre a visão científica do início da vida humana, afirmou: "A conclusão de que a vida humana começa com a fusão do espermatozoide e do óvulo é indiscutível, objetiva, baseada no método científico universalmente aceite de distinguir diferentes tipos de células entre si e em provas científicas extensas. Além disso, é totalmente independente de qualquer visão ética, moral, política ou religiosa específica da vida humana ou dos embriões humanos".
Num inquérito de 2017, perguntou-se a 4 107 americanos quando é que acreditavam que a vida de um ser humano começa. Os inquiridos representavam um espetro demográfico e político diversificado: 62 % tinham opiniões pró-escolha, sendo que 66 % se identificavam como democratas; 57 % eram mulheres e 43 % eram homens; 63 % tinham formação universitária. Quando questionados sobre quem era mais qualificado para determinar quando começa uma vida humana, 80 % escolheram biólogos em vez de filósofos, líderes religiosos, eleitores e juízes do Supremo Tribunal. Quando solicitados a explicar a sua resposta, 91 % dos que escolheram biólogos disseram que a razão era porque eles são especialistas objectivos no estudo da vida.
O mesmo estudo inquiriu 5.557 biólogos de 1.058 instituições académicas. 63 % dos participantes não eram religiosos, 63 % eram homens, 95 % tinham um doutoramento, 92 % eram democratas e 85 % eram pró-escolha. A amostra incluía também biólogos nascidos em 86 países diferentes de todo o mundo. Quando lhes foi perguntado quando acreditavam que a vida humana começa, 95,7 % dos biólogos concordaram com a visão biológica subjacente de que começa na fertilização.
Abusos da pílula abortiva
A biologia é o estudo da vida. O seu significado deriva das palavras gregas "bios" (que significa vida) e "logos" (que significa estudo). Os biólogos estudam a origem, o crescimento e a estrutura dos organismos vivos. Quando as pessoas que estudam a vida nos dizem que a vida de um ser humano começa na fecundação, não deveríamos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para proteger a vida da criança que está a crescer no ventre da sua mãe?
Qualquer aborto tira a vida a um ser humano, mas o aborto químico pode também prejudicar a vida de uma mulher. mãeaté à morte. Se o aborto químico for legalizado, as pílulas abortivas podem acabar nas mãos de traficantes, parceiros abusivos e outras pessoas que planeiam utilizá-las para fins nefastos.
A legalização do aborto químico pode aumentar o número de abortos forçados, tendo já havido relatos de mulheres grávidas a quem foram administradas pílulas abortivas sem o seu conhecimento ou consentimento. Em 2006, um homem do Wisconsin deu à sua namorada uma bebida à qual adicionou mifepristona. Na manhã seguinte, ela ficou doente e abortou o feto de 14 semanas.
Citemos outros casos. Em 2013, um homem enganou a sua namorada grávida, dando-lhe uma pílula abortiva supostamente para tratar a sua infeção, o que resultou na perda do seu filho, disse L. Mungin à CNN em setembro de 2013. Em 2014, a CBS News noticiou o caso de um homem do Kansas que foi preso por ter comprado comprimidos de Mifepristona online e tê-los colocado na comida da namorada, provocando a morte do feto.
Em 2015, o Herald Sun noticiou o caso de um norueguês que colocou comprimidos abortivos no batido da sua ex-namorada, provocando-lhe um aborto. Ela perdeu o bebé na 12.ª semana de gravidez e, dois anos mais tarde, em 2017, um médico da Virgínia foi acusado de ter colocado 4 comprimidos de mifepristona (800 mg em vez dos habituais 200 mg) no chá da namorada, provocando a morte do feto. Declarou-se culpado de homicídio fetal e foi condenado a três anos de prisão, tendo perdido a sua licença médica.
Nesse ano, um homem do Michigan tentou matar o seu filho por nascer, colocando secretamente mifepristona na garrafa de água da sua namorada. A namorada desconfiou e entregou a água à polícia, que determinou que continha o fármaco indutor do aborto. O homem tinha obtido a mifepristona de um traficante de Nova Iorque, que mais tarde foi acusado e condenado.
Entretanto, um estudo de 2018 intitulado "Exploring the feasibility of obtaining mifepristone and misoprostol from the internet" identificou 18 sítios Web que vendem pílulas abortivas sem receita médica ou quaisquer dados médicos relevantes, como o historial clínico, e concluiu que a obtenção de pílulas abortivas em sítios Web farmacêuticos desonestos é viável nos Estados Unidos. O documento concluiu que a obtenção de pílulas abortivas a partir de sítios Web farmacêuticos desonestos é viável nos EUA. Queremos realmente incluir a possibilidade de alguém procurar comprar pílulas abortivas em linha e utilizá-las para fins maléficos, tais como abusar das suas parceiras grávidas e matar os seus filhos?
O que dizem os estudos científicos
Ao avaliar o aborto químico de um ponto de vista médico, temos de examinar os efeitos negativos para a saúde das mães que se submetem ao procedimento.
Um estudo finlandês, coordenado por Marko Niinimäki e publicado na National Library of Medicine, sobre 42.619 abortos, concluiu que o aborto químico tem uma taxa de complicações quatro vezes superior à do aborto cirúrgico e que um quinto de todos os abortos químicos resulta em complicações. Em termos gerais, o relatório concluiu que o aborto químico causou aproximadamente quatro vezes mais acontecimentos adversos do que o aborto cirúrgico.
Pelo menos uma complicação adversa ocorreu em 20 % das mulheres submetidas ao aborto químico e em 5,6 % das que foram submetidas ao aborto cirúrgico. A hemorragia foi relatada como consequência adversa em 15,61 PT3T de pacientes submetidas a aborto químico, em comparação com 2,11 PT3T de pacientes submetidas a aborto cirúrgico.
Do mesmo modo, uma auditoria jornalística intitulada "Abortion Pill 'Less Safe Than Surgery", publicada no The Australian, investigou cerca de 6 800 abortos cirúrgicos e químicos. De acordo com a auditoria, 3,3 % das mulheres que utilizaram mifepristona no primeiro trimestre da gravidez foram às urgências, em comparação com 2,2 % que utilizaram um método cirúrgico.
Além disso, verificou-se que 5,7 % (1 em cada 18 doentes) das utilizadoras de mifepristona necessitaram de readmissão no hospital, em comparação com 0,4 % (1 em 250) das utilizadoras de aborto cirúrgico. A utilização de mifepristona em abortos no segundo trimestre resultou em 33 % de mulheres que necessitaram de alguma forma de intervenção cirúrgica, enquanto 4% sofreram hemorragias graves.
Ao mesmo tempo, um relatório observacional retrospetivo da Califórnia, utilizando dados do Medicaid dos EUA (o programa de cuidados de saúde financiado pelo governo dos EUA que oferece cobertura gratuita ou a baixo custo a milhões de cidadãos), encontrou uma taxa de complicações de 5,2 % para o aborto químico, em comparação com uma taxa de complicações de 1,3 % para o aborto cirúrgico no primeiro trimestre. Também mencionou que o risco de complicações presentes na toma de uma pílula abortiva era quatro vezes superior ao do aborto cirúrgico (U. D. Upadhyay, National Library of Medicine, 2015).
Hemorragias e outras complicações
Além disso, um estudo sueco de 2016, no qual foram entrevistadas 119 mulheres que se tinham submetido a um aborto químico, concluiu que quase metade delas (43 %) sangrou mais do que o previsto e um quarto (26 %) sangrou durante mais de quatro semanas (M. Hedqvis, in Sexual & Reproductive Healthcare, 2016).
A este respeito, a Dra. Ingrid Skop, Directora de Assuntos Médicos do Charlotte Lozier Institute, e obstetra-ginecologista com mais de 25 anos de experiência, escreveu sobre o regime de aborto químico mifepristone-misoprostol no Journal of American Physicians and Surgeons. Aí afirmou que "a mulher média que se submete a um aborto químico terá hemorragias durante 9-16 dias e 8 % terão hemorragias durante mais de um mês. A maioria sofrerá os efeitos secundários do parto, tais como cólicas, hemorragia intensa, náuseas, vómitos, febre, arrepios, dores de cabeça, diarreia e tonturas. Muitas sentirão a devastação emocional de olhar para o corpo do seu filho abortado.
Além disso, o Dr. Skop explicou que a mifepristona contribui para uma resposta inflamatória alterada através do bloqueio dos receptores de glucocorticóides, o que aumenta o risco de infeção por Clostridium sordellii e de sépsis, por vezes levando à morte. Este facto foi confirmado num estudo farmacoterapêutico em que se observou a propensão da mifepristona para o desenvolvimento de infecções, podendo conduzir a um choque sético letal (R. P. Miech, Annals of Pharmacotherapy, 2005).
Em conclusão, os resultados da investigação finlandesa, australiana, americana e sueca e de outros estudos médicos, juntamente com as experiências pessoais de Ingrid Skop, corroboram as observações mútuas: o aborto químico causa efeitos adversos na saúde das mulheres.
Riscos para as mulheres
Pode argumentar-se que os preconceitos selectivos influenciaram as várias investigações científicas/médicas realizadas sobre os efeitos adversos e os factores de risco associados à mifepristona.
No entanto, é bastante revelador que tanto o fabricante de mifepristona, Danco Laboratories, como a Food and Drug Administration (FDA) dos EUA tenham reconhecido os riscos da Mifepristona para a saúde das mulheres: "Quase todas as mulheres que recebem Mifeprex e misoprostol irão reportar reacções adversas, e é de esperar que muitas reportem mais do que uma dessas reacções.
Um relatório do Congresso apresentado ao Comité de Reforma Governamental da Câmara dos Representantes dos EUA, intitulado "The FDA and RU486: Lowering the Standard for Women's Health" (2006), chama a atenção para os riscos físicos para as mulheres que tomam o regime RU-486. Estes incluem reacções como "dor abdominal; cólicas uterinas; náuseas; dores de cabeça; vómitos; diarreia; tonturas; fadiga; dores nas costas; hemorragia uterina; febre; infecções virais; vaginite; rigores (arrepios/tremores); dispepsia; insónia; astenia; dor nas pernas; ansiedade; anemia; leucorreia; sinusite; síncope; endrometrite, salpingite, doença inflamatória pélvica; diminuição da hemoglobina superior a 2 g/dL; dor pélvica; e desmaios".
O mesmo relatório do Congresso questiona a segurança da mifepristona e recomenda a sua retirada dos mercados dos EUA, afirmando que "a integridade da FDA na aprovação e supervisão da RU-486 tem sido deficiente e exige a retirada deste produto perigoso e mortal antes que mais mulheres sofram as consequências conhecidas e esperadas ou morram".
"O RU-486 é um medicamento perigoso para as mulheres, a sua aprovação invulgar demonstra um padrão inferior de cuidados para as mulheres e a sua retirada do mercado é justificada e necessária para proteger a saúde pública", acrescenta o relatório. A FDA também alertou os profissionais de saúde para a infeção por sepsis e recomendou um elevado índice de suspeita de infeção grave e sepsis nas mulheres submetidas a aborto químico.
Os problemas causados não são comunicados
A partir de 2018, a FDA tomou conhecimento de 24 mortes, 4.195 eventos adversos, 1.042 hospitalizações, 599 casos de perda de sangue que exigiram transfusões e 412 casos de infecções associadas à mifepristona (A. F. a. D. Administration, Mifepristone U.S. Post-Marketing Adverse Events Summary até 31/12/2018).
Os números reais dos vários problemas e acontecimentos adversos causados pela mifepristona podem ser muito mais elevados devido a problemas com o Sistema de Notificação de Acontecimentos Adversos da FDA (FAERS).
Um relatório da The Heritage Foundation esclarece esta questão: "Como condição para se tornar um prescritor certificado, o acordo de prescrição exigia originalmente que os prescritores comunicassem acontecimentos adversos graves e complicações à Danco, que, por sua vez, envia relatórios periódicos à FDA. Esses eventos adversos... são compilados no FAERS da FDA. Mas quando uma mulher sofre uma complicação de um aborto, é provável que a comunique a um serviço de urgência ou a outro serviço ambulatório, em vez de o fazer ao prescritor que lhe receitou o regime de pílulas abortivas....
Não há forma de saber com que frequência os serviços de urgência e outras instalações não comunicam as complicações à Danco ou à FDA, uma vez que podem não saber que a mulher está a ser submetida a um aborto químico eletivo em vez de um aborto espontâneo" (M. Israel, em www.heritage.org, março de 2021).
Opacidade
Além disso, as mulheres que procuram tratamento médico para reacções adversas depois de tomarem mifepristona podem estar demasiado doentes ou recusar-se a revelar que tomaram o regime de RU-486 porque não querem que isso conste dos seus registos médicos.
Os profissionais de saúde que não supervisionam os procedimentos de aborto químico, mas que podem tratar doentes infectadas ou com hemorragias, não são obrigados a notificar os efeitos adversos da mifepristona, independentemente de terem conhecimento de que a doente tomou o regime de RU-486.
Os médicos que efectuam abortos químicos podem também não ter conhecimento dos acontecimentos adversos que ocorrem após a administração da RU-486, o que os isenta de notificação, de acordo com o estudo do Congresso de 2006 acima citado.
O mesmo relatório do Comité de Reforma Governamental sobre a mifepristona também explicava as contra-indicações presentes no sistema: "Embora a RU-486 esteja aprovada para utilização até 49 dias de gravidez, nos Estados Unidos é habitualmente prescrita até 63 dias de gravidez. Os médicos também prescrevem frequentemente um regime de dosagem diferente do aprovado pela FDA. Por conseguinte, foi sugerido que existe, de facto, um desincentivo por parte dos médicos prescritores para notificar acontecimentos adversos que possam ser atribuíveis à negligência ou à vontade de um médico em prescrever um regime que não seja o regime aprovado pela FDA para a RU-486".
Em 2016, a FDA reduziu os requisitos de comunicação de modo a que apenas as mortes tivessem de ser comunicadas à própria FDA.
Conclusão
Depois de considerar abundantes fontes científicas e governamentais, é óbvio que os abortos químicos prejudicam toda a gente. O aborto químico não é um medicamento, porque os medicamentos curam, enquanto o aborto mata. Não é seguro devido ao seu historial de causar complicações de saúde nas mulheres, incluindo choque sético, infecções e hemorragias prolongadas ou graves.
Não é socialmente seguro porque as pílulas abortivas têm sido compradas sem receita médica para fins maliciosos, como o assassínio de crianças por nascer sem o conhecimento das mães. A falta de supervisão e as deficiências do sistema de notificação da FDA significam que os verdadeiros danos causados pelos abortos químicos ainda são incertos e que o número de mulheres significativamente prejudicadas pelo regime de pílulas abortivas pode ser substancialmente maior do que o esperado.
A realidade é que não podemos permitir que o aborto químico seja legalizado. Porquê legalizar algo que se demonstrou ser perigoso, com casos em que foi obtido de forma não ética e utilizado de forma enganosa contra as mulheres, enquanto não temos pleno conhecimento das suas verdadeiras causas?
Toda a vida humana tem uma dignidade inerente e deve ser tratada como tal. Uma sociedade livre é aquela em que os seres humanos gozam de igual dignidade, independentemente da idade, sexo, estado de saúde ou outra vulnerabilidade.
Se não respeitarmos, valorizarmos e protegermos a vida desde a conceção, não apoiaremos, cuidaremos e defenderemos a vida de alguém muito depois de ter nascido. Contribuamos para uma sociedade livre e moral, fazendo a nossa parte para garantir que o aborto químico não seja legalizado.
As finanças do Vaticano, os balanços do IOR e da Obrigação de São Pedro
Existe uma ligação intrínseca entre os orçamentos dos Oblatos de S. Pedro e o Instituto para as obras de religião.
Andrea Gagliarducci-12 de julho de 2024-Tempo de leitura: 4acta
Existe uma estreita relação entre a declaração anual da O obolo de São Pedro e o balanço do Istituto delle Opere di Religione, o chamado "banco do Vaticano". Porque o óbolo é destinado à caridade do Papa, mas esta caridade exprime-se também no apoio à estrutura da Cúria Romana, um imenso "orçamento missionário" que tem despesas mas não tem tantas receitas, e que deve continuar a pagar salários. E porque o IOR, desde há algum tempo, faz uma contribuição voluntária dos seus lucros precisamente para o Papa, e esses lucros servem para aliviar o orçamento da Santa Sé.
Durante anos, o IOR não teve os mesmos lucros que no passado, de modo que a parte atribuída ao Papa diminuiu ao longo dos anos. A mesma situação se aplica ao Óbolo, cujas receitas diminuíram ao longo dos anos e que também teve de enfrentar esta diminuição do apoio do IOR. Tanto assim que, em 2022, teve de duplicar as suas receitas com um desinvestimento geral de activos.
É por isso que os dois orçamentos, publicados no mês passado, estão de alguma forma ligados. Afinal de contas, o Finanças do Vaticano sempre estiveram ligados, e tudo contribui para ajudar a missão do Papa.
Mas vejamos os dois orçamentos em mais pormenor.
O globo de São Pedro
No passado dia 29 de junho, os Oblatos de S. Pedro apresentaram o seu balanço anual. As receitas foram de 52 milhões, mas as despesas ascenderam a 103,4 milhões, dos quais 90 milhões para a missão apostólica do Santo Padre. Incluídas na missão estão as despesas da Cúria, que ascendem a 370,4 milhões. A Obrigação contribui assim com 24% para o orçamento da Cúria.
Apenas 13 milhões foram destinados a obras de caridade, aos quais se juntam as doações do Papa Francisco através de outros dicastérios da Santa Sé, num total de 32 milhões, dos quais 8 milhões foram destinados a obras de caridade. financiado diretamente pelo Obolo.
Em resumo, entre o Fundo Obolus e os fundos dos dicastérios parcialmente financiados pelo Obolus, a caridade do Papa financiou 236 projectos, num total de 45 milhões. No entanto, o balanço merece algumas observações.
Será esta a verdadeira utilidade da Obrigação de São Pedro, que é frequentemente associada à caridade do Papa? Sim, porque o próprio objetivo da Obrigação é apoiar a missão da Igreja, e foi definida em termos modernos em 1870, depois de a Santa Sé ter perdido os Estados Pontifícios e não ter mais receitas para fazer funcionar a máquina.
Dito isto, é interessante que o orçamento dos Oblatos também pode ser deduzido do orçamento da Cúria. Dos 370,4 milhões de fundos orçamentados, 38,9% destinam-se às Igrejas locais em dificuldade e a contextos específicos de evangelização, num total de 144,2 milhões.
Os fundos para o culto e o evangelismo ascendem a 48,4 milhões, ou seja, 13,1%.
A difusão da mensagem, ou seja, todo o sector da comunicação do Vaticano, representa 12,1% do orçamento, com um total de 44,8 milhões.
37 milhões (10,9% do orçamento) foram destinados a apoiar as nunciaturas apostólicas, enquanto 31,9 milhões (8,6% do total) foram para o serviço da caridade - precisamente o dinheiro doado pelo Papa Francisco através dos dicastérios -, 20,3 milhões para a organização da vida eclesial, 17,4 milhões para o património histórico, 10,2 milhões para as instituições académicas, 6,8 milhões para o desenvolvimento humano, 4,2 milhões para a Educação, Ciência e Cultura e 5,2 milhões para a Vida e Família.
As receitas, como já foi referido, ascendem a 52 milhões de euros, dos quais 48,4 milhões de euros são donativos. No ano passado, houve menos donativos (43,5 milhões de euros), mas as receitas, graças à venda de bens imobiliários, ascenderam a 107 milhões de euros. Curiosamente, há 3,6 milhões de euros de receitas provenientes de rendimentos financeiros.
Em termos de donativos, 31,2 milhões provêm da recolha direta pelas dioceses, 21 milhões de donativos privados, 13,9 milhões de fundações e 1,2 milhões de ordens religiosas.
Os principais países doadores são os Estados Unidos (13,6 milhões), a Itália (3,1 milhões), o Brasil (1,9 milhões), a Alemanha e a Coreia do Sul (1,3 milhões), a França (1,6 milhões), o México e a Irlanda (0,9 milhões), a República Checa e a Espanha (0,8 milhões).
O balanço do IOR
O IOR 13 milhões de euros para a Santa Sé, em comparação com um lucro líquido de 30,6 milhões de euros.
Os lucros representam uma melhoria significativa em relação aos 29,6 milhões de euros registados em 2022. No entanto, os valores devem ser comparados: variam entre os 86,6 milhões de lucro declarados em 2012 - que quadruplicaram o lucro do ano anterior -, 66,9 milhões no relatório de 2013, 69,3 milhões no relatório de 2014, 16,1 milhões no relatório de 2015, 33 milhões no relatório de 2016 e 31,9 milhões no relatório de 2017, até 17,5 milhões em 2018.
O relatório de 2019, por sua vez, quantifica os lucros em 38 milhões, também atribuídos ao mercado favorável.
Em 2020, o ano da crise da COVID, o lucro foi ligeiramente inferior, com 36,4 milhões.
Mas no primeiro ano pós-pandemia, um 2021 ainda não afetado pela guerra na Ucrânia, a tendência voltou a ser negativa, com um lucro de apenas 18,1 milhões de euros, e só em 2022 voltou à barreira dos 30 milhões.
O relatório IOR 2023 fala de 107 empregados e 12.361 clientes, mas também de um aumento dos depósitos de clientes: +4% para 5,4 mil milhões de euros. O número de clientes continua a diminuir (12.759 em 2022, mesmo 14.519 em 2021), mas desta vez o número de empregados também diminui: 117 em 2022, 107 em 2023.
Assim, a tendência negativa dos clientes mantém-se, o que nos deve fazer refletir, tendo em conta que o rastreio das contas consideradas não compatíveis com a missão do IOR foi concluído há algum tempo.
Agora, o IOR é também chamado a participar na reforma das finanças do Vaticano desejada pelo Papa Francisco.
Jean-Baptiste de Franssu, presidente do Conselho de Superintendência, sublinha na sua carta de gestão os numerosos elogios que o IOR recebeu pelo seu trabalho em prol da transparência durante a última década e anuncia: "O Instituto, sob a supervisão da Autoridade de Supervisão e Informação Financeira (ASIF), está, portanto, pronto a desempenhar o seu papel no processo de centralização de todos os bens do Vaticano, de acordo com as instruções do Santo Padre e tendo em conta os últimos desenvolvimentos regulamentares.
A equipa do IOR está ansiosa por colaborar com todos os dicastérios do Vaticano, com a Administração do Património da Sé Apostólica (APSA) e por trabalhar com o Comité de Investimento para desenvolver ainda mais os princípios éticos do FCI (Faith Consistent Investment), em conformidade com a doutrina social da Igreja. É fundamental que o Vaticano seja visto como um ponto de referência".
Surpresa e emoção entre os transeuntes e vizinhos ao verem o Papa Francisco à porta de uma ótica perto da Piazza del Popolo, em Roma, onde foi comprar um novo par de lentes de contacto, a 8 de julho de 2024.
Uma das imagens mais queridas e veneradas de Roma é a da "Salus Populi Romani".
Segundo a tradição, este ícone, que é visitado pelo Papa antes e depois de cada viagem, foi feito pelo próprio São Lucas Evangelista e levado para Roma por Santa Helena no século IV.
Atribui-se à sua intercessão a salvação da cidade romana da peste que a devastou no século VI.
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São Bento, padroeiro da Europa: a sua "visão de paz" não é utópica
A Igreja celebra São Bento de Nursia (Itália) a 11 de julho, fundador da Ordem Beneditina e declarado padroeiro da Europa em 1964 por São Paulo VI. O Papa Francisco e os seus antecessores recorreram a São Bento em busca da paz e da convivência humana numa Europa ferida.
Francisco Otamendi-11 de julho de 2024-Tempo de leitura: 5acta
Embora a Regra de São Bento ['ora et labora', rezar e trabalhar] não contenha um apelo sobre o tema da paz, "é um excelente guia para um empenhamento consciente e prático a favor da paz". De facto, a sua mensagem ultrapassa os muros dos mosteiros e mostra "como a convivência humana, com a graça de Deus, pode superar os perigos que surgem das disputas e das discórdias".
Isto foi afirmado pelo Papa numa Mensagem dirigido aos participantes de um simpósio ecuménico na Arquidiocese beneditina de Pannonhalma, na Hungria Ocidental, em setembro de 2023, que sublinhava duas outras ideias.
A primeira é que o santo padroeiro da Europa conhecia "a complexidade dos traços linguísticos, étnicos e culturais, que representam ao mesmo tempo uma riqueza e um potencial de conflito". No entanto, ele tinha uma visão serena e pacífica, porque estava plenamente convencido da "igual dignidade e do igual valor de todos os seres humanos". Isto aplica-se especialmente aos estrangeiros, que devem ser acolhidos de acordo com o princípio de "honrar todos os homens".
Papa Francisco: "A procura da paz sem demora".
Isto significa também "saber dar o primeiro passo em certas situações difíceis", porque "a discórdia não deve tornar-se um estado permanente". Estabelecer a paz "antes do pôr do sol", dizia São Bento. Esta, recorda o Papa, "é a medida da disponibilidade do desejo de paz".
E a segunda, sublinhou o Santo Padre, é que "a busca da paz na justiça não pode tolerar qualquer atraso, deve ser prosseguida sem hesitação". A A visão de São Bento sobre a paz não é utópico, mas orienta-se para um caminho que a amizade de Deus para com os homens já traçou e que, no entanto, deve ser percorrido passo a passo por cada indivíduo e pela comunidade".
O evento ecuménico húngaro abordou muitos aspectos do tema da paz, numa altura em que "a humanidade globalizada está ferida e ameaçada por uma guerra mundial progressiva que, travada diretamente em algumas regiões do planeta, tem consequências que prejudicam a vida de todos, especialmente dos mais pobres", disse o Pontífice, segundo a agência oficial do Vaticano, e em que "a guerra na Ucrânia nos chamou dramaticamente a abrir os olhos e o coração a muitas pessoas que sofrem por causa da guerra".
São Paulo VI chamou-lhe "pacis nuntius" (arauto da paz).
"Creio que São Bento, chamado 'pacis nuntius' (arauto da paz) pelo Papa Paulo VI quando foi proclamado padroeiro da Europa, se dirigiria a nós com esta palavra: paz! Não é uma palavra óbvia, não é um conceito abstrato, mas uma verdade a perseguir e a viver", afirmou. Sr. Fabrizio MessinaDiretor da Biblioteca Estadual do Monumento Nacional de Santa Escolástica [irmã gémea de São Bento].
Uma biblioteca que deve as suas origens asantoBenito, porque é, de facto, o biblioteca do Mosteiro de Santa Escolástica de Subiaco, um dos doze mosteiros que foram fundados perto da cidade, no vale do Aniene, pelo próprio São Bento.
"A paz que Bento nos traz é a paz de Cristo. É a paz pela qual Cristo deu a sua vida. Se não abrirmos as nossas portas a Cristo, ficaremos sem paz", acrescentou Dom Fabrizio Messina à agência vaticana, que lhe perguntou como é possível, no atual cenário europeu devastado pela guerra na Ucrânia, percorrer caminhos de paz seguindo os passos de São Bento.
Para a Ucrânia, para a Rússia...
A resposta do diretor da biblioteca foi a seguinte. Em primeiro lugar, o facto histórico: "S. Bento, quando iniciou a sua busca pessoal de Deus, fê-lo subindo a Subiaco e procurando o Senhor. Isto acontece-lhe numa primeira experiência de eremitismo. Como nos recorda S. Gregório Magno, Bento vive sozinho consigo mesmo sob o olhar de Deus. É uma busca de Deus que é, portanto, uma busca de paz".
O ilustre beneditino prosseguiu, dizendo "A verdadeira busca da paz para a Europa, para a Ucrânia, para a Rússia e para todos os países envolvidos neste massacre sem sentido é precisamente encontrar em Cristo a fonte da paz, da luz. Como fez São Bento. Uma paz que não é apenas íntima, mas pessoal. Mas é uma paz que pode realmente ser dada aos outros porque é a paz de Cristo. Ele próprio o disse: "Deixo-vos a minha paz", não como o mundo a dá.
Bento XVI: "A Europa nasceu do seu fermento espiritual".
Em 9 de abril de 2008, o então Papa Bento XVI dirigiu-se aos fiéis de S. Bento de Nursia num discurso aos fiéis da Igreja de S. Bento de Nursia. Público em geral. Começou por dizer. "Hoje vou falar de São Bento, fundador do monaquismo ocidental e também patrono do meu pontificado. Começo por citar uma frase de S. Gregório Magno que, referindo-se a S. Bento, diz: "Este homem de Deus, que brilhou nesta terra com tantos milagres, não brilhou menos pela eloquência com que soube expor a sua doutrina.
"O grande Papa [S. Gregório Magno] escreveu estas palavras em 592; o santo monge tinha morrido cinquenta anos antes e continuava vivo na memória do povo e, sobretudo, na florescente Ordem religiosa que fundou. São Bento de Nursia, com a sua vida e obra, exerceu uma influência fundamental no desenvolvimento da civilização e da cultura europeias".
Continuando com a história, Bento XVI acrescentou: "A obra do santo, e em particular a sua 'Regra', é uma parte muito importante da vida e da obra do santo., foram um verdadeiro fermento espiritual, que mudou, ao longo dos séculos, muito para além dos limites da sua pátria e do seu tempo, o rosto da Europa, fazendo surgir, após a queda da unidade política criada pelo Império Romano, uma nova unidade espiritual e cultural, a da fé cristã partilhada pelos povos do continente. Assim nasceu a realidade a que chamamos "Europa".
Anos antes, em 1999, S. João Paulo II escreveu uma carta ao Abade de Subiaco, na qual exprimia a sua alegria por saber que "a grande família monástica beneditina deseja recordar com celebrações especiais os 1500 anos desde que S. Bento iniciou em Subiaco a 'schola dominici servitii', que conduziria, ao longo dos séculos, inúmeros homens e mulheres, 'per ducatum Evangelii', a uma união mais íntima com Cristo".
As virtudes heróicas de Robert Schumann
Em 11 de julho de 2021, o Papa Francisco, hospitalizado no Gemelli, recordou São Bento nas redes sociais: "Hoje celebramos a festa de São Bento, abade e padroeiro da Europa. Um abraço ao nosso protetor! Felicitamos os beneditinos e as beneditinas de todo o mundo". Além disso, o Santo Padre enviou "os melhores votos para a Europa", para que "esteja unida nos seus valores fundadores".
Algumas semanas antes, em junho, o Papa tinha reconhecido as virtudes heróicas do político francês e pai fundador da União Europeia, Robert Schuman, declarando-o venerável. Nessa ocasião, o padre Bernard Ardura, promotor da causa de Schuman, proferiu um discurso entrevista a Omnes sobre o seu processo de canonização.
"A Europa deve deixar de ser um campo de batalha onde as forças rivais se esvaem em sangue", afirmou Schumann num discurso. "Com base nesta tomada de consciência, pela qual pagámos tão caro, queremos enveredar por novos caminhos que nos conduzam a uma Europa unida e definitivamente pacificada", palavras consideradas vitais para a reconciliação entre a França e a Alemanha.
