O Papa Francisco esteve no México apenas durante cinco dias. Mas se examinássemos tudo o que ele disse durante a sua visita, ficaríamos impressionados com a diversidade e riqueza da sua mensagem. De todas as viagens de Francisco, aquela ao México foi sem dúvida a mais enfática: uma espécie de compêndio das questões que ele tratou no seu pontificado. O Papa teve a oportunidade de falar sobre cada uma das questões que estiveram no centro da sua agenda: exclusão, ecologia, migração, família. Mas nesta ocasião ele acrescentou outros à lista e ofereceu uma visão interligada de todos eles à luz do Evangelho.
Aqueles que esperavam ganhos políticos da sua viagem ficaram desapontados. Com grande habilidade, o Papa conseguiu fugir daqueles que queriam aproveitar a sua visita para levar água à sua fábrica; refiro-me a certos indivíduos e grupos dentro do governo federal, governos locais, partidos políticos, grupos de oposição, meios de comunicação social, grandes empresas. O aspecto mais importante da sua visita pastoral não estava na ordem política mas na ordem moral e, acima de tudo, espiritual.
O Papa não disse nada que já não soubéssemos sobre os problemas do México: os seus males estão à vista. O México é uma nação sobrecarregada pela pobreza, corrupção e violência. Como resultado, muitos mexicanos - felizmente, nem todos, seria injusto generalizar - caíram em letargia, indiferença e fatalismo. Mas talvez o pior dos nossos vícios seja o cinismo. Nos auditórios apinhados onde Francisco ofereceu este grave diagnóstico, pessoas que deveriam sentir-se aludidas, cantadas e aplaudidas, como se o Papa falasse de outro país, de outro planeta.
Perante este cenário desanimador, Francisco ofereceu a mensagem duradoura de Jesus Cristo: põe Deus no centro da tua vida, ama o teu próximo, aprende a perdoar, não negoceies com o mal. O México é um país largamente católico. Seria de esperar que estas regras da vida fossem conhecidas por todos ou quase todos. No entanto, a triste verdade é que o México está longe de Jesus Cristo. Quem são os responsáveis? Poder-se-ia apontar maus elementos dentro do governo, da oligarquia, das elites intelectuais e mesmo da hierarquia eclesiástica. Mas não creio que haja muito sentido em procurar culpados. De certa forma, todos os mexicanos partilham, em maior ou menor grau, a responsabilidade pelas nossas misérias. Em vez de lamentar os nossos infortúnios, deveríamos olhar para o futuro. Foi isto que o Papa Francisco nos convidou: a deixar para trás o conformismo, a acreditar na possibilidade de mudança, a trabalhar em conjunto para construir uma realidade melhor. Há mexicanos que já estão comprometidos com este projecto. Esperemos que a mensagem do Papa motive outros a caminhar por este caminho de esperança.
Não seria fácil escolher o ponto alto da viagem do Papa Francisco. As massas em San Cristóbal de las Casas - dedicadas aos povos indígenas - e em Ciudad Juárez - dedicada à migração - foram muito emotivas e com um poderoso conteúdo social. As duas cidades são extremos geográficos do México que também simbolizam a natureza extrema da realidade da nação. Mesmo antes da sua chegada, Francisco salientou a importância da sua peregrinação à Basílica de Guadalupe. Talvez a imagem mais duradoura da sua estadia seja a do Papa a rezar em silêncio perante a Virgem. O México é um povo abençoado pela presença permanente da Virgem Maria de Guadalupe. Nos momentos mais difíceis da nossa história, ela tem oferecido conforto aos mais necessitados. Ela também tem sido um agente unificador da nacionalidade. O México não pode ser compreendido sem a Guadalupana. Mas então surge uma pergunta perturbadora: por que razão, se nós mexicanos somos tão Guadalupanas, nos distanciámos de Jesus Cristo? Temos sido maus filhos da Virgem? Temos abusado da sua misericórdia? É difícil não supor que haja alguma verdade nestas conjecturas. Contudo, também seria injusto não reconhecer as difíceis condições históricas em que os mexicanos tiveram de lutar contra todo o tipo de adversidades. Como disse Francis, o México é um país longamente sofredor.
O México é o segundo país mais católico do mundo. Para além dos incidentes particulares da viagem do Papa Francisco a essa nação, uma avaliação completa da sua visita terá de ter em conta todo o contexto do seu pontificado. Entretanto, não percamos de vista que o que o Papa Francisco disse no México não é válido apenas para o México: é uma mensagem universal que deve ser ouvida por toda a humanidade. O México deu ao Papa a oportunidade única de formular um discurso que deveria servir de guia para um mundo como o nosso, que está mergulhado na incerteza e no desespero.
Filósofo, Universidade Nacional Autónoma do México.