Recebi recentemente o seguinte testemunho. É de um jovem que frequentou um curso de preparação para noivas. Partilho-o convosco porque é imperdível:
"A razão pela qual venho a este curso, apesar de nem sequer ter namorada, é a minha conversa com o Padre Graciano. O padre Graciano é o padre da minha aldeia. Ele conheceu-me toda a minha vida. Todos na aldeia o adoram. Mesmo aqueles que não acreditam, consultem-no e apreciem-no. Graciano tem a sabedoria dos santos. Talvez por passar tanto tempo na igreja, em frente do pequeno tabernáculo. Seria de pensar que era apenas mais um acessório, juntamente com as cegonhas, os bancos gastos e a torre do sino.
Depois do meu último caso de amor falhado, decidi consultar o Padre Graciano. Apanhei o autocarro para a minha aldeia e fui para a igreja, onde sabia que o encontraria como sempre. Disponível para todos. Depois da sua pequena surpresa por acreditar em mim na cidade, das perguntas habituais sobre a família e dos comentários sobre a minha altura, fui directo ao assunto:
-Pai, preciso do vosso conselho. Já tive várias namoradas e não sei o que é que acaba sempre mal e fico devastado. Não sei se tenho um azar ou se sou um bruto.
Ali, dei rédea solta ao meu despeito acumulado ao longo dos anos e contei-lhe, um a um, todos os meus casos amorosos e os seus fracassos. Ele ouviu com atenção. De vez em quando ele fazia uma pergunta ou sorria para os meus comentários. Sempre fui uma pessoa de tudo ou nada e vivo-a intensamente. Quando terminei, olhei para ele.
-Diz-me, Pai, porque é que acaba sempre mal? Ele levou o seu tempo antes de responder. Ele olhou de lado para o tabernáculo, suponho que implorando ajuda divina, e respondeu-me assim, com a sua habitual doçura e segurança:
-Bem, Nacho. Vamos analisá-lo pouco a pouco. Vamos começar pela primeira rapariga de que me falaste... Ana, certo?
-Sim, Pai.
-Bom. Não sei porque incluiu a Ana como namorada. Aquela rapariga não era uma namorada. Foi algo mais. Chamem-lhe o que quiserem. Um namoro é uma coisa séria. É uma preparação para o casamento. Tal como os padres vão para o seminário e preparam-se, e nós rezamos. O cortejo é como o seminário do casamento.
-Mas pai, eu tinha apenas 18 anos de idade.
-Even se tivesses 15 anos. Aquela rapariga não era uma namorada. Provavelmente nem sequer pensou nela como a mulher da sua vida.
-Não, claro que não. Ela era uma rapariga muito bonita, mas não tínhamos nada em comum.
-Bem, primeira observação. No namoro, não se escolhe uma rapariga só porque se sente atraído por ela. Somos corpo mas também alma. A sua inteligência deve aprovar e também sentir-se atraído pela sua decisão", olhei para ele surpreendido com a simplicidade e lógica do seu raciocínio.
-Então, Patricia? o que é que lhe correu mal?
-Oh, esse foi o próximo... Foi o contrário com esse. Escolheste-a com tudo o que achavas que a tua namorada devia ter, mas não me disseste tu mesmo que andavas com ela e olhavas para outras raparigas?
-Vocês sabem disso, Nacho. Coração e inteligência. Ambos são necessários para escolher. E eu acrescentaria a oração. Que o namoro já pode ser uma coisa sagrada. Não se pode pedir ajuda a Deus apenas quando surge uma emergência. Deve tê-lo em conta em todas as decisões da sua vida. Os pequenos e os grandes. A pessoa que escolher como sua noiva deve ter tudo o que procura em alguém com quem criaria uma família. E depois as famílias têm as suas coisas. Depois vêm as crianças, os solavancos do trabalho, as hipotecas, as doenças... Compreende?
-Sim, pai. Dá-me muito em que pensar.
-Bem, vamos em frente, depois foi Marina....
-Não, pai. Marina foi a última. Depois foi a Carmen.
-O que correu mal com ela?