James Mallon: "Temos de aprender a falar a língua daqueles que não sabem nada do Evangelho".
Omnes entrevista James Mallon, fundador do Divine Renovation Ministry, um projeto que procura devolver aos católicos e às suas paróquias o desejo e os instrumentos necessários para a evangelização.
Alfonso Riobó-11 de julho de 2024-Tempo de leitura: 4acta
James Mallon é um padre que está a fazer trabalho pastoral no Canadá. Durante anos, promoveu a "Ministério da Renovação Divina"(Renovação Divina), um ministério que tem como objetivo reavivar o trabalho missionário nas paróquias para que os católicos estejam plenamente conscientes do seu chamamento a evangelizar.
Este desejo de James Mallon é também concretizado em projectos como "...".Alfa"Trata-se de cursos através dos quais as pessoas podem aproximar-se da fé católica através de sessões descontraídas. Foi precisamente neste contexto que o Padre Mallon falou a Omnes, durante o encontro SED (Salir, Evangelizar, Discipular) organizado por "Alpha" de 5 a 7 de julho em Alicante.
Tal como as sessões que organizam, este encontro "Alpha" foi um acontecimento-chave na formação de todos os participantes em matéria de fé, durante um dia de debates partilhados, refeições e momentos de formação.
A presença de figuras como James Mallon mostra a importância de ter esse "desejo de evangelizar", de que o padre fala nesta entrevista à Omnes. Um desejo, explica, que surge naturalmente quando um católico se encontra verdadeiramente com Jesus Cristo, um momento em que descobre que o próprio Deus o chama à missão.
A renovação evangelizadora parte da proposta de "sair". O que é que nos falta para querermos dar o passo de "sair"?
- Estamos a falar de desejo. E penso que esse é o teste decisivo da fé autêntica. Por vezes, o desejo de evangelizar existe, mas não o fazemos porque temos medo, porque não sabemos como o fazer, porque não temos um instrumento para o fazer, mas isso é algo muito diferente. Se é medo, com o qual todos nós lidamos, sabemos que o Senhor pode lidar com ele. E podemos aprender métodos e ferramentas, mas a ausência de desejo é um problema maior.
Eu diria que há duas razões principais. Se não tens o desejo de que os outros conheçam Jesus, pergunto-te: já o conheceste? Quem é o Jesus com quem comungas? Quem é o Jesus a quem rezas? Quem ouves? Conheces o Jesus do Evangelho? Porque se tiveres uma relação autêntica com Ele, se O conheceres verdadeiramente, como é que não terás o desejo de evangelizar? Por vezes, os nossos pecados, o nosso reconhecimento de que estamos quebrados, as nossas lutas podem diminuir o desejo do nosso coração, mas não o eliminam completamente. Além disso, acredito que o desejo de evangelizar pode ser inflamado pelo Espírito Santo, pois o Espírito Santo destrói o medo.
A missão dirige-se a pessoas numa grande variedade de situações de fé. Como é que chegamos àqueles que não sabem nada sobre ela, ou àqueles que nunca pensariam em pôr os pés numa igreja?
- Por vezes, o que fazemos nas nossas paróquias é dizer às pessoas de fora para entrarem. Esperamos que as pessoas que não têm fé ou nenhuma ligação com a Igreja façam a viagem. Mas não, o missionário é aquele que faz a viagem, aquele que é enviado para procurar e salvar os perdidos. Muitas vezes, porém, esperamos que sejam essas pessoas, os outros, a fazer a viagem até nós. Isto é o oposto do que Deus nos chamou a fazer. Em última análise, é Jesus quem é enviado. Jesus é o missionário original que sai em busca do outro, e por isso também nós, como cristãos, temos de sair.
Ora, não se trata simplesmente de ir, mas de como vamos. Jesus esvaziou-se a si próprio, humilhou-se, tornou-se obediente, e é esse o caminho para Jesus. Não devemos agarrar-nos aos nossos estilos de vida e preferências. Temos de nos encarnar. Jesus veio como um de nós, viveu entre nós, montou a sua tenda entre nós. Temos de ir ter com as pessoas que nada sabem do Evangelho, aprendendo a falar a sua língua, compreendendo que, por vezes, os instrumentos que utilizamos para evangelizar pressupõem demasiado.
Quem beneficia mais, a paróquia ou o indivíduo?
- Se o evangelismo é bem sucedido e frutuoso, como é que não pode beneficiar ambos? A minha própria experiência não é mais do que vivificante e incrível, pois Deus serviu-se de mim para levar as pessoas até Ele. Quando uma paróquia recebe novos crentes que encontraram o Senhor, beneficia muito, por isso creio que o fruto beneficia definitivamente ambos.
A "renovação divina" que implementou pode ser aplicada em regiões com uma mentalidade ou abordagem diferentes das do seu país, o Canadá?
- Tive a sorte de viajar por todo o mundo e fiquei com duas coisas. A primeira é que somos todos muito diferentes, e a segunda é que somos todos iguais, especialmente como católicos, temos os mesmos problemas, as mesmas lutas. Ainda não encontrei nenhum problema ou luta em nenhum país que me faça pensar que não é exatamente o mesmo no Canadá.
A "Renovação Divina" não é um método, é um modelo baseado em princípios vividos em contexto. Os três princípios são simplesmente, número um, o poder do Espírito Santo, número dois, a primazia do evangelismo e número três, o melhor da liderança.
Seja qual for o vosso contexto, se o Espírito Santo aparecesse com poder, isso beneficiaria a vossa paróquia? Se fizessem realmente da evangelização a coisa mais importante da vossa paróquia, acham que isso beneficiaria a vossa paróquia? Se a vossa liderança paroquial melhorasse, isso beneficiaria a vossa paróquia?
Estes três princípios fazem-me pensar que a Renovação Divina é aplicável. Neste momento, o ministério da Renovação Divina está a trabalhar em 94 países diferentes e parece estar a dar frutos.
Falamos de "evangelizar", de renovar as paróquias, de estudar os métodos, mas o que é que isso nos diz sobre o "evangelizador"?
A autoridade de Cristo. Décimo Quinto Domingo do Tempo Comum (B)
Joseph Evans comenta as leituras do 15º Domingo do Tempo Comum e Luis Herrera faz uma breve homilia em vídeo.
Joseph Evans-11 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
Jesus envia os seus apóstolos a pregar, sem recursos básicos, mas com a única coisa de que realmente precisam: o seu mandato. Ele dá-lhes "autoridade sobre os espíritos imundos". mas "Deu-lhes instruções para levarem um pau para a estrada e nada mais, nem pão, nem alforge, nem dinheiro no cinto.". Podiam usar sandálias, mas não duas túnicas. É interessante notar que, noutros relatos em que Jesus envia os seus discípulos, insiste também na pobreza radical, mas há ligeiras diferenças quanto ao que podem ou não vestir. Por exemplo, em Mt 10,10 não lhes é permitido levar um cajado ou sandálias. A questão é que o que importa é a pobreza radical, mas o que é exatamente a pobreza radical pode variar de acordo com as circunstâncias. Nalguns lugares, algo é realmente uma necessidade indispensável; noutros, não.
Jesus está a dizer-nos que o único requisito essencial é a Sua ordem, o chamamento d'Ele, a autoridade que Ele nos dá. Se tivermos isso, nada mais é tão importante. E sem isso, nada será bem sucedido. Há um episódio, por exemplo, em que os israelitas - tendo-se recusado a entrar na Terra Prometida quando Deus lhes disse que o fizessem - tentam fazê-lo mais tarde, mas contra a sua vontade. Não é de estranhar que todo o esforço acabe num desastre total (Nm 14,39-45; Dt 1,41-45).
Uma ideia semelhante aparece na primeira leitura de hoje, em que o sacerdote Amazias ordena ao profeta Amós que deixe o santuário de Betel e regresse à terra de Judá. Isto é "o santuário do rei e a casa do reino".diz ele a Amós. Um rei anterior, na altura do cisma entre o Norte e o Sul de Israel, tinha erigido Betel como santuário para impedir as pessoas de irem a Jerusalém. Tratava-se de uma religião nacionalizada. Para Amazias, a autoridade de Betel vinha do rei. Mas Amós contrapõe que a sua própria autoridade vinha de Deus. Ele não fazia parte de uma família ou de um grupo de profetas, mas Deus chamou-o quando ele era um simples agricultor de sicómoro. O que conta é o chamamento de Deus e não o patrocínio do rei.
É por isso que as leituras de hoje nos ensinam a procurar o nosso apoio onde ele se encontra: em Deus, não nos bens, não no poder humano. A única coisa que importa é o facto de Deus nos ter chamado, nos ter chamado, nos ter chamado, nos ter chamado. "escolhidos em Cristo".como ouvimos na segunda leitura. O chamamento de Cristo é toda a autoridade e apoio de que necessitamos.
Homilia sobre as leituras de domingo 15º Domingo do Tempo Comum (B)
O sacerdote Luis Herrera Campo oferece a sua nanomiliaUma breve reflexão de um minuto para estas leituras dominicais.
Representantes religiosos de todo o mundo comprometem-se a promover o desenvolvimento ético da IA
Representantes religiosos de todo o mundo assinaram o documento "Rome Call for AI ethics" em Hiroshima, a 10 de julho, com o objetivo de promover um desenvolvimento tecnológico que não perca de vista a dignidade do ser humano.
Nos dias 9 e 10 de julho, representantes de religiões de todo o mundo reuniram-se no HiroshimaJapão, num evento que visa promover um compromisso genuíno na procura da paz através da assinatura do documento "Rome Call for AI Ethics".
O evento foi iniciado pela Academia Pontifícia para a Vida, Religiões para a Paz Japão, Fórum para a Paz dos Emirados Árabes Unidos e Comissão para as Relações Inter-Religiosas do Rabinato Chefe de Israel. Ao assinarem o documento, pessoas influentes de todo o mundo e de vários domínios comprometem-se a fomentar o sentido de responsabilidade no desenvolvimento da Inteligência Artificial.
Durante o primeiro dia do evento, os participantes ouviram apresentações não só sobre a ética da utilização da Inteligência Artificial, mas também sobre os desenvolvimentos científicos, tecnológicos e legislativos. Entre os oradores das sessões encontravam-se Brad Smith, Diretor Executivo da Microsoft, e Amandeep Singh Gill, enviado do Secretário-Geral das Nações Unidas para a tecnologia.
Cooperação inter-religiosa
Por outro lado, no dia 10, teve lugar a assinatura do documento. O Presidente da Academia Pontifícia para a Vida, D. Paglia, sublinhou a importância deste acontecimento, afirmando que "todas as religiões são chamadas a trabalhar em conjunto para o bem da humanidade".
Yoshiharu Tomatsu, secretário das Religiões para a Paz no Japão, afirmou que os desafios que surgem com o desenvolvimento da Inteligência Artificial estão a levá-los a comprometerem-se a "promover a inclusão e o respeito mútuo para todos".
Por seu lado, o xeique Abdallah Bin Bayyah, presidente do Fórum da Paz dos EAU, sublinhou que "a cooperação, a solidariedade e o trabalho em conjunto são necessários para lidar com os desenvolvimentos da Inteligência Artificial, onde se misturam interesses, perigos e benefícios, para garantir que os sistemas e os produtos não são apenas avançados, mas também moralmente correctos".
O representante da Comissão para as Relações Inter-Religiosas do Rabinato-Chefe de Israel, Eliezer Simha Weisz, também afirmou que "enquanto pessoas de fé, temos a responsabilidade única de infundir clareza moral e integridade ética na nossa busca pela Inteligência Artificial".
"Rome Call for AI Ethics", um compromisso proactivo
O Papa Francisco, que não esteve presente na assinatura, quis enviar uma breve mensagem mensagem a todos os participantes no evento. Como chefe da Igreja Católica, apelou aos signatários para que "mostrem ao mundo que estamos unidos no apelo a um compromisso pró-ativo para proteger a dignidade humana nesta nova era da máquina".
Além disso, o Pontífice sublinhou a importância de envolver membros de diferentes religiões neste compromisso do "Apelo de Roma". Reconhecer o contributo das riquezas culturais dos povos e das religiões para a regulação da Inteligência Artificial é fundamental para o sucesso do vosso compromisso com a sábia gestão da inovação tecnológica", afirmou.
Os representantes que estiveram presentes neste evento em Hiroshima juntam-se a outras grandes personalidades que já assinaram o documento promovido pelo Vaticano. A Igreja Anglicana, a IBM e a Universidade Sapienza são outras entidades de renome que também se comprometeram a desenvolver a Inteligência Artificial sem perder de vista a ética baseada na dignidade do ser humano.
Todos nós queremos ser saudáveis, mas poucos de nós procuram ser santos. No entanto, estes objectivos não são independentes. A saúde e a santidade estão interligadas.
O autor da carta aos Hebreus exorta-nos a viver em busca da paz e da santidade, porque encontrar a paz ajudar-nos-á a viver plenamente nesta vida, e encontrar a santidade levar-nos-á a viver eternamente na outra vida. Viver em paz com todos os que nos rodeiam trará os dons e as virtudes mais sublimes que espiritualizarão a vida. Este estilo de vida saudável será um terreno fértil para semear frutos de santidade. Quando pensamos em santos, em quem é que pensamos? Os nomes de S. Francisco de Assis, S. Teresa de Ávila, S. Teresa de CalcutáSanto Inácio de Loyola, São João Bosco. Embora a lista seja longa, na realidade existem apenas cerca de 10.000 santos reconhecidos pela Igreja Católica. Se calcularmos que havia 300 milhões de pessoas na terra quando a era cristã começou, e que hoje somos cerca de 8 mil milhões, sem contar com todos os que morreram nos últimos 2000 anos, então 10.000 santos são uma pequena fração dos milhares de milhões que viveram na população humana!
Porque é que é tão difícil tornar-se santo?
Ouvimos falar dos longos processos que por vezes demoram anos, quando a Igreja analisa diligentemente a vida, os milagres e os ensinamentos de um candidato à beatificação ou canonização. Pensemos antes que é difícil ser declarado santo, mas, dia após dia, é suposto vivermos em processos de santificação, o que também significa purificação e transformação, mesmo que nunca sejamos declarados santos.
A santidade não é apenas uma experiência mística de uns poucos dotados e privilegiados que viveram heroicamente as virtudes. A santidade é também uma meta e uma trajetória humanas relacionadas com a pureza do coração, a pureza das intenções e das acções que todos somos chamados a manifestar. Como diz o Salmo 24:3-4, quem subirá ao monte do Senhor, e quem poderá permanecer no seu lugar santo? Aquele que tem as mãos limpas e o coração puro.
Muitos perguntam: podemos ser santos num mundo corrupto, cheio de seduções para o mal, onde o pecaminoso e o banal são a norma? O mal sempre existiu. Recordemos alguns personagens bíblicos. Por exemplo, no tempo de Noé, o pecado desenfreado do mundo paganizado em toda a sua envolvência desafiava a misericórdia divina, ao ponto de Deus querer lavar a face da terra de todo o mal com o dilúvio. Mas afastou uma família que encontrou refúgio no coração de Deus e no abrigo de uma barca. Essa arca simboliza a Igreja, onde procuramos proteção contra o mal exterior, para nos refugiarmos uns nos outros ao abrigo de uma comunidade familiar e espiritual de irmãos e irmãs na fé.
Recordemos também Moisés que, depois de ter renunciado às seduções da vida palaciana do Faraó, conduziu o seu povo para fora da abundância do Egipto e para a privação do deserto, a fim de se purificar e de se despojar da identidade de escravo antes de entrar numa terra de homens livres. Ao longo da história da salvação, muitos de nós encontrámos no coração da arca e no refúgio da Igreja a proteção e a sabedoria necessárias para crescer na obediência a Deus e na santidade. Conhecemos também profetas, peregrinos e eremitas que precisaram do deserto e dos claustros para silenciar as vozes do mundo e aprender a ouvir apenas a voz de Deus.
Em todos os casos, trata-se da mesma procura de Deus por parte de corações famintos e sedentos de encontrar nele o sentido da vida e o objetivo. Precisamos da correção dos nossos irmãos e irmãs na comunidade. Viver em comunidade oferece-nos um modelo de comportamento saudável e replicável. Mas também chegamos a momentos de santidade nos nossos desertos pessoais, a sós com Deus, para nos envolvermos em análises profundas e conversas com Ele que nos darão a revelação pessoal do Espírito Santo e a comunhão de corações.
Qual é o seu caminho para a santidade?
Estou convencido de que muito poucos de nós serão declarados santos, mas todos nós poderemos experimentar momentos de santidade.
Viver momentos de santidade é limpar o coração e despojar a mente de tudo o que nos impede de procurar e desejar a vontade de Deus. Viver momentos de santidade é viver procurando agradar a Deus acima de agradar à carne ou às expectativas do mundo. Para o conseguirmos, precisamos de uma cura interior, como sugere S. Paulo em Romanos 12,1-2: "Por isso, irmãos, tendo em conta a misericórdia de Deus, exorto cada um de vós a oferecer, no culto espiritual, o vosso corpo como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus. Não vos conformeis com o mundo presente, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente. Então vereis qual é a vontade de Deus, boa, agradável e perfeita.
Nós, que seguimos Jesus, caminhamos na fé, dependemos da sua graça e esforçamo-nos também em actos de amor e de misericórdia, o complemento de todos integrados na mesma experiência.
Como diz 1 Pedro 1,15-16: "Em tudo o que fizerdes, sede santos, como é santo aquele que vos chamou, porque está escrito: Sede santos, porque eu sou santo".
Aproximar-nos-emos da santidade se resistirmos à mediocridade espiritual, se falarmos a verdade e agirmos com caridade. Aproximar-nos-emos da santidade com disciplina moral, espiritual e comportamental. Tudo o que nos projecta para sermos melhores seres humanos ajudar-nos-á a santificarmo-nos. O convite à santidade é um convite à mudança e à transformação constantes: mudança de natureza, moderação das reacções, dos impulsos, das tendências, das paixões, erradicação das obsessões.
O oposto da santidade é a degradação dos nossos comportamentos humanos, normalizando e desculpando a decadência moral, o pecado, as falhas e as imperfeições. O oposto da santidade é também quando pecamos não só em actos, mas também em pensamentos. O oposto da santidade é ter prazer no mundano, ser atraído pelo corrupto, entrar em cumplicidade com o pecado e suportar as suas consequências sem vontade de mudar. O plano do inimigo é a decadência. Nesse plano de decadência e perda está a aceitação do pecado como parte da normalidade da vida. O inimigo quer sempre fazer-nos crer que ser pecador faz parte da complexidade de ser um simples ser humano.
No plano de Jesus, é-nos apresentado um programa há muito desejado de cura e auto-aperfeiçoamento que conduz à perfeição. Jesus disse: "Sede santos como o vosso Pai celeste é santo" (Mateus 5, 48). Sabes que mais Jesus descreveu o Pai? Como amoroso, carinhoso, compassivo, compreensivo: todos estes atributos são sinónimos de santidade.
Embora a santidade sempre nos tenha parecido uma miragem ou uma realidade inatingível, a verdade é que todos nós podemos viver momentos de santidade. Quando é que vivemos momentos de santidade? Como diz Mateus 25,35-36 "quando tive fome e me destes de comer, sede e me destes de beber, nu e me vestistes, na prisão e fostes visitar-me".
Quando é que experimentamos momentos de santidade? Quando resistimos aos desejos e impulsos da carne; quando aceitamos as circunstâncias que não podem ser mudadas e nos comprometemos com o que devemos e podemos mudar; quando combinamos sabedoria com humildade; e quando trocamos o ressentimento por empatia e misericórdia.
Quando é que vivemos momentos de santidade? Quando procuramos a presença de Deus nos silêncios, nas azáfamas e nas encruzilhadas da vida, e temos fome e sede dos seus dons, para agradar ao seu coração, e quando transformamos todo o sacrifício em ação de graças e louvor.
Quando é que experimentamos momentos de santidade? Quando somos bondosos, prestáveis, gratos, fiéis, autênticos, compassivos: porque tudo isto é contrário aos instintos humanos e, para manifestar esta nova natureza, precisamos do Espírito de Deus a que também chamamos Espírito Santo.
Experimentaremos momentos de santidade sempre que nos sacrificarmos por amor, respondendo a um necessitado, cuidando de um doente, quer seja a nossa vez ou não; quando não abandonarmos os nossos pais idosos num lar, mas nos dedicarmos a eles nos seus últimos anos de vida, sentindo que a cruz não é pesada, mas suportável, porque é carregada com amor genuíno.
Experimentaremos momentos de santidade quando defendermos a verdade em vez da mentira, quando defendermos a fé e a difundirmos incansavelmente até que outros se convertam e mudem o seu estilo de vida.
Experimentaremos momentos de santidade quando nos deixarmos usar profeticamente e milagrosamente por Deus, que precisa sempre de vasos disponíveis e obedientes ao Seu chamamento e aos estímulos da graça.
Experimentaremos momentos de santidade quando sairmos de um confessionário tendo aceitado o perdão e a misericórdia de Jesus, e quando formos capazes de perdoar aos outros quando nos ofendem, como Ele nos ensinou a fazer; e quando nos curvarmos perante o Santíssimo Sacramento em profunda reverência, entregando-Lhe os nossos fardos e elevando-Lhe o nosso incansável louvor.
Viveremos momentos de santidade quando, embora pudéssemos optar pelo mal, pelo engano, pela fraude, escolhemos a bondade, a verdade e a sinceridade: em vez de acumular, partilhamos: em vez de negar aos outros o nosso pão ou os nossos benefícios, partilhamo-los.
A sua palavra confirma que o chamamento é para todos.
Juraj Šúst: "O tomismo pode defender a fé e dialogar com a cultura secular".
Omnes entrevistou o filósofo, publicitário e ativista eslovaco Juraj Šúst, organizador do festival BHD, um dos eventos culturais mais importantes da Europa Central. O tema deste ano foi: "Cultura (cristã)? Juraj Šúst fala-nos desta iniciativa e do seu percurso intelectual.
Andrej Matis-10 de julho de 2024-Tempo de leitura: 11acta
Juraj Šúst estudou filosofia na Universidade de Trnava, onde também obteve o seu doutoramento. É uma pessoa ativa, conhecida do público eslovaco principalmente como presidente da Sociedade Ladislav Hanus (SLH) e organizador do festival "Bratislava Hanus Days" (BHD).
O BHD é um festival centrado em debates sobre a cultura cristã e o seu envolvimento. Oferece uma variedade de palestras, debates, workshops e espectáculos artísticos que visam relacionar a fé cristã com questões sociais e culturais actuais. O festival realiza-se em Bratislava e, nos últimos anos, tem atraído personalidades como Robert P. George, Scott Hahn e Philip-Neri Reese, O.P.
A história da Hanus e o seu envolvimento no SLH e no BHD testemunham a necessidade de um diálogo aberto entre a fé, o mundo secular e as culturas, bem como o papel crucial dos leigos na educação católica contemporânea e na vida intelectual.
Na edição deste ano do BHD, um dos convidados de destaque foi o Professor Robert P. George, que falou numa das sessões sobre a sua própria pequena conversão intelectual. Aconteceu que, numa disciplina optativa, foi-lhe atribuída a leitura de um texto que não lhe interessava muito. Foi à biblioteca para o ler e, quando o fez, teve uma conversão intelectual. Era o "Górgias", de Platão, e foi um ponto de viragem para o Professor George: decidiu então não procurar o que lhe agradava à sua volta e dedicar-se a uma coisa e apenas a uma coisa: a procura da verdade.
Já teve uma conversão intelectual semelhante e qual foi o seu caminho para a filosofia?
- O que aconteceu foi que, no liceu, estava à procura de uma forma de dar sentido à minha vida. A minha família vinha de um meio católico, não muito refletido intelectualmente, mas que eu respeitava. Ao mesmo tempo, porém, fiquei chocado com o que a cultura secular me oferecia: muitas vezes parecia-me, mesmo no bom sentido, mais orientada para a ação, mais rica do que o que eu via no meu mundo católico.
Cresci com estas duas perspectivas e, de certa forma, escolhi a filosofia para as resolver. No final, achei que era uma desilusão estudar filosofia. Lá estávamos a estudar a história da filosofia, enquanto eu queria tratar das minhas questões existenciais, como Platão e Sócrates. Mas, ao longo dos meus estudos, conheci uma pessoa que era uma espécie de Sócrates para mim, e isso fez-me avançar.
Quem foi um modelo filosófico para si?
- Nessa altura, simpatizava com as filosofias liberais e tentava viver a minha vida católica.
Tinha lido a ideia de Popper de uma sociedade aberta e pareceu-me razoável, pois tratava-se de estar aberto a todos os pontos de vista na sociedade; ele era contra o marxismo, o comunismo e os regimes totalitários. Nessa altura, também me pareceu que ele era tolerante em relação à religião.
Como é que ele passou de Popper para o tomismo?
- Popper interessou-me durante os meus estudos, mas o que sempre senti falta na sua filosofia foi o facto de ele não dar respostas às grandes questões. Apenas respondia às questões práticas e pragmáticas, sobre como viver em conjunto sem nos antagonizarmos uns aos outros. Mas para mim, enquanto jovem, interessava-me saber o que é a verdade, como devo viver, e ele não me deu resposta a isso... Por isso, não me bastava. Platão abriu-me a questão clássica, a procura da verdade, e mais tarde encontrei Agostinho, que me influenciou como um pensador muito sugestivo e também como um católico radical. Isso atraiu-me e disse a mim mesmo: tenho de ser um católico tão radical como ele. Agostinho tocou-me profundamente e ajudou-me a descobrir também a beleza de Tomás.
Como é que chegou a esta viagem filosófica pessoal até SLH, que abre as portas da filosofia e da procura da verdade a muitos outros jovens?
- Cheguei à SLH cerca de um ano após o início da sua existência.
No início, a minha atitude era morna: sentia um pouco que não encontrava o meu caminho junto dos outros, algumas opiniões pareciam-me uma pose, mas pouco a pouco isto mudou e quando me ofereceram para fazer parte da equipa de formação desta comunidade, aceitei.
Durante os meus estudos em Cracóvia, participei no festival Tišner Days, que contou com a presença de filósofos locais e estrangeiros, incluindo Robert Spaemann, na altura. Fiquei fascinado com o facto de muitos jovens participarem nestas conferências. Nunca tinha visto nada assim na Eslováquia e disse para comigo: "Quem me dera que houvesse algo assim no meu país!
E agora temo-lo.
- Já o temos.
A Sociedade Ladislav Hanus organiza também os Hanus Days em Bratislava, um festival em que oradores e público formam uma comunidade dinâmica. Este ano, no âmbito de um debate com o Prof. Robert P. George, um homem mais velho que viveu o comunismo na Eslováquia levantou a questão de saber como é possível que durante os quarenta anos de comunismo - quando a Igreja era perseguida - tenhamos conseguido transmitir a fé aos jovens, e agora, durante os (quase) quarenta anos de consumismo, não o consigamos fazer.
- Não vou falar pelos outros, mas por mim posso dizer que o SLH me ajudou a responder racionalmente a questões que a Igreja ensina, mas que na altura não eram totalmente claras para mim: o aborto, a moral sexual, a relação entre a Igreja e o Estado.
O SLH ajudou-me de muitas maneiras a encontrar, ou pelo menos a procurar, uma base racional para o que a Igreja ensina. Para mim, o SLH foi uma mudança de vida nesse sentido, e gostaria que o SLH tivesse esse efeito em todos os que entram em contacto com ele.
No ano passado, Scott Hahn esteve na BHD e a presença de uma personalidade com mais de 10 títulos publicados na Eslováquia foi muito bem recebida pelas pessoas. Como é que isso foi possível?
- Há uma bela história por trás disso. O bispo auxiliar de Bratislava, Jozef Haľko, dizia-nos muitas vezes: "Convida o Scott Hahn". Tentámos primeiro oficialmente através do sítio Web do Scott. Não obtivemos resposta. Depois descobrimos que um antigo aluno nosso tinha estudado em Trumau, na escola teológica, com o filho de Scott Hahn. Descobrimos também que havia um padre reformado na Eslováquia que tinha passado muito tempo nos Estados Unidos, onde tinha sido capelão militar. Ele ficou entusiasmado com a ideia de convidar Scott Hahn para a Eslováquia e ajudou-nos a concretizá-la. Todas estas coisas se conjugaram.
Como é que foi para si ter o Scott Hahn aqui?
- Muito bom. Queríamos que Scott não só estivesse no nosso festival nessa semana, mas também que se encontrasse com padres, bispos, e tudo isso se concretizou. Scott estava entusiasmado e penso que deu muitos frutos, especialmente para os padres.
O filósofo Juraj Šúst durante uma palestra.
Este ano, Philip Neri Reese, O.P. veio ao BHD, e no ano passado Thomas White, O.P.. Este ano também tivemos a presença de Matt Fradd, um leigo conhecido pelo seu podcast "Pints with Aquinas". Qual é a sua relação com o tomismo?
- Muito fervoroso. Vejo o tomismo como uma tradição intelectual da Igreja Católica que não surgiu por acaso. É uma união da filosofia grega clássica com a fé cristã, cultivada durante séculos. É verdade que, no século XIX, passou por uma crise de redução ao manualismo que provocou a resistência de duas gerações. Mas nem a crítica bíblica nem a própria erudição bíblica podem subsistir sozinhas sem uma filosofia de qualidade, e o tomismo está hoje a regressar em força. Atualmente, o tomismo é a única teologia relevante que pode defender a fé e dialogar também com culturas religiosas ou seculares.
Alguns pensadores dizem que o tomismo está simplesmente fora de moda....
- O tomismo atual é muito mais rico do que costumava ser, porque até os avanços nos estudos bíblicos podem ser traduzidos para esse campo. E devido à ênfase do século XX noutras filosofias, como a fenomenologia, o tomismo contemporâneo pode também recorrer a elas. Não tem de se fechar em silogismos estritos, mas pode ser uma teologia e uma filosofia muito variadas. Pela minha parte, estou muito contente por ainda existirem bons tomistas hoje em dia, que vale a pena convidar para o nosso festival.
Ladislav Hanus, que deu o nome à SLH, era um padre católico; o senhor é um leigo, pai de uma família numerosa. Alfonso Aguiló, um dos convidados do BHD deste ano, também falou sobre o facto de a educação católica ter estado historicamente nas mãos de padres e religiosos e estar agora a passar para as mãos dos leigos. Podemos dizer que esta mudança também está a ocorrer no campo dos intelectuais e sente-se parte desta mudança?
- Não sei se o tempo dos leigos não terá chegado porque há uma crise de padres e religiosos. Gosto quando na educação há uma colaboração entre leigos e padres, e também acredito que o papel do padre como professor é, de certa forma, insubstituível. Seria um grande erro se os leigos começassem a reclamar esse papel. Penso que, pelo menos na Eslováquia, esta tendência não é tão forte, o que me parece correto. Ao mesmo tempo, é verdade que na Igreja, durante as últimas décadas, temos testemunhos de diferentes leigos em vários países que lançaram muitas iniciativas, e penso que esta nova era também nos pode ensinar algo de novo sobre a cooperação entre padres e leigos.
