Família

María Álvarez de las Asturias: "Todo o acompanhamento é terapêutico".

Com uma vasta experiência no acompanhamento de casais de todas as idades, a advogada María Álvarez de las Asturias defende, nesta entrevista à Omnes, a necessidade de uma comunicação fluida no casamento e a necessidade de não recorrer a ajuda à última hora.

Paloma López Campos-27 de janeiro de 2025-Tempo de leitura: 8 acta
Álvarez de las Asturias

María Álvarez de las Asturias é mulher, mãe, jurista e professora. A sua experiência no acompanhamento de casais ao longo da vida e o seu trabalho, primeiro como Defensora do Vínculo e atualmente como juíza do Tribunal Eclesiástico de Madrid, tornaram-na uma voz autorizada em todas as questões relacionadas com a dinâmica saudável do casal.

O acompanhamento é um apoio para os casais em qualquer fase das suas vidas. Está a tornar-se um recurso essencial à medida que cada vez mais mensagens bombardeiam os casais com o mantra "é fácil acabar e começar de novo noutro lugar". Perante esta situação, o acompanhamento pretende transmitir uma mensagem de esperança e de luta pelo matrimónio.

Para saber mais sobre este trabalho, María Álvarez de las Asturias explica em que consiste este recurso, esclarece alguns mitos e mostra que a comunicação é uma das melhores ferramentas que os casais têm para resolver os seus problemas.

Em que consiste o acompanhamento e qual é a chave para este trabalho?

-Nos últimos anos, chegámos ao termo "acompanhamento", que é amplo e engloba a assistência a qualquer pessoa que necessite de ajuda nas suas relações pessoais e familiares. 

Trata-se de uma ajuda não clínica, porque há muitas dificuldades pessoais, de casal e familiares que não têm uma raiz clínica e, por conseguinte, não necessitam de tratamento médico. O acompanhamento é uma boa combinação com outros tipos de ajuda, que pode ser clínica, jurídica ou espiritual. No acompanhamento, é muito importante que nós, profissionais, trabalhemos em parceria: estamos a lidar com pessoas, não com clientes ou fontes de rendimento. Não podemos ser "donos do caso", porque nós não "vemos casos", vemos pessoas.

Esta forma de acompanhamento não clínico surge porque muitas pessoas o solicitam em função da evolução das circunstâncias. 

Há cinquenta anos, as dificuldades eram resolvidas com os conselhos da família e dos amigos. Vivíamos a um ritmo diferente, geralmente mais próximos uns dos outros, mas hoje já não temos essa proteção familiar e social. As pessoas sentem-se muito sós e não sabem para onde se virar.

No acompanhamento, a pessoa a quem se dirige oferece-lhe uma garantia, pela pessoa que é e pela formação que tem, de que tem a capacidade de compreender a dificuldade que está a sentir e a capacidade, se não de resolver essa dificuldade, de o ajudar a encontrar o profissional que o pode ajudar.

Quais são os mitos e as realidades sobre o acompanhamento no casamento?

-A primeira coisa é deixar claro que é difícil para nós pedir ajuda. Ninguém gosta de admitir que tem uma dificuldade. E também não gostamos de falar dos problemas que temos.

Um dos grandes mitos que deve ser esclarecido é que a ajuda oferecida pelo acompanhamento não é para o momento em que já se decidiu separar. Ou seja, as dificuldades de um casal surgem num determinado momento e, desde esse momento até à decisão de se separar, há um enorme espaço de tempo em que é necessário atuar, precisamente para evitar uma rutura.

Sugiro sempre que, se um casal se encontrar numa situação em que se apercebe de uma rutura ou de que a relação está a começar a ficar pesada e não consegue resolver o problema sozinho, deve pedir ajuda. Um mal-entendido deste tipo pode ser resolvido de forma a fortalecer a relação. Mas se esse mal-entendido não for resolvido, o casal tomará facilmente caminhos paralelos que mais tarde divergirão. 

Qual é a necessidade de profissionalizar o acompanhamento?

-Como já disse, por um lado, a solidão das pessoas foi muito influenciada pela dispersão geográfica e também pelo ritmo de vida que levamos. Por outro lado, as famílias deixaram muitas vezes de partilhar os mesmos valores e princípios de antigamente. Este facto é também fortemente influenciado pelo ambiente social que, desde há mais de vinte anos, passou da valorização da família e do casamento para a sua desvalorização e ataque.