-Não sei, porque ela era perfeita. Bonita, boa... ela tinha tudo. Ela até me ajudou a terminar a minha licenciatura.
-Sim. O que correu mal com aquela rapariga é que você foi um idiota. Em primeiro lugar, deixas os teus amigos envolverem-se, e uma relação é uma relação de dois sentidos.
-Mas pai, eles riram-se de mim porque a levei ao ballet em vez do futebol. Tem a sua dignidade e tem de marcar o seu território.
- A "dignidade" de que fala é inútil numa relação amorosa, Nacho. E a coisa do território, deixa isso para os animais na selva. Num cortejo, uma série de virtudes deve ser desenvolvida. Entre eles, a generosidade. Pensar na outra pessoa e não em si próprio. Para alargar o mais possível o seu coração. Dar, dar e dar. Nunca é demasiado pouco. E juntamente com a generosidade, a humildade. Devia ter-lhe pedido desculpa quando lutou porque não estava certo.
-Bem, ela também não," respondi obstinadamente.
-Você deveria ao menos ter dado o primeiro passo", admitiu ele, pacientemente, "O orgulho mata o amor". É preciso saber como pedir perdão. A pessoa que escolher deve também saber como pedir perdão. A humildade é a chave para uma coexistência feliz e faz-nos amar mais uns aos outros. Eu também acrescentaria força. Esta rapariga ajudou-o a terminar o seu curso, o que fazia a dormir na altura em que ela o chamava para estudar? Sem força não se pode construir nada. Gostaria de estar sempre a puxar a outra pessoa como uma criança pequena? Não, Nacho. É preciso ser forte e, ao mesmo tempo, compreensivo e terno. E não só ternura em beijos e abraços. Tendência na forma como nos tratamos uns aos outros, nos nossos gestos. Esta é a base do respeito.
-Mas pai, nós não somos perfeitos", aventurei-me.
-Não, claro que não", disse ele com uma gargalhada. Mas é disso que se trata o namoro. Conhecendo-se e trabalhando em conjunto numa série de virtudes que permitem que o seu amor cresça. Primeiro és "tu e ela", mas depois, em casamento, tens de procurar o "nós". É um processo para toda a vida. Mas começa no namoro.
-Se no fim de contas... não resulta... Qual é o sentido de todo este esforço? Olha para Marina. Com ela tudo era perfeito. E eu fiz um esforço. É verdade que não tenho todas essas virtudes tão bem quanto gostaria, mas dei tudo de mim e correu mal.
-Não. Nada mau. Com Marina eu diria que não foi mau. O sucesso de um cortejo não é necessariamente o de terminar num casamento. O sucesso está em ser uma boa preparação para si como futuro marido e para ela como futura esposa. No amor ambos têm de estar presentes e se ela não quisesse no final, então ela não queria estar. Mas leva consigo uma "mochila" cheia de boas acções que o tornaram melhor. Olhei para ele surpreendido e um pouco consolado.
-Pai, se eu seguir o vosso conselho, encontrarei a pessoa que me cumpre completamente?
-Não, filho", olhou-me com seriedade, "Nunca vais encontrar isso", abri a minha boca com espanto.
Isso só pode ser encontrado no céu. As pessoas não nos completam absolutamente. Ao amor humano o que é próprio do amor humano e ao amor divino o que é próprio do amor divino. De um amor humano pode esperar e aspirar ao mais alto, mas dentro do imperfeito. O senhor mesmo o disse. Não somos generosos, humildes, fortes... e faltam-nos tantas outras virtudes. Não podemos, portanto, exigir dos outros uma perfeição que não existe na terra. Mas devemos esforçar-nos por tornar o nosso amor uns pelos outros tão perfeito quanto possível.
-Obrigado, Pai. Deu-me muito em que pensar. Recomendaria algo mais?