Falámos de Alfonso Aguilar e da educação. Na opinião de Aguiló, a educação em casa é uma reação ao facto de termos de nos defender deste mundo, e não é uma reação ideal. Ele pensa que não devemos retirar-nos do espaço público, mas sim permanecer nele e estar presentes nas instituições educativas. É pai de seis crianças que são educadas em casa. Qual é a sua experiência e a sua opinião sobre isto, ou esta é uma questão controversa?
- Essa é uma excelente pergunta. Eu tenho uma opinião sobre ela. Vamos ver por onde começar...
É verdade que a educação doméstica é uma reação. É uma reação à crise da educação católica. Esta crise é mais profunda no Ocidente, mas também já existe na Eslováquia. E a crise consiste no facto de as escolas católicas serem católicas no nome, por assim dizer, mas porque já não enfatizam a ortodoxia da fé dos professores e especialmente dos alunos, a cultura nessas escolas é como que indistinguível da cultura secular, na qual a religião e as suas manifestações são uma espécie de adesivo. Hoje, mesmo na Eslováquia, apercebo-me de que a Igreja entende as escolas católicas como um espaço para a evangelização dos alunos e das crianças. Na minha opinião, isto é lamentável.
Então, achas que a escola não é o lugar certo para a evangelização?
- É certo que precisamos de escolas onde haja espaço para a evangelização, mas também precisamos de escolas onde haja espaço para a catequese, para o crescimento na fé. Para que esse espaço se abra, é essencial que haja ali crianças e professores que partilhem a fé católica, que amem Jesus Cristo e queiram aprender a amá-lo ainda mais, a partir do conhecimento da verdade. E, conhecendo a verdade, amarão ainda mais Cristo. E isso deve ser claro, inequívoco, intransigente e evidente para todos os actores envolvidos na escola em questão.
Na sua opinião, a evangelização e a catequese podem ter lugar na mesma instituição ou são necessários dois tipos de escolas diferentes?
- Precisamos de dois tipos de escolas. Escolas segundo Bento, "ora et labora", onde há uma "regula" ou regra, onde podemos aprender a viver segundo a fonte católica, sem compromissos. Escolas que possam ser um farol no bairro, na região em que se situam.
E também precisamos de escolas segundo S. Domingos, como me disse o Padre Philip-Neri Reese quando esteve em Bratislava para o BHD. Escolas onde haja um espírito católico, uma mente católica, onde a tradição católica seja preservada na sua plenitude e onde, ao mesmo tempo, os professores sejam capazes de comunicar com o mundo contemporâneo. Escolas onde todos podem estudar.
Mesmo os não católicos?
- Mesmo os não católicos. Na minha opinião, o Padre Reese estava a referir-se principalmente às universidades, embora eu possa imaginar escolas secundárias deste tipo também. Mas, na minha opinião, as universidades são mais adequadas para o efeito. Nessas escolas, a cultura católica pode fazer incursões no mundo secular contemporâneo. E pode, de certa forma, mostrar a esse mundo que tem os melhores pressupostos para ser um árbitro capaz de dialogar entre culturas, entre religiões, entre secularismo e religião, porque tem a enorme tradição da filosofia realista tomista. O que fez no passado com a cultura árabe e judaica, pode fazer hoje com as culturas actuais que compõem a sociedade contemporânea. São dois tipos de escolas de que precisamos. E o que não precisamos é de escolas católicas formais.
Então, a razão pela qual escolheste o ensino em casa é porque não temos escolas católicas honestas?
- Sim, mas há ainda outra razão. A educação em casa, nos primeiros anos de vida, é muito bonita. Os pais são os primeiros educadores, e a educação não é apenas instrução, mas também formação. É natural que as crianças aprendam os princípios básicos da matemática, da língua, da religião, etc., à mesa da cozinha. E aprendem-no como parte integrante das suas vidas. Não é que eu tenha de aprender algo para os exames e que, graças a isso, entre numa boa escola e comece uma carreira de sucesso, mas que aprenda tudo como parte integrante da minha vida quotidiana. E, neste contexto, o importante não é a carreira, os prémios e os diplomas, mas viver a fé católica de uma forma bela, em plenitude, em unidade com a tradição e em plena unidade com a vida quotidiana. E onde é que isto pode ser melhor conseguido do que no círculo familiar? Assim, a educação em casa não é apenas uma fuga do mundo, ou uma opção deixada quando tudo o resto falha. Pelo menos nos primeiros anos de vida, é também uma opção natural e atractiva.
Os vossos filhos não têm saudades dos amigos?
- A educação em casa não tem de ser feita de forma isolada. A famílias encontrar-se, coordenar, inspirar e hoje em dia, graças à tecnologia, é mais fácil do que no passado estabelecer ligações e comunicar. Mas pode tornar-se um desafio se não viver numa comunidade onde existam outras famílias interessadas no ensino doméstico.
O que pensa sobre o conteúdo do ensino nas escolas actuais?
- Hoje em dia, há uma tendência para ensinar as crianças a pensar, mas muitas vezes isso não passa de uma folha de figueira perante a incerteza sobre o que pensar. Não dizemos às crianças o que pensar porque nós próprios não sabemos o que pensar. Mas, claro, o pensamento crítico é bom em si mesmo. Mas temos de ensinar as crianças a pensar de tal forma que a fé não seja apenas um rótulo para elas, mas que a luz da fé ilumine o seu pensamento em todas as áreas da sua vida. Isto é algo que precisamos de redescobrir e restaurar. Reencontrar algo que já existiu, e até mesmo melhorá-lo.
J.J. Rousseau é famoso pelo seu livro "Emilie ou l'éducation", mas, paradoxalmente, não se preocupou com o seu filho. Tem seis filhos, como é que consegue conciliar o seu trabalho maravilhoso com o cuidado da sua família?
- Tento não separar o trabalho da família. Quero que os meus filhos vejam o que o pai faz e que podem gostar. Para que não vejam o trabalho como algo que afasta o pai da família, mas como algo de que também eles podem beneficiar. O meu objetivo educativo é que os meus filhos vejam no pai que ele ama Cristo, que isso é algo de que nunca abdicará, que celebramos o domingo juntos, que o dedicamos a Deus Nosso Senhor, que vamos à missa juntos, que comemos juntos ao domingo.... e que isso tem prioridade sobre tudo o resto, sobre os amigos, etc. Eles nem sempre o recebem com entusiasmo, mas eu insisto e penso que se há uma coisa que transmito aos meus filhos é pelo menos isto: que o pai não falava apenas de Deus, mas vivia a sua relação com Ele.
Que mundo gostaria de deixar aos seus filhos? Onde deposita a sua esperança na cultura ocidental?
- É preciso que haja mais famílias que procurem viver a radicalidade da fé, famílias cujos filhos sejam sementes de vida cristã que um dia crescerão e florescerão. Embora não se trate de uma mudança total a nível da sociedade, haverá muitos oásis onde as pessoas poderão ser tocadas pelo amor de Cristo.
Creio que isso exigirá de nós, cristãos, esse martírio. Também na vida quotidiana, mas talvez também noutras situações mais difíceis. Penso que, à medida que o laicismo for mais agressivo, haverá confrontos com a fé e, se não quisermos ser tépidos, mas inequívocos, teremos de confiar no elemento cavalheiresco da vida. É também para isto que tento orientar os meus filhos.
Um documento longo, composto por 112 pontos divididos em duas secções, mais uma introdução e conclusões. Este é o esboço do Instrumentum Laborisque servirá de guia para a segunda sessão da assembleia sinodal de outubro próximo "Como ser uma Igreja sinodal missionária".
Novos ministérios baptismais como a escuta, o papel das mulheres nos processos de decisão da Igreja, incluindo a questão do diaconado, novas formas de exercer o ministério petrino e a revitalização dos Conselhos Pastorais são alguns dos aspectos que emergem do documento que servirá de base aos trabalhos da Assembleia.
Vários níveis de audição
O Cardeal Grech, Secretário-Geral do Sínodo, explicou que "durante o período entre a Primeira e a Segunda Sessão, o caminho do Sínodo continuou a ser caracterizado por um profundo exercício de escuta, uma escuta realizada a vários níveis.
Confirmou-se assim que o Sínodo é, acima de tudo, um formidável ginásio de escuta". Uma escuta que envolve "o sentido da fé do Povo de Deus, a voz dos pastores e o carisma dos teólogos". Grech recordou que "depois da celebração da Primeira Sessão, o Sínodo 'voltou' - por assim dizer - às Igrejas locais".
Uma segunda consulta que levou, "apesar das limitações de tempo", a que a Secretaria Geral do Sínodo recebesse "nada menos que 108 Sínteses Nacionais preparadas pelas Conferências Episcopais (num total de 114), às quais se juntam 9 respostas recebidas das Igrejas Católicas Orientais, 4 dos Encontros Internacionais das Conferências Episcopais e a Síntese da União dos Superiores Gerais e da União Internacional dos Superiores Gerais representantes da Vida Consagrada".
Este rico material, ao qual se juntam as Observações livremente enviadas por indivíduos e grupos (incluindo até algumas Faculdades de Teologia e de Direito Canónico), constitui o quadro de apoio do documento hoje apresentado, porque o seu objetivo é agora submeter ao discernimento de alguns - os Membros do Sínodo, que se reunirão novamente em outubro - o que foi dito por todos - as Igrejas locais em que vive o Povo de Deus".
O cardeal maltês recordou ainda as consultas e encontros realizados com teólogos, que levaram à "constituição de 5 Grupos de Estudo, compostos por 33 especialistas com diferentes formações e experiências, chamados a aprofundar algumas das questões fundamentais que permeiam o Relatório Síntese": o rosto sinodal missionário da Igreja local (1), dos agrupamentos de Igrejas (2) e da Igreja universal (3), bem como o método sinodal (4) e a questão do "lugar", entendido não só em sentido geográfico, mas também em sentido cultural e inseparavelmente teológico (5).
Os contributos destes grupos foram também incorporados no Instrumentum Laboris e constituirão a base de uma ajuda teológica que será publicada em breve".
A estes cinco grupos juntaram-se outros 10, anunciados pelo Papa, chamados a aprofundar "temas sobre os quais a Assembleia Sinodal já chegou a um consenso significativo e que, por isso, pareceram suficientemente maduros para poderem passar à fase de elaboração de propostas concretas de reforma a submeter ao Santo Padre".
Estes Grupos já estão operacionais ou, em alguns casos, sê-lo-ão em breve: apresentarão um primeiro relatório das suas actividades na Segunda Sessão, com vista a oferecer as suas conclusões ao Bispo de Roma, possivelmente em junho de 2025.
Além disso, a Comissão de Canonistas, chamada a estudar um projeto de reforma das normas canónicas diretamente envolvidas no processo sinodal, está operacional desde 2023. Mais recentemente, o SECAM (Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar) iniciou um caminho de discernimento teológico e pastoral sobre o acompanhamento das pessoas em situação de poligamia.
Estes dois organismos apresentarão igualmente uma primeira avaliação das suas actividades em outubro.
A síntese da escuta
O processo sinodal incluiu a audição dos pastores, tanto bispos como párocos: "As suas vozes ressoam também no documento hoje publicado", disse Grech, que descreveu o Insrtumentum Laboris como "um concerto colorido de vozes, uma verdadeira polifonia, rica em timbres e acentos".
Por seu lado, o Relator Geral, Cardeal Jean-Claude Hollerich, Arcebispo do Luxemburgo, ilustrou o trabalho das Igrejas locais realizado desde o encerramento da primeira sessão: "Os relatórios recebidos mostram uma Igreja viva e em movimento. De facto, o que mais se destaca ao ler não só os relatórios, mas também as experiências e boas práticas que chegaram ao Secretariado Geral, é que o sínodo, o processo sinodal, foi e continua a ser um tempo de graça que já está a dar numerosos frutos na vida da Igreja. Do Quénia à Irlanda, da Coreia ao Brasil, os relatórios sublinham este dinamismo renovado que a escuta oferecida e recebida está a trazer às comunidades".
E não só: "Eles atestam unanimemente, sem esconder as fadigas e as dificuldades da conversão sinodal, também um sentimento de alegria e de gratidão, como o relata, por exemplo, a Conferência Episcopal dos Estados Unidos".
Outro elemento particularmente interessante, sublinhou Hollerich, "foi a adoção generalizada da 'Conversa no Espírito': este método sinodal foi introduzido nas reuniões de várias estruturas eclesiásticas.
O Cardeal recordou também as iniciativas de formação sobre a sinodalidade e alguns frutos que já se fazem sentir: uma certa maturidade no caminho sinodal das Igrejas locais, o paroquialismo que se nota nas contribuições, a capacidade de releitura e de autoavaliação.
Por seu lado, os dois secretários especiais da Assembleia, Padre Giacomo Costa e Monsenhor Riccardo Battocchio, foram responsáveis por ilustrar mais pormenorizadamente o conteúdo do Instrumentum Laboris. "A introdução é fundamental para compreender o documento", disse Costa, recordando a afirmação de uma Igreja africana: "A partir de agora, ninguém poderá considerar as Igrejas locais como meras receptoras do anúncio do Evangelho, sem poderem dar qualquer contributo. A Igreja é harmoniosa, não é homogénea, e é uma harmonia que não pode ser dada por adquirida".
Primeira secção: Os princípios básicos
O P. Battocchio explicou que a primeira secção, "Fundações", contém "elementos que apoiam e orientam o caminho de conversão e reforma que o povo de Deus é chamado a percorrer". Reúne os frutos do caminho iniciado em outubro de 2021, mas que tem raízes mais longínquas. Serve para verificar a existência de um consenso sobre alguns aspectos decisivos: ser Povo de Deus, ser sinal de unidade em Cristo, ser uma Igreja que acolhe e é chamada a dar".
Battocchio disse que, a partir do "reconhecimento das diferenças entre homens e mulheres, será necessário um maior reconhecimento dos carismas, da vocação e do papel das mulheres em todas as áreas da vida da Igreja" e "novas formas ministeriais e pastorais terão de ser exploradas". A reflexão sobre o acesso das mulheres ao diaconado será abordada no grupo de estudo 5, em colaboração com o Dicastério para a Doutrina da Fé.
Segunda secção: relações, percursos e lugares
A segunda secção está dividida em três partes. A primeira trata das "relações", começando pela "relação fundamental com Deus". Seguem-se as relações entre os baptizados, as que preservam a comunhão com os ministros e as relações entre as igrejas. Prevê a possibilidade de estabelecer outras formas de ministério batismal, como o ministério da escuta e do acompanhamento", distinto e diferenciado dos ministérios ordenados.
Segue-se o capítulo "Percursos". Uma necessidade muito forte é a da "formação integral com momentos comuns partilhados". Depois, a formação para o discernimento: "deixar-se guiar pelo Espírito". Depois, o "tema essencial" das decisões: "Como desenvolver maneiras de tomar decisões respeitando os papéis". Por fim, a transparência, não só no domínio dos abusos sexuais e financeiros, mas também, por exemplo, nas formas de respeitar a dignidade humana.
A última parte refere-se aos "Lugares", ou seja, os contextos concretos em que as relações se encarnam. Partindo da pluralidade das experiências eclesiais, o Instrumentum Laboris "convida-nos a ir além de uma visão estática dos lugares.
A experiência do enraizamento territorial mudou ao longo dos anos. É dada muita atenção ao ambiente digital, bem como a "repensar alguns aspectos da articulação territorial da Igreja e a reforçar a circularidade da realidade eclesial".
Nesta perspetiva, propõe-se uma reavaliação dos Conselhos específicos.
Por fim, o serviço à unidade do Bispo de Roma, para estudar formas de exercício do ministério petrino abertas à nova situação do caminho ecuménico e à unidade dos cristãos.
Os bispos espanhóis reunidos num encontro do sessão plenária extraordinária, a quinta na sua história, adoptaram três documentos: o Plano global de reparação menores e pessoas com direitos iguais, vítimas de abuso sexual, as linhas de trabalho que incluem este plano de correção, bem como o critérios orientadores da reparação integral para as vítimas de abuso sexual de menores ou adultos equiparados na lei.
No encerramento desta Assembleia Plenária Extraordinária, o Presidente da Conferência Episcopal Espanhola, Monsenhor Luis Argüello sublinhou que este plano de Reparação integral concentra-se especialmente nos casos que "têm as portas fechadas" devido à prescrição civil, à morte do autor do crime ou a outras situações.
"Este plano de reparação pretende ser subsidiário. Quando as vias legais, civis, penais, criminais, canónicas tiverem terminado ou as vias possíveis de reparação tiverem terminado, a Igreja mantém as suas portas abertas para ouvir qualquer vítima", sublinhou o presidente dos bispos espanhóis.
Para além dos documentos, os bispos aprovaram a criação de uma comissão consultiva, composta por pessoas de vários domínios, incluindo a Igreja, a psicologia e pessoas próximas das associações de vítimas. Esta comissão terá o seu próprio regulamento interno sobre a forma de atuar.
Na conferência de imprensa dada por Argüello juntamente com o presidente da CONFER, Jesús M. Díaz Sariego, o presidente do episcopado espanhol pediu às administrações públicas e à sociedade que respeitem as regras de funcionamento da Igreja e explicou que "não é um decreto-lei que obriga, mas sim que na Igreja nos dotamos de critérios de comunhão para que as pessoas que decidam que têm direito a esta reparação possam dirigir-se a uma diocese ou a uma comissão consultiva para tratar do caminho da reparação".
A Igreja, afirmou Luis ArgüelloSei que nada pode, por si só, curar a dor sofrida por tantas vítimas de abusos, mas manifestamos o nosso firme compromisso de prosseguir nesta via de reparação e de colaboração com o Ministério Público e as forças do Estado quando estes crimes ocorrem".
Este plano prevê que, no caso hipotético de uma vítima não encontrar refúgio numa instância da Igreja, diocese ou congregação, pode sempre dirigir-se a "outra porta" para seguir o seu caminho de reparação.
Reparação integral
Este plano de reparação abordará o processo de vários ângulos e é, em grande parte, o resultado de ouvir as vítimas de abuso de várias partes da Igreja nos últimos anos.
O presidente dos bispos quis sublinhar que "uma reparação integral requer tempo, pessoas e compensações financeiras. Há dinheiro, mas também tempo e pessoas. A Igreja responde com os recursos da sua comunhão de vida e da sua comunhão de bens a tudo o que tem de enfrentar".
Isto significa que, para além do trabalho de acompanhamento, prevenção e formação que já está a ser realizado, a Igreja terá de assumir uma possível compensação financeira para as vítimas de abuso.
Também na conferência de imprensa que se seguiu, o presidente da CEE explicou que "não é o chefe dos bispos" e que o que foi aprovado nesta assembleia extraordinária não pode ser obrigado a cumpri-lo, mas sublinhou que o facto de ter sido aprovado praticamente por unanimidade pelos bispos dá uma indicação do empenho da Igreja espanhola neste caso.
Um plano que nasce do compromisso, não da obrigação
Relativamente à qualificação de unilateralismo, que um membro do governo espanhol tinha recentemente qualificado de unilateral neste plano de reparação, o presidente dos bispos espanhóis quis sublinhar que "é claro que é unilateral. É uma decisão nossa, que responde a uma obrigação moral, não jurídica, por nossa própria iniciativa". Argüello rejeitou a crítica do governo, afirmando que para eles se trata de "um reconhecimento, porque quando se fecha a via legal, tem de se abrir uma porta não legal".
Tanto Argüello como Díaz Sariego sublinharam a vontade da Igreja de trabalhar em conjunto com outros organismos sociais e governamentais na luta contra os abusos.
Anos de trabalho
"O trabalho de reparação da Igreja não começa nem termina hoje", sublinhou D. Argüello. Neste sentido, tanto o presidente dos bispos, como o presidente da Conferência Espanhola de Religiosos, recordaram o caminho que a Igreja percorreu "há mais de 20 anos, quando se tornaram conhecidos estes casos de pessoas abusadas por membros das nossas comunidades" e, sobretudo, nos últimos seis anos.
10 perguntas sobre o "Instrumentum Laboris" do Sínodo publicado hoje
O "Instrumentum Laboris" (IL, Instrumento de Trabalho), para os membros da segunda sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que terá lugar em outubro, sobre o tema "Como ser uma Igreja sinodal missionária",foi tornada pública hoje. As conclusões da Assembleia, que é um órgão consultivo, serão apresentadas ao Papa para uma possível exortação apostólica.
Francisco Otamendi-9 de julho de 2024-Tempo de leitura: 10acta
O documento tem 32 páginas e é composto por uma introdução, uma justificação, três partes e uma conclusão, intitulada "A Igreja sinodal no mundo". A IL articula as sínteses recebidas para animar a reflexão da Assembleia sobre a questão central do mês de outubro: 'Como ser uma Igreja sinodal em missão".
Na conclusão, o texto apela à encíclica Todos os irmãosque "nos apresenta o apelo a reconhecermo-nos como irmãs e irmãos em Cristo ressuscitado, propondo-o não como um estatuto, mas como um modo de vida. A Encíclica sublinha o contraste entre o tempo em que vivemos e a visão de convivência preparada por Deus. O véu, o cobertor e as lágrimas do nosso tempo são o resultado do crescente isolamento uns dos outros, da crescente violência e polarização do nosso mundo e do desenraizamento das fontes da vida.
Igreja sinodal missionária: escuta profunda e diálogo
"Este Instrumentum laboris - explica a Secretaria Geral do Sínodo, presidida pelo Cardeal Mario Grech - interpela-nos e interroga-nos sobre como ser uma Igreja sinodal missionária; como nos empenharmos numa escuta e num diálogo profundos; como sermos co-responsáveis à luz do dinamismo da nossa vocação batismal pessoal e comunitária; como transformar as estruturas e os processos para que todos possam participar e partilhar os carismas que o Espírito derrama sobre cada um para o bem comum; como exercer o poder e a autoridade como serviço".
"Cada uma destas questões é um serviço à Igreja e, através da sua ação, à possibilidade de curar as feridas mais profundas do nosso tempo", acrescenta a parte final do documento.
O "Instrumentum laboris" pode ser consultado em várias línguas no sítio Web oficial do Secretaria Geral do Sínodoque contém uma secção específica para os trabalhos da Segunda Sessão da XVI Assembleia. Para além das IL, esta secção contém Perguntas Frequentes (FAQ), Infografias e outros documentos úteis não só para a preparação dos membros da assembleia, mas também para qualquer outra pessoa ou grupo que deseje aprofundar o seu conhecimento da Igreja sinodal.
Em fevereiro deste ano, o Papa Francisco ordenou que alguns dos grupos de estudo analisará dez perguntase apresentar as suas conclusões, se possível, até junho de 2025. Uma das perguntas e respostas deste esquema, para efeitos de clarificação, está relacionada com esta questão.
Perguntas e respostas
A Secretaria Geral do Sínodo preparou uma série de perguntas, dez para ser exato, com as respectivas respostas, que a Omnes transmite aqui.
O que é o "Instrumentum laboris"?
- Como indica a sua expressão latina, o "Instrumentun Laboris" (IL) é, antes de mais, um instrumento de trabalho para os membros da Segunda Sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos. Este facto justifica também a sua linguagem e o uso de noções e categorias teológicas em algumas das suas partes. Um subsídio teológico, a ser publicado em breve, facilitará a sua leitura e permitirá uma compreensão mais profunda das noções e categorias teológicas utilizadas.
Nasce das reflexões que as Conferências Episcopais, as Igrejas Católicas Orientais e outras realidades eclesiais internacionais, bem como os relatórios apresentados pelos pastores durante a reunião de trabalho de três dias dos Pastores para o Sínodo, fizeram sobre o Relatório Síntese da Primeira Sessão (4-29 de outubro de 2023) à luz das indicações dadas pela Secretaria Geral do Sínodo através do documento Rumo a outubro de 2024.
A IL articula assim as sínteses recebidas com o objetivo de incentivar a reflexão da Assembleia sobre a questão central da assembleia de outubro Como ser uma Igreja sinodal em missão.
Como instrumento de trabalho da 16ª Assembleia, a IL não é um documento magisterial, nem um catecismo. Também não é um texto que ofereça respostas prontas, nem um documento que pretenda abordar todas as questões relacionadas com a necessidade de ser cada vez mais "sinodal em missão".
É um documento, fruto da escuta, do discernimento e da reflexão sobre a sinodalidade que amadureceu ao longo do processo sinodal. É um texto de base, articulado mas essencial, concebido sobretudo como suporte do método com o qual a assembleia será chamada a trabalhar e a favorecer a oração, o diálogo, o discernimento, o amadurecimento de um consenso a partir de algumas convergências amadurecidas ao longo do caminho em vista da entrega ao Santo Padre de um Documento Final da XVI Assembleia.
O "Instrumentum laboris" tem a sua origem nos relatórios recebidos pela Secretaria Geral do Sínodo. Quem enviou estes relatórios?
- Em dezembro de 2023, o Secretariado Geral, através do documento "Rumo a outubro de 2024", convidou toda a comunidade cristã a refletir sobre a questão orientadora identificada para a Segunda Sessão da XVI Assembleia: Como ser uma Igreja Sinodal em Missão, propondo uma série de percursos e actividades diferenciadas com base no Relatório Síntese, aprovado pelos membros da XVI Assembleia no final dos trabalhos da Primeira Sessão, em outubro de 2023.
O objetivo era manter vivo o dinamismo sinodal, promovendo a nível local uma reflexão sobre o modo de reforçar a corresponsabilidade diferenciada na missão por parte de todos os fiéis e, ao mesmo tempo, pedir às Conferências Episcopais, às Igrejas Católicas Orientais e aos agrupamentos de Igrejas que reflectissem sobre o modo de articular a dimensão da Igreja como um todo e o seu enraizamento a nível local, recolhendo assim os frutos da reflexão em torno do Relatório de Síntese.
Apesar do pouco tempo disponível, até 30 de junho de 2024 tinham sido recebidos nada menos que 108 relatórios das Conferências Episcopais (de um total de 114), 9 das Igrejas Católicas Orientais (de um total de 14), para além do contributo da USG-UISG (respetivamente a União Internacional dos Superiores Maiores e a União Internacional dos Superiores Gerais). Para além do contributo de alguns dicastérios da Cúria Romana, o Secretariado Geral recebeu também mais de 200 comentários de entidades internacionais, faculdades universitárias, associações de fiéis ou comunidades e indivíduos.
Obviamente, ao redigir o Instrumentum laboris, o Secretariado Geral teve também em conta os relatórios apresentados pelos pastores durante a sessão de trabalho de três dias do Encontro Internacional de Pastores para o Sínodo e de alguns grupos de trabalho: os cinco grupos criados pelo Secretariado Geral do Sínodo para aprofundar o estudo teológico de cinco áreas de reflexão, na sequência do que foi repetidamente pedido pela Assembleia (o rosto da Igreja sinodal missionária; o rosto sinodal missionário dos agrupamentos de Igrejas; o rosto da Igreja universal; o método sinodal; o "lugar" da Igreja sinodal na missão), e uma comissão específica de peritos canónicos criada para apoiar o trabalho dos teólogos.
Neste sentido, o Instrumentum Laboris pode verdadeiramente ser visto como um documento da Igreja que soube dialogar com diferentes sensibilidades e diferentes contextos pastorais.
Quem redigiu o "Instrumentum laboris"?
- Como qualquer outro documento da Secretaria Geral do Sínodo relativo ao processo sinodal, o Instrumentum Laboris (IL) é o fruto de um trabalho que envolveu um grande número de pessoas de diferentes partes do mundo e com diferentes competências.
Em primeiro lugar, um grupo de teólogos (homens e mulheres, bispos, sacerdotes, consagrados e leigos) de vários continentes, mas também os membros do XV Conselho Ordinário da Secretaria Geral do Sínodo, acompanhados por alguns Consultores da mesma Secretaria.
Uma primeira versão do documento foi então enviada a cerca de setenta pessoas, representantes de todo o Povo de Deus (sacerdotes, consagrados e consagradas, leigos, representantes de realidades eclesiais, teólogos, agentes pastorais e um número significativo de pastores) de todo o mundo, de diferentes sensibilidades eclesiais e de diferentes "escolas" teológicas.
Esta consulta alargada foi efectuada para manter a coerência com o princípio de circularidade (o que vem de baixo, volta para baixo) que animou todo o processo sinodal. Esta verificação do material preparado à luz dos relatórios recebidos foi também um exercício, por parte do Secretariado-Geral, da responsabilidade que caracteriza a Igreja sinodal.
Finalmente, após as devidas modificações, a IL foi devolvida ao Conselho Ordinário que, depois de uma série de alterações, a aprovou e a transmitiu ao Santo Padre para aprovação final.
Como é que está estruturado?
- O "Instrumentum laboris" é composto por cinco secções. Após a introdução, o IL abre com uma secção dedicada aos Fundamentos da compreensão da sinodalidade, que repropõe a consciência amadurecida ao longo do caminho e sancionada pela Primeira Sessão.
Seguem-se três partes intimamente ligadas, que iluminam a vida sinodal missionária da Igreja a partir de perspectivas diferentes: (I) a perspetiva das Relações - com o Senhor, entre irmãos e entre Igrejas - que sustentam a vitalidade da Igreja muito mais radicalmente do que as suas estruturas; (II) a perspetiva dos Caminhos que sustentam e alimentam concretamente o dinamismo das relações; (III) a perspetiva dos Lugares que, contra a tentação de um universalismo abstrato, fala da concretude dos contextos em que se encarnam as relações, com a sua variedade, pluralidade e interligação, e com o seu enraizamento no fundamento nascente da profissão de fé.
Cada uma destas secções será objeto de oração, intercâmbio e discernimento num dos módulos que marcarão os trabalhos da segunda sessão. Um resumo da IL está disponível em www.synod.va
Este "Instrumentum laboris" parece, na sua estrutura, um pouco diferente do anterior, que continha muitas folhas com muitas perguntas, por que razão foi escolhida esta estrutura?
- A Assembleia é uma realidade em evolução e o Instrumentum Laboris está ao serviço da Assembleia e não o contrário. Se na Primeira Sessão foi necessário fazer convergir as muitas questões que emergiram da ampla consulta do Povo de Deus a nível local, nacional e continental, agora é necessário que dessas convergências se possa chegar a um consenso. Enquanto na primeira sessão foi pedido aos membros que escolhessem a área temática em que desejavam contribuir, na segunda sessão todos os membros abordarão o mesmo texto e discutirão as mesmas propostas.
O "Instrumentum Laboris" é destinado aos membros da XVI Assembleia, mas como é que os grupos sinodais locais e, em geral, os fiéis que não participarão na Assembleia de outubro o podem utilizar? Como podem contribuir para os trabalhos de outubro?