Por tudo isto, os casais encontram dificuldades na sua vida e é-lhes mais difícil encontrar alguém que tenha a mesma visão que eles. Daí a necessidade de um acompanhamento profissional que possa responder aos pedidos dos casais que não encontram a ajuda de que necessitam no seu ambiente imediato.

Qual é a primeira coisa a considerar quando se lida com uma crise no casamento?

-A primeira coisa a saber é que as crises são uma parte natural de uma relação. Se começar uma relação, seja ela qual for, com a firme intenção e desejo de a fazer durar no tempo, essa relação vai passar por crises, porque as crises são mudanças. A relação amorosa que não cresce, morre. 

Crescimento significa mudança, e a mudança é uma crise. As mudanças nas circunstâncias obrigam-nos a reposicionarmo-nos, mas temos de perder o medo da palavra "crise", porque tendemos a pensar que é equivalente a pensamentos de separação e não são a mesma coisa.

Há crises que têm uma origem negativa, mas outras têm origem em algo positivo, como o nascimento de um filho ou uma promoção no trabalho. Sabendo isto, podemos dizer que, em princípio, as crises podem ser resolvidas com uma boa comunicação. 

Uma crise não resolvida é o que pode levar a uma separação. Se não conseguirmos resolver uma crise, é bom estabelecer um limite de tempo, não demasiado longo. Se, após um certo período de tempo, ainda estivermos a arrastar a dificuldade, devemos pedir ajuda para a resolver.

O que é que acontece quando um dos cônjuges quer ter um acompanhamento mas o outro tem reservas?

O ideal é que ambos procurem aconselhamento mas, como "o ótimo é inimigo do bom", caso um deles não queira, pelo menos através do que vai, pode-se tentar melhorar a relação. No entanto, é sempre melhor ouvir os dois lados. Também é verdade que muitas vezes acontece que o parceiro relutante se abre à possibilidade de acompanhamento quando vê que a outra pessoa faz mudanças que afectam positivamente a relação.

Penso também que o facto de o acompanhamento não ser clínico é uma vantagem que elimina barreiras. Para além disso, penso que este acompanhamento não clínico é muitas vezes uma boa maneira de a pessoa que precisa de tratamento clínico se aperceber de que seria bom pedi-lo.

Que sentido faz o acompanhamento e a existência de um sistema deste tipo numa altura em que há tanto medo do compromisso e em que nos habituámos ao divórcio e à separação?

-Faz todo o sentido do mundo, porque o que a sociedade nos propõe está a causar um enorme sofrimento a muitas pessoas. 

Ninguém se casa para falhar. Ninguém quer sair-se mal na sua família e o que descobrimos é que quando se anuncia a possibilidade de trabalhar para melhorar uma relação, a maioria das pessoas quer correr esse risco. 

O nosso trabalho faz sentido e surge a pedido de pessoas que não encontram apoio no seu ambiente familiar e social para levar a cabo o seu compromisso e a sua união de amor.

Qual é a diferença entre o acompanhamento clínico e o acompanhamento não clínico?

-Devemos começar por esclarecer que todo o acompanhamento, mesmo que se trate de tomar um café com uma pessoa e de a ouvir, é terapêutico, porque ajuda a aliviar a preocupação ou o sofrimento. Mas nem todo o acompanhamento é clínico. A diferença entre o acompanhamento e os cuidados clínicos é que existem dificuldades nas relações (dificuldades de comunicação, ou nas relações com os sogros) que não têm origem numa patologia; e nestes casos, os médicos têm poucas hipóteses de as resolver. 

Por outro lado, se um dos membros do casal ou da família precisar de cuidados clínicos, é bom que o resto da família possa contar com acompanhamento para viver essa situação, uma vez que a patologia de um tem repercussões nas relações de todos.

Qualquer forma de escuta amorosa, não julgadora e não crítica de outra pessoa é acompanhamento. Todos nós o podemos fazer até certo ponto. Mas quando a dificuldade começa a ser grande, é aconselhável recorrer a um profissional com formação no domínio da sua preocupação. 

No meu caso, a minha formação jurídico-canónica e a minha formação em aconselhamento de luto e feridas emocionais, juntamente com a minha experiência com casais de noivos, dão-me uma qualificação mais elevada do que a de um amigo bem intencionado.