-Dir-lhe-ia que quando conhecer a pessoa certa, procure amá-la muito e conheça-a bem. É importante falar de tudo com toda a confiança e de uma forma natural. Sobre a fé, sobre questões da vida (aborto, eutanásia...), sobre os seus projectos (trabalho, etc.). E também, Nacho, aproveite o facto de agora viver numa grande cidade. Procura preparação para namorados, educa-te bem. É bom ter preparação para os académicos mas também para a vida. É bom viver em comunidade e com Deus. Não o deixe de lado.
-Obrigado, pai. Pensarei em tudo o que me disse.
Mil resoluções saíram dessa conversa. Não sei se vou encontrar a pessoa certa. Mas eu sei que se o fizer, estarei pronto.
Na prática do aconselhamento matrimonial deparamo-nos frequentemente com problemas que têm a sua origem no namoro ou que poderiam ter sido evitados se o namoro se tivesse desenvolvido adequadamente. Um bom noivado é uma garantia importante para um casamento forte. Mas como nos podemos preparar bem no namoro?
Penso que a primeira coisa que temos de considerar são as seguintes questões preliminares: o que é um namoro e o que espero do namoro e depois do casamento. Uma vez resolvidas estas questões, abordaremos a questão de como fazer do nosso cortejo um momento de verdadeira preparação para o casamento.
O que é um namoro
Relativamente à primeira ideia: o que é um namoro. Devemos distinguir o namoro de outras formas que encontramos hoje e que não são nada parecidas. O namoro não é uma relação com o direito ao atrito. Namoro não é uma relação que deixe de lado qualquer tipo de compromisso ou exclusividade. Namorar não é um namoro, nem são namoricos ou arranjos semelhantes.
O noivado é uma fase de preparação para o casamento entre duas pessoas que sentem amor um pelo outro e querem que este cresça cada vez mais a cada dia. De facto, a preparação para o casamento não é a preparação pré-casamento antes da celebração do casamento, mas um período mais longo e importante.
Para os cristãos, porém, o namoro vai para além do meramente humano e chega também ao espiritual. O empenho é já um caminho de santidade e de preparação para viver a vocação universal ao amor que se concretiza no casamento.
Se um amigo nosso nos dissesse que queria tornar-se padre, pareceria lógico perguntar-lhe se tinha pensado bem, se tinha rezado sobre isso... e mesmo assim, para começarmos a namorar uma pessoa, deixamos Deus fora disso. É importante rezar sobre a pessoa que queremos namorar e, uma vez noivos, rezar também por essa pessoa.
Se não deixarmos Deus fora do nosso cortejo, habituar-nos-emos a algo que é muito importante: tê-Lo em conta também no nosso casamento.
O que esperamos do namoro
Em relação à segunda ideia preliminar: o que esperamos do namoro e depois do casamento. Isto é algo em que também precisamos de reflectir. Todos nós nascemos com um desejo insaciável de sermos amados apenas por sermos quem somos. Não por ser bonito, inteligente ou ter um bom emprego, mas por ser Perico Perez. Este desejo gera um vazio interior que, em certos momentos, pode até ser doloroso: ninguém me compreende, sinto-me só, etc.
Um erro comum é pensar que no namoro, e mais tarde no casamento, encontrarei uma pessoa que preencherá completamente essa lacuna. Isso é impossível porque o amor humano nunca é perfeito e a nossa sede é de amor perfeito. Esse vazio só será completamente preenchido no céu.
Apenas aquilo que é próprio do amor humano pode ser pedido ao amor humano. E, dentro de um amor humano, o amor dos noivos contém potencialmente o que deve ser realizado no decurso do casamento. Um amor que, na sua imperfeição, tende e esforça-se por ser o mais perfeito possível. Um amor que tende a passar de "tu e eu" para "nós". Este é um processo que deve ser desenvolvido durante todo o casamento e que nunca se esgota.
Ideias chave
Uma vez esclarecidas estas questões preliminares, podemos agora abordar todos os aspectos que podem ou não tornar o meu cortejo um sucesso.