- O "Instrumentum laboris" dirige-se em primeiro lugar aos membros da Segunda Sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos. No entanto, é também um instrumento precioso para os grupos individuais a nível diocesano e nacional que desejam continuar o seu caminho de reflexão e discernimento sobre o modo de caminhar juntos como Igreja e de levar por diante iniciativas eclesiais. Por exemplo, a IL pode oferecer uma oportunidade especial para um encontro - mesmo virtual - entre os membros da Assembleia e pelo menos a equipa nacional na fase de preparação do encontro de outubro, também através do método sinodal da Conversa no Espírito.
Desta forma, o papel representativo de cada membro da Assembleia pode tornar-se tangível. Em todo o caso, é importante que todos aqueles que se interessam pela conversão sinodal da Igreja em vista da missão continuem a empenhar-se para que o dinamismo eclesial iniciado com a consulta do Povo de Deus em 2021 não se desvaneça e para que o exercício da corresponsabilidade pela missão da Igreja continue a desenvolver-se a nível local, como já está a acontecer.
Além disso, a IL ajudará certamente a compreender como é importante que os fiéis acompanhem os trabalhos da Assembleia com a oração, pedindo ao Espírito Santo - o verdadeiro protagonista dos trabalhos de outubro - que sustente a grande tarefa confiada aos membros da Assembleia.
O Instrumentum Laboris menciona um subsídio teológico. De que se trata?
- Para acompanhar o Instrumentum laboris, relativamente conciso, a Secretaria Geral do Sínodo achou por bem oferecer algumas pistas teológicas e canónicas sobre os temas da IL, a fim de ajudar os membros da Assembleia - sem excluir um círculo mais vasto de destinatários - a reconhecer e a compreender as raízes e as implicações do que está contido na IL.
Aprofundar" do ponto de vista teológico significa: sublinhar a referência de cada um dos temas à Sagrada Escritura, à Tradição da Igreja, ao Concílio Vaticano II, ao recente Magistério do Bispo de Roma dos episcopados mundiais.
"Aprofundar" do ponto de vista canónico significa: mostrar como o discernimento em relação a questões individuais se pode traduzir em práticas reguladas e verificadas também através do instrumento normativo.
Mais do que um texto orgânico, a Convenção será apresentada como uma série de "glosas" à IL. De facto, uma versão actualizada da IL conterá algumas referências à Convenção nas margens de cada capítulo.
Alguns temas foram confiados aos 10 grupos de trabalho criados pelo Papa Francisco. Como deve ser interpretada esta decisão? É uma forma de retirar estes temas do debate da Assembleia?
- Desde o início, o Papa Francisco insistiu que este Sínodo não é sobre este ou aquele tema, mas sobre a sinodalidade, sobre como ser uma Igreja missionária a caminho. A Assembleia de outubro e todas as questões teológicas e propostas pastorais de mudança têm este objetivo. A Assembleia deve, portanto, ser um momento em que cada participante, colocando-se num caminho iniciado em 2021 e trazendo a "voz" do povo de Deus de onde provém, invoca a ajuda do Espírito Santo e a dos seus irmãos e irmãs para discernir a vontade de Deus para a sua Igreja, e não uma oportunidade para impor a sua própria visão da Igreja.
Ao mesmo tempo, o Papa Francisco saudou a convergência que os membros da Assembleia expressaram durante a Primeira Sessão sobre uma série de questões relevantes relativas à vida e à missão da Igreja em perspetiva sinodal, sobre as quais a Assembleia alcançou um consenso consistente, quase sempre superior a 90%, através da criação de 10 grupos de trabalho específicos. Trata-se de questões importantes, algumas das quais devem ser tratadas a nível de toda a Igreja e em colaboração com os Dicastérios da Cúria Romana.
Não se trata, portanto, de subtrair certas questões ao debate da assembleia, que já exprimiu uma convergência quanto à sua importância, mas de fornecer elementos úteis, do ponto de vista teológico e canónico, para oferecer ao ministério de Pedro.
Por conseguinte, estes grupos já devem ser considerados como um fruto do caminho sinodal. Nestes grupos participam peritos e bispos de diferentes partes do mundo, identificados com base na sua experiência e respeitando a variedade de origens geográficas, antecedentes disciplinares, género e estatuto eclesial necessários para uma abordagem autenticamente sinodal.
Estão a recolher e a enriquecer as contribuições existentes sobre os temas que lhes foram atribuídos. Os grupos deverão concluir os seus trabalhos, se possível, antes do final de junho de 2025.
O que podemos esperar da conclusão do Sínodo?
- A celebração da segunda sessão da XVI Assembleia do Sínodo dos Bispos não significa o fim do processo sinodal. A Constituição Apostólica Episcopalis Communio (EP), que rege todo o processo sinodal, recorda que o Sínodo se compõe essencialmente de três fases: a consulta dos fiéis, o discernimento dos pastores e a fase de implementação.
Estas três fases não devem ser entendidas apenas num sentido cronológico. De facto, com a celebração da XVI Assembleia, segundo o PE, estaríamos na fase de discernimento dos pastores, seguida do momento de receção dos trabalhos da Assembleia pelas comunidades locais.
No entanto, o discernimento dos pastores acompanhou quase todo o processo sinodal (ou seja, já na fase de consulta, que, de facto, já viu o discernimento dos pastores a nível local, nacional e continental).
Além disso, podemos testemunhar que a fase de "implementação" já começou imediatamente após os primeiros encontros. Os "frutos" sinodais são já numerosos: muitos são os testemunhos das realidades eclesiais que mudaram a sua ação eclesial em sentido sinodal, com uma maior corresponsabilidade de todos os fiéis baptizados.
Por isso, a conclusão da Segunda Sessão não será o fim do processo sinodal, mas apenas um momento importante no discernimento dos pastores.
Por outro lado, nos sínodos anteriores foi aprovado um documento final que foi entregue ao Santo Padre. Este documento continha algumas indicações que a Assembleia desejava entregar ao Papa. Normalmente, passados alguns meses, o Papa entregava a toda a Igreja um documento chamado Exortação Pós-Sinodal, que continha algumas disposições relacionadas com o tema em questão.
Espera-se que esta Assembleia produza também um documento final a ser apresentado ao Santo Padre para uma possível exortação. O objetivo da Assembleia Sinodal é dar orientações ao Papa. O Sínodo tem carácter consultivo e não deliberativo.
Onde é que a IL pode ser encontrada?
- O "Instrumentum laboris" pode ser encontrado em várias línguas no sítio oficial do Secretariado Geral do Sínodo (www.synod.va), onde foi criada uma secção específica para os trabalhos da Segunda Sessão da XVI Assembleia. Para além do IL, esta secção contém também Perguntas Frequentes (FAQ), Infografias e outros documentos úteis não só para a preparação dos membros da assembleia, mas também para qualquer outra pessoa ou grupo que deseje aprofundar o seu conhecimento da Igreja sinodal.
Sobre o cisma de Viganó, "a Igreja espera sempre a conversão".
Carlo Maria Viganó, antigo núncio nos Estados Unidos, foi declarado culpado do crime de cisma, depois de ter manifestado repetidamente críticas inaceitáveis ao Papa e à comunhão eclesial. Davide Cito, professor de Direito Canónico na Universidade Pontifícia da Santa Cruz, explica os aspectos canónicos desta questão.
No passado dia 4 de julho, o Dicastério para a Doutrina da Fé, presidido por Mons. Víctor Manuel Fernández, declarou Mons. Carlo Maria Viganò culpado do crime de cisma e confirmou a excomunhão latae sententiae em que incorrera por "declarações públicas, das quais resulta a sua recusa em reconhecer e submeter-se ao Sumo Pontífice". Carlo Maria Viganò do crime de cisma e confirmou a excomunhão latae sententiae em que tinha incorrido pelas "declarações públicas, das quais decorre a sua recusa em reconhecer e submeter-se ao Sumo Pontífice, da comunhão com os membros da Igreja a ele submetidos e da legitimidade e autoridade magisterial do Concílio Ecuménico Vaticano II".
Carlo Maria Viganó, natural de Varese, foi ordenado sacerdote em 1968. Rapidamente entrou para o corpo diplomático da Santa Sé. Ocupou vários cargos na Cúria Romana, o último dos quais foi o de núncio apostólico nos Estados Unidos, de 2011 a 2016. Depois de renunciar ao cargo por razões de idade, tornou-se um crítico constante do Papa Francisco. Nos últimos anos, as suas críticas tornaram-se cada vez mais fortes, ao ponto de negar a legitimidade do Papa, pedir a sua demissão ou não aceitar os ensinamentos do Concílio Vaticano II.
O que é que aconteceu para que o antigo representante da Santa Sé nos Estados Unidos assinasse a sua separação da Sé de Pedro? Falámos com Davide Cito, professor de Direito Penal Canónico na Pontifícia Universidade da Santa Cruz, que sublinha os fundamentos jurídicos canónicos da decisão da Santa Sé, mas lembra que a porta da Igreja está sempre aberta.
Há alguns dias, soubemos que Carlo M. Viganó, antigo núncio nos Estados Unidos, tinha sido declarado culpado de cisma. Porque é que a Igreja o declara culpado?
-Conforme indicado no comunicado de imprensa emitido pelo Dicastério para a Doutrina da Fé A 4 de julho, foi levado a cabo um processo penal canónico pelo mesmo Dicastério, que é o órgão competente para julgar os crimes contra a fé cometidos por bispos.
No caso de Monsenhor Carlo Maria Viganò, ele foi "acusado do crime reservado de cisma (cânones 751 e 1364 CIC)" e do art. 2 das Normas sobre os crimes reservados ao Dicastério para a Doutrina da Fé.
Foi considerado culpado porque foram provados os factos que constituem o crime de cisma, resumidos nas palavras do comunicado: "São conhecidas as suas declarações públicas, que se traduzem na sua recusa em reconhecer e submeter-se ao Sumo Pontífice, à comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos e à legitimidade e autoridade magisterial do Concílio Ecuménico Vaticano II".
Ao mesmo tempo, a sua culpa foi provada no sentido de que ele cometeu estes actos criminosos, que são particularmente graves porque tocam a própria identidade da Igreja, sendo crimes contra a fé, livremente e de boa vontade, consciente das consequências das suas acções. Por esta razão, mons. Viganò "foi considerado culpado do crime reservado de cisma. O Dicastério declarou a excomunhão. latae sententiae ex can. 1364 § 1 CIC".
As razões de Viganó para a sua posição têm algum fundamento canónico?
-Considerando as declarações repetidamente feitas por Mons. Viganò, que se recusou a comparecer perante o juiz, mostrando mais uma vez o seu desprezo pela autoridade legítima da Igreja, não parecem ter qualquer base canónica. Viganò, que se recusou a comparecer perante o juiz, mostrando mais uma vez o seu desprezo pela autoridade legítima da Igreja, elas não parecem ter qualquer base canónica.
Negar, entre outras coisas, a legitimidade e a autoridade magisterial de um concílio ecuménico, como o Concílio Vaticano II, é inaceitável para um católico fiel.
Ao mesmo tempo, como no crime de heresia, em que o herege pensa que ele, e não a Igreja, tem a verdadeira fé, no crime de cisma, o cismático afirma que representa e defende a verdadeira Igreja contra a mesma Igreja, que é considerada falsa e ilegítima.
Os cismas no Oriente, no Ocidente e o cisma que deu origem à Igreja Anglicana são bem conhecidos. Estamos a falar do mesmo tipo de cismas?
-Não me parece. Os cismas do Oriente e do Ocidente a que se refere têm uma origem complexa, com problemas doutrinais, disciplinares e também políticos, que se reflectiram depois no conflito sobre as autoridades eclesiásticas que deviam presidir às Igrejas Orientais e depois à comunidade anglicana.
Além disso, a complexidade histórica destes cismas é indissociável do caminho ecuménico que a Igreja Católica está a empreender com estas Igrejas e comunidades cristãs para percorrer o caminho da unidade entre os cristãos.
Neste caso, por outro lado, não há Igrejas ou comunidades envolvidas, mas um Arcebispo individual que, por razões pessoais, embora sempre com justificações aparentemente muito nobres, e sem presidir a qualquer tipo de comunidade eclesial (que nunca teve), vai simplesmente rejeitando a autoridade legítima da Igreja em todos os domínios em que a Igreja actua, tentando aparecer como "vítima" da autoridade que não reconhece e, ao mesmo tempo, "defensor" de uma verdadeira Igreja que, na verdade, está apenas na sua mente.
Porque é que umas dão origem a outras igrejas e outras não? Todas as seitas cristãs são cismáticas?
Para criar Igrejas em sentido estrito, não basta tentar "criá-las", mas é necessária a presença de um verdadeiro episcopado, no qual se dê a sucessão apostólica e no qual se acredite também no sacramento da Ordem.
Por outro lado, o cisma é um desvio da Igreja Católica, no sentido em que uma comunidade ou seita cristã não é cismática por essa razão. Para ser cismático, é preciso ser católico. De facto, como ofensa canónica, afecta apenas os católicos e não outras pessoas baptizadas.
Qual é a diferença canónica entre cisma e heresia, e ambas implicam a excomunhão?
-Embora as duas infracções estejam incluídas no título "..." e "...".Crimes contra a fé e a unidade da Igreja". e, por isso, contrários ao bem da fé, razão pela qual são tão graves e comportam a pena de excomunhão, que manifesta de certo modo a perda da plena comunhão com a Igreja, são diferenciados pelo objeto do ato criminoso.
No caso da heresia, o objetivo da ofensa é negar uma verdade de fé, por exemplo, a divindade de Jesus Cristo ou a Imaculada Conceição da Virgem Maria.
O cisma, por outro lado, é a recusa de se submeter ao Sumo Pontífice ou de manter a comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos. Uma vez que o Romano Pontífice "como sucessor de Pedro, é o princípio e o fundamento perpétuo e visível da unidade tanto dos bispos como da multidão dos fiéis" (Lumen Gentium, 23), o cisma ataca diretamente a estrutura fundamental da Igreja na sua constituição hierárquica.
Ao mesmo tempo, uma vez que é a Igreja e o seu Magistério que ensinam as verdades da fé e guardam os fiéis na fé, ao negar a autoridade do Papa e a comunhão com ele, coloca-se fora da comunhão da Igreja.
Em termos jurídicos e práticos, em que situação fica Viganó e que passos terá de dar para que lhe seja levantada a excomunhão?
-Uma vez que a pena de excomunhão foi declarada, ou seja, tem efeitos públicos, é necessário fazer referência ao cân. 1331 §2 do Código de Direito Canónico, que estabelece os efeitos da pena de excomunhão quando esta é declarada. Por exemplo, está proibido de celebrar a Missa e, se o tentar fazer, deve ser rejeitado ou a cerimónia litúrgica deve cessar.
São inválidos todos os actos de autoridade regimental que ele possa praticar; não pode receber pensões eclesiásticas, nem pode receber validamente qualquer tipo de cargo ou função na Igreja. Ao mesmo tempo, se agir contra as proibições estabelecidas no cânone, podem ser acrescentadas outras penas canónicas, não excluindo a expulsão do estado clerical.
Obviamente, a Igreja espera sempre a conversão dos fiéis que cometeram delitos, e é por isso que a excomunhão é uma pena tão medicinal, para que o sujeito que cometeu um delito se arrependa. Arrepender-se dos seus actos e manifestar a sua unidade e obediência ao Sucessor de Pedro é o caminho para a cessação da pena de excomunhão e, assim, para o regresso à plena comunhão com a Igreja.
Os cristãos são e devem ser conservadores, no sentido em que recebem os dons de Deus, fazem-nos seus e transmitem-nos com generosidade. Ao mesmo tempo, são e devem ser progressistas, porque a revelação cristã afirma o valor do tempo como espaço em que Deus actua e o homem responde livre e pessoalmente.
9 de julho de 2024-Tempo de leitura: 5acta
Num interessante ensaio do padre irlandês Paul O'Callaghan intitulado ".Desafios entre fé e cultura. Dois irmãos de sangue na dinâmica da modernidade."(Rialp, 2023), há um capítulo lúcido sobre o alargamento da noção de gratidão através da integração do conservadorismo e do liberalismo progressista. Tentarei sintetizar as ideias que me parecem mais pertinentes, utilizando a palavra "progressista" em vez de "liberal", pois penso que é mais bem entendida no âmbito hispânico.
A cultura moderna é claramente marcada por uma escolha entre o conservadorismo e o progressismo. As pessoas são atraídas numa ou noutra direção, mas não em ambas: são propostos dois estilos culturais opostos que se encontram e marcam claramente o tipo de decisões que as pessoas tomam, a forma como se relacionam entre si e como respondem às questões últimas. Qual dos dois representa melhor o perfil de um crente cristão que tenta agradecer a Deus os dons recebidos, ou será realmente possível e desejável integrá-los?
Conservadores
A designação de conservador e de progressista é temperamental e pessoal. Algumas pessoas querem agarrar-se ao que têm, ao que lhes foi transmitido, ao que vem do passado; preferem claramente a experiência prática e a sabedoria. Talvez o façam por medo de perder o que é bom em troca da aquisição do que se promete ser melhor; ou talvez por uma atitude de reconhecimento e gratidão pelo que lhes é disponibilizado por aqueles que os precederam.
Os conservadores são geralmente um pouco receosos de perderem o que têm, talvez preguiçosos, nem sempre generosos com os seus bens, embora tendam a estar satisfeitos e contentes com a vida tal como ela é, muitas vezes nostálgicos, mais realistas do que idealistas, inclinados a levar os outros a ajustarem as suas prioridades "para o seu próprio bem", apegados ao previsível, aceitando e defendendo o coletivo, o status quo, a forma como as coisas são. Por conseguinte, podem ser vistos como autoritários e, por vezes, pessimistas. Por outro lado, na maioria das vezes, agradecem humildemente a Deus pelo que receberam e expressam a sua gratidão usando o mundo criado tal como foi feito e não abusando dele. Em suma, poderíamos dizer que o conservador é uma pessoa de fé.
Progressistas
Outros, porém, estão convencidos de que o que lhes foi transmitido, o que receberam do passado e dos outros, é imperfeito ou mesmo decadente e precisa de ser renovado ou mudado, e não apenas recebido com gratidão incondicional. Sentem-se livres, com direito e capazes de desafiar o status quo. "Por definição", diz Maurice Cranston, "um liberal é um homem que acredita na liberdade". Estão convencidos de que a mudança e o progresso são possíveis e necessários, seja na lei, nas estruturas ou nas formas estabelecidas de fazer as coisas. São essencialmente pró-direitos, impacientes com o rígido e o estático, muitas vezes prontos a descartar o que receberam dos outros, do passado. São frequentemente avessos à tradição e dão por vezes a impressão de serem ingratos.
O impulso progressista ou é motivado por um desejo sincero e generoso de melhorar as coisas e superar o mal na sociedade ou por uma falta de apreço inconveniente pelo que foi recebido dos outros no passado. Podem ser excessivamente confiantes nas suas ideias e projectos, mais idealistas e teóricos do que realistas, menos preparados para ouvir e aprender com o passado, para retificar ou corrigir as suas ideias ou visão quando necessário, para estarem insatisfeitos com a sua própria identidade; podem ser impacientes, inquietos e agitados, facilmente dispostos a permitir que "os outros" os mudem, mais individualistas do que colectivistas. Querem mudar as coisas, vivem para o futuro, sonhando impacientemente com "os novos céus e a nova terra" de que fala o Apocalipse (21,1-4). O progressista, fundamentalmente, espera.
Por falar em conservadores, Roger Scruton observa que "a sua posição é correcta mas aborrecida; a dos seus detractores, excitante mas falsa". Por esta razão, os conservadores podem ter uma espécie de "desvantagem retórica" e, consequentemente, "o conservadorismo tem sofrido uma negligência filosófica". Como disse o historiador Robert Conquest, "é-se sempre de direita nas questões que se conhece em primeira mão" ou Matthew Arnold que criticou o progressismo afirmando que "a liberdade é um excelente cavalo para montar, mas para montar em qualquer lado".
Religião, conservadores e progressistas
Embora muitos crentes considerem a religião como uma força liberalizadora, na sua maioria, as religiões são geralmente consideradas como elementos "conservadores" na sociedade: ajudam as pessoas a agarrarem-se às coisas, à realidade. No entanto, a ideia de que a religião é conservadora não pode ser aplicada univocamente a todas as religiões, muito menos ao cristianismo. Assim, podemos perguntar-nos: o verdadeiro cristianismo é conservador ou progressista? O cristianismo diz respeito a todos os aspectos da vida humana e da sociedade. A antropologia cristã é essencialmente integradora, tal como a vida e a espiritualidade cristãs. A única coisa que os cristãos rejeitam e excluem totalmente no homem é o pecado, que o separa de Deus, dos outros, do mundo e de si mesmo, destruindo a vida no sentido mais amplo da palavra.
Cristianismo, síntese afirmativa
Uma vez que o cristianismo não exclui nada de substancial da composição humana - nem o corpo nem o espírito, nem a liberdade nem a determinação, nem a sociabilidade nem a individualidade, nem o temporal nem o eterno, nem o feminino nem o masculino - parece que tanto os aspectos "conservadores" como os "progressistas" da vida humana individual e da sociedade no seu conjunto devem ser mantidos simultaneamente, se possível, numa síntese afirmativa e superadora. Um cristão pode ser conservador ou progressista por temperamento, mas a sua verdadeira identidade cristã deve ter algo de ambos.
Como disse uma vez o pastor metodista (progressista) Adam Hamilton: "Quando as pessoas me perguntam: és um conservador ou um progressista, a minha resposta é sempre a mesma: Sim. Mas qual? Ambos! Sem um espírito progressista, tornamo-nos aborrecidos e estagnados. Sem um espírito conservador, ficamos sem âncora e à deriva". O que impede esta integração é precisamente a presença divisória do pecado no coração do homem.
Os cristãos são e devem ser conservadores, no sentido de que recebem os dons de Deus através da Igreja de Jesus Cristo, fazem-nos seus e transmitem-nos generosa e criativamente aos que lhes sucedem. E, ao mesmo tempo, são e devem ser progressistas, porque a revelação cristã afirma a realidade e o valor do tempo como espaço em que Deus actua e o homem responde livre e pessoalmente à sua graça e à sua palavra. Os conceitos fundamentais são o tempo, a liberdade e a dignidade intocável e insubstituível de cada pessoa humana que vive com e para os outros homens. Além disso, o cristianismo atribui um peso especial à conversão (em grego "metanoia") que significa literalmente "ir para além da morte" e evoca a necessidade de superar a própria convicção e a situação atual.
O cristianismo foi originalmente uma enorme novidade na vida pessoal de milhões de homens e mulheres que romperam com os seus fracassos e pecados pessoais, com o judaísmo do seu tempo, com o modo de vida comum na sociedade, com a idolatria, estabelecendo uma visão profundamente renovada da dignidade de todas as pessoas, especialmente das mulheres e das crianças, do valor do casamento e da sexualidade, uma nova liturgia, uma nova abordagem. Um novo começo, um progresso, uma projeção para o futuro, para a eternidade. O poder de Deus injetado na vida dos homens pecadores produziu uma transformação e uma libertação espantosas na vida pessoal e social; libertou energias até então desconhecidas entre os homens; lançou-os numa vida de trabalho e de evangelização significativa e apaixonada. Fê-lo antes, fá-lo agora e continuará a fazê-lo até que o Senhor venha na sua glória.
Quinhentas mil pessoas acorrem à peregrinação mariana em Levoča, na Eslováquia
Durante o primeiro fim de semana de julho de 2024, milhares de pessoas participaram numa peregrinação mariana à Basílica da Visitação em Levoča, na Eslováquia.
Jana Dunajská-8 de julho de 2024-Tempo de leitura: 5acta
Nos dias 6 e 7 de julho, a cidade de Levoča, no norte da Eslováquia, assistiu a uma das peregrinações marianas mais concorridas do mundo. Europa. Mais de 500 000 pessoas participaram nas cerimónias religiosas e nas actividades da peregrinação. Num país com uma população de cinco milhões de habitantes, esta afluência sublinha a profunda devoção e o significado espiritual da peregrinação para os eslovacos. Durante estes dias, o sacramento da confissão desempenhou um papel de destaque, com numerosos sacerdotes disponíveis para oferecer este serviço aos peregrinos, dia e noite.
O programa da peregrinação foi variado: no sábado, para além das várias missas, incluindo uma em rito grego, houve um mini festival de música cristã que atraiu muitos jovens. No domingo, houve uma Via-Sacra, oração da Liturgia das Horas, recitação do terço e, no final, uma missa solene presidida pelo bispo de Spiš, D. František Trstenský.
Na sua homilia, D. Trstenský encorajou os presentes a serem fiéis ao Evangelho e a anunciá-lo com alegria; sublinhou que esta atitude alegre é uma necessidade do nosso tempo: "Não tenhamos medo de viver a nossa fé com alegria, de nos alegrarmos com ela, porque o Senhor está convosco. Desejo-vos a alegria da evangelização. A nossa Eslováquia não precisa de anunciadores tristes, mas de anunciadores alegres, que tenham experimentado a alegria do anúncio".
História da peregrinação mariana a Levoča
A peregrinação mariana a Levoča, que se realiza anualmente por altura da festa de São Cirilo e São Metódio (celebrada na Eslováquia a 5 de julho), é um dos eventos de peregrinação mais antigos e significativos da Eslováquia. As suas raízes remontam à Idade Média, quando, em 1247, foi construída a primeira capela dedicada à Virgem Maria em Levoča (na região nordeste de Spiš). Este ato foi uma resposta aos numerosos milagres que alegadamente ali ocorreram. A peregrinação tornou-se rapidamente num importante acontecimento espiritual que atraía crentes de toda a região e até de países vizinhos.
A peregrinação a Levoča continuou mesmo durante as invasões turcas, quando os crentes procuraram refúgio e apoio espiritual. No século XVII, foi construída uma basílica barroca na colina Mariánska Hora, que ainda hoje serve como a principal igreja de peregrinação. Esta basílica é uma verdadeira joia arquitetónica que oferece aos seus visitantes não só uma experiência espiritual, mas também um deleite estético com a sua magnífica arquitetura e decoração.
A importância deste lugar de peregrinação não passou despercebida em Roma. O Papa João Paulo II elevou a igreja da Visitação da Virgem Maria a basílica menor (basílica menor) em 26 de janeiro de 1984. Este título reconhece a importância e o significado espiritual deste lugar. Onze anos mais tarde, a 3 de julho de 1995, teve lugar a maior peregrinação da história de Levoča, envolvendo mais de 650 000 pessoas na presença do próprio Papa.
Personalidades proeminentes
A peregrinação mariana a Levoča tem atraído muitas personalidades proeminentes de várias áreas da vida pública. Entre os mais importantes está o Papa João Paulo II, que visitou Levoča durante a sua visita. viagem apostólica à Eslováquia em 1995. A sua presença conferiu à peregrinação um significado especial e reforçou a sua dimensão internacional. Além disso, a peregrinação conta regularmente com a presença de bispos, padres e outros líderes espirituais que reforçam o significado espiritual do evento com a sua presença.
Outras personalidades proeminentes que visitaram Levoča durante a peregrinação mariana incluem vários políticos, personalidades culturais e artistas eslovacos, que vêm não só em busca de inspiração espiritual, mas também para apoiar a tradição e o património cultural.
Peregrinação durante o comunismo
A peregrinação mariana a Levoča adquiriu um significado especial durante a era comunista, quando o regime reprimiu e monitorizou a vida religiosa. Nesses tempos difíceis, a peregrinação tornou-se um símbolo de resistência e de força espiritual para muitos crentes. As pessoas iam em peregrinação a Levoča apesar do risco de perseguição ou castigo.
A peregrinação representava um refúgio e um local onde os crentes podiam exprimir livremente a sua fé e obter apoio espiritual. Esta força espiritual e moral representada pela peregrinação ajudou a manter a esperança e a reforçar a força interior das pessoas numa altura em que os direitos e liberdades fundamentais eram sistematicamente violados. Os peregrinos encontraram-se com sacerdotes e religiosos clandestinos, que lhes deram apoio espiritual e encorajamento.
A peregrinação hoje
Atualmente, a peregrinação mariana a Levoča é um evento que atrai dezenas de milhares de crentes todos os anos. Os preparativos para a peregrinação começam vários meses antes do evento, para que tudo esteja perfeitamente organizado. Para além das principais cerimónias religiosas, que incluem missas, orações e procissões, a peregrinação é acompanhada por vários eventos culturais e sociais.
A peregrinação de Levoča é atualmente um evento espiritual moderno que combina valores tradicionais com novas formas de expressão espiritual. Muitos jovens aproveitam a oportunidade de ir em peregrinação para encontrar a paz interior e reforçar a sua fé. Os organizadores asseguram que o programa é rico e variado, oferecendo várias formas de enriquecimento espiritual e cultural.
Um dos pontos altos da peregrinação é a procissão nocturna, que começa na basílica e termina no topo da colina Mariánska Hora. Esta procissão simboliza a peregrinação espiritual e uma profunda experiência interior para muitos peregrinos. Os peregrinos transportam velas, iluminando o caminho, o que cria uma experiência visual e espiritual inesquecível.
Número de participantes
Todos os anos, um grande número de crentes participa na peregrinação mariana a Levoča. Durante o fim de semana da peregrinação principal, cerca de 500.000 a 600.000 peregrinos vêm aqui. Este enorme número de pessoas, especialmente significativo num país com uma população de cinco milhões, testemunha a importância e a popularidade deste evento espiritual, que transcende as fronteiras da Eslováquia e atrai crentes de vários países.
(TK KBS/ Martin Magda)
Importância para a região
A peregrinação mariana é de grande importância não só para os fiéis, mas também para toda a região de Spiš. Todos os anos, atrai milhares de visitantes, o que tem um impacto positivo na economia local. O alojamento, os restaurantes e as lojas registam um aumento da procura e do tráfego durante a peregrinação, o que traz benefícios financeiros para os residentes locais.
Para além dos benefícios económicos, a peregrinação tem também uma importância cultural e social. Mantém e reforça valores tradicionais como a fé, a família e a comunidade. Para muitas pessoas, a peregrinação é uma oportunidade de reencontrar velhos amigos e familiares, o que contribui para o reforço dos laços sociais.
Os desafios e o futuro da peregrinação
Como qualquer grande evento, a peregrinação mariana a Levoča enfrenta desafios. Um dos principais é garantir a segurança e o conforto de todos os participantes. Os organizadores trabalham em conjunto com as autoridades locais para garantir alojamento, estacionamento e outras instalações suficientes.
Outro desafio é manter e desenvolver a tradição no contexto do mundo moderno. Com a crescente influência da digitalização e da globalização, é importante encontrar formas de atrair os jovens e manter o seu interesse pela peregrinação. A este respeito, os organizadores procuram utilizar as redes sociais e os meios de comunicação modernos para promover a peregrinação e atrair um público mais vasto.