No acompanhamento, quando dizemos a uma pessoa treinada o que nos está a acontecer, é mais fácil determinar a verdadeira importância do problema. Quando temos uma dificuldade e ela dá voltas na nossa cabeça, é normal que ela se "enrole". Nessa altura, é difícil ver o problema de forma objetiva. Ao exprimir e trazer à tona o que nos incomoda, a dificuldade começa a ser vista com a importância que tem e é um primeiro passo para a cura.

Como acompanhar um casamento de 50 anos, com os seus defeitos, rotinas e virtudes já tão marcados que se torna difícil mudar?

-Estes casamentos também têm crises, como a do ninho vaziopor exemplo. Nesta fase em particular, há quem diga que se tivermos síndrome do ninho vazio é porque o vosso casamento não está a correr bem, mas isso é bárbaro. Esta é a idade em que os vossos filhos se tornam normalmente independentes. Mesmo que não tenham filhos, ambos os cônjuges estão a envelhecer e provavelmente já vêem o fim da sua vida profissional no horizonte. A idade em que se encontra não irá duplicar, o que significa que está a começar a viver a segunda parte da sua vida. Por conseguinte, coisas em que não pensavam antes estão agora a vir ao de cima.

A geração anterior, que cuidou de si e a quem podia recorrer, já não está presente ou começa a precisar dos seus cuidados. De repente, encontramo-nos na primeira fila. Os outros vêm ter consigo, mas é difícil para si encontrar alguém a quem recorrer. 

É perfeitamente normal que, nesta situação, haja uma crise existencial. Se se viveu como se queria viver, é mais fácil resolver esta crise e enfrentar os vícios ou os problemas que entravam a relação. Se o casal ainda está disposto a manter o compromisso que os une, é mais fácil encontrar uma forma de enfrentar a crise e de se adaptar às novas circunstâncias da sua vida.

A dificuldade perigosa surge quando um ou ambos os parceiros, num determinado momento da relação após o casamento, têm a impressão de que não estão a viver a vida que queriam viver. É nessa altura que surge a crise existencial, que muitos situam por volta dos cinquenta anos, mas que pode ocorrer em qualquer altura. Se não estão satisfeitos com a vida que estão a viver, muitos decidem bater a porta e ir-se embora. Se chegar a este ponto, é difícil resolvê-lo. É um problema que só pode ser prevenido: a prevenção baseia-se em cuidar dessa união de amor todos os dias, renovando o compromisso conjugal. Ou seja, a morte súbita do matrimónio, que bater com a porta e ir-se emboraA razão para isso é que não foi dito em tempo real o que estava a tornar-se incómodo no casamento. 

É por isso que temos de ser muito cuidadosos com a comunicação e dizer um ao outro as coisas que pesam na relação. Temos de dizer um ao outro o que gostamos, o que achamos difícil, as nossas esperanças e as mudanças que gostaríamos de ver ou fazer.

A comunicação é necessária para cuidar da nossa relação e para garantir que a vida que levamos juntos nos convém. Isto não significa que possamos fazer tudo o que gostaríamos de fazer; mas ao falarmos sobre tudo (o que gostamos, o que nos custa, as ilusões e as mudanças que gostaríamos) fazemos o que é possível e evitamos atirar à cara um do outro as coisas que avaliámos em conjunto como não sendo possíveis ou que devemos adiar.

Há algum momento do acompanhamento em que se percebe que, para aquele casamento, o único recurso que resta é a separação? O que se faz então?

-É importante notar que no acompanhamento não tomamos decisões por outras pessoas. Ajudamos a pessoa que vem ao acompanhamento a levantar e a pôr em cima da mesa as coisas que precisa de esclarecer para tomar as decisões que lhe parecem adequadas. 

No acompanhamento, apoiamos as pessoas que não se sentem capazes de tomar decisões sozinhas na altura, mas não tomamos decisões por elas.

Há casais que, do ponto de vista do companheiro, podem ser capazes de seguir em frente. Mas não se pode tomar essa decisão por eles se, no final, decidirem separar-se. Temos de respeitar a liberdade das pessoas, essa é a primeira coisa.

Como profissionais de acompanhamento, devemos também acompanhar as separações e as rupturas. Sem julgar, porque é uma situação que pode ser traumática e a crítica acrescenta sofrimento a um momento já doloroso.

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