Antes de mais, é preciso ter em mente que cada cortejo deve começar com uma paixoneta. Deve haver sempre uma atração amorosa uns para os outros. Mas, como o ser humano não é apenas um corpo mas também uma alma e tem inteligência, a atracção que sentimos por esta outra pessoa deve ser confirmada pela nossa inteligência. Ou seja, não basta que uma pessoa me atraia fisicamente, mas também deve atrair-me com a minha inteligência. Essa pessoa deve ter aqueles aspectos que procuro na pessoa com quem quero formar uma família no futuro. É bom ter isto em mente e estar ciente, em reflexão, de que a vida matrimonial não será como era quando éramos jovens e despreocupados. Haverá obrigações, doenças, solavancos relacionados com o trabalho na estrada... e em todas estas circunstâncias a pessoa que me acompanhará será aquela que eu escolher agora.
Em segundo lugar, é importante ter em conta uma série de virtudes humanas que são uma boa "mochila" para levar consigo para o casamento. São virtudes que tenho de ver se a pessoa com quem namoro as tem e, ao mesmo tempo, virtudes que tenho de saber se eu próprio as tenho ou se tenho de trabalhar nelas. É claro, tendo em conta que ninguém é perfeito. O importante é que a virtude exista ou que haja um esforço sincero para a alcançar. Entre estas virtudes destacaria:
- Humildade. É muito importante ver já no cortejo se a outra pessoa sabe como pedir perdão. Se souberem reconhecer o que fizeram de errado e recomeçarem. O orgulho é um dos piores inimigos do amor sincero e, portanto, do casamento. Devemos trabalhar sobre esta virtude durante o noivado e prestar muita atenção a ela.
- Tenderness. Não só em manifestações físicas mas também na linguagem, em gestos: como me fala, como me ouve, como me trata... E não só a mim mas também aos outros. A ternura é a base do respeito, sem a qual é muito difícil ou impossível manter um casamento.
- Generosidade. Mesmo como noivos, devemos praticar a procura do bem da outra pessoa primeiro, sem pensar tanto em nós próprios. A generosidade é a chave da felicidade. É verdade que no namoro o dom de si não é tão completo como no casamento, mas para que o dom se torne aquilo que deveria ser, é necessário trabalhar na generosidade com o outro e estendê-lo a amigos, colegas de trabalho, etc. Aqueles que se esforçam por tornar os seus corações grandes estão melhor preparados para o casamento.
- Fortaleza. A fortaleza é uma virtude chave para qualquer relação amorosa. No namoro podemos ver se a outra pessoa se desfaz por alguma coisa, se é preguiçoso nos estudos ou negligente no trabalho. É esta virtude que permite que o casamento seja um casamento forte.
Para além de todas estas virtudes (poder-se-ia falar de muitas mais), dois outros aspectos que merecem destaque são: a fé e os temas sobre os quais devemos falar antes de nos casarmos.
Em relação à fé, não é essencial que a outra pessoa partilhe a minha fé, embora isso fosse muito bom. Em qualquer caso, tenho de considerar se existe uma rejeição da fé que tenho. É muito fácil respeitarmo-nos mutuamente durante o namoro nesta área, mas depois haverá questões como a educação das crianças na fé, pôr em prática as minhas próprias crenças, e assim por diante. Estas são questões muito importantes que precisamos de ter em conta já no namoro e não esperar que sejam resolvidas automaticamente quando nos casarmos.
Em termos de temas a falar antes do casamento, é muito bom falar progressivamente à medida que o noivado avança e, naturalmente, sobre todas as questões que são importantes. Não nos podemos limitar a falar de questões sem importância. Precisamos de conhecer bem a pessoa, como ela pensa, como agiria em certas circunstâncias. Exemplos de questões que precisam de ser discutidas antes do casamento são: questões relacionadas com a vida (aborto, eutanásia), questões relacionadas com a paternidade (regulação natural, contracepção, fertilização in vitro, paternidade responsável, etc.), questões relacionadas com a vida em comum (onde quero viver, tipo de trabalho, etc.).
Finalmente, é importante salientar a importância crescente das iniciativas para preparar os noivos, mesmo que ainda não tenham um noivo ou noiva. A formação e o acompanhamento são uma boa garantia para reforçar e enriquecer o nosso compromisso.