A peregrinação mariana a Levoča é um importante acontecimento espiritual e cultural que reúne crentes de toda a Eslováquia e do estrangeiro. A sua rica história, a presença de personalidades proeminentes e a sua forma moderna fazem desta peregrinação uma experiência única que atrai milhares de pessoas todos os anos. Apesar dos desafios do mundo contemporâneo, a peregrinação mariana a Levoča continua a ser um forte símbolo de fé, tradição e comunidade.
Cientistas católicos: Guillermo Giménez Gallego, a luz da fé no laboratório
O jesuíta Guillermo Giménez Gallego centrou a sua investigação na química das proteínas. A Omnes oferece esta série de pequenas biografias de cientistas católicos graças à colaboração da Sociedade de Cientistas Católicos de Espanha.
Josefa Zaldívar-8 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
Guillermo Giménez Gallego (31 de março de 1945 - 8 de julho de 2022) foi um padre jesuíta e biólogo. Nascido em Ceuta, aos 16 anos entrou no noviciado da Companhia de Jesus no Colégio de São Francisco de Borja em Córdova, onde estudou Humanidades.
Em 1965, mudou-se para Alcalá de Henares, onde obteve o diploma eclesiástico de filosofia.
Em 1970 viveu em Granada, onde trabalhou como subdiretor do Colégio Mayor "Loyola" e estudou Ciências Biológicas com um prémio extraordinário na Universidade de Granada (1974). Posteriormente, mudou-se para Madrid, onde concluiu a sua tese de doutoramento na Universidade Autónoma de Madrid (UAM), também com um prémio extraordinário.
Começou a trabalhar como professor assistente na UAM, o que combinou com os seus estudos de teologia na Universidade de Comillas. Em 1981 foi nomeado colaborador científico do CSIC no Centro de Investigações Biológicas (CIB).
Ordenado diácono em 1982 e sacerdote em 1983, trabalhou no Instituto Merk de Investigação Terapêutica. Regressou depois a Espanha e entrou no CIB, onde foi nomeado diretor em 1996-1999 e 2002-2004.
Reformou-se em 2015, mas continuou associado ao IBC como professor investigador. "ad honorem até à sua morte.
Guillermo conseguiu escolher um tema de investigação muito frutuoso, a química das proteínas, o que lhe permitiu criar uma grande escola. Estudou numerosas proteínas envolvidas em várias doenças, mas a proteína estrela da sua carreira foi, sem dúvida, o fator de crescimento ácido dos fibroblastos (aFGF).
Durante a sua estadia no Instituto Merk, isolou este fator do cérebro humano. Em seguida, sequenciou o gene que o codifica. Isto permitiu-lhe sintetizar o aFGF em grandes quantidades para estudar a sua estrutura tridimensional e conceber inibidores específicos.
Recebeu numerosos prémios: Prémio Nacional de Investigação na categoria de Biomedicina em 1993, Prémio de Investigação Básica da Sociedade Espanhola de Cardiologia em 1995 e presidente da sexta secção da Real Academia Nacional de Farmácia desde 2007.
William foi um cientista católico exemplar, capaz de trazer a luz do cristianismo para os laboratórios de investigação.
O autorJosefa Zaldívar
Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC) Sociedad de Científicos católicos de España (Sociedade Espanhola de Cientistas Católicos)
O Papa incentiva os católicos de Trieste a participarem na vida política
O Papa Francisco fez uma breve visita a Trieste, em Itália, onde se encontrou com os participantes na 50ª Semana Social Católica. Nos seus discursos, o Santo Padre sublinhou a necessidade de nos envolvermos na política como católicos que procuram o bem comum.
O Papa Francisco deslocou-se no dia 7 de julho a TriesteItália, numa breve visita apostólica por ocasião da 50ª Semana Social dos Católicos em Itália, que decorreu de 3 a 7 de julho, sob o tema "No coração da democracia. Entre a história e o futuro".
Durante o encontro, o Santo Padre dirigiu-se aos participantes da conferência, agradecendo-lhes pela sua atividade, que é particularmente relevante hoje porque "é evidente que no mundo de hoje a democraciaA verdade seja dita, não está de boa saúde. Isto interessa-nos e preocupa-nos, porque está em jogo o bem da humanidade, e nada do que é humano nos pode ser estranho.
Por isso, disse Francisco, temos de "assumir a responsabilidade de construir algo de bom no nosso tempo", uma missão que a Semana Social Católica tem em mente graças ao seu promotor, o Beato Joseph (Giuseppe) Toniolo.
Os cristãos não podem ignorar esta situação, explicou o Pontífice. "Assim como a crise da democracia é transversal a diferentes realidades e nações, também a atitude de responsabilidade perante as transformações sociais é um apelo dirigido a todos os cristãos, onde quer que vivam e trabalhem, em todas as partes do mundo".
O coração ferido da democracia
O Papa comparou a crise da democracia a "um coração ferido", marcado pela exclusão social dos pobres, dos idosos e das crianças. Foi fomentada uma "cultura do desperdício", na qual os detentores do poder perderam a capacidade de "ouvir e servir as pessoas". Isto vai contra o verdadeiro significado da democracia, disse o Papa, porque o que é importante não é apenas poder votar, mas "que todos possam exprimir-se e participar".
Em resposta, o Pontífice apontou "os princípios da solidariedade e da subsidiariedade" como uma boa base para restaurar a democracia. "De facto, um povo é mantido unido pelos laços que o constituem, e os laços são reforçados quando cada um é valorizado", disse Francisco.
O Papa apelou então a "uma democracia com um coração curado" que continue a "cultivar sonhos para o futuro" e a promover "o envolvimento pessoal e comunitário". Por isso, o Santo Padre encorajou os católicos a participarem na vida política para promover o bem comum e "serem uma voz que denuncia e propõe numa sociedade muitas vezes silenciosa e onde demasiados não têm voz".
"Este é o papel da Igreja", concluiu Francisco. Uma Igreja que deve "comprometer-se com a esperança, porque sem ela gerimos o presente mas não construímos o futuro. Sem esperança, seríamos administradores, equilibradores do presente e não profetas e construtores do futuro".
O Papa destaca o escândalo de um Deus humano
Após a sua presença no dia de encerramento da Semana Social Católica, o Santo Padre celebrou a Santa Missa. Durante a homilia, pediu aos presentes que se interrogassem sobre os obstáculos que os impedem de acreditar em Jesus. Tal como para os seus contemporâneos, que não conseguiam compreender "como é que Deus, todo-poderoso, se pode revelar na fragilidade da carne de um homem", para muitos, hoje, Cristo continua a ser um escândalo.
Para muitos, é difícil compreender "uma fé fundada num Deus humano, que se inclina para a humanidade, que se preocupa com ela, que se comove com as nossas feridas, que assume o nosso cansaço". Em suma, é um escândalo para a sociedade ver "um Deus fraco, um Deus que morre na cruz por amor e me pede para vencer todo o egoísmo e oferecer a minha vida pela salvação do mundo".
No entanto, Francisco afirmou que "precisamos do escândalo da fé. Não precisamos de uma religiosidade egocêntrica que olha para o céu sem se preocupar com o que está a acontecer na terra". Precisamos do escândalo da fé, uma fé enraizada no Deus que se fez homem e, portanto, uma fé humana, uma fé de carne, que entra na história, que toca a vida das pessoas, que cura os corações partidos, que se torna o fermento da esperança e a semente de um mundo novo", afirmou o Papa.
O Papa e o compromisso com a paz
O Papa Francisco retomou esta ideia durante a sua reflexão na oração do Angelus, onde afirmou que "a caridade é concreta, o amor é concreto", pelo que não basta ficar com a ideia de viver por amor e de servir os outros, mas é preciso manifestá-la em actos concretos.
O Pontífice terminou a sua viagem a Trieste apelando aos católicos para que renovem o seu "compromisso de rezar e trabalhar pela paz".
A figura do padre na história da literatura é de grande interesse, porque nos permite abordar de forma realista a visão do mundo que a sociedade atual tem da pessoa do padre.
Juan Carlos Mateos González-7 de julho de 2024-Tempo de leitura: 9acta
Tal como aparece em muitas obras literárias, o padre é descrito depreciativamente como "clerical", e a sua pessoa e a sua missão são claramente julgadas sob uma luz negativa. Na história da literatura, a figura do padre esteve sempre muito presente, mas nos romances actuais adquiriu um tom crítico generalizado: os comportamentos e as atitudes dos clérigos são muitas vezes ridicularizados, e há uma certa vontade, algo implícita, de espalhar um grande "descrédito social" sobre a figura do padre. A herança cristã e clerical, sobretudo na literatura contemporânea, é vista como um pesado fardo do qual a sociedade se deve libertar o mais rapidamente possível, para adquirir a sua autonomia, maturidade e emancipação.
Os clássicos
No Século de Ouro espanhol, Cervantes apresenta-nos o clérigo da aldeia onde nasceu o seu cavaleiro da triste figura. Trata-se de um clérigo leitor, ainda que pouco esclarecido. Um clérigo que tinha medo da literatura. Decide que os livros de cavalaria que enlouqueceram o seu bom vizinho Don Quijano devem ser atirados para a fogueira. Cervantes não faz juízos de valor, pois não quer "fazer sangue" com o clero. Cervantes conta coisas que lhe aconteceram, porque sabe que o que aconteceu a estes clérigos foi exatamente o que Santa Teresa disse: que "não sabiam mais e não serviam para mais".
Quevedo, na sua imortal "Historia del Buscón llamado Pablos", apresenta um clérigo sujo "como um rato numa alvenaria, com uma batina maltrapilha, quase verde de descoloração e cheia de sujidade".. Quevedo, que conhecia bem o clero, pois era um assíduo frequentador de conventos e capelas, não se dava bem com a ganância de muitos dos padres com quem lidava. A este aspeto, juntam-se as desavenças pessoais comOs "poetas-sacerdotes" que foram seus contemporâneos: Góngora e Lope de Vega. Eram tempos em que muitos escritores eram padres e/ou religiosos: Fray Luis de León, Tirso de Molina, Calderón de la Barca, San Juan de la Cruz... Eram muito educados, muito cultos e, pela forma como eram tratados e estudados, estavam muito próximos dos clérigos.
Os primeiros romances
Só vários séculos mais tarde é que um padre aparece no romance como protagonista. Chegou em 1758 com a "Historia del famoso predicador Fray Gerundio de Campazas" (História do famoso pregador Fray Gerundio de Campazas)., do jesuíta Francisco José de Isla: uma divertida sátira contra os pregadores bombásticos e ocos, "padres assustadores dos púlpitos da região".. Um livro cheio de ironia e de escárnio, porque era uma forma de assinalar um dos defeitos clericais mais comuns.
Nos primeiros romances do século XIX, quando o escritor imaginava que o padre era um filão suficientemente rico para não ser desperdiçado, recorria-se a vários "clichés" do mundo rural e dos costumes mais ou menos públicos, em que o padre não dava um exemplo condizente com o seu estatuto. O padre, por exemplo, mantinha uma vida de amancebamento ou vivia uma "vida dupla". Podemos recordar o que Santa Teresa escreveu no "Livro da Vida" (capítulo V) quando, ao passar por Becedas, soube que o padre estava a viver um "caso" com uma mulher.
É muitas vezes um cliché que o padre que tinha uma criada em casa, o seu tratamento se desviava normalmente para algo demasiado familiar, que "literariamente" ultrapassa o possível serviço à casa. Normalmente, é também um "cliché literário" que, para falar mal do padre, se recorra ao seu gosto pela boa comida ou ao seu hábito noturno de beber jícaras de chocolate com croutons. De facto, havia um chocolate chamado "del canónigo", que era anunciado nas paredes dos bares das aldeias com um mosén gordo a espreitar por cima da chávena e a caminho da boca com os picatostes, já manchados com o chocolate espesso e quase olfativo. Clarín compôs "La Regenta" com "elementos narrativos" semelhantes.o Juan Valera "Pepita Jiménez" o Juan Valera "Pepita Jiménez" o Juan Valera "Pepita Jiménez" o Juan Valera "Pepita Jiménez".ou "Los gozos y las sombras" de Torrente Ballester.o Pérez Galdós "Fortunata y Jacinta"...
Maus hábitos, vocações duvidosas
Estes maus hábitos, segundo alguns, devem-se ao facto de, nos seminários, os futuros sacerdotes receberem uma formação/deformação que apenas tratava dos defeitos a evitar e das armadilhas morais a prevenir, e não das virtudes com que o sacerdote se devia adornar. Juan Valera, por exemplo, leva este facto a consequências quase dramáticas, dentro do sentimentalismo geral do romance "Pepita Jiménez".(1874), a experiência do seminarista Luis de Vargas, a partir do momento em que encontra Pepita Jiménez, uma mulher viúva de grande sensibilidade, contra a qual o seminarista encontra poucos argumentos. O seminarista apercebe-se de que o caminho para o qual Deus o chama não é aquele que, talvez um pouco "inconscientemente", ele tinha empreendido.
Nos romances de Pérez Galdós há também numerosos clérigos "sem vocação", uma vocação, a vocação sacerdotal, que o escritor canário questionou repetidamente. Os padres que desfilam nos romances de Galdós não são muito exemplares: nem aqueles que aparecem como personagens comuns na vida do povo, nem aqueles outros que Galdós pinta com um olhar crítico e mordaz. "Tormento" (1883) é, possivelmente, o primeiro romance espanhol a tratar do "problema do celibato sacerdotal"e da sua má experiência, sobretudo quando o amor de uma mulher se cruza no caminho do padre. Embora Galdós não escreva certamente uma "tese" sobre este assunto.
Esta visão galdosiana do clérigo que, no meio do mundo, não vive alegremente o seu celibato, é retomada por Leopoldo Alas Clarín, naquele que é possivelmente um dos três melhores romances da literatura espanhola, "La Regenta".(1885). Clarín joga com os sentimentos e a tentação do cónego magistral da catedral, que tem demasiada vaidade e pouco juízo. É vencido pelas circunstâncias sociais e domésticas, que põem em perigo a sua fidelidade a uma vocação que não sabe orientar para não ser devorado por uma cidade (Vetusta Oviedo) em que vive todos os dias.
No século XX, em 1943, Gonzalo Torrente Ballester publicou o seu primeiro romance: "Javier Mariño"., onde há muito de autobiográfico neste relato do professor galego: são claras as recordações da sua passagem por um seminário onde, apesar de todos os seus esforços, uma suposta vocação sacerdotal "não vingou". O autor não se demora muito a esclarecer alguns comportamentos da sua personagem, mas não há dúvida de que, apesar das acusações que lhe são feitas, o livro tem a honestidade de não enganar ninguém. No fim de contas, se há vocação que deve ser examinada com sinceridade, é a de alguém que se julga chamado à vida sacerdotal.
Realidades e preconceitos
Mas nem tudo é drama e conflito. A visão que alguns romances mais recentes tiveram dos padres mostrou momentos de "exaltação gloriosa". Santos Beguiristain, "Por esos pueblos de Dios" ("Por esses povos de Deus")(1953) e José Luis Martín Descalzo, "Un cura se confiesa" (1953) e José Luis Martín Descalzo, "Un cura se confiesa" (1953).(1961), deixaram alguns destes elementos "laudatórios" na visão pessoal de si próprios e do seu sacerdócio que "vieram a romancear", porque era a sua história pessoal que fornecia o enredo dos seus romances. Os padres que aparecem nestes livros são padres reais, sem grandes virtudes, com os defeitos que todos temos e, sobretudo, com um grande entusiasmo para levar até ao fim o sacerdócio que receberam quando eram ainda rapazes de aldeia, cheios de sonhos e esperanças.
Na segunda metade do século XX, duas acusações principais foram feitas ao clero: a introdução da noção de pecado e a procura gananciosa do poder. É recorrente recordar o "horror clerical" (Lourdes Ortiz), porque "com tanto pecado, com tantos demónios" (Ray Loriga em "O pior de tudo", "O pior de tudo", "O pior de tudo", "O pior de tudo", "O pior de tudo", "O pior de tudo", "O pior de tudo", "O pior de tudo")., 1992) têm como objetivo introduzir os homens no "labirinto da culpa" (como a personagem de Juan Mirón em "Caballeros de fortuna" de Luis Landero)., 1994).
Desta forma, os escritores criam "espaços psicológicos" onde não é possível divertir-se, "numa sociedade repressiva, medíocre e hipócrita" (Lourdes Ortiz), habitada por um "rebanho de criaturas doces e bovinas que ainda iam à missa ao domingo" (Lucía Etxebarría, "Beatriz y los cuerpos celestes", "Beatriz y los cuerpos celestes", "Beatriz y los cuerpos celestes", "Beatriz y los cuerpos celestes")., 1998). Os padres procuram impor uma "ordem do cemitério" (Francisco Umbral, "Los helechos arborescentes", "Los ferns arborescentes")., 1979) e uma "religião de escravos" (F. Umbral, "Las ninfas") e uma "religião de escravos" (F. Umbral, "Las ninfas")., 1975).
Esta tensão é o fio condutor dos nossos romances mais recentes: a figura clerical do padre é a antítese daquilo que exige e permite o gozo do corpo e da vida. "Os arredores de Deusde António Gala reflecte claramente a luta e a vitória da Irmã Nazaré, que se torna Clara Ribalta quando sai do convento e se reencontra com o amor e a vida, na "periferia de Deus".. É a "prova irrefutável" desta "tese" hedonista, porque dentro da Igreja, mesmo que haja algumas pessoas (incluindo padres) que tentam abrir outras perspectivas, a negação da vida acaba por se impor. Assim se diz. É por isso que se compreende que não haja vocações, porque "os jovens tentam aproveitar a sua juventude e a sua vida sem cálculos nem projectos"., como o reformado Luciano diz à sua irmã religiosa em "Uma Tenda à Beira da Água".(1991) de Gustavo Martín Garzo.
Através da imposição das suas ideias e do controlo das consciências, os padres são apresentados como expoentes de uma subtil dominação da sociedade. Assim, moldam estas cidades "mesquinhas", "cemitérios de folhas secas", "cemitérios de folhas secas"., encerrada por uma "moralidade clássica e fechada", à maneira de uma "cidade levítica"., A Cuenca natal de Raúl del Pozo, em 2001, ou a Valladolid da adolescência de Umbral, descrita em "El hijo de Greta Garbo"., marcado por"o campesinato clerical"., soberba e fátua, longe da sensibilidade do povo, ou da Oileia de "Onde é sempre outubro"., de Espido Freire (2001).
De forma semelhante, León Luis Mateo Díez descreve em "La fuente de la edad" (A fonte da idade)como uma "cidade maldita", um "cadáver perdido", fechada na sua "memória mesquinha", cujos habitantes são "filhos da ignomínia" porque são governados pelos mais hipócritas e inúteis e pelas "batinas". Mesmo uma geração posterior de escritores, como Valdeón Blanco, define a cidade de Valladolid como "teológica, agostiniana e conventual"., oposto ao desenvolvimento da cidade moderna, industrial e universitária ("The Red Fires")., 1998).
As figuras sacerdotais aparecem, assim, sob uma luz sombria, centrada sobretudo no seu comportamento e nas relações intra-eclesiais. Em "Mazurka para dois mortos", de Camilo José Cela, a ambivalência dos padres galegos é evidente, na linha da produção geral do autor.
Coordenadas de uma visão negativa
Os autores que se movem mais diretamente num ambiente cristão não escondem a sua atitude "anti-clerical", como José Jiménez Lozano e Miguel Delibes. O primeiro, na sua obra inicial "Un cristiano en rebeldía" (Um cristão em rebelião), denuncia a "dureza de espírito" dos homens da Igreja, atitude que marcou a atitude inquisitorial da Igreja em Espanha, como procura provar na sua investigação sobre "Los cementerios civiles y la heterodoxia española" (Os cemitérios civis e a heterodoxia espanhola).. É um tema que aparece em romances como "El sambenito".o "História de um outono, mas que continua até hoje em obras como "Um Homem na Linha", "Um Homem na Linha", "Um Homem na Linha", "Um Homem na Linha", "Um Homem na Linha" e "Um Homem na Linha".(2000).
Miguel Delibes, por seu lado, retrata o carácter sombrio e azedo de uma religiosidade estreita e sombria, que pode raiar a hipocrisia ("La sombra del ciprés es alargada", "Mi idolatrado hijo Sissi", "Cinco horas con Mario")., Em "Senhora de vermelho sobre fundo cinzento", pretende abrir perspectivas religiosas mais próximas e mais humanas.ou "Cartas de uma sexagenária voluptuosa".. O seu último romance "O Herege".A partir da própria dedicatória, contrasta uma religiosidade inquisitorial com a autêntica religião livre, própria do espírito.
Completamente autobiográfica é a história de Javier Villán "Sin pecado concebido" (Sem pecado concebido).(2000). A passagem do autor pelo Seminário de Palência não foi propriamente um período feliz e tranquilo, nem um período de harmonia consigo próprio. O autor começa por dizer que "a primeira noite que passei no Seminário foi uma noite triste".. Muitos mais se seguiram. E o facto é que "os dias daquelas noites não foram hinos de glória e tranquilidade". Javier Villán conta, com evidente desprendimento, algumas das experiências que teve de suportar durante os anos que viveu na casa de formação diocesana. No final, acabou por sair porque, possivelmente, diz o autor com amargura, "o futuro não existe"..
O subtítulo do livro já nos dava uma ideia do final a que nos queria conduzir: "Alegrias e tribulações de um seminarista".Esta rejeição da formação clerical é motivada, sobretudo, pela imposição de dogmas ou de verdades irracionais e, sobretudo, pelas "barreiras que ela coloca à fruição da vida", ao desabrochar dos instintos, ao jogo do desejo... Por isso, conclui: "Deus não se encontra no culto presidido pelos padres, mas fora dos templos, no contacto com a terra e a natureza".
Estamos a ver como duas coordenadas convergem na consideração da figura do padre, mas que se retroalimentam mutuamente, provocando uma visão negativa do padre. Por um lado, podemos detetar o peso histórico que passou para o imaginário coletivo da sociedade espanhola e, por outro, a emancipação do homem, exaltando a sua autonomia racional e o seu livre arbítrio para poder realizar o que quer, os seus desejos, vontades e instintos, tudo sob a bandeira da reivindicação das "novas liberdades". Assim, a função sacerdotal parece "encarnar" uma repressão que deve ser superada. A figura do padre centra o papel e o significado da Igreja, em termos de institucionalização de uma determinada religião, e o do cristianismo, em termos da sua magnitude histórica.
Conclusões
Perante o adiamento da figura do padre (e do que ele representa), qual é o quadro que emerge à luz da literatura espanhola? O que se pretende eliminar é o papel mediador dos indivíduos e da instituição.
Por um lado, o romance abriu a perspetiva de uma "religião do nada" (J. Bonilla, Javier Marías, J. A. Mañas, G. Martín Garzo ou F. Umbral, que usa a expressão), dominada pela experiência da solidão, da angústia, do sem-sentido... Esta opção deixa o homem só e abandonado, sujeito ao destino ou ao absurdo, e remete, por isso, para a força do desejo como único caminho para a vida, única forma de sair do nada. Sem acesso a uma realidade fundadora, ou a uma origem amorosa ou a um objetivo esperado, a vida reduz-se a um jogo de máscaras que se esgota na sua mera aparência.
Por outro lado, abre-se a perspetiva de uma "religião do Todo" que aspira à fusão com a Vida em todas as suas possibilidades de gozo e de crueldade (A. Gala, T. Moix, L. A. de Villena, F. Sánchez Dragó, J. L. Sampedro). Nem nesta forma de religiosidade (que pode ser considerada paganismo ou sincretismo) são necessários mediadores. Cada pessoa tem de procurar os meios adequados para entrar no "êxtase" que certas experiências podem proporcionar, podendo assumir indistintamente a violência e/ou o desinteresse que essa vida manifesta, relativamente a indivíduos específicos.
O protagonista da maioria dos romances espanhóis é deixado sozinho perante o Nada ou a incomensurabilidade do Todo. Neste contexto, a figura do padre, na medida em que actua "in persona Christi et in nomine Ecclesiae", pode ser delineada de forma mais clara.. Deve tornar percetível a missão de uma Igreja que vive do chamamento permanente do Senhor que, como enviado do Pai na força do Espírito, comunica e testemunha um dom capaz de resgatar o homem da sua solidão, da fatalidade do destino ou de uma totalidade que acaba por anular o valor eterno da pessoa.
Miguel Ángel Martínez: "Através da ciência é fácil chegar a Deus".
Miguel Ángel Martínez-González, médico e epidemiologista, é um dos cientistas mais importantes da cena internacional. Nesta entrevista, fala da relação entre as suas facetas científica e cristã e de como a investigação é também uma forma de servir os outros.
Loreto Rios-6 de julho de 2024-Tempo de leitura: 6acta
Miguel Ángel Martínez-González é médico, investigador e epidemiologista, professor de Medicina Preventiva e Saúde Público Universidade de Navarra e Professor Associado de Nutrição na Universidade de Harvard. Com a editora Planeta, publicou os livros Saúde de certeza (2018), O que é que come? (2020), Cuidados de saúde em chamas (2021) y Salmão, hormonas e ecrãs (2023). Em 2021, foi incluído na lista "Highly Cited Researchers 2021" do Clarivaronde se encontra entre os 6.600 cientistas mais citados do mundo. Em 2022, o Ministério da Ciência e Inovação atribuiu-lhe o prestigiado Prémio Nacional de Investigação em Medicina Gregorio Marañón pelas suas contribuições sobre a importância da nutrição, da dieta mediterrânica e do estilo de vida saudável no domínio da medicina preventiva.
Como é que o seu lado científico enriquece a sua fé e vice-versa?
Penso que para um cientista, especialmente quando se está na primeira divisão da investigação, há muitos perigos que podem estragar todo o seu trabalho, relacionados com o ego, o orgulho, a vaidade, o desejo de aparecer, etc. E isto tem consequências muito negativas para o trabalho profissional de um investigador, porque muitas vezes acontece que os investigadores seniores querem estar em todo o lado e não permitem que os jovens tenham relevância e destaque suficientes, ou que possam continuar o seu trabalho a longo prazo. Plantar árvores de cuja sombra outros possam beneficiar é algo em que estou muito empenhado, precisamente por causa da minha fé, porque me parece que todo o cristianismo se baseia na ideia de que aquele que dá é mais feliz do que aquele que recebe. Esta atitude de generosidade, de saber esconder-se em muitos momentos e dar lugar aos outros, que os outros comecem onde nós acabámos, são valores de fé que tornam certamente a investigação muito mais produtiva a longo prazo. É muito mais eficaz fazer trabalhar trinta pessoas do que trabalhar como trinta, mas quando o ego domina, queremos estar em todo o lado, aparecer, e não deixamos que as pessoas que estão a colaborar mostrem a cabeça. É preciso saber recuar no momento certo, sobretudo quando se está a atingir o auge da carreira e se aproxima a reforma. Esse passo atrás torna a investigação mais produtiva, porque mais pessoas se envolvem, assumem a liderança e tomam as rédeas.
E vice-versa, o trabalho profissional enriquece a fé. O aprofundamento da biologia humana tem sempre um sentido de fascínio pelo funcionamento do ser humano, pelos seus mecanismos de controlo, pelos seus órgãos, pela sua fisiologia, etc. E é muito difícil que isso não conduza a Deus. Descobrem-se maravilhas verdadeiramente impressionantes. Esse fascínio parece-me ser uma força muito poderosa para nos aproximarmos da fé e de Deus.
Além disso, através do trabalho, estabelecemos muitas relações com outras pessoas e vemos muitas oportunidades para as ajudar espiritualmente, para tentar aproximá-las de Deus com um zelo apostólico que é inerente ao cristianismo. Estive com vários dos galardoados com os Prémios Nacionais de Investigação para Jovens, que foram atribuídos pela primeira vez no ano passado, e as conversas com eles, de uma forma natural, acabaram por transmitir aspectos de fé, aspectos que temos dentro de nós devido à nossa crença cristã. Isso ajuda, e o mesmo acontece quando se tem um trabalho científico importante, que ocupa muito do nosso tempo. Dá-nos a oportunidade, sobretudo com os nossos estudantes, com as pessoas cujas teses estamos a orientar ou que estão a estagiar connosco como jovens professores, de abrir os seus horizontes ao sobrenatural e de ver que, através da ciência, é fácil chegar a Deus. Em todas as questões de estilo de vida e de saúde pública, que é o domínio em que desenvolvi a minha carreira científica, vê-se que, no fim de contas, o que vai contra a natureza humana prejudica o ser humano. Vê-se isso com dados científicos, não apenas com a fé. Colocar no organismo uma série de substâncias que não são típicas da alimentação natural, ou deixar-se levar por uma série de comportamentos que são fundamentalmente hedonistas, consumistas, acaba por produzir mais doenças físicas e mentais. De certa forma, dizemos: "A Bíblia tinha razão". Com a ciência, vê-se finalmente que a humildade, a sobriedade, o uso correto da razão e a ordenação dos nossos apetites concupiscíveis têm um impacto na saúde, e quando se vê isso com os dados de estudos realizados com dezenas de milhares de pessoas, a fé é reforçada.
Então pode dizer-se que acreditar é saudável?
Em Boston, duas das pessoas com quem trabalho em Harvard estão também a colaborar com o Human Flourishing Centre, dirigido por um professor de Harvard muito prestigiado e convertido ao catolicismo, Tyler VanderWeele. Um dos trabalhos mais poderosos que publicou, numa das melhores revistas médicas, mostra como a prática religiosa previne o suicídio. É algo que está provado com dados empíricos, que ter convicções religiosas e praticá-las reduz os factores de risco de suicídio.
Lembro-me de que, quando concebi o grande estudo de coorte que fizemos em Navarra, há 25 anos, em Harvard, com a ajuda dos professores de lá, um deles, que não era propriamente crente, me disse: "Olhe, se vai recrutar antigos alunos da Universidade de Navarra, onde há tantos católicos, vai baixar as taxas de mortalidade, porque vão morrer menos, vão ter menos doenças". E ele era ateu, mas disse-me: "Tenho muita experiência de ter feito estudos epidemiológicos e vejo que quando as pessoas têm mais prática religiosa têm melhores hábitos de saúde, embebedam-se menos, consomem menos drogas, são menos promíscuos sexualmente, vão ao médico quando é a sua vez e são mais responsáveis pela sua própria saúde". No fim de contas, quando uma população tem mais crenças cristãs, tem melhores hábitos de saúde, o que reduz as taxas de mortalidade. Portanto, logicamente, é um benefício para a saúde.
O seu interesse pela investigação é apenas científico ou é também uma forma de ajudar os outros?
É claro que ajudar é a força motriz, é uma prioridade absoluta. Repito isto muitas vezes aos meus colaboradores e tento tê-lo sempre presente. Recentemente, reuni-me com um grupo de cardiologistas em Madrid, porque estamos a desenvolver um estudo muito ambicioso que me foi financiado pelo Conselho Europeu de Investigação, e disse-lhes: "Vamos incorporar muitos médicos neste estudo, e eles podem perguntar: "E se eu contribuir com doentes para este estudo, vão dar-me um certificado de participação, vão colocar-me nos artigos como investigador? E eu respondi: "Claro que vamos fazer tudo isso, mas isso não é o mais importante". Têm de pensar no serviço que estão a prestar a muitos doentes que têm um problema que nós vamos resolver. Também lhes expliquei que se um médico examina um doente nas urgências com dores no peito, lhe diz que não há nada de errado, e o doente vai para casa e morre porque teve um enfarte do miocárdio e o médico não o detectou, isso é uma falha terrível da medicina. Mas na saúde pública, se dissermos ao doente: "Não há nada de errado com este hábito", e se verificarmos que este hábito está a aumentar a mortalidade em 10 %, mas é partilhado por 70 % da população, produzem-se milhões de mortes por não o fazermos corretamente. O que fazemos na saúde pública tem repercussões imensas. Disseram-me há dias em Harvard, numa conferência que dei: é preciso um grande sentido de responsabilidade e muita coragem para fazer estudos de saúde pública, porque está em jogo a vida e a saúde de milhões de pessoas e, logicamente, temos de ver Jesus Cristo em cada uma delas, tal como fazemos em medicina clínica. O que acontece é que, quando se trata de epidemiologia e de saúde pública, é em grande escala. Talvez não o vejamos tão imediatamente como o doente que não fizemos o eletrocardiograma e morre de ataque cardíaco, mas a realidade é que, com as decisões que tomamos na saúde pública e com a investigação que fazemos, podemos estar a beneficiar ou a prejudicar milhões de pessoas. E nessas pessoas temos de ver Jesus Cristo, caso contrário perdemos o sentido cristão da vida.
Considera que existe um preconceito contra os crentes na ciência ou esse preconceito já foi ultrapassado?
Não, não, o preconceito existe e é absolutamente injusto, porque é apenas isso, um preconceito. A realidade é que temos de ter a perspetiva de que os católicos não são seres de segunda classe, e que temos o mesmo direito de investigar que qualquer outra pessoa. Não podemos ser pessoas marginalizadas. Aqui também temos de exercer força e coragem e não nos deixarmos encurralar, não sermos tímidos ou auto-conscientes. Penso que nós, católicos, temos de estar convencidos de que a fé proporciona uma visão mais global, mais complementar, e que nos leva a elevar a nossa visão e a ser mais rigorosos, precisamente porque temos fé. Porque vemos que o que fazemos aqui tem repercussões para além desta vida, e isso dá-nos um grande sentido de responsabilidade. Deus vai responsabilizar-me por tudo isto. E a transcendência para além da vida terrena é algo que nos ajuda a fazer melhor o nosso trabalho profissional, e sobretudo com a visão de São Josemaria de que este trabalho é santificável. Por isso, logicamente, olhamos para esse trabalho com muito mais solidez do que se não tivéssemos fé.
St Peter's 2023, entre a generosidade e os desafios financeiros
Os dados da Obrigação de São Pedro para 2023 mostram que as obras de caridade do Vaticano continuam a ser uma prioridade, apesar das dificuldades em fazer face aos custos financeiros dessa ajuda.
O Relatório anual 2023 da Bula de S. Pedro, publicada nos últimos dias, aborda como sempre as actividades financeiras e caritativas da Santa Sé, mas revela como o ano passado foi marcado por alguns desafios económicos, continuando a registar a generosa solidariedade dos fiéis de todo o mundo.
No total, o documento atesta uma receita de 52 milhões de euros, dos quais 48,4 milhões de euros provêm de doações directas e 3,6 milhões de euros de receitas financeiras. No entanto, as despesas excederam largamente as receitas, que ascenderam a 109,4 milhões de euros. O resultado foi um défice de 57,4 milhões de euros, o que obrigou o fundo a retirar 51 milhões de euros do seu património para fazer face aos seus compromissos de solidariedade.
Os donativos ao Obole reflectem o carácter universal da Igreja Católica. As dioceses continuam a ser a principal fonte de contribuições (64,4 %), seguidas das fundações (28,8 %). Os Estados Unidos lideram o ranking dos países doadores com 13,6 milhões de euros, seguidos da Itália (3,1 milhões) e do Brasil (1,9 milhões). São igualmente significativas as contribuições de AlemanhaA presença da missão da Igreja no Sul, na Coreia do Sul e em França demonstra um compromisso verdadeiramente global com a missão da Igreja.
Projectos de caridade
Apesar das dificuldades financeiras, o Óbolo manteve o seu compromisso de apoiar obras de caridade. Em 2023, foram atribuídos 13 milhões de euros a 236 projetos em 76 países. África foi o principal beneficiário, recebendo 41,6 % dos fundos para projetos de ajuda direta, seguida da Ásia (21,4 %) e da Europa (18,5 %).
Especificamente, os projectos centraram-se em três áreas principais: extensão da presença evangelizadora (43 % dos fundos), com a construção de novas igrejas e estruturas pastorais em países como a Guatemala, a Tanzânia e a Albânia; projectos sociais (33 %), incluindo iniciativas como o apoio ao projeto "Hospitais Abertos" na Síria e programas de assistência a mulheres grávidas no México; e, finalmente, apoio a Igrejas locais em dificuldade (24 %), com o financiamento de actividades como a renovação de seminários e casas religiosas em países como o Congo, Angola e Sri Lanka.
Apoiar a missão apostólica
Um número significativo diz respeito ao apoio à missão apostólica do Santo Padre: 90 milhões de euros, ou seja, 24,% da despesa total dos Dicastérios e organismos do Vaticano (370,4 milhões), foram cobertos pela Obrigação.
Estes fundos contribuíram para várias áreas consideradas cruciais: 35 milhões para o apoio às Igrejas locais em dificuldade; 12 milhões para o culto e a evangelização; 11 milhões para a difusão da mensagem; 9 milhões para as nunciaturas apostólicas e 8 milhões para o serviço da caridade.
Impacto humanitário e desafios futuros
Através dos Dicastérios da Cúria Romana, o Papa Francisco doou um total de cerca de 45 milhões de euros para obras de caridade em 2023. No entanto, este compromisso contínuo para com os mais necessitados está a deparar-se com uma realidade financeira cada vez mais complexa. O défice registado também em 2023 levanta dúvidas sobre a sustentabilidade a longo prazo do atual modelo de financiamento.
De facto, a necessidade de recorrer aos activos para cobrir as despesas correntes pode obrigar a Santa Sé a rever as suas estratégias de angariação de fundos e a forma como distribui os recursos.
Transparência e confiança
Isto não invalida o facto de a publicação detalhada destes dados confirmar o desejo de transparência, permitindo aos crentes e aos benfeitores conhecer a utilização dos recursos. É também uma forma de manter e reforçar a confiança dos próprios doadores. Com o entendimento de que, à medida que a Igreja continua a responder às crescentes necessidades humanitárias em todo o mundo, será crucial equilibrar a generosidade com uma gestão financeira prudente para assegurar a continuidade da missão evangelizadora a longo prazo.
Numa artigo anteriorLembrámo-nos do outro nome antigo da Etiópia, Abissínia, dos Habeshat (abissínios), um dos primeiros povos etíopes de língua semítica, de origem sudárabe (sabáica), que colonizaram o planalto etíope já na época pré-cristã.
Os sabeus são originários do Iémen, uma nação situada no extremo sul da Península Arábica que foi o berço de civilizações antigas, embora hoje seja um dos países mais pobres do mundo, assolado durante décadas por fomes e guerras civis, em especial a atual, entre o grupo armado Huthi (xiita-zaidita), apoiado pelo Irão, e o governo central e outros grupos de inspiração sunita.
Alguns dados
O Iémen, terra de maravilhas naturais, como a ilha de Socotra, e de maravilhas arquitectónicas, como Shibam (chamada a Manhattan do deserto), a antiga cidade de Sana'a ou Taiz (para citar apenas algumas) é hoje uma república que se tornou património mundial, de jureO Ministério dos Negócios Estrangeiros administra todo o território do país.
No entanto, de facto, devido à desestabilização que se seguiu à guerra civil iniciada em 2015, existem dois governos opostos: um, reconhecido pela comunidade internacional, é liderado pelo Primeiro-Ministro Ahmad Awad bin Mubarak (no poder desde fevereiro de 2024); o outro por Abdel-Aziz bin Habtour, do Congresso Geral do Povo (CGP), no poder desde fevereiro de 2024.partido de ideologia nacionalista árabe fundada pelo primeiro presidente e ditador do Iémen unificado, 'Ali 'Abd Allah Saleh, posteriormente assassinado em 2017 pelas milícias rebeldes Houthi na guerra civil iemenita).
A situação política, já de si complexa, é agravada pela presença de grupos terroristas como a Al Qaeda na Península Arábica (AQAP) e o Estado Islâmico (ISIS), que actuam em algumas zonas do país. A capital, Sana'a, não é controlada pelo governo legítimo, mas pelos rebeldes Houthi, pelo que Aden, a quarta maior cidade do país e o principal porto, é considerada a capital provisória.
A área total do Iémen é de cerca de 528.000 km² (ligeiramente maior do que a Espanha). O país faz fronteira com a Arábia Saudita a norte, Omã a leste, o Golfo de Aden a sul e o Mar Vermelho a oeste.
A população é de cerca de 30 milhões de habitantes, com uma elevada taxa de crescimento demográfico e uma média de idades inferior a 25 anos. A maioria dos iemenitas é de etnia árabe e a língua oficial é o árabe, embora existam pequenas comunidades que ainda falam línguas árabes do sul (Soqotri, Mehri, etc.), descendentes da antiga língua árabe do sul (não árabe) falada na região no tempo dos sabeus.
O Islão é a religião predominante, com uma maioria sunita (53%) e uma minoria xiita considerável (47%), principalmente zaidis. Apenas 0,05% da população não pratica o Islão (existem pequenas comunidades de cristãos e hindus) e a antiga comunidade judaica do Iémen emigrou em massa para o recém-fundado Estado judaico após o nascimento de Israel. O último punhado de judeus que restava no país, ameaçado pela Al-Qaeda e pelos rebeldes xiitas, fugiu para Israel ou para os EUA em 2009.
História antiga: Sabeus e Himyaritas
Tal como referido no início, o Iémen (da raiz semítica y-m-n, que significa simultaneamente "direita" e "sul", "sul": Ben-yamìn, ou Benyamìn, o último filho de Jacob, significa em hebraico "filho da direita", ou "da boa fortuna") viu florescer no seu solo grandes culturas e civilizações, também devido ao seu território caracterizado por uma variedade de paisagens, incluindo montanhas, desertos e costas. As regiões montanhosas do centro são particularmente férteis, enquanto as zonas costeiras são quentes e húmidas.
Entre o século IX a.C. e o século VI d.C., vários reinos estabeleceram-se na região. Entre eles, o reino de Sabá, famoso pela lendária rainha que visitou o rei Salomão em Jerusalém (mencionada tanto na Bíblia como no Alcorão).
Os sabeus, que falavam árabe meridional, eram hábeis comerciantes de incenso e especiarias, e a região era também famosa entre os gregos e os romanos. Eram também excelentes construtores, de tal forma que criaram uma das maravilhas do mundo antigo, a barragem de Ma'rib (de que ainda hoje se podem admirar algumas ruínas), construída no século VII a.C., que foi uma das mais avançadas obras de engenharia hidráulica da Antiguidade. Esta barragem permitiu a irrigação de uma grande área de terreno e tornou a região numa das mais férteis da Arábia, de tal forma que ficou conhecida como Arábia felix.
A barragem foi reconstruída várias vezes ao longo dos séculos, mas o seu colapso final, por volta de 570 d.C. (precisamente na altura do advento do Islão), contribuiu para o declínio definitivo do reino de Sabá.
Outros grandes reinos foram os de Ma'in e Qataban, mas sobretudo o de Himyar (os Himyaritas), cuja cidade principal, Najran, era conhecida tanto pelos produtos dos seus campos férteis como pelo seu comércio, a ponto de ser o ponto de partida da mais importante rota de caravanas entre a Síria e a Arábia (também percorrida pelo próprio Maomé quando negociava aromas com a Síria) e de ser mencionada por Cláudio Ptolomeu, o geógrafo greco-romano, na sua obra Geografia.
Foi precisamente em Najràn que teve lugar o infame episódio dos "mártires homeritas" (ou seja, himiaritas), cuja história está ligada ao rei himiarita Yusuf As'ar Yath'ar, mais conhecido por Dhu Nuwas, que, convertido ao judaísmo, levou a cabo uma política de perseguição contra os cristãos do seu reino que culminou, em 523 d.C., com o massacre de 20.000 cristãos da região, com o massacre de 20.000 homens, mulheres e crianças queimados vivos numa grande fogueira, com o massacre de 20.000 cristãos da região, com o massacre de 20.000 cristãos, homens, mulheres e crianças, queimados vivos, segundo se diz, numa grande fogueira. O mais famoso destes mártires é Santo Areta de Nakhran, que era o chefe da comunidade cristã local. A Igreja Católica comemora Santo Areta e os mártires homeritas a 24 de outubro.
Diz-se que até Maomé, o fundador do Islão, tinha uma grande admiração por estes mártires, cuja história se tornou célebre pouco antes do seu nascimento (é descrita e condenada pelo Corão) devido à grande indignação causada mesmo longe do reino Himyarita, ao ponto de o rei cristão de Axum (na Etiópia), com o apoio do Império Bizantino, intervir para depor Dhu Nuwas e pôr fim à dinastia Himyarita, estabelecendo o controlo Axumita sobre a região.
Desde a chegada do Islão até aos nossos dias
A partir do século VII d.C., o país foi objeto de uma rápida islamização. A nova fé foi aceite pelos habitantes locais, que ajudaram a difundi-la para além da Península Arábica, especialmente na África Oriental e no Sudeste Asiático. Durante o período medieval, a região esteve sob o controlo de várias dinastias islâmicas, incluindo os Abássidas, os Fatimidas e os Rasulidas.
A partir do século XVI, o Iémen passou a fazer parte do Império Otomano, que manteve um controlo alternado com dinastias locais, nomeadamente os Imãs Zaydi, uma seita xiita que governava as regiões montanhosas do norte. O poder dos Imãs Zaydi consolidou-se em 1918, após o fim da Primeira Guerra Mundial e a retirada otomana, com a criação do Reino Mutawakkilita do Iémen.
No sul, o porto de Aden tornou-se uma importante base comercial britânica. A presença britânica estendeu-se então gradualmente ao chamado Protetorado de Aden, que agrupava os numerosos sultanatos e xeques da região. Foi o início de uma divisão, entre o norte e o sul do país, que viria a ter consequências duradouras na política iemenita.
Em 1962, um golpe militar apoiado pelo Egipto derrubou o Imã Zaydi do Norte e proclamou a República Árabe do Iémen (Iémen do Norte). Seguiram-se anos de guerra civil entre as forças republicanas e monárquicas, apoiadas pela Arábia Saudita. A guerra civil terminou em 1970 com a vitória dos republicanos e a instauração de uma república.
Entretanto, o sul tornou-se independente em 1967, após um longo conflito contra os britânicos, como República Democrática Popular do Iémen, com um governo marxista-leninista apoiado pela União Soviética. Este Estado era único na região pela sua ideologia comunista e manteve-se praticamente isolado do resto do mundo árabe.
Em 22 de maio de 1990, o Iémen do Norte e o Iémen do Sul uniram-se finalmente, formando a República do Iémen, com Ali Abdullah Saleh, antigo fundador do partido nacionalista árabe Congresso Geral do Povo e presidente do Norte, como presidente (e ditador) do novo Estado unificado.
No entanto, a transição não foi fácil e as tensões entre o Norte e o Sul persistiram, culminando numa guerra civil em 1994, na qual o Norte, liderado por Saleh, conseguiu prevalecer sobre o Sul.
Durante a década de 2000, o governo de Saleh enfrentou numerosos problemas, incluindo o conflito com os rebeldes Houthi no norte, movimentos secessionistas no sul e a presença de grupos terroristas como a Al-Qaeda na Península Arábica (AQAP).
A primavera Árabe de 2011 também foi palco de protestos em massa no Iémen contra a corrupção, o desemprego e a repressão do governo de Saleh. Após meses de protestos e violência, Saleh foi forçado a demitir-se em 2012, cedendo o poder ao seu adjunto, Abdrabbuh Mansur Hadi, num plano de transição mediado pelo Conselho de Cooperação do Golfo. Uma transição que, no entanto, não curou as profundas divisões políticas e sociais.
Em 2014, os rebeldes Houthi tomaram o controlo da capital, Sana'a, e obrigaram Hadi a fugir. Este facto desencadeou um conflito civil em grande escala em 2015, com a intervenção de uma coligação militar liderada pela Arábia Saudita (culpada de massacres contra civis) em apoio do governo de Hadi.
O conflito provocou uma das piores crises humanitárias do mundo: de acordo com as estimativas da ONU, pelo menos 7 400 a 16 200 pessoas morreram no Iémen desde o início da guerra, que também deslocou mais de 3 milhões de pessoas e provocou uma fome generalizada.
Até à data, o país continua dividido e instável, com o norte sob o controlo dos rebeldes Houthi, o governo internacionalmente reconhecido a controlar partes do sul e da costa ocidental, apoiado pela coligação saudita, e o Conselho de Transição do Sul (STC) a reivindicar autonomia no sul.
Os esforços de paz, mediados pela ONU e por outras organizações internacionais, conduziram a cessar-fogos que, infelizmente, são apenas temporários, e uma resolução duradoura do conflito parece ainda muito distante. A crise humanitária prossegue e a população civil sofre com a fome, as doenças e a falta dos serviços mais essenciais.
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Bispos espanhóis finalizam plano de reparação global para as vítimas de abusos
Após a reunião da Comissão Permanente da Conferência Episcopal Espanhola, os bispos reunir-se-ão no dia 9 de julho em Assembleia Plenária Extraordinária para aprovar o novo Plano de Reparação Integral das Vítimas de Abuso Sexual.
A Comissão Permanente da Conferência Episcopal Espanhola reuniu-se no início de julho. Após as sessões, o Secretário-Geral da Conferência Episcopal, Francisco César García Magán, compareceu perante os meios de comunicação social para dar conta dos trabalhos efectuados.
O primeiro tema abordado pelo Secretário-Geral durante a reunião foi conferência de imprensa foi a aprovação pela Comissão Permanente do "Plano de Reparação Integral das Vítimas de Abuso Sexual de Menores e Equiparados (PRIVA)". Trata-se, nas palavras de García Magán, de "um plano de ação para os casos em que não é possível seguir a via judicial, nem civil nem canónica", mas em que se procura também "a reparação integral das vítimas".
Este plano, que será submetido à aprovação de todos os bispos espanhóis na Assembleia Plenária Extraordinária convocada para 9 de julho, foi elaborado em diálogo com o Secretário-Geral da Conferência Espanhola de Religiosos (CONFER). Da mesma forma, o Secretário-Geral da Conferência Episcopal garante que teve encontros com as vítimas e esteve em diálogo com o Governo espanhol. No entanto, em resposta a questões colocadas pelos jornalistas, García Magán explicou que não podia explicar em que medida o contacto com as vítimas influenciou o PRIVA.
Responder às vítimas de abuso
Embora o documento do PRIVA ainda não tenha sido divulgado, na conferência de imprensa foi dito que "estabelece critérios para a avaliação e aplicação do plano". Os casos para os quais está maioritariamente orientado são aqueles "em que o autor do crime faleceu ou o processo prescreveu, de forma a oferecer uma reparação adequada que responda à procura que cada caso particular exige".
O objetivo, explicou Monsenhor García Magán, é poder proporcionar um verdadeiro acompanhamento, de modo a que as vítimas tenham assistência espiritual, médica e psicológica, e que recebam uma reparação financeira.
Da mesma forma, o Secretário-Geral anunciou que no documento não é indicado qualquer número de vítimas, pois consideram que "o importante é dar uma resposta, não um número".
Os seminários, o Concílio de Niceia e os fenómenos sobrenaturais
Outro dos temas tratados pela Comissão Permanente foi "o projeto de Plano de aplicação dos critérios para a reforma dos seminários em Espanha". Depois dos contributos dados nos últimos dias, o documento será apresentado para estudo na Assembleia Plenária que se realizará em novembro.
Por outro lado, o presidente da Comissão Episcopal para a Doutrina da Fé propôs à Comissão Permanente que "seja elaborada uma Declaração por ocasião do 1700º aniversário do Concílio de Niceia". Segundo explicou na conferência de imprensa, essa Declaração teria lugar durante "uma celebração ecuménica baseada no Credo".
A mesma Comissão Episcopal trabalhou também sobre a questão do papel da Conferência Episcopal "no processo de discernimento dos fenómenos sobrenaturais e das aparições à luz da documento"O Vaticano sobre esta questão.
Principais eventos em 2025
Monsenhor García Magán assinalou também durante a conferência de imprensa que a Conferência Episcopal está a trabalhar em dois grandes eventos que terão lugar em 2025. Por um lado, as actividades que a Igreja espanhola está a preparar para o Jubileu; por outro lado, o Congresso Nacional das Vocações que terá lugar no próximo ano em Madrid, de 7 a 9 de fevereiro.
A Comissão Permanente durante uma sessão de trabalho (Flickr / Conferência Episcopal Espanhola)
Outras questões e um erro no comunicado de imprensa
Por fim, o Secretário-Geral da Conferência Episcopal referiu que a Comissão Permanente aprovou o calendário para 2025. Como eventos a destacar, os bispos realizarão os seus exercícios espirituais de 12 a 18 de janeiro; as Assembleias Plenárias serão de 31 de março a 4 de abril e de 17 de novembro a 21 de novembro; finalmente, a Comissão Permanente realizará as suas reuniões de trabalho a 25 e 26 de fevereiro, 17 e 18 de junho e 30 de setembro e 1 de outubro.
García Magán aproveitou a sua intervenção para assinalar que havia um erro no comunicado de imprensa enviado aos jornalistas. Os bispos fizeram uma "reflexão interna sobre o documento 'Fiducia supplicans'", mas não estava realmente prevista "a publicação de qualquer documento" a este respeito, ao contrário do que indicava a nota.
O caso Belorado e a crise migratória
Em resposta às perguntas feitas após a sua intervenção, o secretário-geral indicou que "oficialmente não se falou de Belorado", referindo-se à excomunhão das freiras clarissas de Burgos. Apesar disso, García Magán descreveu o caso como "uma questão dolorosa e muito lamentável", elogiando a atuação do arcebispo de Burgos, que se destaca pela sua "clareza, caridade e paciência".
Por outro lado, o secretário falou brevemente sobre a crise migratória nas Ilhas Canárias e sobre a nota dos bispos das ilhas, apoiada pela Conferência Episcopal. A este respeito, afirmou que o episcopado rejeita "a utilização ideológica e política da crise migratória" e descreveu o trabalho de ajuda aos imigrantes como uma defesa da vida na sua totalidade.
Nomeações e renovações
Para concluir o seu discurso, o Secretário-Geral mencionou algumas das nomeações e renovações de cargos que tiveram lugar durante a reunião do Comité Permanente.
Entre as nomeações figuram o consiliário nacional do movimento "Cursilhos de Cristandade", o bispo de Alcalá de Henares, D. Antonio Prieto, e o conselheiro espiritual da associação "Renovación Carismática Católica de España", o padre Francisco Javier Ramírez de Nicolás.
Por outro lado, entre as renovações contam-se José Gabriel Vera, como diretor do secretariado da Comissão Episcopal das Comunicações Sociais, e Manuel Bretón, como presidente da Cáritas Espanhola.
Conferência Episcopal Chilena adverte contra a limitação da objeção de consciência em relação ao aborto
Os bispos do Chile alegam ao Estado que o novo regulamento sobre a objeção de consciência em caso de aborto é inconstitucional e conduzirá à discriminação do pessoal de saúde com base nas suas convicções religiosas.
Pablo Aguilera-4 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
No passado mês de maio, o Ministério da Saúde chileno elaborou um novo regulamento sobre a "objeção de consciência no sector da saúde". aborto"Esta medida substituiria a que está em vigor desde 2018, em que os profissionais e instituições de saúde podem declarar-se objectores através de um procedimento simples. Para ter validade legal, requer a aprovação da Controladoria Geral da República.
No dia 1 de julho, D. René Rebolledo, presidente do Conferência Episcopal do Chileem nome de todos os bispos, apresentou uma apresentação dirigida à Controladoria-Geral da União Europeia, salientando a sua inconstitucionalidade e ilegalidade. No seu documento, a Comissão recorda que a objeção de consciência é um direito humano fundamental que assenta na liberdade de consciência, pelo que a restrição deste direito pode afetar outros direitos fundamentais, como a igualdade e a não discriminação. Este facto está claramente estabelecido na Constituição chilena.
Além disso, o Código de Saúde faz uma menção explícita às pessoas autorizadas por lei a serem objectores de consciência: o médico cirurgião e o resto do pessoal que desempenha as suas funções no interior do bloco operatório durante a intervenção.
Discriminação em razão da crença
O novo regulamento favoreceria o favorecimento arbitrário dos não objectores na distribuição dos turnos e no recrutamento de pessoal médico. Além disso, introduz uma modificação importante na distribuição dos turnos a efetuar pelos chefes dos serviços de gineco-obstetrícia, estabelecendo que as listas de objectores de consciência serão tidas em conta para "favorecer a presença de pessoal não objetor na distribuição dos turnos". Trata-se de uma discriminação com base nas convicções morais ou religiosas do pessoal médico - que afectam a sua disponibilidade - e não na sua idoneidade.
O bispo sublinha que o regulamento condiciona o livre exercício da objeção de consciência, na medida em que obriga as instituições (estabelecimentos de saúde públicos e privados) e as suas equipas médicas e funcionários (pessoas singulares) objectores de consciência a adotar e a seguir requisitos burocráticos e onerosos que, embora não impeçam o exercício do direito, o dificultam de forma desproporcionada, de tal modo que, no seu conjunto, constituem incentivos destinados a alterar o estatuto de objetor de consciência.
Este novo regulamento elimina a disposição atual que estabelece que uma pessoa que tenha declarado a objeção de consciência "manterá esse estatuto em todos os centros de saúde onde exerça funções, sem distinguir se são públicos ou privados". A eliminação desta disposição obriga o objetor que presta serviços em diferentes estabelecimentos a submeter-se aos procedimentos necessários para manifestar novamente a objeção de consciência.
Prejuízo de um direito fundamental
Rebolledo, há cinco medidas que impõem condições que dificultam e/ou desencorajam o livre exercício do direito à objeção de consciência. A aprovação do regulamento significaria o enfraquecimento do direito fundamental à consciência e a viver de acordo com as suas convicções religiosas.
Outras organizações, como a "Comunidad y Justicia", também apresentam um pedido semelhante à Controladoria, que o resolverá nos próximos meses.
O documento "O bispo de Roma", publicado pelo Dicastério para a Unidade dos Cristãos, oferece uma visão da figura do Papa numa perspetiva ecuménica e sinodal.
Como deve ser entendido e exercido o ministério do Papa? Esta é uma questão central para a Igreja Católica, para as suas relações com as outras Igrejas e comunidades cristãs, bem como para o desenvolvimento da sua missão evangelizadora.
Isto é o que o documento de estudo publicado pelo Dicastério para a Unidade dos Cristãos com o título "O Bispo de Roma. Primado e sinodalidade nos diálogos ecuménicos e respostas à encíclica 'Ut unum sint'" (13-VI-2024).
Naquela encíclica, S. João Paulo II convidava, em 1995, a repensar as modalidades de exercício do ministério do Papa, para que "possa realizar um serviço de fé e de amor" reconhecido por todos os interessados (n. 95). Desde então, o atual Dicastério, antigo Conselho Pontifício para a Unidade dos Cristãos, tem-se empenhado em recolher as respostas a este convite, especialmente as que nascem dos diálogos teológicos do ecumenismo.
No subtítulo, "primado e sinodalidade" indica não só a circunstância do processo sinodal atualmente em curso como referência, mas, mais profundamente, que a figura do primado e do seu ministério se deve exprimir no quadro da sinodalidade da Igreja.
O texto responde igualmente às conclusões do Papa FranciscoHoje, o ministério petrino não pode ser plenamente compreendido sem esta abertura ao diálogo com todos os crentes em Cristo" (Homilia na véspera da Conversão de São Paulo, 25 de janeiro de 2014).
Por razões de espaço, limitamo-nos aqui a apresentar as principais questões teológicas em causa e as propostas finais do Dicastério à Igreja Católica no seu conjunto.
Questões teológicas fundamentais
Francisco observou: "O caminho do ecumenismo permitiu-nos chegar a uma compreensão mais profunda do ministério do Sucessor de Pedro, e devemos confiar que continuará a fazê-lo no futuro" (Homilia na véspera da Conversão de São Paulo, 25 de janeiro de 2014).
Como fruto dos diálogos ecuménicos, foram identificadas quatro questões em que surgiram novas abordagens ou nuances.
1) Os fundamentos bíblicos do ministério petrino. Reconhece-se o lugar especial de Pedro, como crente e como apóstolo, entre os doze apóstolos; e que, precisamente por causa da sua fragilidade, ele faz brilhar mais a graça de Deus e o capital primordial de Cristo na Igreja. Assim, "na confissão de fé da Igreja emergem três dimensões fundamentais: uma dimensão comunitária, uma dimensão colegial e uma dimensão pessoal" (n. 37). Por outro lado, é feita uma distinção entre a "Igreja mãe" (de Jerusalém) no Novo Testamento e o primado posterior da Igreja de Roma.
Para além de reconhecer o lugar especial de Pedro, é sublinhada a categoria do episcopado com a interdependência mútua de ajuda e serviço entre os seus membros e ao serviço de toda a Igreja. Neste contexto, entende-se o significado da autoridade na Igreja e da "função petrina" com a tarefa especial de cuidar e exprimir a unidade, facilitar a comunicação, a ajuda mútua ou a correção e a colaboração na missão. Como sucessor de Pedro, o Bispo de Roma tem o primado.
2) O "direito divino" foi um argumento utilizado pelo Concílio Vaticano I (1870) na sua declaração sobre o primado romano (const. "Pastor aeternus"), enquanto que tanto os ortodoxos como os protestantes o consideravam simplesmente um desenvolvimento humano ou histórico. Atualmente, esta expressão, ius divinum (bem como outras como "ofício petrino"), é entendida no contexto de um primado universal concebido no âmbito da colegialidade dos bispos, da koinonia-comunhão e da dimensão histórica da Igreja. A essência (doutrinal) do primado pode ser vivida (e tem sido vivida) em formas (históricas) muito diferentes.
3) e 4) No que diz respeito às definições do Vaticano I sobre o primado da jurisdição e a infalibilidade papal, vários grupos de diálogo teológico-ecuménico apontaram a necessidade de aprofundar a interpretação das definições dogmáticas do Vaticano I, "não isoladamente, mas à luz do Evangelho, de toda a tradição e no seu contexto histórico" (n. 59).
Aprofundar o Vaticano I à luz do Vaticano II
Relativamente a este último, o contexto histórico, há que recordar: os riscos do conciliarismo; a interrupção do Concílio pela eclosão da guerra franco-prussiana; a distinção entre as declarações do Concílio e as suas intenções (assegurar a unidade da Igreja na fé e no amor, bem como a sua liberdade de anunciar o Evangelho e a sua independência na nomeação dos cargos eclesiásticos); a distinção entre o texto e a sua interpretação é também importante (cf. Carta dos bispos alemães de 1875, subscrita pelo Papa Pio IX, com a afirmação de que o episcopado é tanto uma instituição divina como uma instituição cristã). A distinção entre o texto e a sua interpretação é também importante (cf. a Carta dos bispos alemães de 1875, subscrita pelo Papa Pio IX, com a afirmação de que o episcopado é uma instituição tão divina como o papado; e que a infalibilidade do Papa se situa no quadro da infalibilidade da Igreja sob certas condições, e não acima, mas ao serviço da Palavra de Deus).
Em geral, entende-se que "o Vaticano I só pode ser corretamente recebido à luz do ensinamento do Concílio Vaticano II" (n. 66). O Concílio Vaticano I foi o primeiro a ser aprovado pelo Papa, que re-situou o ministério papal na sua relação com o episcopado (colegialidade episcopal). E restabelece a ligação entre os "poderes" sacramentais e jurídicos conferidos pela ordenação episcopal, afirmando que o exercício da autoridade do bispo é controlado, em última instância, pela autoridade suprema da Igreja. Nos nossos dias - observa o documento - "o conceito conciliar de colegialidade foi desenvolvido no âmbito do princípio mais amplo da sinodalidade, especialmente no magistério do Papa Francisco" (n. 66; cf. Francisco, Discurso por ocasião do 50º aniversário da instituição do Sínodo dos Bispos, 17 de outubro de 2015).
No entanto, apesar destas declarações, os diálogos ecuménicos continuam a apontar algumas dificuldades em relação a certos princípios: assegurar as expressões da infalibilidade à luz da revelação dada na Sagrada Escritura; colocar a infalibilidade ao serviço da indefetibilidade de toda a Igreja (a certeza de que as portas do inferno não prevalecerão contra ela); facilitar o exercício da colegialidade episcopal; valorizar a "receção" da doutrina por parte dos fiéis (pertencente ao "sensus fidei et fidelium").
Propostas do Dicastério para a Unidade
Nas propostas do Dicastério, distingue-se entre contributos, princípios e sugestões para uma renovada compreensão e exercício do Primado.
a) Contribuições. O texto sublinha que existe uma oportunidade para avançar em algumas direcções: uma reflexão comum sobre a natureza da Igreja e a sua missão no mundo; a interdependência entre primado e sinodalidade a todos os níveis da Igreja; a compreensão da sinodalidade como uma qualidade fundamental de toda a Igreja, incluindo a participação ativa de todos os fiéis; a distinção e a inter-relação entre colegialidade e sinodalidade.
Como passos futuros nos diálogos teológicos, propomos o seguinte:
- Melhorar a ligação e a articulação entre os diálogos ecuménicos, especialmente entre os diálogos orientais e ocidentais;
- Abordar conjuntamente o primado e a sinodalidade como dimensões eclesiais.
- Lembrem-se de que "o ministério primacial ('um') é um elemento intrínseco da dinâmica da sinodalidade, assim como o aspeto comunitário que inclui todo o Povo de Deus ('todos') e a dimensão colegial que faz parte do exercício do ministério episcopal ('alguns')" (Francisco, Discurso ao grupo de trabalho ortodoxo-católico Santo Ireneu, 7 de outubro de 2011).
- Articular esta reflexão tripartida a nível local, regional e universal.
- Clarificar o vocabulário (significado mais preciso de sinodalidade/conciliaridade, colegialidade, primado, autoridade, poder, administração, governo, jurisdição; compreender o significado de "Igreja universal" não como poder mas como autoridade ao serviço da comunhão.
- Promover a receção ("receção ecuménica") dos resultados destes diálogos para que se tornem um património comum entre o Povo de Deus, facilitar o acesso aos documentos do diálogo, organizar eventos académicos, encorajar respostas e a implementação local de alguns deles.
- Valorizar o "diálogo da vida com a doutrina". Nas palavras de Francisco, "o diálogo da doutrina deve ser teologicamente adaptado ao diálogo da vida que se realiza nas relações locais e quotidianas entre as nossas Igrejas; estas constituem um autêntico 'locus' ou fonte de teologia" (Discurso à Comissão para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, 23-VI-2022).
- Incentivar gestos particulares e acções simbólicas do Bispo de Roma, com criatividade e generosidade, promovendo a reflexão teológica sobre os mesmos.
b) Princípios e sugestões para o exercício renovado do primado
Para acolher e responder às propostas dos diálogos ecuménicos e de outros estudos sobre a renovação do exercício do primado, sugerem-se as seguintes linhas:
- A inspiração do princípio de subsidiariedade para facilitar a participação de todo o Povo de Deus na sinodalidade.
- A re-receção católica ou o comentário oficial do Vaticano I, à luz do Vaticano II, a eclesiologia de comunhão e o quadro da "hierarquia das verdades" (UR 11). O primado romano deve ser explicado sublinhando a convergência ecuménica sobre o fundamento bíblico, o desenvolvimento histórico e o significado teológico do primado e da sinodalidade. Isto pode facilitar a compreensão da terminologia do Vaticano I.
- A distinção mais clara entre as diferentes responsabilidades do Papa, sublinhando o seu ministério episcopal a nível local (e, neste sentido, o significado da catedral da Diocese de Roma: São João de Latrão).
- O avanço da configuração sinodal da Igreja, com reflexos concretos nas instituições e nas práticas, inspirando-se nas Igrejas Católicas Orientais, e utilizando os novos meios de comunicação social, tudo isto segundo uma diversidade de níveis e contextos culturais.
- O aprofundamento do estatuto jurídico das conferências episcopais, conferindo-lhes uma autoridade adequada, segundo o modelo dos antigos patriarcados (cf. LG 23), bem como dos organismos episcopais continentais.
- O estudo da possibilidade de o Sínodo dos Bispos ser um órgão deliberativo, sempre com e sob o sucessor de Pedro.
- A possibilidade de constituir um sínodo permanente em representação do colégio dos bispos.
- A promoção da sinodalidade ad extra através da "comunhão conciliar" (reuniões de líderes das Igrejas para promover, através de processos de discernimento conjunto, o "ecumenismo prático" da oração, ação e testemunho cristãos conjuntos).
- O convite a outras comunhões cristãs para participarem nos processos sinodais católicos.
Conclusão
A conclusão do documento sublinha que o primado deve estar enraizado no mistério da Cruz e que a unidade dos cristãos é, antes de mais, um dom do Espírito Santo que devemos implorar na oração, uma vez que o "ecumenismo espiritual" é a alma do movimento ecuménico.
Assim se exprime Francisco: "A unidade não surgirá como um milagre no fim. Pelo contrário, a unidade surge no caminho; o Espírito Santo fá-lo no caminho. Se não caminharmos juntos, se não rezarmos uns pelos outros, se não colaborarmos de muitas maneiras possíveis neste mundo para o Povo de Deus, então a unidade não acontecerá! Mas acontecerá neste caminho, em cada passo que dermos. E não somos nós que o fazemos, mas o Espírito Santo, que vê a nossa boa vontade" (Homilia na véspera da Conversão de São Paulo, 25 de janeiro de 2014).
Ninguém é profeta na sua própria terra. 14º Domingo do Tempo Comum (B)
Joseph Evans comenta as leituras do 14º Domingo do Tempo Comum e Luis Herrera faz uma breve homilia em vídeo.
Joseph Evans-4 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
Seria de esperar que, quando Jesus regressasse à sua cidade natal, Nazaré, onde tinha crescido, tivesse sido bem recebido. Certamente que o conheciam e teriam gostado dele. Bem, conheciam-no, ou pensavam que o conheciam, e esse era precisamente o problema.
Tinham-no visto crescer. Ele era o carpinteiro local. Conheciam os seus familiares mais próximos. Ficaram surpreendidos por ele saber tanto. Nos 30 anos que antecederam a sua partida de Nazaré, provavelmente nunca tinha pregado na sinagoga. É por isso que, no Evangelho de hoje, ouvimos os seus vizinhos dizerem "Onde é que ele vai buscar tudo isto, que sabedoria lhe foi dada, e estes milagres feitos pelas suas mãos? [...] E escandalizavam-se por causa dele"..
Jesus deixou-os como o carpinteiro do povo. Regressou como o Salvador do mundo. Não mudou. Sempre tinha sido o Salvador do mundo, mas tinha-o mantido escondido. Agora revela a verdade sobre si próprio. Mas estas pessoas não estavam dispostas a deixar que o seu conforto fosse perturbado. Não queriam saber mais.
Nós podemos correr o mesmo perigo. Temos pouco conhecimento da nossa fé e isso impede-nos de querer ir mais fundo. Essa é a grande tragédia: tornamo-nos complacentes. Não queremos saber mais.
Uma das piores maldições possíveis é saber um pouco e pensar que isso é suficiente. Como diz o ditado: "Pouco conhecimento é perigoso". O maior teólogo da Igreja, São Tomás de Aquino, a quem Deus disse um dia: "Escreveste bem sobre mim, Tomás"Mais tarde, teve uma visão de Deus no céu. Esta visão chocou-o de tal forma que pousou a caneta e nunca mais escreveu. Comparado com o que tinha visto nessa visão, pensou que tudo o que tinha escrito era "palha". Morreu alguns meses depois.
Deus é sempre mais. Ele é infinito. Há tanto para aprender sobre Ele. A grande mística Santa Catarina de Sena descreveu o conhecimento de Deus como um mergulho num oceano infinito onde há sempre mais para descobrir. Deus realizar-nos-á na medida em que nos deixarmos realizar. Se o nosso desejo for como um dedal, Deus dar-nos-á um dedal cheio de si. Se o nosso desejo for como um balde, Deus dar-nos-á um balde cheio de Si. Se o nosso desejo é como um reservatório, Deus encher-nos-á como um reservatório. E se o nosso desejo for como um oceano, Deus encher-nos-á como um oceano. Em última análise, a questão é: quanto é que eu desejo conhecer Deus?
Homilia sobre as leituras de domingo 14º Domingo do Tempo Comum (B)
O sacerdote Luis Herrera Campo oferece a sua nanomiliaUma breve reflexão de um minuto para estas leituras dominicais.
Antonia, mãe de Carlo Acutis: "O meu filho é um sinal de esperança para os jovens".
Antonia Salzano, mãe de Carlo Acutis, fala nesta entrevista à Omnes sobre o seu filho, que considera "um grande sinal de esperança para os jovens", devido à vida normal que levou. O jovem italiano, como nos diz com alegria a mãe, será canonizado no próximo Jubileu.
Federico Piana-3 de julho de 2024-Tempo de leitura: 5acta
"Uma grande e incontida alegria". A mãe de Carlo Acutis estava a transbordar de emoção quando ouviu a notícia de que o Papa Francisco, durante a Consistório Público Ordinário O Papa tinha decidido que o seu filho seria canonizado durante o Jubileu de 2025, numa data ainda por determinar.
Em conversa com a Omnes, Antonia Salzano explica que esta notícia era aguardada com ansiedade e preocupação: "Carlos tem muitos devotos espalhados por todo o mundo e a canonização permitirá agora que o culto seja universal: isto dar-nos-á também a possibilidade de levar a cabo outras iniciativas em honra de Carlos, como a construção de uma igreja ou a dedicação de algumas capelas".
Amor sem limites
O jovem, que em breve seria elevado às honras dos altares, morreu aos 15 anos de leucemia fulminante. Nos três dias de agonia que precederam a sua morte, Carlos declarou oferecer os seus dolorosos sofrimentos ao Papa e à Igreja. Era grande o seu amor pela EucaristiaChamava-lhe repetidamente "a minha estrada para o Céu", e para Nossa Senhora: um amor sem limites que o levava a assistir diariamente à Santa Missa e a rezar o Santo Rosário.
Como muitos rapazes da sua idade, era apaixonado pelo web design. A sua exposição em linha sobre os milagres eucarísticos, que obteve milhões de visitas em todo o mundo, continua a ser famosa, ao ponto de alguns esperarem que possa ser designado como o santo padroeiro da Internet.
Atenção aos mais pequenos
"O Carlo é um grande sinal de esperança para os jovens", explica a mãe, "porque viveu aquilo por que os jovens passam: as alegrias, os medos, as esperanças. E o Carlo diz-lhes: 'se eu consegui, vocês também conseguem'.
Tem a certeza de que o seu filho é um estímulo no difícil mas fascinante caminho da santidade, porque Carlo "transmite valores que podem ser partilhados por todos, mesmo por crentes e não crentes. Olhou de facto muito intensamente para as periferias existenciais de que o Papa Francisco gosta tanto hoje em dia".
Em Milão, recorda Antonia, "Carlo cuidava dos claustros, tinha um cuidado especial com os imigrantes, era amigo deles: no seu funeral, a igreja estava cheia, apinhada, com muitos deles. Eram carregadores, criados, cuidadores: ele tinha-os conhecido. Para ele, cada pessoa era um mundo, não fazia distinções. Tinha um sorriso e uma boa palavra para toda a gente.
Bálsamo para um mundo ferido
O novo santo com o seu sorriso contagiante pode ser um bálsamo para um mundo ferido por guerras, divisões, ódios e incompreensões. Como diz a mãe: "Ele estava habituado a construir pontes. Acolhia toda a gente. Estas guerras nascem da rivalidade, da inveja, do desejo de posse e de poder. O Carlo, pelo contrário, era uma criança que abdicava até de um par de sapatos porque sabia que havia tanta gente a passar fome no mundo. Costumava dizer-me: "Mãe, um par de sapatos é suficiente para mim, em vez de gastar dinheiro em sapatos novos, vamos ajudar os doentes. Vamos fazer uma boa ação.
Ser essencial
Quando Carlo era ainda muito pequeno, com cerca de seis anos, costumava ralhar com os primos mais novos por deixarem sempre a torneira da água aberta. Antonia ainda se lembra: "Ele dizia-lhes: 'não desperdicem água, é um bem precioso e um dia vai acabar'. O Carlo já tinha estes sentimentos no seu coração, estava habituado a viver o essencial. Ao ver este mundo onde em muitas nações há opulência e desperdício, o meu filho costumava dizer que a Terra, de certa forma, é um caixote do lixo a girar, e talvez não estivesse errado. Quando ia à praia no verão, o seu jogo favorito era ir para o mar com o seu barco e apanhar o lixo que vinha à superfície na maré alta.
Devoção crescente
A devoção a Carlo está a crescer no mundo todos os dias. A mãe não esconde o facto de que "ainda hoje temos dificuldade em acompanhar todas as notícias que nos chegam. Todos os dias recebemos notícias de possíveis milagres de curas e conversões. Aqueles que não o conhecem, agora, com a próxima canonização, terão a oportunidade de o conhecer melhor e de rezar por ele".
Carlo Acutis (Imagem de OSV)
Antonia recorda depois a extraordinária exposição sobre os milagres eucarísticos que teve lugar quando ele dava catequese e cujo objetivo era tornar Cristo conhecido e amado. A exposição chegou a todos os continentes. Só nos Estados Unidos, por exemplo, foi acolhida em 10.000 paróquias. "Carlo", acrescenta a mulher, "admirava-se frequentemente com as longas filas de espera para assistir a um concerto ou a um jogo de futebol, filas que não via na igreja. Não gostava tanto disso que dizia: 'Se as pessoas se apercebessem da importância da Eucaristia, as igrejas estariam tão cheias que as pessoas já não conseguiriam entrar'.
Confissão frequente
O amor de Carlo pela Eucaristia levava-o a confessar-se uma vez por semana. "O Carlo", explica a mãe, "procurava, através de constantes e assíduos exames de consciência, tirar da sua alma todos os fardos que o impediam de voar alto. Queria ser santo, mas dizia a brincar que não queria ser como S. Francisco, que ele amava e que considerava um místico demasiado sublime para o conseguir. O Senhor, na sua bondade, agradou-lhe".
Os dois milagres
O primeiro milagre ligado à beatificação de Carlo, que teve lugar em Assis a 10 de outubro de 2020, diz respeito à cura de uma criança brasileira que sofria de uma rara anomalia anatómica congénita do pâncreas. O segundo, que levou à sua santificação, diz respeito a uma rapariga costa-riquenha, estudante em Itália, que foi operada a um traumatismo craniano na sequência de um acidente. Quando a sua filha se debatia entre a vida e a morte, a mãe desta pobre rapariga foi rezar ao túmulo de Carlo, cujos restos mortais repousam no Santuário de Despojo, em Assis. "Aquela mulher ajoelhou-se junto do túmulo do meu filho", recorda Antonia com emoção, "e ficou ali todo o dia: acabou por obter esta grande graça. Muitas pessoas da Costa Rica também se tinham juntado às suas orações. A sua fé era heróica.
Instrumento de conversão
O facto de Carlo ser canonizado durante o Grande Jubileu de 2025 representa para Antonia uma grande oportunidade para toda a Igreja: "O meu Carlo é um instrumento de conversão. Pode ser um modelo para todos, especialmente para os jovens. O Jubileu é um tempo de graça, um tempo em que o Senhor nos chama a mudar a nossa vida e a aderir ao projeto de santidade que Ele tem para cada um de nós". Há uma frase que a mãe desta nova santa gosta de repetir e que nunca esquecerá: "Todos nascemos como originais, mas muitos morrem como fotocópias".
Dois filmes sobre Carlo Acutis
Por ocasião da próxima canonização de Carlo Acutis, Contratante+ coloca à disposição dos seus utilizadores os dois filmes sobre o "influenciador de Deus" realizados por José María Zavala: "El Cielo no puede esperar" (O Céu não pode esperar) e "El latido del Cielo" (O batimento cardíaco do Céu).
Em ambas as cassetes, encontram-se vários testemunhos de amigos e familiares que falam do jovem Acutis, da sua exposição de milagres eucarísticos e do impacto que teve na vida de centenas de pessoas.
Como é que um arquiteto assume a tarefa de construir um edifício que deve ser um elo de ligação entre o homem e Deus e um sinal da Igreja que acolhe? Esta é a reflexão do autor, especialista em arquitetura sagrada.
Esteban Fernández-Cobián-3 de julho de 2024-Tempo de leitura: 7acta
Há já algum tempo que estudo os fundamentos e a história da arquitetura religiosa contemporânea e reparei que a liturgia tem sido objeto de intensa controvérsia entre os especialistas desde antes do Concílio Vaticano II. Mas, como arquiteto, só posso observar o processo a partir do exterior, ou seja, tentar compreendê-lo a partir da minha própria disciplina.
O Cardeal Carlo Maria Martini recordou que, historicamente, as igrejas têm sido concebidas por clérigos e não por arquitectos. Já não é assim e, por isso, as reflexões que se seguem centrar-se-ão mais nos arquitectos que projectam as igrejas do que nos clérigos que as encomendam. Assim, podemos perguntar: como trabalha um arquiteto que tem de construir uma igreja católica? Onde vai? O que pensa?
O que é uma igreja?
Para o Código de Direito Canónico (1983), uma igreja católica não é mais do que um espaço consagrado à celebração pública do culto divino. Mas para definir com um mínimo de precisão que um objeto arquitetónico é uma igreja, temos de responder a duas questões: o que representa e como é utilizado.
Uma primeira referência significativa aparece na passagem narrada no Evangelho de Lucas 22,12. Aí se explica como Jesus Cristo instrui os seus discípulos para prepararem a refeição da Páscoa. Diz-lhes que devem ir a casa de um conhecido que lhes mostrará uma grande sala onde podem arrumar tudo. Esta sala espaçoso e organizado pode ser apresentado como um paradigma espacial do espaço do culto cristão. De facto, no "Dedicação ritual de igrejas e altares".(1977), Paulo VI apenas pediu que uma igreja fosse adequada e decente (II.I.3).
Na realidade, qualquer igreja deve poder assumir quatro utilizações básicas: acolher os fiéis que se reúnem para a oração, tanto comunitária como individual; contextualizar o anúncio da Palavra de Deus e a celebração da Eucaristia; favorecer a reserva e a adoração do Santíssimo Sacramento; e permitir a celebração dos outros sacramentos, sobretudo no caso das igrejas paroquiais.
A ordem destas quatro funções não é fortuita, mas responde a uma hierarquia concetual que tem sido um tema frequente de discussão nas últimas décadas.
É também geralmente aceite que uma das funções próprias da igreja é a sua expressividade, entendendo-se como expressivo ou simbólico aquele edifício que possui uma atmosfera qualificada que remete para outras realidades. Esta atmosfera deve colocar o espírito em tensão e educar no sentido do sagrado. Assim, aparecem as dimensões espiritual e pedagógica de cada templo.
Muito se tem escrito sobre o simbólico na arquitetura religiosa, e por vezes de forma abusiva. Falamos de simbolismo quando, para compreender uma realidade de natureza espiritual, precisamos de recorrer a um intermediário material que nos remete intuitivamente para ela; esse intermediário é o símbolo.
Se uma igreja estiver bem adaptada à sua utilização litúrgica, já estará em conformidade com o simbolismo intuitivo, profundo e, ao mesmo tempo, simples, contido na liturgia católica. Isto está nos antípodas da tendência algo ingénua de identificar o espaço espiritual com o espaço vazio ou evocativo. Uma igreja não é isso, porque o culto cristão se baseia num facto objetivo: o sacrifício pascal de Jesus Cristo.
Como trabalha um arquiteto
Ora, todos os arquitectos sabem que há um momento em que os conceitos, por mais sugestivos que sejam, têm de ser traduzidos em formas e números. Todos os arquitectos sabem que há um momento em que os conceitos, por mais sugestivos que sejam, têm de ser traduzidos em formas e números. Qual é o comprimento de um altar? Quais devem ser as dimensões de um batistério? Qual é a quantidade certa de luz para uma celebração litúrgica?
Quando um arquiteto se vê confrontado com um projeto de arquitetura religiosa, realiza normalmente uma série de tarefas preliminares.
Em primeiro lugar, recordará as igrejas que mais o impressionaram na sua experiência pessoal. Depois, recorrerá aos manuais de arquitetura: o que diz Ernst Neufert sobre as igrejas? E Ching? Se estiver um pouco mais informado, consultará o livro de Cornoldi ou o Bergamo-Prete. E se for mexicano, terá provavelmente ouvido falar dos projectos do recentemente falecido Fray Gabriel Chávez de la Mora.
Aqui poderá rever as obras de arquitetura mais importantes que foram construídas nos últimos anos, tanto em catálogos impressos como na Internet, ou mesmo em prémios internacionais como o Sola de Frate. Talvez - se o arquiteto estiver realmente empenhado no assunto - leia os documentos da sua circunscrição eclesiástica, difíceis de traduzir em formas, mas que ele não tem outra opção senão justificar. Estes documentos remetem sempre para a jurisprudência anterior, em constante atualização, e para cuja análise não está normalmente habilitado. Ele poderia mesmo consultar as fontes originais, ou seja, os documentos do Concílio Vaticano II. Se o fizer, a sua perplexidade será absoluta.
No final, o arquiteto acabará por recorrer à história dos círculos de giz contada por Leo Rosten: "Era uma vez um tenente do exército do czar que, enquanto montava o seu cavalo através de uma pequena shtelO tenente espantado reparou em cem círculos de giz num dos lados do celeiro, cada um com um buraco de bala no centro. O tenente espantado parou o primeiro homem que encontrou e perguntou-lhe sobre os alvos. O homem suspirou: "Ah, é o Shepsel, o filho do sapateiro. Ele é um bocado estranho. -Não me importo. É tão bom atirador... Não me está a perceber", interrompe o homem. Está a ver: O Shepsel dispara primeiro e depois desenha o círculo de giz".
Nesta questão, é mais fácil inventar algo e depois tentar justificá-lo do que o contrário.
Factores inesperados
Cada templo pode ser considerado como um grande recetor - um transístor, uma antena, um router - que, de certa forma, tem a missão de revelar as realidades que nós, com os nossos sentidos, não conseguimos perceber. É por isso que é necessário que as igrejas sejam templos, ou seja, que sejam capazes de convocar a natureza para que também ela possa participar no culto divino. Isto não se consegue tornando a parede da cabeceira transparente, por exemplo, mas recuperando os arquétipos espaciais de que Jean Hani fala no seu livro "O simbolismo do templo cristão". (1962): o portão, a estrada, a gruta, a montanha, etc.
A arquitetura religiosa é um problema de ambiente total. Não se trata de dispor os fiéis à volta do altar. A impressão que os fiéis recebem - e que lhes permite entrar em contacto com o divino - é a soma de muitos factores, entre os quais gostaria de destacar três: o sentimento de acolhimento, a formação litúrgica da comunidade e a ars celebrandi do sacerdote, ou seja, a sua maneira de celebrar a Santa Missa. Qualquer arquiteto que queira projetar uma igreja deve estar ciente disto.
Do ponto de vista espacial, a sensação de acolhimento pode ser identificada, num primeiro momento, com a existência de um espaço que antecede o espaço de culto: o átrio. Ao entrar numa igreja, o átrio deve funcionar como um espaço de transição entre o profano e o sagrado. O nosso corpo e o nosso espírito precisam de tempo para perceber as mudanças conceptuais. É por isso que o átrio é o lugar de acolhimento por excelência, onde se cria comunidade, se partilham experiências e até bens materiais. O átrio é um espaço essencial nas igrejas, sobretudo nas igrejas urbanas.
O acolhimento - e também a dignidade - podem ser ameaçados por uma manutenção deficiente do edifício. Não me refiro apenas a danos ou sujidade, mas também a cartazes para anúncios ou campanhas da igreja, ecrãs para projetar letras de canções, para não falar de ajustes improvisados no mobiliário litúrgico. Qualquer um destes objectos tem muito mais poder visual do que a própria arquitetura.
Assim, o espaço torna-se inconsequente, por vezes quase ridículo, e o ridículo é incompatível com o sagrado. Esta situação foi, de facto, condenada pelo Concílio Vaticano II, quando apelou a uma nobre simplicidade para todos os objectos destinados ao culto.
Atrevo-me a dizer que, antes de inventar novas formas para as igrejas, é necessário recuperar a dignidade da celebração: aprofundar cada gesto e cada palavra através do estudo e da oração.
Teologicamente, a Igreja, enquanto instituição, é o Templo do Espírito Santo, mas é também o Povo de Deus e o Corpo de Cristo. Esta última qualidade - o Corpo de Cristo - foi a reivindicação central do Movimento Litúrgico, no qual se baseou durante décadas a reforma do espaço celebrativo, seguindo a teologia paulina. Mas ficou escondida depois do Concílio, quando a eclesiologia carismática e popular serviu de pretexto para gerar espaços de celebração do Corpo de Cristo. membros da assembleia.
Se a liturgia for cuidada, se houver paixão pela Palavra de Deus, se, com a devida educação litúrgica, os fiéis compreenderem, ponto por ponto, o que se passa em cada celebração, se procurarem viver ao longo da semana o que celebram ao domingo; se, em suma, a missa for o centro e a fonte de toda a vida dos fiéis cristãos (o que, não o esqueçamos, é o nó capital da reforma litúrgica), então a igreja, como edifício, poderá contribuir com tudo o que tem para contribuir.
Parafraseando Rudolf Schwarz, poderíamos dizer que uma missa bem celebrada num espaço inconsistente é preferível a uma missa mal celebrada num espaço perfeito. Isto não dispensa o arquiteto - muito pelo contrário - de aplicar toda a intensidade possível ao seu projeto.
Algumas observações finais
Gostaria de dizer uma palavra sobre a localização do tabernáculo. Durante mais de mil anos, o tabernáculo foi o centro das igrejas.
Vários estudos indicam que a sua deslocação para uma capela lateral após o Concílio Vaticano II contribuiu para a drástica redução da piedade eucarística nas últimas décadas. E embora alguns países do mundo tenham tentado restaurar a devoção ao Santíssimo Sacramento através da construção de capelas de adoração perpétua, do ponto de vista arquitetónico, considero necessário que o sacrário volte a presidir permanentemente ao espaço eclesial, como sugere a última edição do Instrução Geral do Missal Romano (2002, n.º 314-315). Caso contrário, construiremos edifícios vazios, que não serão nem Casas de Deus, nem Portas do Céu, nem mesmo Templos do Espírito Santo.
Então, como se deve construir uma igreja católica depois do Vaticano II? Em resumo, podemos dizer que a arquitetura religiosa é um fenómeno vivo e em constante mutação; tanto os arquitectos como os clérigos falam, discutem, publicam artigos e livros sobre estas questões com regularidade. O Papa e os bispos também.
Sobre estas bases, a Sagrada Congregação para o Culto Divino emite instruções, notas pastorais, recomendações, cartas, etc. Mas até que todo este material seja incorporado numa nova edição do Instrução Geral do Missal Romanonão pode ser considerado vinculativo.
Até à data, as edições latinas (editio typica) do Instrução Geral do Missal Romano Houve três: 1969/70, 1975 e 2002 (reeditado em 2008 com algumas alterações).
Em Espanha, a versão de 2002 foi implementada em 2016 (as versões anteriores foram implementadas em 1978 e 1988, respetivamente).
Por isso, antes de começar a projetar uma igreja, qualquer arquiteto deve fazer duas coisas: ler o capítulo 5 da última edição do Instrução Geral do Missal Romanointitulado "Arranjo e ornamentação das igrejas para a celebração da Eucaristia", porque é aí que tudo se passa. Ao mesmo tempo, não devemos perder de vista o facto de que cada bispo é soberano: é ele que decide como as coisas se fazem na sua diocese.
Seguindo estas orientações, dentro de meio século, poderemos reconstruir uma verdadeira arquitetura, de acordo com o espírito e a letra do Concílio Vaticano II. Penso que é simplesmente isso que deve ser feito.
O autorEsteban Fernández-Cobián
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Bispos espanhóis incentivam integração de menores migrantes
O diálogo entre as diferentes administrações públicas competentes e a urgente solidariedade interterritorial, acompanhada de um acolhimento global que favoreça a integração social dos jovens migrantes, é a mensagem da subcomissão episcopal espanhola para as migrações e dos bispos das Ilhas Canárias.
Francisco Otamendi-2 de julho de 2024-Tempo de leitura: 3acta
Os bispos das duas dioceses das Ilhas Canárias, D. José Mazuelos e D. Bernardo Álvarez, e o auxiliar Cristóbal Deniz, levaram a cabo uma uma chamada para não esqueceros contributos dos migrantes para a nossa sociedade, que são notáveis", e "criar uma cultura do encontro, ultrapassar a fobia dos estrangeiros, lutar contra as máfias e promover o desenvolvimento dos países de origem".
Como afirma a encíclica "Fratelli tutti" do Papa Francisco, e recordam os bispos, "estas são realidades globais que exigem uma ação global, evitando uma 'cultura de muros' que favoreça a proliferação de máfias, alimentadas pelo medo e pela solidão".
Os bispos salientam ainda que "muitos dos nossos irmãos e irmãs não embarcariam numa viagem tão incerta e perigosa se os seus povos e países vivessem em situações mais justas e se a Espanha e a Europa fossem mais eficazes na promoção de canais de migração legal, ordenada e segura".
"Juntamente com as entidades eclesiásticas que trabalham com e para as crianças, adolescentes e jovens migrantes", acrescentam, "sublinhamos que a sua proteção e integração é um dever ao abrigo da legislação espanhola e europeia e um bem moral que todos os católicos devem promover.
Juntamente com os bispos das Canárias, confiam no diálogo entre as administrações públicas competentes para estabelecer um modelo de acolhimento global que "favoreça a integração social das crianças, adolescentes e jovens migrantes, bem como uma interação positiva com o ambiente social onde são acolhidos".
Requisitos para reduzir os fluxos migratórios
O episcopado espanhol considera que "é preciso fomentar uma cultura do encontro que nos ajude a crescer como humanidade". Com o Papa Francisco, acreditamos que "todos nós precisamos de uma mudança de atitude em relação aos imigrantes e refugiados, uma mudança de uma atitude defensiva e suspeita de desinteresse ou marginalização, para uma atitude baseada na "cultura do encontro", a única capaz de construir um mundo mais justo e fraterno, um mundo melhor" (Mensagem para o Dia dos Migrantes e Refugiados 2014).
Os prelados canários rejeitaram "a instrumentalização ideológica e o discurso alarmista que se pode fazer em torno dos menores migrantes ou do complexo fenómeno das migrações", e sublinharam que "sem condições de vida, de trabalho e de dignidade para as populações dos países de origem, não será fácil reduzir os fluxos migratórios". Os eurodeputados manifestaram ainda a sua "alegria pela notícia de que os nossos governos e a maioria dos nossos políticos abriram um caminho de esperança para ajudar a população das Ilhas Canárias a encontrar uma solução para esta realidade".
As Ilhas Canárias encontram-se numa situação "extrema" em relação aos menores migrantes, afirmou Candelaria Delgado, Ministra da Segurança Social, Igualdade, Juventude, Infância e Família das Canárias, há alguns dias.
Papa: os migrantes fogem da insegurança e da opressão
No seu mensagem Para o 110.º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, que se celebra a 29 de setembro deste ano, o Papa Francisco centrou as suas palavras no tema "Deus caminha com o seu povo".
O Pontífice diz que "é possível ver nos migrantes do nosso tempo, como nos de todas as épocas, uma imagem viva do povo de Deus a caminho da pátria eterna"; e que, tal como os judeus no êxodo, "os migrantes fogem frequentemente de situações de opressão e abuso, de insegurança e discriminação, de falta de projectos de desenvolvimento". Para além destas graves ameaças, "encontram muitos obstáculos no seu caminho", como a falta de recursos, o trabalho perigoso e não remunerado e a doença.
Arcebispo Argüello: apoio à regularização dos migrantes
No início de março, quase imediatamente após ter sido eleito presidente da Conferência Episcopal, o arcebispo de Valladolid, D. Luis Argüello, apoiou publicamente a Iniciativa Legislativa Popular (ILP) para a regularização de quase 400.000 estrangeiros residentes em Espanha antes de novembro de 2021, sublinhando que "é tempo de ultrapassar uma polarização causada por interesses políticos".
Neste sentido, Argüello declarou na rede social X, antigo Twitter, que "a dignidade humana pede-nos para acolher, proteger, promover e integrar estes vizinhos, muitos deles menores", e escreveu um declaração a este respeito. Na mesma linha declarou o Arcebispo de Madrid, Cardeal José Cobo.
Juntamente com a figura de S. Tomé, a revista Omnes centra o seu olhar na realidade do Ocidente, em que o envelhecimento da população é um desafio incontornável que a Igreja deve enfrentar com a mais profunda caridade e justiça.
2 de julho de 2024-Tempo de leitura: 2acta
São Tomás de Aquino dizia que "a misericórdia é, em si mesma, a maior das virtudes, uma vez que lhe pertence servir-se dos outros e, mais ainda, socorrer as suas carências". Esta frase enquadra-se no seguinte número duplo A edição de julho e agosto de 2024 da Omnes, na qual a figura de Aquino e os idosos no mundo atual estão no centro do conteúdo da revista.
Triplo aniversário
São Tomás de Aquino, um dos nomes sem os quais a filosofia e a teologia não podem ser compreendidas atualmente, continua muito vivo.
Em 2023 assinala-se o 700º aniversário da sua canonização, em 2024 o 750º aniversário da sua morte e em 2025 o 800º aniversário do seu nascimento.
Na carta que o Papa Francisco dirigiu aos bispos das dioceses diretamente ligadas ao Doutor Angélico, salientou que o principal legado do ilustre dominicano se baseia "sobretudo na santidade, caracterizada por uma especulação particular que, no entanto, não renunciou ao desafio de se deixar provocar e medir pela experiência, mesmo pelos problemas e paradoxos inéditos da história, lugar dramático e ao mesmo tempo magnífico, para nela discernir os traços e a direção para o Reino que há-de vir". De facto, a inspiração, o método, os ensinamentos e as reflexões de um dos maiores Doutores da Igreja continuam plenamente actuais oito séculos após a sua morte.
Os nossos idosos
Juntamente com a figura de São Tomás, o número especial da Omnes centra-se na realidade do Ocidente, em que o envelhecimento da população é um desafio incontornável que a Igreja deve enfrentar com a mais profunda caridade e justiça, bem como com a criatividade necessária para evitar reducionismos e aproveitar as grandes potencialidades dos idosos na vida da sociedade e da Igreja.
Há muitas iniciativas em todo o mundo que não só cuidam dos idosos, mas também fazem deles os principais protagonistas.
O desafio de uma cultura de cuidados holísticos, de valorização e redescoberta de uma sociedade mais velha, mas não envelhecida, é sem dúvida uma das principais tarefas dos políticos, dos pastores e dos fiéis no mundo de hoje.
Este "voltar-se para os outros" a que S. Tomás se refere na frase que recordámos e que, para os cristãos, se traduz no exercício da caridade, a principal virtude entre todas as virtudes e o tronco central da fé.
Como eu disse Bento XVIÉ belo ser velho! Em cada idade é preciso saber descobrir a presença e a bênção do Senhor e as riquezas que ela encerra. Nunca te deixes aprisionar pela tristeza! Recebemos o dom de uma vida longa. Viver é belo mesmo na nossa idade, apesar de alguns "males" e limitações. Que a alegria de nos sentirmos amados por Deus, e não a tristeza, esteja sempre no nosso rosto".
São Tomás de Aquino é o tema da edição de julho-agosto da revista
A edição de julho-agosto de 2024 da revista Omnes apresenta São Tomás de Aquino. A Igreja celebra o triplo aniversário de Aquino: 2023 marca os 700 anos da sua canonização; 2024 marca os 750 anos da sua morte; e 2025 marcará os 800 anos do seu nascimento.
A revista impressa de julho-agosto de 2024 centra-se em São Tomás de Aquino e apresenta contribuições de autores fundamentais para a interpretação atual do pensamento de Aquino. Aproveitando a ocasião do seu triplo aniversário, o novo número da Omnes pretende mostrar a grande influência deste Doutor da Igreja.
Entre os nomes que assinam as colaborações estão Lluís ClavellA conferência foi presidida pelo antigo presidente da Pontifícia Academia de São Tomás de Aquino; Lorella Congiunti, presidente da Sociedade Internacional de São Tomás de Aquino; e Alan Joseph Adami, professor de Sagrada Teologia na Pontifícia Universidade de São Tomás de Aquino.
O dossier é completado com artigos sobre os principais temas do pensamento de Aquino, a sua visão do homem e a sua interpretação do pensamento aristotélico.
Especial para idosos
O especial de verão da revista Omnes é dedicado aos idosos, aos cuidados e à cultura da integração. Através da análise efectuada por especialistas como María Teresa Bazo ou Mario J. Paredes, este especial lança luz sobre a situação dos idosos e tenta sugerir ideias para melhorar o seu nível de vida e a sua inclusão na sociedade.
Entre os artigos encontram-se também as histórias de vários idosos que decidiram continuar a dar o que podem diariamente.
O primado papal, o Sínodo e o caminho apostólico
Giovanni Tridente, Federico Piana e Ramiro Pellitero escrevem sobre a atualidade do Vaticano. Entre os temas que abordam este mês estão o novo documento "O Bispo de Roma" e o "Instrumentum Laboris" da próxima sessão do Sínodo.
Além disso, há uma secção dedicada à viagem apostólica do Papa Francisco em setembro de 2024. Naquela que será a sua viagem mais longa até à data, o Santo Padre visitará a Indonésia, Singapura, Timor Leste e Papua Nova Guiné.
Razões, Étienne Gilson e a Carta de Barnabé
Este mês, Juan Luis Lorda fala, no seu artigo na revista Reasons, de Étienne Gilson, autor de um dos livros mais panorâmicos sobre o pensamento cristão no século XX. Como explica Lorda, Gilson relata no seu livro como os grandes temas do conhecimento se transformaram graças à interpretação de autores cristãos.
Em Razões há também um interessante artigo escrito por Jerónimo Leal sobre a "Carta de Barnabé". Este artigo explica as profecias e prefigurações que se referem a Cristo.
"Amar sempre mais" e os primeiros cristãos
No âmbito das Experiências, este número da Omnes apresenta o projeto "Amar siempre más", uma iniciativa pastoral assente em três pilares: a família, o espiritual e o social.
Por outro lado, as Iniciativas deste mês correspondem a "Os primeiros cristãos"O sítio Web, criado por estudantes universitários, reúne informações sobre as primeiras comunidades de seguidores de Cristo.
Cultura, Evangelho e livros
Como todos os meses, a revista inclui também breves meditações sobre o Evangelho; uma abordagem a uma figura cultural importante, neste caso o Prémio Nobel Adolfo Pérez Esquivel; e recensões de vários livros que podem ser ideais para este verão.
A revista julho-agosto 2024 está disponível em formato digital para os assinantes das versões digital e impressa. Para os assinantes da versão impressa, um exemplar será entregue em sua casa nos próximos dias.
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Os dias de descanso estão a chegar, e não faz mal rever o nosso conceito de descanso. Há duas premissas bíblicas. O Génesis 2,1-2 diz: "Assim foram acabados os céus e a terra e todo o universo. E quando ele (Deus) terminou a sua obra no sétimo dia, descansou no sétimo dia". E Jesus disse: "Vinde a mim, todos vós que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei".
Francisco Otamendi-2 de julho de 2024-Tempo de leitura: 3acta
O texto do Génesis E continua: "E Deus abençoou o sétimo dia e santificou-o, porque nele descansou de toda a obra que Deus tinha feito ao criar". Assim, Deus santificou o repouso, como Jesus fará com o trabalho (trinta anos na oficina de José), e também com o repouso, quando estiver cansado da viagem.
O abaixo-assinado é um jornalista, não é um especialista em Sagrada Escritura, nem em artes festivas, nem em psicologia. Aqui estão apenas alguns pontos que nos podem ajudar a descansar, em alguns dos significados do termo que o Real Academia Espanhola. Estes são:
1. Cessar o trabalho, reparar a força com a quietude.
2. ter algum alívio das preocupações.
3. Aliviar-se, ter alívio ou consolação comunicando a um amigo ou pessoa de confiança os seus problemas ou dificuldades.
4. Descansar, dormir.
5. Diz-se de uma pessoa: estar calmo e descuidado porque tem confiança em algo ou alguém.
6.Para aliviar alguém no trabalho, para o ajudar no seu trabalho.
Há mais significados para o termo "descanso", mas estes são suficientes para uma rápida reflexão numa perspetiva cristã, que qualquer pessoa pode fazer.
1. parar de trabalhar, restaurar a força através da quietude
Este é o primeiro significado. Ele indica o Catecismo da Doutrina Católica que "assim como Deus 'cessou no sétimo dia de toda a obra que tinha feito' (Gn 2, 2), assim também a vida humana segue um ritmo de trabalho e de repouso. A instituição do Dia do Senhor ajuda cada um a gozar de um tempo de repouso e de descontração suficiente para poder cultivar a sua vida familiar, cultural, social e religiosa" (n. 2184).
2. ter algum alívio das preocupações
São Mateus escreve: "Vinde a mim, todos vós que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso. Porque o meu jugo é fácil de suportar e o meu fardo é leve".
No conhecido fragmento de abandono à Providência, S. Lucas regista E disse aos seus discípulos: "Por isso vos digo: não andeis preocupados com a vossa vida, pelo que haveis de comer, nem com o vosso corpo, pelo que haveis de vestir; porque a vida é mais do que o alimento, e o corpo mais do que o vestuário. Olhai para os corvos: não semeiam nem ceifam, não têm armazém nem celeiro, e Deus alimenta-os; quanto mais valiosos sois vós do que as aves! Quem de vós, por estar sobrecarregado, pode acrescentar uma hora ao tempo da sua vida? Portanto, se não podeis fazer a mais pequena coisa, por que vos preocupais com o resto?"
3. Aliviar-se, comunicar a um amigo os males ou as dificuldades.
Papa Francisco: "Deus, no Decálogo, mostra outra luz do que é o repouso, que é 'contemplação e louvor'". "Ao repouso como fuga da realidade, o Decálogo opõe o repouso como bênção da realidade", acrescentou numa entrevista ao Papa. Público em geral em 2018.
"Para nós, cristãos, o dia do Senhor é o domingo, e na Eucaristia, que significa 'dar graças', é o culminar desse dia de contemplação e bênção, em que acolhemos a realidade e louvamos o Senhor pelo dom da vida, agradecendo-lhe a sua misericórdia e todos os bens que nos concede". O repouso no Senhor é uma doutrina estabelecida por autores espirituais. Francisco recordou em várias ocasiões as palavras do Salmo: "Só em Deus repousa a minha alma", e a necessidade de cultivar o silêncio e a oração.
Na mesma catequese, o Papa disse que "o descanso é também um tempo propício para a reconciliação, para enfrentar as dificuldades sem fugir delas, para encontrar a paz e a serenidade de quem sabe apreciar as coisas boas que tem, mesmo no meio da dor ou da pobreza".
4. Descansar, dormir
Numerosos médicos, psiquiatras e psicólogos defenderam as propriedades benéficas do sono, numa sociedade em que o tempo necessário para dormir é frequentemente reduzido. Defenderam igualmente a prática de exercício físico moderado, em função da idade e com indicação ou controlo médico.
5. Estar calmo e despreocupado devido à confiança em algo ou alguém.
Esta questão foi mencionada nos pontos 2 e 3 supra. Talvez se possa acrescentar a conveniência de cultivar amizadeO amor que é "um amor recíproco que deseja todo o bem para o outro, um amor que produz união e felicidade", como escreveu São João Paulo II, e sobre o qual o Papa Francisco meditou na Exortação Apostólica Christus vivit e na sua catequese.
6. Aliviar alguém no trabalho, ajudar outra pessoa
Cuidar dos outros, especialmente dos mais necessitados, dos pobres, dos idosos e dos doentes, para além de cumprir o mandato da caridade, é sempre benéfico para o espírito, e uma boa prova disso são os testemunhos de muitas pessoas que se dão aos outros.
Lluís Clavell: "A família é a forma mais elevada de amizade".
Nesta entrevista, Lluís Clavell, antigo presidente da Academia Pontifícia de São Tomás de Aquino, responde às perguntas da Omnes sobre o conceito de família nos escritos de Aquino, a atualidade do seu pensamento e a sua influência nos dias de hoje.
Loreto Rios-1 de julho de 2024-Tempo de leitura: 5acta
A família é um dos grandes temas da atualidade. No entanto, o facto de ser um tema de enorme relevância nos dias de hoje não é razão para pensar que no passado não tenha sido um tema de grande importância. Tanto assim é, que já no século XII São Tomás de Aquino Reflectiu sobre o assunto e deixou para a posteridade alguns pensamentos que podem ser fundamentais para o século XXI.
Lluís Clavell é também Professor de Metafísica na Pontifícia Universidade da Santa Cruz, onde foi Reitor de 1994 a 2008. Foi também consultor do Conselho Pontifício para a Cultura e membro do conselho de administração da Sociedade Internacional Tomás de Aquino.
Nesta entrevista, o antigo presidente da Academia Pontifícia de São Tomás de Aquino responde às perguntas da Omnes sobre o conceito de família nos escritos de Aquino, a atualidade do seu pensamento e a sua influência nos dias de hoje.
Como é que São Tomás de Aquino define a família?
- Relativamente a estas questões mais teológicas, tenho de confessar os meus limites. Sempre me debrucei sobre o assunto mais pelo lado filosófico, por exemplo, pelo lado da amizade. Aristóteles dedica a este assunto nada menos do que dois livros do Ética a Nicómaco. A família é a forma mais elevada de amizade, e o amor interpessoal entre os cônjuges é a coisa mais educativa que existe. Não que seja preciso inventar grandes coisas: quando os filhos vêem como os pais se amam, aprendem quase tudo. São Tomás fala da família como um ventre espiritual. É o lugar onde a criança cresce, se forma, aprende o que é a liberdade, muitas coisas, não só o uso da linguagem.
Que outros aspectos menos conhecidos do pensamento de São Tomás estão a ressurgir hoje em dia?
- Recentemente, por exemplo, na Academia de S. Tomás, em Roma, realizou-se uma sessão plenária em que foi apresentado um volume sobre as emoções segundo S. Tomás. Os teólogos também têm estudado bastante o assunto. Talvez no passado tenha sido menos frequente, porque seguiam uma visão mais puramente intelectual, centrada no dogma. Mas é evidente que S. Tomás, que tem muito a dizer sobre as emoções, está agora a ser mais estudado.
O mesmo se passa noutros aspectos. Por exemplo, existe atualmente um tomismo que se chama "tomismo bíblico", mais centrado nos comentários aos escritos da Sagrada Escritura e aos Salmos. O próprio São Tomás compôs também poesia, hinos litúrgicos, que ainda hoje cantamos e de que gostamos.
Qual é então, segundo São Tomás, a importância da família?
- A família, por um lado, é um sinal de miséria: nascemos, precisamos de aprender a falar, de ser ensinados... A família é uma necessidade. Mas também é uma grandeza, que é um aspeto que algumas pessoas não vêem. Refiro-me à grandeza da família como um projeto de vida, porque a vida não se resume a ter sucesso num emprego.
Ao lermos S. Tomé, vemos que ele capta muito bem este facto: precisamos da família, porque somos crianças; mas, ao mesmo tempo, é uma grande coisa, porque os animais não têm verdadeiramente uma família. Muitas pessoas descobrem-no quando têm um desastre familiar: é a coisa mais difícil que nos pode acontecer. A família é poder amar, e amar com um amor de doação, gratuito, recíproco, total. São Tomás chega a dizer que, deste ponto de vista, o género humano é superior aos anjos. Os anjos ajudam-nos, mas os anjos não têm filhos, mas os homens têm.
É importante ver a família não apenas como uma necessidade, como uma carência, mas como algo mais, um projeto de vida. Agora estamos assustados com o declínio da taxa de natalidade, mas isso significa que talvez tenhamos criado módulos de trabalho e de triunfo que olham apenas para uma parte do que é a pessoa humana.
Como é que a visão de São Tomé nos influencia hoje?
- São Tomás viveu num período muito notável. Houve o nascimento das universidades, e ele conhecia bem o neoplatonismo e Santo Agostinho, mas o aristotelismo chegou-lhe, como uma irrupção, e chegou-lhe também através de pessoas de países árabes ou de países conquistados pelos árabes, como no caso de Espanha. É uma pessoa que, juntamente com a sua formação no Neoplatonismo, conhece bem Aristóteles, que não era só filosofia, era também ciência, biologia, física, etc.
Encontra-se, portanto, numa situação ideal, incrível, que lhe permitiu oferecer-nos algo que perdurou ao longo dos tempos. Espanta-me que, nestes anos, tenhamos reflexões como a de Alistair MacIntyre sobre a fragmentação do conhecimento. Foi um dos livros que mais impacto teve em mim, eu estava a viver na fragmentação do conhecimento, e apercebi-me disso até certo ponto, mas a universidade ajudou-me muito a tentar unir, a fazer comunicar as diferentes formas de conhecimento. O Tomás tentou fazê-lo, e é também por isso que, quando se cultiva este campo, se sente a sua ajuda, que é algo do passado, mas que se sente como algo muito atual.
Por exemplo, vamos realizar em breve um congresso mundial de filosofia (1-8 de agosto, em Roma), no qual a Rede Ibero-Americana de Filosofia também está envolvida. É um congresso centrado numa filosofia que atravessa fronteiras, e fomos convidados a ter uma sessão sobre São Tomás, juntamente com outras dedicadas a outros grandes filósofos da história.
E agora uma pergunta curiosa: que influência pensa que este ressurgimento do pensamento de Aquino teve nas recentes eleições europeias?
- A família entrou numa fase um pouco mais contestada a partir da revolução antropológica de 1968, e mais recentemente com algumas medidas dos governos europeus, incluindo o Parlamento Europeu. Os resultados das eleições europeias mostram que a Filosofia e a Teologia de S. Tomás suscitam grande interesse. Falando agora sobre as recentes eleições, um jovem filósofo, formado na Complutense, em estudos de ciência política, comentou que uma Europa que ignora a verdade da pessoa conduz à frustração. Nos resultados eleitorais, podemos ver que há também uma revolta contra isso.
Este jovem filósofo comenta que a negação da verdade da pessoa entre as elites europeias leva a uma mudança como reação. Há quem interprete isto apenas de um ponto de vista político, mas este autor, que é simultaneamente político e filósofo, considera que não se trata apenas de uma questão política, mas também de uma questão antropológica, há uma certa consciência entre os jovens de que é necessário mudar, realçar as coisas que são importantes para ser feliz e construir uma Europa melhor. A questão da defesa das raízes cristãs da Europa está presente: penso que não está morta e que se faz em diálogo. Um filósofo bem equipado com o moderno e o antigo tem muito a dizer.
Num mundo desconectado, individualista e desumano como o nosso, perante a popularização do sem contactoA Igreja será um sacramento de salvação enquanto for capaz de ser um sinal visível de fraternidade.
1 de julho de 2024-Tempo de leitura: 4acta
Depois do "Dai-vos uns aos outros a paz fraterna", ninguém, absolutamente ninguém, apertou a mão do vizinho de banco. E as duas pessoas a quem estendi a mão rejeitaram-na com um gentil cumprimento oriental. Quanto a vós, não sei, mas eu vejo o perigo de uma vida cristã. sem contacto.
Não se tratava certamente de uma eucaristia paroquial dominical, mas de uma daquelas missas de um dia de semana, numa igreja situada num local central, de manhã cedo, onde os fiéis não se conhecem habitualmente.
Chegam mesmo à hora de início, sentam-se longe uns dos outros e depois apressam-se a chegar aos seus empregos nos escritórios e lojas das redondezas, pelo que é compreensível que haja falta de confiança, mas a popularização da vénia tornou-se pandémica, nunca se disse melhor, desde a Covid. Em breve, em vez de "a paz esteja convosco", estaremos a dizer "namaste".
O apelo para minimizar o contacto durante esta catástrofe global era mais do que justificado, mas, ao fim de algum tempo, a motivação higiénica torna-se uma desculpa que esconde, na minha opinião, algo mais profundo, uma forma subtil de fé individualista que coloca o praticante nos antípodas da fé cristã.
O mistério da Encarnação quebrou a barreira entre Deus e o homem. Jesus é Deus que toca e que se deixa tocar. Durante a sua vida pública, repreendeu os escrúpulos dos fariseus e o seu medo de se tornarem impuros pelo contacto físico e, com a sua morte na cruz e o consequente rasgar do véu do templo, significou também o fim da separação cúltica entre os homens e o "sagrado".
Há poucas semanas, retomámos as leituras dos domingos do Tempo Comum que, neste ciclo B, correspondem ao evangelista Marcos. Trata-se de um evangelho que nos apresenta um Jesus um pouco "atarracado", se me permitem a expressão.
Vemo-lo tomar pela mão a sogra de Pedro e a filha de Jairo, tocar a pele doente do leproso e a língua atrofiada do surdo-mudo, abraçar as crianças, tomá-las nos braços, impor-lhes as mãos e pedir-lhes que as deixem vir até ele.
Também o vemos apertado no meio de uma multidão ou numa casa cheia e até a ser beijado por Judas no Getsémani, o que indica que se tratava de uma forma habitual de saudação.
O auge do desejo de Jesus de entrar em contacto físico com os seus discípulos de todos os tempos está na instituição da Eucaristia, onde não só nos convidou a tocá-lo, mas também a comê-lo (essa é a nossa fé).
Não somos espíritos circunstancialmente corpóreos, mas uma unidade de corpo e alma; e, na Igreja, membros do único corpo de Cristo, do qual ele é a cabeça. Por isso, não só a Eucaristia torna presente esta intimidade com o sentido do tato, mas também os outros sacramentos.
Assim, no Batismo, vemos o sinal na testa, a unção no peito e na cabeça, a imposição das mãos ou o rito do "...".effetá"Na ordenação, o bispo impõe as mãos sobre o futuro sacerdote e unge as suas mãos com o santo crisma; na Confirmação, assiste-se também à imposição das mãos e à unção, bem como a sinais como a mão do padrinho sobre o ombro do crismando ou o abraço do bispo ou o beijo da paz.
Na confissão, podemos ver o padre colocar uma ou duas mãos sobre a cabeça do penitente durante a absolvição; na unção dos doentes, o ministro aplica o óleo na testa e nas mãos dos fiéis; e no casamento, os noivos apertam as mãos, colocam o anel um no outro e dão o beijo da paz (e isto até onde consigo ler, porque depois tem de ser consumado).
Em todos estes "sinais visíveis de uma realidade invisível", como se define a palavra sacramento, a ação de Deus que lava, cura, alimenta, fortalece, une, cria, abençoa, perdoa, transmite o seu poder, acolhe... Em suma, ama, porque uma fé sem obras, uma ação espiritual sem correspondência corporal, é uma fé morta.
Não somos anjos, mas seres humanos feitos à imagem e semelhança de Deus, de carne e osso, o mesmo que ressuscitará transformado e que nos acompanhará eternamente. Porque é que o rejeitamos, deixando-nos levar por tradições muito distantes daquilo que Jesus Cristo nos ensinou?
Quando o nosso espiritualismo desencarnado se torna mais doloroso é quando rejeitamos os favoritos do Senhor, os pobres, os doentes, os idosos, os migrantes... Com eles, adverte-nos o Papa Francisco, "podemos ter compaixão, mas geralmente não lhes tocamos".
Oferecemos-lhe a moeda, mas evitamos tocar-lhe na mão e deitamo-la fora. E esquecemos que este é o corpo de Cristo! Jesus ensina-nos a não ter medo de tocar os pobres e os excluídos, porque Ele está neles. Tocar os pobres pode purificar-nos da hipocrisia e fazer-nos preocupar com a sua condição. Tocar os excluídos.
Num mundo desconectado, individualista e desumano como o nosso, perante a popularização do sem contactoA Igreja será um sacramento de salvação enquanto for capaz de ser um sinal visível de uma comunidade de verdadeiros irmãos e irmãs que, como tal, não têm medo de dar as mãos.
Como crentes em Deus Trindade, um Deus que é uma comunidade de pessoas em relação íntima, temos de ter a noção clara de que ninguém se salva sozinho, mas pela mão de outro. Sim, pela mão de quem está ao seu lado.
Jornalista. Licenciado em Ciências da Comunicação e Bacharel em Ciências Religiosas. Trabalha na Delegação Diocesana dos Meios de Comunicação Social em Málaga. Os seus numerosos "fios" no Twitter sobre a fé e a vida diária são muito populares.
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O Papa encoraja a Igreja e a sociedade a "não excluir ninguém".
O Papa Francisco sublinhou, durante a meditação do Angelus, que "Deus não nos mantém à distância", pelo que os católicos devem seguir o seu exemplo para acolher e amar as pessoas "sem rótulos".
Durante o Angelus No domingo, 30 de junho, o Papa Francisco, com base no Evangelho do diaO facto de Jesus ter tocado em duas mulheres que eram consideradas impuras, segundo a lei judaica, foi destacado.
Cristo, disse o Pontífice, "contesta uma conceção religiosa errada, segundo a qual Deus separa os puros de um lado e os impuros do outro. Deus, como nosso Pai, não faz tal distinção, "porque todos somos seus filhos, e a impureza não provém da comida, da doença ou mesmo da morte, mas a impureza provém de um coração impuro".
Deus não nos mantém à distância
Esta é a lição que devemos aprender com esta passagem do Evangelho, explicou o Papa. "Perante os sofrimentos do corpo e do espírito, perante as feridas da alma, perante as situações que nos oprimem e mesmo perante o pecado, Deus não nos mantém à distância, Deus não se envergonha de nós, Deus não nos julga. O que o Senhor faz, sublinhou Francisco, é aproximar-se "para se deixar tocar e para nos tocar", porque assim nos salva da morte.
Cristo, disse o Santo Padre, olha para cada cristão para dizer: "Sofri todas as consequências do pecado para te salvar". E com isto, o crente enche-se de esperança.
Perante isto, o Papa encorajou todos a perguntarem-se: "Acreditamos que Deus é assim? Deixamo-nos tocar pelo Senhor, pela sua Palavra, pelo seu amor? Entramos em relação com os nossos irmãos e irmãs, oferecendo-lhes a mão para os levantar, ou mantemo-nos à distância e rotulamos as pessoas de acordo com os nossos gostos e preferências?
Francisco concluiu a sua meditação pedindo que "olhemos para o coração de Deus, para que a Igreja e a sociedade não excluam, não excluam ninguém, não tratem ninguém como 'impuro', para que todos, com a sua própria história, sejam acolhidos e amados sem rótulos, sem preconceitos, para que sejam amados sem adjectivos".
O Papa, os Protomártires e a Paz
Depois da oração do Angelus, o Papa quis saudar "as crianças do Círculo Missionário 'Misyjna Jutrzenka'", da Polónia, e os peregrinos "da Califórnia e da Costa Rica". Referiu-se também "às Filhas da Igreja" e "aos rapazes do Gonzaga de Mântua".
Como de costume, o Santo Padre rezou pela paz, colocando esta intenção nas mãos do Sagrado Coração de Jesus. Recordou também os proto-mártires romanos e recordou que "também nós vivemos em tempos de martírio, mais ainda do que nos primeiros séculos". O Papa quis enviar uma mensagem de apoio a todos os cristãos que sofrem perseguições e violências por viverem a sua fé, e pediu a todos os católicos que os apoiassem e se deixassem "inspirar pelo seu testemunho de amor a Cristo".
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